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Drakemont era uma cidade pequena, e segredos não permaneciam escondidos por muito tempo.
Marina já sentia os olhares. Alguns curiosos, outros frios. A senhora da padaria, antes tão gentil, agora não sorria mais. Um dos mecânicos se recusou a consertar seu carro. Isla, a dona da livraria, foi a única que não mudou com ela.
Naquela manhã, Marina entrou na livraria, respirando fundo para manter a calma. Isla levantou os olhos do balcão e sorriu.
— Você viu ele de novo, não é?
Marina congelou.
— Quem?
Isla fechou o livro à sua frente.
— Kieran. Você o viu. E não foi por acaso. — Ela se aproximou, baixando a voz. — Acha mesmo que ele é só um homem?
Marina hesitou, o coração acelerando.
— Eu... eu vi coisas. Mas não quero saber. Não quero fazer parte disso.
— Então é tarde demais, querida. — Isla suspirou. — Quando um lobo escolhe... não há volta. E agora... todos sabem.
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Na floresta, no Círculo de Pedra
Kieran estava diante do Conselho da Alcateia. Seu pai, Darian, observava-o como um general analítico, enquanto os outros membros esperavam, tensos.
— Então confirma? — perguntou Darian. — Sentiu o imprinting?
Kieran assentiu.
— Sim. É ela. A humana.
Murmúrios se espalharam pelo círculo.
Lysandra, de pé ao lado do pai, se adiantou.
— Isso é uma afronta às nossas tradições! Nós, mulheres da alcateia, crescemos esperando esse dia. E ele se ajoelha por uma... humana quebrada?
Kieran avançou um passo, os olhos brilhando com fúria contida.
— Cuidado, Lysandra.
Ela o enfrentou de igual para igual.
— Vai me bater? Vai matar alguém da sua própria espécie por ela?
Althaia ergueu a voz.
— Já chega! — Seu tom ressoou pelo círculo, impondo silêncio. — O vínculo é sagrado. A natureza escolheu. Mas cabe a ele... decidir se lutará por isso ou não.
Darian olhou o filho com dureza.
— O que você pretende fazer?
— Protegê-la. A qualquer custo.
Lysandra cerrou os punhos. A guerra havia começado.
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À noite, na cidade...
Marina saía da livraria quando sentiu algo errado. O vento mudou. As luzes da rua pareciam mais fracas. Um arrepio percorreu sua espinha.
Ela apertou o casaco contra o corpo e apressou o passo. Quando virou a esquina, uma mulher alta e loira surgiu em seu caminho.
Lysandra.
— Então é você — disse a loba, sorrindo com escárnio. — A humana que roubou o futuro Alfa da alcateia.
Marina parou. Seu corpo inteiro gritou por perigo, mas ela não deu as costas.
— Eu não roubei nada. Eu não quero nada.
— Ah, mas ele quer você. — Lysandra deu um passo à frente. — E isso já é demais.
Antes que Marina pudesse reagir, Lysandra a empurrou contra a parede. Seus olhos brilharam com fúria sobrenatural.
— Escute bem, ratinha: fique longe dele. Ou o que o seu ex fez com você vai parecer brincadeira perto do que eu posso fazer.
Marina empalideceu, os olhos arregalados.
— Como você...
— Nós ouvimos tudo. Sabemos tudo. Você acha que pode esconder cicatrizes num lugar como esse?
Uma sombra caiu sobre elas de repente. Um rosnado profundo preencheu o ar.
Kieran.
Ele estava ali, os olhos dourados flamejando. A raiva em seu rosto era selvagem.
— Se encostar nela de novo, Lysandra, eu juro... vai perder mais que seu orgulho.
Ela sorriu com desafio.
— E se ela não for forte o suficiente para o que você é, Kieran? Vai arriscar tudo por uma mulher que mal consegue te olhar sem tremer?
— É por isso mesmo que eu arrisco. Porque ela ainda não fugiu.
Lysandra recuou, mas não sem antes lançar um olhar gélido a Marina.
— Isso ainda não acabou.
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Mais tarde, na pousada...
Kieran acompanhou Marina até o quarto. Ela estava em silêncio, com os olhos baixos. Ele parou à porta.
— Me desculpe por isso.
Ela olhou para ele, e havia algo quebrado, mas também firme em sua voz.
— Eu não sei o que está acontecendo. Não entendo o que sinto perto de você. Parte de mim quer correr. Parte de mim quer... — sua voz falhou — ...ficar. Mas eu não posso. Eu não consigo confiar. Em ninguém.
Kieran assentiu devagar.
— Então eu espero. O tempo que for. Porque meu lobo já te reconheceu. E eu... estou começando a reconhecer você também.
Ela fechou a porta com delicadeza, sem dizer mais nada. Mas naquela noite, seus sonhos foram diferentes. Não havia medo. Havia calor. Um toque na pele. Um corpo sobre o seu, mãos grandes, uma respiração ofegante no ouvido.
E um nome sussurrado:
“Marina...”
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Na escuridão da floresta, Lysandra se ajoelhava diante de uma figura encapuzada. Seus olhos estavam tomados por ódio.
— Quero que tire ela do caminho.
A figura sorriu, mostrando dentes afiados.
— Vai me custar caro.
— Pago o preço.
E o lobo exilado sorriu na escuridão.
Thorne havia retornado.
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