O FILHO EM SILÊNCIO

⚠️ Capítulo com conteúdo+18⚠️

— Capítulo 8 —

A taverna fervia de vozes, fumaça e calor humano, abafada apesar da claridade da tarde que entrava pelas frestas das janelas. Lá dentro, parecia já ser noite: lamparinas ardiam preguiçosas, as mesas manchadas de vinho e gordura brilhavam sob a luz vermelha, e o ar impregnado de suor e fumo se tornava quase sólido.

Gilian Tornabuoni apoiava-se no tampo úmido de uma mesa, o corpo entregue ao vinho, embora seus gestos conservassem uma firmeza herdada da disciplina social que lhe fora ensinada desde menino. Marco, ao lado, gargalhava sem pudor, alto e desmedido, atraindo olhares de reprovação. Copos se empilhavam diante deles, e a garrafa, esvaziada e cheia de novo, passava de mão em mão como troféu.

— Mais uma! — berrou Marco, batendo o punho no tampo, fazendo os copos tremerem. — Se vamos morrer pobres, que seja de tanto beber!

As cartas caíram da mesa vizinha, um dos jogadores praguejou, e em segundos já havia empurrões, cadeiras arrastadas, insultos cuspidos com vinho no hálito. Gilian riu também, mas seu riso soava rouco, como se viesse de longe, pesado de cansaço.

Dois empregados robustos avançaram, agarrando-o e a Marco sem cerimônia. Foram arrastados para fora como sacos de feno, sob vaias e risadas, lançados contra a claridade da rua que os cegou por instantes.

Atirados à rua, Marco tropeçou contra Gilian, ainda rindo e agarrando a garrafa como um troféu barato. A claridade os obrigou a semicerrar os olhos. Foi nesse instante que Gilian a viu.

Duas jovens caminhavam pela calçada, protegidas por sombrinhas claras. Uma delas, ereta, de vestido bem cortado, tinha olhos verdes que pareciam reter a própria luz da tarde.

O olhar de Gilian cruzou o dela, e o vinho, misturado ao instinto insolente, fez-lhe nascer nos lábios um sorriso enviesado. Murmurou, alto o bastante para ser ouvido:

— Se as flores de Florença tivessem olhos… seriam como os seus.

Marco explodiu em gargalhadas, abraçando-o pelo ombro, comemorando como se fosse façanha. Gilian riu também, mas seu riso não tinha raiz — era superficial, um reflexo. Para ele, fora apenas mais uma provocação, uma ousadia de rua, como tantas que seriam esquecidas ao cair da noite.

A moça, no entanto, corou antes de ser puxada pela amiga escandalizada. Gilian a seguiu com os olhos apenas por segundos, até que Marco o arrastou adiante. Logo retomou o passo vacilante, o vinho substituindo qualquer lembrança. Para ele, aquilo não passava de mais um episódio banal de insolência.

A carruagem não seguiu para casa. Ainda rindo com Marco, Gilian inclinou-se para o cocheiro e ordenou outra direção, num gesto tão automático quanto os goles de vinho. Pouco depois, desciam diante de uma casa discreta, de fachada sóbria demais para ser inocente: cortinas pesadas, luzes vermelhas filtradas pelas janelas, perfumes doces escapando pelas frestas.

O ar ali tinha outro peso: mistura de incenso barato, pó de arroz e risos abafados. Marco seguiu para os fundos, já acostumado aos corredores, enquanto Gilian entrou como quem pisa em terreno conhecido. Os ombros mantinham-se retos apesar do vinho, e os olhos semicerrados ainda guardavam a insolência herdada do sangue Tornabuoni.

Uma mulher de cabelos negros, pele clara e lábios pintados de carmim aproximou-se, sorrindo com familiaridade. Os dedos deslizaram pelo braço dele como se percorressem um caminho repetido muitas vezes.

— Mais cedo hoje, senhor Tornabuoni. — O tom era doce e provocador, mas sem surpresa.

Ele não respondeu. Apenas deixou que o conduzisse pelo corredor estreito, onde portas se abriam e fechavam em ritmo constante, revelando fragmentos de corpos, gemidos abafados e gargalhadas rápidas. Os degraus de madeira rangiam sob seus passos, como se reclamassem a pressa.

No fim, chegaram a um quarto pequeno, iluminado por lamparinas de vidro vermelho que lançavam sombras voluptuosas pelas paredes. A cama estreita, coberta por lençóis de seda já puídos, esperava como cenário ensaiado.

Gilian a puxou pela cintura com firmeza, colando os lábios contra o pescoço dela. O gesto foi rápido, ardente, como se quisesse provar de imediato que ainda dominava aquele terreno.

A porta fechou-se atrás deles, abafando o rumor do salão. O quarto parecia mergulhado em penumbra vermelha: lamparinas lançavam sombras ondulantes pelas paredes, e o cheiro de perfume barato misturado a vinho adocicado impregnava o ar.

Gilian a puxou pela cintura, colando os lábios no pescoço alvo. Seus beijos eram fortes, impacientes, como se buscassem devorar em vez de seduzir. As mãos deslizaram pelo quadril, subiram firmes até libertar-lhe os seios do corpete, que logo foram envolvidos por sua boca quente, chupados com avidez. A cortesã arqueou o corpo, gemendo alto, mas seus gemidos tinham cadência ensaiada, o tom exato para atiçar sem entregar alma.

Ele a virou de súbito contra a cama estreita, deitando-se sobre ela com peso decidido. O corpo parecia comandado por certeza: pegada firme, respiração quente, suor escorrendo-lhe pela têmpora. Ela o recebia com gestos fluidos, como quem já sabia de cor o que fazer, deslizando dedos habilidosos, beijos calculados, pernas que se abriam com naturalidade.

Mas, quando o instante crucial chegou, o corpo dele simplesmente recusou. O gesto, antes tão seguro, estancou como lâmina que perde o fio. Gilian franziu o cenho, insistiu, moveu-se contra ela como quem desafia o próprio destino, mas nada respondia.

A cortesã, com paciência treinada, tentou socorrê-lo. Dedos ágeis o percorriam, os lábios desciam por sua pele, buscando reacender o fogo. Mas era como soprar cinzas frias: o desejo nele ardia no olhar, no gesto, mas permanecia ausente onde mais importava.

Um silêncio desconfortável se insinuou entre os gemidos encenados. Por fim, ela ergueu os olhos, o sorriso enviesado ferindo mais que consolo:

— Seu ardor é fogo que não encontra chama.

As palavras caíram como sentença. Gilian afastou-se de súbito, sentando-se na beira da cama, o corpo em tensão. Passou as mãos pelo rosto, a respiração pesada não de prazer, mas de vergonha.

Ela ajeitou o vestido com calma, o ar profissional intacto.

— Não é problema meu, senhor. — A voz saía fria, prática. — O tempo, ainda assim, tem preço.

Saiu, fechando a porta com estalo seco.

Mais tarde, já em casa, Gilian atirou o casaco sobre a cadeira com gesto brusco e aproximou-se do espelho. A vela acesa tremulava, projetando sobre o vidro um reflexo cruel: um homem de vinte e cinco anos, alto, belo aos olhos da cidade, mas prisioneiro de uma falha que ninguém suspeitava.

Os cabelos negros caíam sobre a testa úmida, os olhos amendoados devolviam-lhe um brilho cansado, quase amargo. Apertou os punhos contra o móvel, como se quisesse punir o reflexo. Podia suportar que o chamassem de bêbado, de inconsequente, de dissoluto. Esses insultos eram fáceis; podia transformá-los em riso.

Mas o que o destruía era aquilo que não podia confessar: o corpo que o traía sempre no mesmo momento. Cada tentativa se convertia em derrota íntima. Cada derrota era um grilhão invisível que lhe pesava nos ombros, arrastando-o para o fundo.

Deixou-se cair na cama, os braços abertos, o peito arfando não de desejo, mas de impotência. O silêncio do quarto parecia zombar dele: nenhum riso cúmplice, nenhum rumor de taças. Apenas a escuridão testemunhava sua miséria.

E, na solidão sufocante, compreendeu que não havia vinho capaz de embriagar essa verdade. Não havia mulher capaz de desfazê-la. Carregava sozinho um fardo que não se media em dívidas ou escândalos, mas naquilo que ele nunca conseguia ser.

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