Florença, 1905. Em meio ao brilho elegante da Belle Époque, casamentos não são feitos de amor, mas de alianças e interesses. Magnólia foi criada para obedecer, para sorrir nos salões e calar seus desejos. Mas um encontro inesperado a arrasta para um mundo de paixões proibidas e segredos que nenhum dote ou etiqueta é capaz de conter. Entre promessas familiares e a sedução do desconhecido, ela descobrirá que certas marcas não se apagam — gravam-se na pele, na alma… e no destino.
Ler mais— Capítulo 10 —O sábado desceu sobre Florença como um véu dourado. As carruagens começaram a alinhar-se diante do portão dos Altoviti antes mesmo que o sino da catedral anunciasse as oito badaladas. O som dos cascos misturava-se ao rolar das rodas sobre o cascalho, compondo um ritmo solene que ecoava pelo jardim iluminado por lanternas de vidro. Criados moviam-se com discrição, recebendo capas e chapéus; Salvadori, o mordomo, regia a entrada como um maestro silencioso, cada gesto preciso, cada detalhe no compasso da noite.O salão principal resplandecia sob a claridade de centenas de velas refletidas em cristais e espelhos. A orquestra, já disposta em semicírculo, afinava cordas com a concentração de quem se prepara para mais do que música — para o anúncio de prestígio. O piano, fechado, repousava num canto como fera contida. Sobre as mesas, toalhas de linho caíam em ondas até o chão, e arranjos de magnólias brancas espalhavam um perfume discreto, tão calculado quanto os sorrisos q
— Capítulo 9 —Os dias seguintes ao jantar transcorreram com uma cadência diferente na casa dos Altoviti. Não era o silêncio cerimonioso das manhãs, tampouco a pressa ruidosa das visitas. Era um rumor constante, como se o próprio assoalho carregasse segredos em cada ranger. Mensageiros batiam ao portão com frequência incomum; o mordomo, Salvadori, surgia e desaparecia como sombra eficiente; atrás da porta do escritório, a pena de Arthur riscava o papel sem descanso.Magnólia percebia tudo com a atenção de quem lê o ar: as criadas cochichavam nomes enquanto trocavam lençóis; na cozinha, discutia-se não só tempero, mas prestígio; no jardim, jardineiros alinhavam mudas como soldados antes da revista. Havia algo em gestação — não apenas uma festa, mas uma declaração. E, embora ninguém dissesse em voz alta, ela sabia: parte daquela declaração seria escrita também com a sua presença.Na manhã de terça-feira, o salão de refeições amanheceu inundado de luz. A porcelana refletia a claridade,
⚠️ Capítulo com conteúdo+18⚠️ — Capítulo 8 —A taverna fervia de vozes, fumaça e calor humano, abafada apesar da claridade da tarde que entrava pelas frestas das janelas. Lá dentro, parecia já ser noite: lamparinas ardiam preguiçosas, as mesas manchadas de vinho e gordura brilhavam sob a luz vermelha, e o ar impregnado de suor e fumo se tornava quase sólido. Gilian Tornabuoni apoiava-se no tampo úmido de uma mesa, o corpo entregue ao vinho, embora seus gestos conservassem uma firmeza herdada da disciplina social que lhe fora ensinada desde menino. Marco, ao lado, gargalhava sem pudor, alto e desmedido, atraindo olhares de reprovação. Copos se empilhavam diante deles, e a garrafa, esvaziada e cheia de novo, passava de mão em mão como troféu. — Mais uma! — berrou Marco, batendo o punho no tampo, fazendo os copos tremerem. — Se vamos morrer pobres, que seja de tanto beber! As cartas caíram da mesa vizinha, um dos jogadores praguejou, e em segundos já havia empurrões, cadeiras a
— Capítulo 7 —Na manhã de quinta-feira, o desjejum decorreu sob a luz clara que atravessava as cortinas de renda. A mesa estava impecável, mas a harmonia era apenas fachada. Giovanna partiu o pão com movimentos calculados e, sem esperar ocasião, quebrou o silêncio:— Não podemos adiar mais, Arthur. — Seus olhos pousaram sobre o marido como lâminas. — Magnólia já não é mais menina. É hora de pensar seriamente em alianças.Arthur folheou devagar o jornal, mas não parecia lê-lo. Os dedos tamborilavam no tampo da mesa, medindo o peso das palavras que viriam.— Já estamos pensando nisso.— Pensar não basta. — Giovanna ajeitou o guardanapo no colo, firme. — A família Mancini tem demonstrado interesse. Ernesto Mancini é distinto, fala francês, dança com elegância e tem a postura de um estadista. Um nome como esse jamais mancharia o nosso.Arthur ergueu o olhar, deixando o jornal dobrado de lado. A boca curvou-se num sorriso breve, quase irônico.— Os Mancini são estáveis, é verdade. Mas est
— Capítulo 6 —A manhã seguinte nasceu envolta em um silêncio quase cerimonioso. A casa, que na noite anterior pulsara como um organismo vivo, agora parecia exausta, respirando em suspiros longos. O átrio ainda carregava o perfume adocicado das flores, agora ligeiramente murchas; no salão principal, as velas derretidas haviam deixado manchas de cera na toalha, e as cadeiras, levemente desalinhadas, lembravam soldados após uma batalha elegante. Criadas recolhiam taças esquecidas e guardanapos amassados, movendo-se devagar, como se também partilhassem da ressaca social.Na sala de refeições, Giovanna mantinha-se firme diante de uma mesa mais simples que a da noite anterior, mas não menos impecável. Segurava a xícara com dedos rígidos, como se segurasse não apenas o chá, mas a reputação da família. De vez em quando, ajeitava o lenço no colo sem necessidade, apenas para reafirmar disciplina.— O jantar foi um sucesso — disse, a voz clara, sem esforço, como quem constata um fato. — Ninguém
— Capítulo 5 —A quinta-feira amanheceu carregada de expectativa. Desde cedo, a casa fervilhava como se fosse um organismo vivo. Na cozinha, o cheiro forte de carnes assadas misturava-se ao perfume adocicado das sobremesas em preparo; o cozinheiro, suado, brandia a colher de pau como se fosse um cetro, distribuindo ordens mais rápidas que o tilintar das panelas. Criadas corriam pelos corredores com travessas fumegantes, toalhas recém-passadas e arranjos de flores ainda úmidos do orvalho.Giovanna surgia em cada cômodo como sombra exigente: testava o brilho da prata contra a luz da vela, endireitava quadros já alinhados, avaliava o frescor dos buquês. Cada gesto era afiado como lâmina — nada escapava ao seu olhar.Magnólia observava em silêncio, mas não era a mesma passividade de antes. O vestido de seda clara moldava-lhe a cintura, as luvas rendadas aguardavam sobre a penteadeira, e o colar de pérolas, frio contra a pele, parecia vibrar com a respiração. Mais do que bela, sabia que pr
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