O uivo da solidão

O uivo da solidão PT

Lobisomem
Última atualização: 2025-09-03
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Kieran, o herdeiro da alcateia de Drakemont, lida com o peso de seu destino. Um ser poderoso, belo e temido, mas profundamente solitário. Seu lobo interior permanece em silêncio, sem reconhecer uma parceira. Enquanto isso, Marina chega à cidade. Uma mulher quebrada, fugindo de um passado de abusos brutais. Carrega no olhar a dor e a desconfiança. Tudo que deseja é paz.

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Capítulo 1

🌕 Capítulo 1 — A Chegada da Forasteira

A névoa pairava sobre a pequena cidade de Drakemont como um véu silencioso, envolvendo cada telhado, cada rua de pedra irregular, cada árvore que se erguia como uma sentinela antiga. Era como se a cidade vivesse num estado suspenso entre sonho e realidade, presa em uma bolha de tempo onde o passado nunca morria e o presente parecia sempre à beira de se desfazer.

Encravada entre montanhas cobertas por florestas densas, Drakemont era esquecida pelos mapas modernos e raramente recebia forasteiros. Aos olhos do mundo, talvez nem existisse. Para aqueles que a conheciam, porém, ela carregava uma atmosfera peculiar, um misto de aconchego rural e mistério sufocante. Um esconderijo perfeito para quem buscava desaparecer.

E era exatamente isso que Marina procurava.

---

O carro velho que ela alugara rangeu ao parar diante de uma pequena pousada de madeira. O motor, cansado, soltou um último suspiro antes de silenciar. Marina ficou por um instante imóvel ao volante, encarando o reflexo de seus próprios olhos no retrovisor. Havia tanto desgaste ali que parecia que a própria vida a tinha desbotado.

Com os ombros curvados e a alma em pedaços, ela desceu do veículo. Arrastava consigo uma mala surrada, de couro gasto, que já perdera a dignidade há muito tempo, assim como ela própria acreditava ter perdido a sua. Os longos cabelos castanhos caíam em desalinho, escondendo parte de seu rosto, como uma cortina entre ela e o mundo.

A brisa fria que soprava das montanhas não conseguia afastar o peso que ela carregava dentro do peito. Era um fardo invisível, mas tão real que sua coluna parecia dobrar-se sob ele.

A porta da pousada rangeu suavemente quando uma senhora idosa surgiu, trazendo o calor humano que o lugar exalava. Dona Amália, como se apresentaria em instantes, tinha os olhos cheios de ternura. Eram olhos que já haviam visto muito da vida: alegrias, dores, perdas e renascimentos.

— Você veio sozinha? — perguntou com doçura, estendendo-lhe a chave de um quarto simples.

Marina respirou fundo antes de responder. Sua voz saiu baixa, quase engolida pela própria névoa que cobria a cidade.

— Vim. Só eu.

O silêncio que se seguiu pareceu denso. Não era apenas a ausência de palavras, mas um reconhecimento silencioso. Havia algo nos olhos daquela jovem que não precisava de explicação. Um abismo de dor e sobrevivência que só quem já sofrera poderia identificar.

Amália não insistiu. Apenas sorriu, o tipo de sorriso que oferecia abrigo sem exigir confissões. E assim, Marina atravessou a pequena recepção de madeira e subiu as escadas, levando consigo a chave e um coração cheio de cicatrizes.

---

Naquele mesmo dia, algumas horas depois, o quarto já parecia pequeno demais para conter o turbilhão dentro dela. O colchão duro não oferecia descanso, e as paredes estreitas sufocavam. Então, Marina se deixou guiar pelo instinto, ou talvez por um chamado mais profundo, que ainda não compreendia.

Caminhou pela estrada de terra que serpenteava entre as colinas e levava à floresta. Cada passo parecia um mergulho em direção ao desconhecido, mas também uma fuga desesperada do passado que a perseguia.

O ar ali era diferente. Mais úmido, mais denso, impregnado de vida. A floresta não era apenas um conjunto de árvores — era uma presença, antiga, quase sagrada. Os galhos se entrelaçavam sobre sua cabeça como se formassem arcos de catedrais naturais. O vento fazia as folhas sussurrarem histórias antigas, e o canto dos animais noturnos já começava a se erguer como um coral selvagem.

Marina se sentou em uma pedra coberta de musgo, o frio da superfície invadindo sua pele. Fechou os olhos. Respirou fundo. Queria esquecer, ainda que por instantes. Queria que aquela mata engolisse seus pensamentos, que a solidão a embalasse.

Foi então que aconteceu.

---

Um arrepio percorreu-lhe a espinha, rápido como uma descarga elétrica. Os pelos de sua nuca se eriçaram. Algo no ar mudara.

Um cheiro. Diferente. Intenso. Quase animal. Não era o odor úmido da floresta, nem o perfume adocicado das flores noturnas. Era algo cru, selvagem, que despertava instintos primitivos de alerta e fuga.

Quando abriu os olhos, ela o viu.

Entre as árvores, dois pontos dourados brilhavam na escuridão. Olhos. Observando-a com uma intensidade hipnótica.

Seu corpo congelou. Os músculos recusavam-se a obedecer. Ela pensou, por um instante, que fosse fruto de sua mente cansada. Mas então ele emergiu das sombras.

Um lobo.

Não um lobo comum.

Ele era imenso, maior que um cavalo. A pelagem negra como a própria noite refletia a luz fraca da lua em tons de prata. Os olhos dourados ardiam como fogo líquido, brilhando com inteligência, com emoção, com algo que transcendia o simples instinto animal.

Ele avançou um passo, e o chão pareceu estremecer. Parou diante dela, apenas alguns metros de distância.

Marina queria gritar, mas a voz se perdeu na garganta. Queria correr, mas suas pernas não respondiam. Ainda assim, dentro dela, uma voz suave sussurrou: Ele não vai te machucar.

O lobo a encarou em silêncio. Aquele olhar era profundo demais, carregava peso demais, como se atravessasse sua alma.

E então, diante de seus olhos incrédulos, algo extraordinário aconteceu.

O lobo recuou para trás das árvores, desaparecendo nas sombras. Marina mal teve tempo de recuperar o fôlego quando ouviu o som de passos.

Um homem surgiu.

Nú, como se tivesse nascido do próprio vento.

Seus músculos eram esculpidos como uma estátua viva, o corpo poderoso e selvagem. Os cabelos escuros caíam em desalinho sobre a testa, e os olhos dourados — os mesmos olhos que a observavam instantes antes — brilhavam intensos, perigosos e, ao mesmo tempo, estranhamente protetores.

Kieran.

Ele a fitava como se tivesse esperado por aquele momento durante toda a vida. Como se, ao vê-la, algo dentro dele tivesse finalmente encontrado seu lugar.

E dentro dele, o lobo rugia em êxtase:

“Ela é nossa. É ela. Finalmente.”

Mas no rosto de Marina, o que havia era puro pavor.

— Não tenha medo — disse ele. Sua voz era grave, carregada de algo que vibrava além do humano, quase hipnótica. — Eu não vou te machucar.

Marina deu um passo para trás, o coração martelando no peito.

— Q-quê... o que você...?

— Meu nome é Kieran — respondeu, levantando as mãos, em gesto de rendição, mantendo distância. — Eu sou... só um morador dessa floresta.

Ele fez uma pausa, olhando-a como se ela fosse algo raro, precioso.

— E você... você é diferente.

Ela tremia. Seus olhos marejados refletiam não apenas medo, mas também um sofrimento antigo, uma vida marcada por cicatrizes invisíveis.

— Eu só quero ficar sozinha... — disse ela, a voz falhando como vidro prestes a se quebrar.

Aquelas palavras atingiram Kieran como uma lâmina. Ele sentiu uma dor aguda, um peso físico. O laço já começava a se formar. O imprinting gravava seu destino nela, e resistir seria impossível. Mas ela... não estava pronta.

Ele respirou fundo, tentando conter o lobo dentro de si que clamava por aproximar-se.

— Entendo. — Seus olhos, dourados e intensos, suavizaram. — Mas... não posso te deixar sozinha por muito tempo. Você corre perigo aqui.

— Eu já vivi o pior perigo da minha vida — ela retrucou, virando-se bruscamente.

E correu.

Seus passos ecoaram pela trilha, o som apressado de quem foge não apenas de um homem, mas também do destino.

Kieran permaneceu onde estava, o peito arfando, o corpo inteiro vibrando com a ausência dela.

> “Ela não está pronta... mas é ela. É a nossa companheira.”

Pela primeira vez em muitos anos, o lobo sentiu algo que julgava perdido: esperança.

---

Enquanto Marina se encolhia no quarto da pousada, soluçando entre lençóis ásperos, confusa e assustada, Kieran subia até uma colina da floresta.

De lá, podia ver a cidade iluminada, cada lâmpada como uma estrela frágil presa ao chão. O vento frio soprava sobre seu corpo nu, mas ele não sentia o frio. Sentia apenas o vazio deixado pela distância dela.

E então, incapaz de conter-se, ergueu o rosto para o céu.

Um uivo longo e solitário cortou a noite, carregando na melodia selvagem toda a saudade de uma alma que finalmente encontrara o que procurava.

A escuridão se agitou em resposta.

E o destino dos dois, Marina e Kieran, havia apenas começado a se entrelaçar.

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🌕 Capítulo 1 — A Chegada da Forasteira
🌕 Capítulo 2 — O Imprinting e o Rejeito
🌕 Capítulo 3 — O Julgamento da Alcateia
🌕 Capítulo 4 — As Primeiras Ameaças
🌕 Capítulo 5 — Fantasmas do Passado
🌕 Capítulo 6 — A Lenta Conquista
🌕 Capítulo 7 — A primeira vez
🌕 Capítulo 8 — O Sangue dos Lobos
🌕 Capítulo 9 — O Julgamento da Lua
🌕 Capítulo 10 — Segredos de Sangue
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