Amália foi traída por aqueles que deveriam protegê-la. Vendida pelos próprios pais, que viam em sua beleza uma oportunidade de lucro, ela foge — mas a liberdade dura pouco. Capturada e levada a um leilão clandestino em Salerno, seu destino muda ao ser comprada por um estranho: Glauco. Homem poderoso e aparentemente impenetrável, Glauco a adquire por puro capricho, sem saber que aquela decisão colocará em risco as muralhas que construiu ao redor de si. O que ele não esperava é que, ao trazer Amália para sua mansão nas colinas de Sorrento, também abriria as portas para segredos antigos, feridas mal cicatrizadas e verdades perigosas. Enquanto o passado ressurge — e nomes como Sofia, Laerte e Danilo ganham novos contornos —, Amália luta não só por liberdade, mas também por sentido, dignidade e justiça. Nessa casa de silêncios e memórias, quem aprisiona quem?
Leer másOs lances começaram um após o outro: cem mil. Cento e cinquenta. Trezentos mil. Quinhentos mil. Dois milhões de euros.
—5 milhões! Glauco ergueu a placa, a voz ressoando como um trovão no salão abafado.
—5 milhões, dou-lhe uma! 5 milhões, dou-lhe duas! 5 milhões, dou-lhe três – vendido! O leiloeiro anunciou, o rosto se contorcendo num sorriso tão largo que quase rasgava a pele enrugada. — Parabéns a esse senhor bondoso!
No palco, a Amália permaneceu impassível. Já havia perdido as contas de quantas vezes fora leiloada assim. O estômago revirava, mesmo vazio.
Mais uma vez, era colocada diante de homens que não a viam, avaliavam. Disputavam seu corpo como se fosse porcelana rara. Agora fora arrematada por um desconhecido, sua voz causou-lhe arrepios. Um refúgio? Não. Apenas um inferno diferente – onde sua carne valia mais que sua alma.
Aquela não era a primeira vez, mas parecia ser a ultima. Tinha doze anos, quando seu próprio pai vendeu-lhe pela primeira vez para trabalhar em uma casa de familia. Uma criança ainda e já condenada.
Escapou de casas trancadas, de mãos ásperas, de olhares sujos. Forçada a trabalhar, obrigada a calar. Sempre sozinha.
Aos dezesseis, sem ter para onde ir, voltou para casa. Estava fraca, faminta, mas viva. Ele a recebeu como quem recolhe mercadoria perdida. trabalhava e todo dinheiro que recebia dava a seu pai para que ele a deixasse ficar e não a vendesse novamente.
Porém sua ambição não tinha limites, a vendeu de novo, ela agora tinha vinte anos, vinte mil euros, foi a pedida, quanto valia sua honra? Sua vida? Para seu pai nada, apenas o suficiente para ele cobrir suas dividas de uma noite de jogatina.
Queriam mais do que seus serviços. Queriam seu corpo. Sua juventude. O desespero tem um ciclo cruel. E ali estava ela. Outra vez. Leiloada como quem põe uma peça em exposição.
Amália estava assustada. Sentia-se acuada e impotente. Por mais que tivesse tentado escapar, acabou sendo apanhada, ela sabia que seria a última, quando foi lavada novamente para aquele porão.
Em seu peito, o coração batia apressado. Ela podia ouvir, em seus ouvidos, o pulsar das artérias no silêncio daquele porão frio e úmido. Depois de ter sido exibida ao “público”, em um vestido velho que mal cobria seu corpo, como uma mercadoria, fora acorrentada ali. Ela não os encarou, mas, pelo pouco que viu, pareciam bestas-feras esperando para estraçalhá-la: olhos lascivos e gestos grosseiros. Sentiu o estômago revirar. De volta àquele lugar onde estava havia três dias, permaneceu no chão. Poucas lágrimas caíram. Já não havia mais o que chorar, nem esperança. Algum tempo depois, ouviu passos. O coração, que ainda não havia se acalmado, voltou a bater forte e acelerado, fazendo-a tremer de ansiedade e medo. Quando os passos se aproximaram, ela continuou olhando para o chão. Seus cabelos longos cobriam o rosto sujo. — O senhor tem certeza? Ouviu a voz suave de um homem, que soava ansioso. — Sim. Absoluta! Respondeu o outro, com voz forte e magnética. Apesar do tom grave, parecia tranquilo. Amália pressentiu quando um deles se aproximou e se agachou para olhá-la. — Olhe para mim! Ordenou a voz firme. — O que você quer de mim? Amália levantou o rosto e o encarou, ainda com algumas mechas caindo sobre o olhar. — Acha que, porque me comprou, vou ser grata a você? Acha que é melhor do que quem me vendeu? — Não me acho melhor que ninguém. Eu sou. Não pense demais. Você é apenas uma mercadoria qualquer. Não tem nada de especial para mim. Disse ele, com voz compassada. — Então me deixe ir! Se não se importa, me deixe ir! Ela alterou o tom. Kakakaka. O riso dele ecoou pelo cômodo escuro de pedra. Ninguém esperava. Ele não parecia o tipo que ria. — Sabe quanto você me custou? Perguntou, encarando os olhos azuis como safiras. — Não sei, mas acredito que não tenha sido tanto. Sou apenas uma garota miserável, que teve a má sorte de nascer onde nasci. Se me der uma chance, posso pagar. Consigo um trabalho e... Glauco a observava. Ainda não a tinha visto direito. Estava ali apenas de passagem, mas, ao ver os homens disputando por ela, não pensou duas vezes: deu o maior lance, um valor que ninguém além dele poderia cobrir. Fez por puro capricho. Apesar da raiva, seu rosto parecia angelical. A pele clara, com queimaduras de sol que avermelhavam levemente o nariz e as maçãs do rosto, ainda era fresca. Seus lábios pequenos e bem desenhados tinham um tom rosado intenso. Embora magra, o vestido velho e fino revelava seios medianos e firmes, a cintura estreita e as pernas levemente torneadas. — Você é muito ingênua... ou muito burra! Acredita mesmo que existe algum trabalho que possa remunerá-la o suficiente para me pagar em menos de vinte anos? — Você não pagaria tanto em uma mulher como eu. O que você quer? Por que fez isso? Amália ergueu o queixo, tentando decifrá-lo. Glauco era um homem muito rico, muito bonito. Não precisava de alguém como ela. Se quisesse uma empregada, bastava contratar uma com uma criação muito melhor. Era alto, alcançava, com facilidade, um metro e noventa. Seu corpo era forte, trabalhado. O maxilar bem desenhado se destacava ainda mais com a barba bem aparada. Naquela noite, usava um terno cinza, impecavelmente cortado, e a camisa com dois botões abertos deixava à mostra parte do peito torneado, com pelos escuros. Os cabelos, escuros e penteados de lado, foram arrumados com um gesto rápido, os dedos deslizando com precisão. Seus olhos claros se destacavam por causa dos cílios escuros. — Não vou discutir meus negócios com você. Respondeu, se levantando e se afastando um pouco. Depois, reaproximou-se. Abaixou-se e tirou uma chave do bolso do colete. Quando estendeu a mão, viu os cílios dela tremerem de ansiedade enquanto o encarava. Um contraste interessante. Ele a observava com atenção. Rosto angelical, temperamento selvagem. “Uma mistura muito interessante. ” Pensou, com um sorriso discreto. A presença do homem bagunçava os sentidos de Amália. O perfume amadeirado alcançava seu nariz. Ela podia sentir o calor vindo do corpo dele, mas a aura era tão fria que tremeu quando ele tocou as algemas que a prendiam à parede. O coração de Amália disparou ainda mais do que no momento em que ele surgiu com sua autoridade imponente. O barulho das correntes caindo fez seu coração quase parar. Era um alívio. Estavam tão pesadas. Glauco lançou um olhar discreto aos braços dela: havia feridas, muitos hematomas. Segurou-a pelo braço e a ergueu. Seus olhares se encontraram. Primeiro, raiva. Depois, vazio. Então, o corpo dela cedeu, frágil como uma boneca quebrada, ela murchou nos braços dele. Sem esforço, Glauco a ergueu, carregando-a pelos corredores frios do porão. Danilo, seu assistente, o acompanhava de perto pelo corredor. O vestido fino deixava à mostra as clavículas, brancas e frágeis. Ela estava visivelmente abaixo do peso. — Continue no leilão. Você sabe o que eu quero. Não importa o preço: traga para casa. Disse Glauco, entrando no carro. — Não seria melhor que eu a levasse, e o senhor ficasse para o leilão? Ousou Danilo, hesitando. — Não acredito que não seja capaz. Basta dar o lance. Respondeu Glauco, com desagrado, enquanto colocava Amália, desacordada, no banco traseiro de seu Lincoln. Danilo assentiu com um leve movimento de cabeça. Esboçou um sorriso que morreu antes de alcançar os olhos. Glauco se virou lentamente em direção ao carro. O olhar era cortante. Antes de dar partida, olhou pelo retrovisor. A garota permanecia imóvel, como se dormisse. A pele e os lábios, agora, um pouco pálidos. Danilo ficou para trás, observando o carro preto desaparecer na estrada antes de subir as escadas do leilão, com a mesma expressão neutra de sempre. O Lincoln preto deslizava pela estrada sinuosa de Amalfi. No alto da encosta, sob o luar de Sorrento, a mansão Bergamo o aguardava. Ali, entre luxo e segredos, começava a história mais perigosa de suas vidas.Sobre ela, tocava gentilmente sua cintura enquanto explorava seus lábios delicados com desejo. Amália deslizava os dedos sobre as costas largas e fortes; perdia-se nas carícias dele.Glauco era como um lobo faminto. Desejava-a simplesmente. Sua inocência e falta de experiência só atiçavam ainda mais sua imaginação.Seus toques delicados, seus gemidos contidos, cada parte do corpo dela era um prazer anunciado, dentro dela ele explodiu, não se contendo mais, quando ela tremeu em seus braços, apertando-o suavemente com as pernas.Com a respiração entrecortada, ela se aninhou sob seu peito. Glauco acariciou gentilmente seus cabelos, beijou sua testa, deitou ao seu lado e a puxou para si.Sentindo uma paz inexplicável, a viu adormecer em seus braços. Nem parecia a mesma garota que o enfrentara, mais cedo, na sala.Pela manhã, Amália desceu devagar as escadas, o cabelo ainda úmido repousando sobre os ombros. Usava um vestido leve e os olhos carregavam uma serenidade estranha. Serena demais
Naquela noite, Amália, depois do banho no quarto de cima, desceu devagar até o porão, vestindo apenas a camisola, a sala estava vazia e na penumbra. As madeixas soltas escorriam pelas costas, caminhou pelo grande corredor, o chão gelado sob os pés a fez arrepiar.Mas ao abrir a porta... parou.O quarto estava vazio.Sem a cama, sem o baú de cobertas velhas, até a mesa velha desapareceu. Apenas poeira e umidade onde seus pés se acostumaram a buscar abrigo.Fechou a porta lentamente. Com raiva. E com um certo medo, seu coração batia rápido.Subiu as escadas com os olhos semicerrados, puxando o tecido da camisola para cobrir melhor os ombros. Glauco estava no escritório lidando com com algumas demandas do clã. Fechou a pasta, marrom, de couro, abriu a gaveta, viu o envelope deixado sobre sua mesa naquele dia. "Lupo". Cerrou os olhos, um pouco irritado.Fechou a gaveta e caminhou silenciosamente até a adega, todos na casa já tinham ido dormir, se perguntou onde estaria Amália, enquanto
Danilo assentiu do outro lado da linha, mesmo sabendo que Glauco não podia vê-lo.— Tem mais uma coisa, Acrescentou Glauco. — Amália disse que queria aprender a cozinhar. Acho que... devo isso a ela. Providencie isso.Danilo silenciou por um instante. Glauco percebeu hesitação de Danilo.— Claro. Posso entrar em contato com alguma escola. Algo discreto. Ou, se preferir, trago alguém de confiança para dar aulas na mansão, mas sei que não gosta de estranhos em sua casa.— Faça como achar melhor. Mas comece logo.— Sim, senhor.Glauco desligou. Ficou ali, com o telefone ainda na mão, olhando para a mesa, mas não estava vendo nada. Havia algo, muito sutil, que o incomodava. Por algum motivo, Danilo lhe parecia diferente. Todavia, resolveu deixar para depois. Não era o momento. Outro dia talvez separasse um tempo para saber se havia algo errado. Agora, o mais importante era manter Amália segura.Já era quase a hora do almoço quando Glauco deixou o escritório. No caminho, parou ao ver
Por um instante, ele não soube o que responder. A luz fraca do corredor iluminava apenas parte do rosto dela. Havia sarcasmo na voz de Amália, sim, mas por baixo havia cansaço... e dor.— Sua dívida não é o que me preocupa agora. Disse ele, mais sério.Ela ergueu os olhos, mas não se mexeu.— Então o que é? Minha presença aqui? Ou o que não consegue entender sobre mim, ou porque não pode me controlar?Glauco se aproximou da cama devagar. Olhou ao redor, sentindo o cheiro de mofo e o frio úmido que subia do chão.— Não sei o que me incomoda mais. O fato de você ter descido... ou o fato de eu não conseguir explicar por que me incomoda. Disse, em voz baixa, mais para si mesmo do que para ela.Ela esboçou um meio sorriso, frágil. queria entender o que se passava com ele, que lugar ocupava na vida dele, se é que tinha um lugar na vida dele.— Talvez porque aqui embaixo ninguém te enxerga. Nem eu. E isso te incomoda. Ela disse de maneira fria.Ele não respondeu. Apoiou-se na cama, fazendo o
Ficou ali, olhando para ela, vigiando seu sono. O pensamento longe. Lembranças antigas surgiam como cenas projetadas num filme silencioso, vultos do dia em que Sofia desapareceu, mas não saiu de sua vida. Um passado que insistia em não ficar enterrado. Era perto da hora do jantar, Laerte apareceu. Entrou como quem era dono da casa, sem cerimônia.— Um milagre você aqui. Tem trabalhado muito, irmão. Disse, indo direto à adega.— O que faz aqui? Glauco perguntou, sem esconder a desconfiança.— Preciso da sua ajuda no negócio dos pescados. Estão me sobrecarregando com taxas.Falava casualmente, tomando vinho. Mas os olhos estavam voltados para a escada.Sofia desceu logo depois, uma verdadeira aristocrata. Vestido verde escorrendo pelo corpo, cabelos soltos como cascatas. Sorria para Glauco. Mas os olhos de Laerte não a deixavam.Durante o jantar, Laerte insistiu para que Glauco entrasse no negócio. Mas Glauco sabia que por trás dos pescados vinham armas, drogas, tráfico… e todos os cri
Amália estava desacordada no fundo da vala. Um risco escuro descia da lateral da testa até a têmpora, misturado à poeira do terreno. O vestido, amarrotado, agarrava-se ao corpo como se tentasse protegê-la. Entre as pedras, seu pé descalço tremia involuntariamente. Glauco escorregou no cascalho, os joelhos ralando na descida abrupta da encosta. Os seguranças hesitavam a vala era funda e um pouco apertada. — Cuidado! Gritou ele. — Qualquer movimento errado pode machuca-la mais. Um dos homens tentou abrir caminho por um lado menos íngreme. Nice surgiu ofegante ao topo do aclive, com a mão no peito, sem acreditar no que via. — Meu Deus...Sussurrou, levando a mão à boca. — Busquem uma corda. Glauco ordenou, enquanto descia com cuidado para dentro da vala. Glauco ajoelhou-se ao lado de Amália. Suas mãos trêmulas afastaram os fios de cabelo colados ao rosto dela. A respiração estava fraca, mas presente. Sentiu a pulsação lenta em seu pescoço. Ao encostar os dedos, uma pontada r
Último capítulo