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🌕 Capítulo 5 — Fantasmas do Passado

O sol já se escondia por detrás das árvores, tingindo o céu de tons de laranja e dourado, espalhando sombras longas pelas ruas de Drakemont. Marina caminhava lentamente, o corpo ainda tenso após os eventos recentes. A lembrança da loba de Lysandra e, mais ainda, do jeito que Kieran havia surgido em seu socorro, ainda pulsava em sua mente. Pela primeira vez em anos, alguém a havia protegido sem esperar nada em troca. Alguém que a via, mesmo em seus pedaços, como inteira.

Kieran.

Ele a deixara em frente à pousada com um toque suave na mão. Disse que não a forçaria a vê-lo novamente, mas Marina sabia que ele estaria por perto. Sempre. Mesmo que fosse das sombras.

O vento carregava o perfume da floresta, da terra úmida, das flores silvestres que surgiam nos jardins da cidade, e Marina sentiu que, por um breve instante, poderia respirar. Que o mundo, mesmo perigoso, ainda tinha beleza.

Dois dias depois, a cidade parecia tranquila demais. Cada passo dela em direção à livraria de Isla era acompanhado pelo estalo dos calçados na calçada, pelo farfalhar das folhas secas e pelo sussurro do vento entre os galhos. Ela tentava absorver cada detalhe: o cheiro da madeira velha das casas, o som distante de crianças brincando, o murmúrio de uma vida que continuava apesar de tudo.

E então, um som. Um timbre de voz que a fez congelar.

— Marina?

A voz era conhecida, dolorosamente familiar.

Não era a suavidade do carinho ou da amizade. Mas porque era a voz de alguém que a usou como um brinquedo e tirou dela a oportunidade de ter tudo de bom que o mundo tinha a oferecer. O ser que havia destruído partes dela, que havia roubado a confiança e a alegria.

Ela se virou devagar, o rosto perdendo aos poucos a cor.

Ricardo.

Ele estava ali, encostado casualmente em um carro preto. Alto, bronzeado, com aquele sorriso que antes a iludia, agora a fazia tremer de nojo e raiva. Parecia que o tempo não havia passado para ele, que sua presença ainda era um lembrete cruel do que ele representava.

— Finalmente… achei que tinha perdido você de vez.

Marina recuou alguns passos, o coração batendo tão rápido que doía.

— O que você está fazendo aqui? Como me encontrou? — perguntou, tentando manter a voz firme, mas sem sucesso.

— Estava com saudades — respondeu ele, aproximando-se lentamente. — Fiquei mal quando você sumiu. Não foi justo. Ainda bem que você é burra o bastante para esquecer que eu tenho alguns conhecidos poderosos. Deveria ter escondido seu rosto melhor das câmeras!

Marina sentiu o nó no estômago apertar, a raiva subindo junto com o medo. Suas mãos se fecharam em punhos, os dedos tremendo.

— Você… você é um maldito. Depois de tudo que me fez sofrer! Por que simplesmente não me deixa em paz?

Ricardo sorriu, cruel, e inclinou-se para mais perto.

— Eu te amava, Marina. Você que é fresca demais — o tom de voz dele mudava a cada frase, alternando entre ironia e ameaça. — Sempre reclamando do jeito que eu te fodia… do jeito que te dava “carinho”.

— Haha...fodia? carinho? isso é um novo jeito de nomear espancar e abusar? — o nervosismo tomava de conta, seu corpo se enrijeceu. Ela recuava, cada passo mais difícil do que o anterior.

— Essa é sua desculpa? — murmurou, a voz fria. — Vem parar aqui, nessa cidade pequena, com outro homem? Sério? Você acha que pode fugir de mim com outro? acha que eu não sei a vagabunda que você é? fugiu com outro e agora inventa essas desculpas ridículas para cima de mim!

— Sai daqui. Agora. — Ela tentou manter a voz firme.

— Você vai voltar comigo. Nem que eu tenha que te arrastar. — Ele sorriu. — E depois a gente conversa com calma. Vou te lembrar que não pode trair o homem que te deu tudo e sair impune.

Ele avançou, agarrando com força. Marina sentiu a dor quando seu braço foi apertado, seu corpo sendo puxado em direção ao carro. Cada músculo queimava na tentativa de escapar.

E então, o som que congelou tudo: um rosnado baixo, ameaçador e gutural, que parecia vir das profundezas da própria terra.

Ricardo se virou, os olhos arregalados.

Kieran.

Ele caminhava devagar, cada passo carregado de intensidade e ameaça. Seus músculos tensos, os olhos dourados brilhando como brasas, a aura de fúria quase tangível. Marina sentiu o ar mudar, como se o mundo inteiro tivesse parado para observá-los.

— Solte-a — Kieran disse, a voz baixa, cheia de poder. — Ou eu arranco sua garganta.

Ricardo riu, desdenhoso.

— Então você é o cão de guarda dela? — zombou. — você é realmente uma puta Marina! — Disse olhando nos olhos dela, ignorado o aviso de Kieran.

Kieran não respondeu. Em um instante, movendo-se com velocidade sobrenatural, agarrou Ricardo e lançou-o para longe, o corpo dele batendo contra o chão com força. Marina sentiu a terra tremer levemente com o impacto. O braço dela ainda ardia, marcado pelo aperto do agressor. Kieran rosnava, cada som uma expressão de raiva pura.

— Maldito… — murmurou, respirando fundo, o corpo vibrando com tensão. — Você já era!

Kieran olhou para Marina. Os olhos dela estavam marejados. Seu ódio só aumentou. Ricardo aproveiou que não era mais o foco da atenção de Kieran, soltando xingamentos ele se pôs de pé novamente e avançou em direção aos dois erguendo o punho, seu alvo era Marina.

— Você é minha! e de mais ninguém!

Foi então que Kieran em um movimento rápido socou suas costelas. Com força. O estalo ecoou no ar.

— Ela nunca te pertenceu seu verme!

Ele agoniava no chão com os braços envolta do tronco e a respiração irregular. Kieran cerrou os dentes em descontentamento por velo vivo ainda. estava cego de raiva.

Marina aproximou-se, a mão trêmula tocando o braço dele. Sentiu no fundo do seu ser que se não fizesse nada Kieran o mataria.

— Kieran… — sua voz suave, quase falhando. — Não quero que você o mate. Não vale a pena.

Ele fechou os olhos, respirando fundo, lutando para não assumir a forma de lobo e destroçar o lixo à sua frente . As garras começaram a se formar nas pontas dos dedos, os dentes cerrados, o peito subindo e descendo rapidamente.

— Olha pra mim — disse Marina, a voz firme apesar do medo. — Eu tô aqui. Com você.

Ele a olhou, respirou fundo, e lentamente começou a se acalmar.

— Não vou matá-lo — disse, a voz ainda carregada de fúria, — mas ele não ficará solto.

Com um gesto rápido, tirou o celular do bolso e discou. Segundos depois, o silêncio da floresta foi quebrado pelo som de passos pesados. Um lobo gigante emergiu das sombras, olhos flamejando, e abocanhou Ricardo pelo colarinho da blusa, sumindo em seguida na escuridão.

Marina permaneceu imóvel, incrédula.

— Kieran… o que vai fazer com ele? — perguntou, ainda com o coração acelerado.

— Não precisa se preocupar — respondeu ele, voltando o olhar para ela. — Vou cumprir meu papel como seu companheiro. E manter o lixo bem longe de você, princesa.

Ela soltou um suspiro de alívio, observando o breu onde Ricardo desaparecera. Não importava como ele seria tratado; se ele fosse morto, devorado ou enterrado vivo ela não ligava, o que importava era que ele não a machucaria novamente.

— Venha… deixe-me fazer companhia esta noite — disse Kieran, erguendo a mão com a voz serena.

Marina hesitou, mas sabia que precisava dele. Mas sabia que essa noite ela precisava de companhia. E aquele homem surpreendentemente era o único que poderia dar o sentimento de segurança que ela tanto precisava naquele momento.

---

Mais tarde, subiram juntos a colina até a cabana de Kieran. O caminho era iluminado por uma lua generosa, que refletia nas árvores e nos pequenos arbustos, criando um tapete de sombras suaves. Marina não conseguia deixar de notar os detalhes da paisagem: a delicadeza das flores silvestres, o brilho do orvalho, a luz da lua tocando os troncos das árvores. Era como se a natureza estivesse tentando tranquilizá-la, dizendo que tudo ficaria bem. A luz do lua tornava tudo ainda mais incrível e ela se pegava observando Kieran e como tudo reluzia nele deixando ele ainda mais irresistível.

"Realmente delicioso"

Marina ergueu a mão nos lábios, surpresa pelo pensamento que acabou de ter. Ela não tinha ideia sobre o que sentia, era uma confusão sem fim. Depois de algum tempo caminhando, ela finalmente viu pequenos feixes de luz amarela brilharem a alguns metros

A cabana surgiu à frente deles, simples, rústica, mas acolhedora. Feita de madeira escura, com pequenas janelas de vidro e uma varanda estreita com um banco de madeira. Pequenos feixes de luz escapavam pelas frestas da porta. O cheiro de lenha queimada e ervas secas preenchia o ar.

— Bem vinda ao meu humilde lar princesa. — disse com um sorriso tranquilo no rosto.

— É linda...

Kieran apresentou os cômodos, com a empolgação de uma criança. Sala, cozinha, banheiro e o quarto. Havia apenas um quarto na casa. O pensamento veio instantâneamente a mente de Marina, que corou com o pensamento.

— Dormirei no sofá. — Seu tom era rouco quase um sussurro. Como se soubesse exatamente o que ela havia pensado.

— Não quero ser um incômodo.

— Você nunca será princesa! E fui eu quem te trouxe, então relaxe e apenas descanse tranquilamente.

Depois de um banho demorado, Marina vestiu uma blusa roupa dele, que mais parecia um vestido. A cabana estava em silêncio, ela buscou por ele, dando passos suaves e hesitantes enquanto observava com mais calma o local ao seu redor.

Kieran estava sentado na beira da varanda, o corpo parcialmente iluminado, sem camisa, os músculos ainda tensionados e marcados por arranhões. Ele parecia ao mesmo tempo perigoso e vulnerável, forte e delicado, como uma criatura mítica que pudesse proteger ou destruir com a mesma intensidade.

Marina aproximou-se e sentou-se ao lado dele. O silêncio entre eles era confortável, carregado de tensão e cumplicidade.

— Lhe caiu bem... — disse, lançando um olhar que derreteria qualquer uma.

Marina corou, vendo seu olhos dourados deliszarem sobre ela. Desviando o olhar para longe, ela mudou de assunto.

— Você quase perdeu o controle hoje — disse ela, a voz suave.

— Sim — respondeu Kieran, sem desviar o olhar.

— Mas parou… por mim.

Ele suspirou, olhando para o horizonte.

— Porque se eu te perdesse… eu também me perderia.

Ela respirou fundo, sentindo o peso daquelas palavras.

— Eu ainda tenho medo. De tudo. Mas hoje… obrigada!

Kieran estendeu a mão, mantendo uma distância respeitosa. Marina sorriu e tocou seus dedos.

— Sobre ele… faça-o sofrer! — disse, meio em brincadeira, meio em cumplicidade. Voltando os olhos para ele novamente.

— Nem precisava dizer, princesa! — respondeu ele, sorrindo de volta.

O vento soprava suave, trazendo consigo o perfume da floresta, da madeira e da segurança. Por um momento, Marina sentiu que, apesar de tudo, estava exatamente onde deveria estar: ao lado de alguém que a protegia, que a entendia, e que a fazia sentir-se inteira, mesmo entre os pedaços quebrados de sua alma.

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