Ela era apenas a afilhada da secretária. Ele, o filho rebelde do homem mais poderoso da cidade. Clara nunca imaginou que, ao entrar na mansão Ferraz como funcionária, também entraria no radar do herdeiro mais imprudente e irresistível de Ferranópolis. Theo Ferraz tem tudo o que quer, mas Clara não está disposta a ser apenas mais um capricho. Entre provocações, encontros proibidos e uma paixão que ameaça sair do controle, os dois vão descobrir que certos desejos têm um preço alto... e que nem mesmo um segredo bem guardado é capaz de impedir o destino de cobrar seu preço.
Leer másClara
A mansão Ferraz brilhava sob luzes douradas que pareciam saídas de um sonho caro demais pra mim. Do jardim, chegavam risos, brindes e o tilintar afinado de taças. Era uma daquelas festas que a gente só vê em revistas ou novelas, mas lá estava eu, tentando parecer à vontade entre políticos, empresários e mulheres que sabiam andar com salto como quem flutua.
Apertei o colar de prata que herdei da minha mãe. Sempre faço isso quando estou nervosa. O salto emprestado da madrinha parecia conspirar contra mim, e o vestido preto, embora elegante, parecia gritar que eu não pertencia àquele mundo.
— Respira, menina — sussurrou Teresa, ajeitando com carinho a gola do meu vestido. O olhar dela era um misto de orgulho e apreensão. — Você já conquistou o Roberto. Agora é só não derrubar vinho em ninguém.
Conquistar o Roberto... exagero dela. Ele havia sido gentil comigo, sim, e disse que “Teresa sempre indicava as melhores”. Mas era só isso. Já a esposa dele… Viviane Ferraz parecia saída de um conto de fadas ao contrário. Linda, sim. Elegante, também. Mas com um olhar que fura, corta e analisa tudo como se o mundo estivesse sempre abaixo dela.
Quando me cumprimentou, os dedos frios dela envolveram os meus com um sorriso venenoso.
— Que doce — disse, lançando um olhar para o marido. — Espero que seja tão eficiente quanto a… sua antecessora.
Engoli seco. Tentei sorrir, mas senti uma tensão se instalar nos meus ombros e que não me abandonou desde então.
A verdade é que aquela noite era importante. Eu estava celebrando minha contratação como secretária de Roberto Ferraz, o homem mais poderoso de Ferranópolis, e havia conseguido o cargo graças à mulher que mais admiro no mundo: minha madrinha, Teresa.
— Um brinde ao futuro brilhante — disse ela, erguendo a taça.
Aceitei a primeira taça de espumante com um sorriso. A segunda, já mais animada. Mas logo tudo ao meu redor começou a ficar mais... dourado. O som aumentou, o riso das pessoas parecia mais intenso, e minhas bochechas ficaram quentes.
— Vá tomar um ar, menina. Está corada demais — Teresa disse com um sorriso. — Use a varanda dos fundos. A do lado oposto ao jardim.
Concordei prontamente com a sugestão e fui. O som dos meus saltos soava alto demais contra o mármore da casa. Quando abri a porta de vidro da varanda, fui recebida por uma brisa leve. Encostei no parapeito e fechei os olhos por um instante, tentando recuperar o equilíbrio.
— Esperando o príncipe encantado ou tentando escapar da sua própria história?
Abri os olhos de repente. O susto fez meu estômago revirar. Virei-me devagar, reconhecendo aquela voz antes mesmo de ver quem era.
Theo Ferraz.
Encostado em uma coluna, com um copo de uísque na mão e um sorriso torto nos lábios, ele me observava como quem se diverte com a queda de alguém.
— Desculpe, não vi que tinha alguém aqui — disse, tentando parecer firme, mesmo com o calor subindo pelo meu rosto.
— Estranho. As pessoas sempre percebem quando há um Ferraz por perto.
A vontade de revirar os olhos foi imensa, mas me contive.
— Só precisava de um pouco de ar — murmurei.
Ele inclinou a cabeça, como quem me estudava. Usava uma camisa branca, parcialmente desabotoada no peito, e os punhos arregaçados deixavam à mostra os antebraços bronzeados. Me senti ainda mais tonta e dessa vez não foi só pelo vinho.
— Ar? Normalmente as pessoas fogem dessa festa por motivos mais... interessantes.
— Como o quê?
Não sei por que perguntei. Talvez porque meu filtro já estivesse meio frouxo.
— Tédio. Desespero existencial. Ou pra transar nos banheiros — ele respondeu, com naturalidade.
De maneira inesperada, ele se aproximou e, de repente, o perfume dele me envolveu: madeira, tabaco e algo doce. Ri, sem querer, levando a mão à boca.
— Você é tão cínico quanto...
— Quanto? — Ele estava perto agora, perigosamente perto.
— Quanto alguém que nasceu com tudo na vida pode ser.
Ele soltou um riso baixo. Quase um ronronar.
— Você me julga rápido demais, princesa.
— Não sou princesa.
— Mas combina com você — ele encostou no parapeito ao meu lado, os ombros quase tocando os meus. — Então, qual é sua desculpa pra estar aqui? Parente perdida? Amiga da filha de alguém?
Hesitei. Teresa havia pedido para eu não comentar sobre o trabalho até o anúncio oficial no dia seguinte.
— Minha madrinha me trouxe.
— Ah... a famosa madrinha. Deve ser alguém importante, então.
— Ela é — respondi com orgulho. — Teresa é excepcional.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Imagino que você seja a substituta de Teresa, então? A nova vítima do velho? Aposto que ele adorou seu... currículo.
A raiva me subiu pelas veias.
— Ele contratou minha competência, não minha personalidade.
Tentei recuperar minha postura, mas ele já estava soltando as suas ironias mais uma vez.
— Então você está comemorando a grande ascensão no império como secretária júnior?
Doía. Porque ele sabia quem eu era desde o começo. Estava me testando.
— É só trabalho, Theo. E diferente de você, eu levo isso a sério.
Ele riu curto.
— Tão séria que já está bêbada na primeira semana. Brilhante.
Abri a boca pra responder, mas me segurei. Não valia a pena. Tentei sair dali, mas o mundo girou um pouco, me fazendo apoiar novamente no parapeito.
Ele me observou por um segundo. Depois se aproximou.
— Você está bem?
— Estou. Não preciso da sua ajuda.
— Ótimo — disse, se afastando para a sombra. — Porque eu não vim aqui pra bancar o cavalheiro. Só estou esperando minha deixa para sumir dessa festa ridícula.
Ele saiu, me deixando sozinha com o coração acelerado e uma mistura de vergonha, raiva e... algo que eu não queria nomear.
Quando recuperei a compostura e voltei à festa, passei por um grupo de rapazes que riam com um copo na mão. E ouvi a voz dele, com aquele tom debochado que parecia carregar o mundo nas costas:
— O velho quer que eu faça um discurso hoje. Aposto que ele chora se eu falar em “responsabilidade”.
Theo Ferraz sempre foi e pelo visto, sempre seria um problema. Dos grandes. O fato de eu pensar nele desde os quinze anos não amenizava o sentimento que parecia querer transbordar do meu coração naquele momento.
Anos amando a distância alguém inatingível e agora, tudo está prestes a mudar. Porque agora, Theo Ferraz não vai estar tão longe quanto sempre esteve. Ele parece até mesmo acessível a uma garota simples e sem origem aristocrática. E aquele pensamento traiçoeiro era extremamente perigoso.
O alarme tocou alto em meu cérebro quando naquele momento, Theo se voltou em minha direção e ao me reconhecer, ergueu a taça de whisky que não estava segurando em uma saudação irônica, e jurei ter visto um brilho de promessa naqueles olhos castanho-dourados.
TheoMeu estômago virou. Meu coração deu um salto doloroso. O sangue ferveu.Ela virou-se devagar, como se tivesse sentido minha aproximação. E quando nossos olhares se encontraram, eu vi. O choque. O medo. A culpa. Tudo estampado no rosto dela.E eu odiei aquilo. Odiei a mim mesmo por ainda achá-la tão bonita. Odiei ainda me importar.— Então é verdade — cuspi as palavras, sem conseguir conter o veneno na voz. — Você realmente não perdeu tempo.Ela não disse nada. Só me olhou. E talvez isso tenha me irritado ainda mais.— Eu devia ter imaginado. — Minha voz saiu baixa, carregada de desprezo. — É claro que você estaria aqui. Com ele.Ela empalideceu, as mãos deslizando automaticamente para proteger a barriga, como se quisesse esconder o óbvio. Mas já era tarde demais.— Veio direto pra cama do meu pai? Foi isso? — continuei, me aproximando mais. — E ainda teve a audácia de engravidar dele?Vi a dor passar pelo rosto dela, mas eu não parei. Não podia. Eu precisava que doesse nela també
TheoEntrei no quarto como um furacão, os passos pesados ecoando no piso de madeira. Abri o closet com um puxão brusco e arranquei a mala da prateleira de cima, deixando que caísse no chão com um baque surdo. Sem pensar, comecei a enfiar roupas dentro dela de maneira frenética — camisetas, calças, uma jaqueta que nem lembrava de ter trazido. Nada fazia sentido. Nada importava. Qualquer coisa serviria. Eu só queria ir embora dali. Eu precisava voltar para o Brasil.— Theo... — Lorena surgiu na porta, a voz doce, como sempre, mas carregando um quê de pena que me irritou profundamente.— Eu não tenho paciência pra você hoje, Lorena — rosnei sem olhar para ela. — Fecha a porta e vai embora.— Por favor, eu só quero ajudar...Revirei os olhos e me virei para encará-la, rindo com um sarcasmo amargo.— Ajudar? Você? — sacudi a cabeça, descrente. — Você é só uma marionete da minha mãe. Nada mais.Ela não se ofendeu. Apenas deu alguns passos para dentro do quarto e fechou a porta com delicade
TheoSete meses.Sete meses desde que eu tinha deixado Ferranópolis. Desde que eu tinha deixado ela.O relógio na parede da sala marcava meio-dia e onze quando eu finalmente arrastei meu corpo para fora do quarto. Meus pés descalços deslizaram sobre o mármore frio até o sofá, onde eu praticamente me joguei, sem me importar com a cena patética que eu deveria parecer.Minha mãe, como sempre impecável naquela elegância plástica que ela tanto cultivava, me observava como quem observa um animal ferido e sem serventia largado no meio da sala.— Vai continuar com essa palhaçada até quando? — O tom dela era de desprezo puro, como se a simples visão do meu cabelo bagunçado e da minha camiseta amassada a enojasse. — Já faz sete meses, Theo. Sete meses! E você ainda não superou a secretária cafona do seu pai?Revirei os olhos, sem forças nem para responder à altura. A verdade é que eu não me importava mais com o que ela dizia. Nem sobre Clara. Nem sobre qualquer coisa.Simplesmente me afundei ma
ClaraMeu corpo mudou antes que minha mente estivesse pronta. A curva da barriga agora era evidente, mesmo com as roupas mais largas que eu tentava usar no escritório. Ainda era discreta o suficiente para que alguns apenas desconfiassem, mas Laís já fazia questão de passar a mão sobre ela como se fosse um amuleto da sorte, mesmo durante reuniões sérias.— Esse bebê já vai nascer habituado a contratos e relatórios — ela brincou uma manhã, me ajudando a organizar a papelada da nova auditoria.— E com tolerância a café forte e falta de sono — acrescentei, sorrindo cansada.A verdade é que eu mal parava. Desde que Roberto me promoveu, meu mundo virou um turbilhão de reuniões, análises, decisões. Ele confiava em mim, e eu me sentia responsável por retribuir essa confiança em dobro.— Você precisa desacelerar, Clara — ele me disse certa vez, ao notar minha expressão exausta. — Já está cuidando de uma vida. Não precisa carregar a empresa também.Mas ele dizia isso enquanto passava horas ao m
ClaraO apartamento de Laís cheirava a lasanha e aconchego.— Você não pode esconder isso para sempre, Clara. — Ela colocou um prato cheio na minha frente. — Principalmente agora que está começando a aparecer.Meus dedos instintivamente tocaram a pequena curva sob meu umbigo, ainda escondida sob o moletom largo.— Eu só preciso de mais algumas semanas.— Para quê? — Laís espetou um garfo na minha direção. — Para o Roberto descobrir sozinho e se sentir traído de novo?— Ele não vai...— Ele vai, Clara! &m
ClaraTeste de farmácia pode errar. Pode dar falso positivo... né?Mas eu sabia. Lá no fundo, eu já sabia.Ainda assim, peguei o carro e fui até a cidade vizinha antes do amanhecer. Escondida sob óculos escuros, com um boné enfiado até a metade do rosto e um casaco largo demais para o calor abafado de fim de inverno. Não queria correr riscos. Em Ferraznópolis, qualquer enfermeira poderia conhecer meu nome, fazer perguntas demais, falar o que não devia. Ali, pelo menos, eu era só mais uma mulher nervosa pedindo um exame de sangue.Esperei por duas horas sentada em uma cadeira dura, com o estômago embrulhado e as unhas marcando a palma da mão. Quando meu nome foi chamado, o som me cortou como uma lâmina.O resultado veio num envelope branco, dobrado e selado. Abri ainda no estacionamento da clínica.Positivo. A palavra dançava diante dos meus olhos, cruel e definitiva.Grávida.De Theo.Um homem que me odeia. Um homem que me acusou de ter um caso com o próprio pai. Que me humilhou. Que
Último capítulo