Uma decisão desesperada. Um contrato perigoso. Um amor impossível. Giulia Morelli vive em Siracusa, carregando o peso de uma família à beira do colapso: sua mãe luta contra uma doença grave, e o tempo para salvar sua vida está acabando. Quando todas as portas se fecham, Giulia descobre um clube secreto em Palermo — um lugar onde mulheres são leiloadas ao maior lance, e a única chance de salvação é se vender para o homem mais temido da Sicília. Salvatore Mancini, um poderoso chefe da máfia italiana, compra Giulia sob condições duras e intransigentes. Entre quartos luxuosos, regras rígidas e um contrato que mais parece uma sentença, ela mergulha num mundo de controle, perigo e prazeres intensos. Mas o que começa como um acordo frio e calculado logo se transforma em algo que nenhum dos dois esperava: um amor que desafia o poder, a dor e os segredos do passado. Entre sacrifícios, mentiras e uma luta pela redenção, Giulia e Salvatore terão que escolher se esse sentimento é forte o suficiente para vencer as sombras que os cercam — ou se o preço desse amor será maior do que podem pagar.
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O trem sacudia sob mim enquanto eu encostava a testa na janela fria. Olhava para fora, mas não via nada além de um céu cinza e pesado, igual ao nó que apertava meu peito.
“Só mais um mês... mamãe aguenta mais um mês.” Era o que eu precisava acreditar, porque não tinha escolha.
Lembrei dela, tão frágil na cama, a pele pálida e o peito subindo e descendo devagar demais, como se cada respiração fosse uma luta. Os ataques de falta de ar estavam ficando mais frequentes. O médico disse que a cirurgia podia esperar, mas não por muito tempo. Eu tinha que arrumar o dinheiro antes que fosse tarde demais.
Tentei de tudo: empréstimos, ajuda dos parentes, até chorar no telefone para alguns amigos. Nada funcionou. Só restava isso — o clube secreto, o leilão. Me vender para salvar a mulher que me deu a vida.
O trem manteve seu ritmo constante enquanto meu coração parecia querer acelerar. Fechei os olhos por um instante e voltei a ela — minha mãe, Marta. Ainda consigo vê-la sentada à beira da cama, segurando o ar como se fosse a última gota de esperança que lhe restasse. Quando a doença se manifestou, tudo desmoronou. Descobrimos um tumor no pulmão, agressivo, avançado. O médico disse que a cirurgia era urgente, mas, com o seguro negando cobertura, o valor do procedimento era impossível de alcançar de outra forma.
Lembro das noites em que ela acordava sufocada, tentando chamar meu nome, e eu corria para aliviar seu desconforto, sentando ao lado da cama, acariciando sua mão fina e fria. Ela tentou me tranquilizar: “Minha filha, não seja tola. Ainda posso esperar mais algumas semanas.” Mas eu via o medo nos olhos dela, o medo de não acordar mais um dia. Quantas vezes ela franziu o cenho, piscando, tentando disfarçar a dor? Quando ela tentava respirar fundo, eu sentia meu peito apertar. Quem me dera poder respirar por nós duas.
As contas médicas se empilhavam na mesa da cozinha. Cada aviso de cobrança parecia um punhal no peito. A cada ligação de bancos e credores, meu estômago se retorcia. Eu me vi obrigada a procurar ajuda em lugares que nem imaginava existir.
Os olhos voltaram para a paisagem cinzenta passando pela janela: planícies secas, oliveiras retorcidas, e o mar se insinuando ao longe, quase invisível por entre a névoa. Cada quilômetro que me separava de Palermo era um passo para sacrificar meu próprio corpo em troca de esperança. As lembranças vinham em ondas: a voz fraca de minha mãe, “Filha, faça o que achar melhor, mas viva depois de mim” — como se soubesse que a própria vontade de viver se diluía a cada dia.
Pensava em Serena, minha melhor amiga.Marco, meu pobre irmão, sem ciência de nada disso.
Engoli em seco quando o trem freou ao entrar na estação de Palermo. O som metálico ecoou dentro de mim e, por um instante, pensei na vida que eu poderia ter se não fosse aquela decisão. Apertei a alça da mochila, vesti a coragem que restava e desci. Cada passo era pesado, mas eu não podia parar. Ainda havia um mês para provar que o amor pela minha mãe valia qualquer preço, mesmo que esse preço fosse meu próprio coração.
Foi só no final de semana passado que tudo começou a tomar forma. Eu mal podia acreditar, mas foi uma stripper do clube — uma mulher chamada Lara — quem me falou sobre o leilão secreto para ricos. Eu a conheci por acaso, quando fui ao clube procurando respostas, e ela foi a única que se dispôs a conversar comigo. Lara não era só uma artista; ela conhecia as regras daquele submundo melhor do que ninguém.
Ela me contou sobre os leilões, como tudo funcionava por trás das cortinas, e me avisou dos perigos. “Se decidir entrar, não pode hesitar. Eles sentem medo, e o medo é um convite para serem cruéis.” Aquela conversa me gelou, mas também me deu um fio de esperança.
No sábado passado, cheguei a Palermo disfarçada, tentando parecer segura, mas meu coração estava em turbilhão. Fui até a Madame, uma mulher imponente, que controlava tudo ali com mãos de ferro e olhos de águia. Conversei com ela, expliquei minha situação, e senti a desconfiança em cada palavra dela.
Não foi fácil — tive que provar que estava disposta a tudo, que não recuaria. Mostrei que meu desespero era real, e que eu não tinha outra escolha. Depois de horas de tensão, Madame finalmente concordou em me aceitar.
Assinar aquele contrato foi como amarrar um nó no meu destino, mas também era a única chance que eu tinha de manter a esperança viva. Agora, enquanto o leilão começava a se desenrolar diante dos meus olhos, eu sabia que estava a um passo de tudo mudar — para o melhor ou para o pior.
Cheguei à porta do clube secreto com o peito apertado. Não havia volta agora. Pensei na resistência dela, em como segurou a minha mão quando chorei pela primeira vez, dizendo que eu não devia desistir. Suspirei fundo, ajeitei a gola da jaqueta e empurrei a porta que me levaria ao leilão. Dentro, as luzes se acenderam em um flerte de penumbra e luxo. A Madame me esperava, imponente. Olhei para baixo, sentindo o peso do olhar crítico que me avaliava — mas a única coisa que importava era que, em algumas horas, eu teria os recursos para manter minha mãe viva por mais um dia, mais uma semana, mais um mês.
O cheiro de perfume barato misturado com suor e nervosismo pairava no ar. Algumas conversavam baixo, outras se maquiavam com mãos trêmulas.
Foi então que uma mulher entrou. Mais velha, com o batom borrado, mas ainda tentando manter uma pose de quem manda no pedaço. O vestido brilhava de forma exagerada, como se quisesse iluminar o quarto inteiro. Ela se aproximou de mim, com um sorriso meio cínico.
— Querida, venha cá — ela disse, puxando meu braço com firmeza. — Olha só onde você está se metendo. Não é lugar para meninas como você.
Olhei para ela, sem saber o que responder. Ela continuou, com uma voz baixa e firme, como se quisesse me convencer, mas também me intimidar:
— Essas aqui — disse, apontando para as outras — são só prostitutas comuns. Mas você, minha flor da noite, é diferente. Você é a virgem.
Ela me fitou com um olhar intenso, quase paternal, enquanto falava:
— Vai ser arrumada como uma rainha. Nada de se misturar com essas meninas. Você vai entrar no leilão sendo uma princesa, entendeu?
Fiquei parada, imóvel, enquanto a mulher saía como uma atriz que tinha feito sua cena e deixava o palco. As outras meninas sequer olharam para mim — estavam ocupadas demais tentando parecer desejáveis, embora seus olhos dissessem o contrário.
Eu não disse nada. Engoli a náusea que subia pela garganta. Era isso. Eu não era mais gente. Só um pedaço de carne.
Uma assistente surgiu logo depois, me chamando com um aceno seco. Segui pelos corredores estreitos até um outro camarim — esse mais limpo, mais silencioso, mais... luxuoso. Mas tudo ali me parecia errado, como um caixão coberto de ouro.
Não demorou muito até começarem o processo.
Tiraram minha roupa sem perguntar, como se eu fosse uma boneca. Fiquei ali, vulnerável, sentindo mãos frias me tocarem sem qualquer delicadeza. Me lavaram como se quisessem apagar qualquer traço de humanidade. A água quente queimava, e mesmo assim eu tremia.
Depois veio a depilação. Cada puxada era uma lembrança de onde eu estava. Cada centímetro de pele exposta parecia gritar.
Passaram óleos e cremes no meu corpo como se estivessem preparando um banquete. Me perfumaram com algo doce demais, enjoativo, que grudava na pele feito pecado.
Quando me vestiram, o vestido parecia feito para outra mulher. Era vermelho escuro, de cetim, moldava cada curva e deixava pouco para a imaginação. As alças finas, o decote profundo, a fenda que subia até a coxa. Não era roupa — era armadura para o desejo alheio.
Colocaram joias pesadas no meu pescoço, brincos que quase tocavam meus ombros. Um anel que parecia pesar mais que minha alma. Por fim, os saltos — finos, altíssimos, impraticáveis. Um tipo de prisão elegante.
Olhei para o espelho, tentando reconhecer aquela imagem. A garota que me olhava de volta não era eu. Era uma versão silenciosa, ensaiada, vendida.
Respirei fundo. Só um mês. Só um mês.
Uma batida na porta. O leilão ia começar.
O som da música suave e das vozes masculinas sussurradas preenchia o ar do outro lado da cortina pesada. As luzes do palco vazavam pelas bordas, como um pôr do sol doentio prestes a me engolir.
Fui posicionada ao centro, no meio de uma fileira de garotas. Todas lindamente produzidas, com olhares vazios ou treinados. Algumas sorriam para o nada, outras olhavam para o chão. Eu fiquei reta, tentando manter as pernas firmes. Mas minha boca secava, e a ânsia subia pelo estômago.
O pano se abriu.
A luz forte me cegou por um segundo, e então o burburinho preencheu tudo — vozes, suspiros, sorrisos depravados. Homens de terno e olhar predador, sentados como em um teatro privado. Alguns seguravam taças, outros catálogos. E todos olhavam para nós como se fôssemos parte de um cardápio.
Uma a uma, as meninas foram chamadas. O leiloeiro, um homem de cabelo branco e sorriso escorregadio, anunciava suas “qualidades” como quem vendia vinho raro.
— Temos aqui a encantadora Sofia, de olhos esmeralda e boca de pecado... começamos com dez mil...
As cifras subiam, as meninas saíam, e o palco ia esvaziando.
Até que restou apenas eu.
Sozinha. No centro. As luzes me esquentavam a pele, mas por dentro eu estava fria. Meu coração era um tambor na garganta. As mãos tremiam ao longo do corpo. Quis correr, gritar. Mas fiquei.
O leiloeiro se aproximou do pedestal, ajeitou o microfone e sorriu para o público, como quem revela a sobremesa principal.
— Senhores... o momento mais aguardado da noite. Temos aqui um verdadeiro tesouro. Virgindade certificada, beleza inquestionável, e apenas dezoito anos. Uma flor não tocada pelo mundo. A partir de cinquenta mil euros.
Ele continuou — Senhores... agora temos um presente raro, quase lendário. — Ele fez uma pausa dramática, como se saboreasse cada palavra. — Uma flor ainda fechada. Inocente. Intocada.
Minha visão embaçou por um segundo. A bile subiu à boca. Respirei fundo, tentando não vomitar.
— Virgindade garantida por laudo médico. Jovem. Saudável. Discreta. Italiana. Uma experiência única... para o cavalheiro que oferecer o melhor preço.
A plateia murmurou em expectativa. Alguns homens sorriram, outros ergueram as sobrancelhas. A excitação no ar era podre, pegajosa, cruel.
Eu era um objeto. Um mito a ser violado. E todos ali estavam prontos para me possuir como se meu corpo fosse um troféu e minha dor, um detalhe irrelevante.
A ânsia voltou com força. Travei o maxilar. Se eu caísse, ninguém me levantaria.
Mas então... o silêncio se instalou.
E foi aí que ele entrou.
— Abre logo isso, mulher! — Giulia insistia, sentada na ponta do sofá com os cotovelos nos joelhos, olhos arregalados de curiosidade.— Tô com medo. — respondi, rindo nervosa, com o teste ainda fechado nas mãos. — E se for negativo?— A gente chora e tenta de novo. Mas se for positivo… ai, meu Deus, se for positivo! — ela bateu palmas e puxou a almofada contra o peito. — Anda logo, Serena! Eu tô grávida ou não tô? Porque se você estiver, eu tô grávida junto.— Isso é chantagem emocional — murmurei, me levantando e andando em círculos pelo tapete claro da sala.Estávamos na casa dela. Aurora brincava no quintal com dois cachorros enormes e completamente mimados por Salvatore. Ele estava na cozinha, jurando que sabia fazer lasanha. Mentira. Mas ninguém tinha coragem de impedir.— Tá. Respira. Abre. — falei sozinha.Entrei no banheiro com o coração batendo no pescoço.O silêncio do corredor foi substituído por um grito estrangulado quando vi as duas listras surgirem como se sempre tivess
Um ano depois Narração: SerenaNunca pensei que usaria branco. Nunca pensei que veria minha própria imagem no espelho e me sentiria… inteira.O vestido caía suave sobre meus ombros, com rendas delicadas que desciam até os pulsos. Não era um vestido de princesa. Era meu. Forte, simples e bonito — como eu aprendi a ser.— Está linda, meu amor — disse Giulia, entrando no quarto com um sorriso emocionado. Os olhos dela já estavam molhados, e ela segurava um lenço amassado como quem já havia desistido de parecer composta.— Se você começar a chorar agora, eu não vou conseguir parar — respondi, rindo entre lágrimas.Ela veio até mim e me abraçou com força.— Um ano atrás… — começou, mas a voz falhou. — Um ano atrás eu achei que te perderia.— Eu também.Nos olhamos. Cúmplices. Sobreviventes.— Mas agora… você vai se casar com o homem mais leal e mais turrão da face da Terra.— E mais doce também, quando ninguém tá olhando — completei, sorrindo.Ela riu.— A Aurora tá que não se aguenta. Di
A luz suave da manhã atravessava as cortinas grossas do quarto, desenhando faixas douradas no chão de madeira.Meus olhos se abriram devagar. O corpo ainda pesado pela vigília, mas o coração… o coração acelerou assim que percebi.Os braços dela estavam em volta da minha cintura.Serena.Ela estava acordada. Deitada ao meu lado, o rosto enterrado contra meu abdômen, como se buscasse abrigo no próprio calor do meu corpo. Os ombros tremiam. E demorou um segundo até que eu percebesse o que era aquilo.Ela estava chorando.Lentamente, passei a mão por entre os fios do cabelo dela, com um cuidado quase reverente.— Serena? — chamei baixinho, com medo de quebrá-la mais uma vez. — Ei… sou eu. Tá tudo bem agora.Ela não respondeu. Apenas apertou mais forte o abraço. As lágrimas molhavam minha camiseta. E eu deixei. Que chorasse. Que desabasse tudo ali.— Você voltou… — sussurrou, a voz trêmula e abafada. — Eu achei que… que ia morrer lá. Que ninguém vinha. Que… que você tinha me deixado.— Nun
Corremos pelo túnel, os pés espirrando água suja, a respiração presa na garganta. A dor de Salvatore era visível — sangue manchava sua lateral, o ombro ferido estava rígido — mas ele não parava. Nem eu.A luz no fim do túnel era fraca, quase imperceptível, mas sabíamos onde levava: o cais velho. Morozov estava tentando escapar. O som de um motor ao longe confirmou isso.— Ele tem um barco — murmurei.— Não vai sair dali — Salvatore respondeu, num tom baixo, rouco, carregado de ódio.A silhueta dele surgiu na saída. Morozov corria em direção ao píer, mancando, o braço ensanguentado pressionando o abdômen. Um barco pequeno estava à espera, com dois homens russos armando os motores. Ele gritou algo em russo, apontando para trás.Eles viraram as armas na nossa direção.— COBERTURA! — gritei, me jogando atrás de um dos pilares de concreto. Salvatore se abaixou atrás de uma caixa enferrujada.Tiros estouraram. Madeira, pedra e faíscas voaram.Respirei fundo. Olhei para Salvatore.— Eu vou p
No dia seguinte, o salão principal da mansão Mancini estava lotado. Capos de todas as famílias aliadas e neutras haviam sido convocados. O som grave das vozes, o tilintar dos copos, os olhares carregados de tensão formavam uma atmosfera densa — como um trovão prestes a cair.Salvatore Mancini entrou por último.Não sorriu, não cumprimentou. Só caminhou até o centro da sala, parou diante da lareira apagada, e ergueu um envelope vermelho.— Este é o sangue de um de vocês.Silêncio absoluto.— Não literalmente, claro. Mas emocionalmente. Porque quando alguém leva uma mulher inocente, ligada a um dos meus homens… está dizendo para todos aqui que nossas famílias são vulneráveis. Que nossas mulheres podem ser moeda.Ele ergue os olhos. E ali, naquele segundo, não havia o marido de Giulia, o pai de Aurora, nem mesmo o amigo. Havia o Don.— Isso não é mais sobre Giovanni. É sobre todos nós. Hoje foi Serena. Amanhã será a filha de outro. A irmã. A esposa. Por isso, quem não se mover comigo... e
Descemos do carro em uma clareira longe da estrada principal. O céu já estava completamente azul, mas para mim, tudo parecia tingido de cinza.Salvatore veio até mim, o rosto coberto de fuligem, as mãos cerradas em punhos.— Você viu o carro? — ele perguntou, direto.— Vi a explosão. Vi fumaça. E ouvi o rádio. Ele não estava morto. Ele sumiu.Salvatore chutou uma pedra, os olhos faiscando de ódio.— Eu devia ter cortado a garganta dele quando tivemos a chance. Essa clemência vai nos custar caro. — Ele não escapou sozinho. — cruzei os braços, tentando controlar a raiva. — Alguém avisou. Alguém muito perto.Marco se aproximou, respirando com dificuldade.— Temos quatro mortos. Dois desaparecidos. Um dos motoristas está gravemente ferido… perdeu a perna na explosão.— E o resto? — perguntei.— Os que sobraram estão na rota B, recuando para o ponto de apoio. Mas estão assustados. Acham que a guerra voltou de vez.— Não acho. — Salvatore murmurou. — A guerra nunca foi embora. Só estávam
Último capítulo