Renascida como Patrícia, Lúcia jamais esperava encontrar no príncipe o reflexo de um amor perdido em outra vida. Agora, dividida entre o desejo e o destino, ela precisa lutar para conquistar um coração que já foi prometido a outra, e também evitar um destino amargo.
Ler maisHenry retornava à corte ao entardecer, o céu tingindo-se de tons de cobre e violeta. Seu sorriso discreto não passou despercebido pelo rei, que observava os servos descarregarem a caça recém-trazida. — Vejo que foi uma caçada produtiva, meu filho — comentou, lançando um olhar analítico aos animais abatidos. O grão-duque fez um sinal para que os cozinheiros levassem a caça à cozinha, enquanto Henry permanecia ali, ainda perdido em pensamentos. — Foi um dia… interessante — respondeu, um leve sorriso brincando nos lábios. — Ah, é? Me conte! O príncipe hesitou, mas antes que pudesse mudar de assunto, Marcus, um de seus acompanhantes na caçada, soltou distraidamente: — Assustamos uma jovem… Zacarias o cutucou discretamente, mas já era tarde. — Conheceu alguém, meu filho? O brilho no olhar do rei denunciava sua expectativa. — Pai, foi apenas um breve encontro. A moça passeava com seu cachorro quando se assustou com o som do disparo. Fui até ela para me desculpar, nada ma
Uma semana se passou, e numa tarde sentir um peso invisível sobre os ombros, um turbilhão de pensamentos que precisavam se dissipar. Decidi sair para espairecer e levei Bruno, o cachorro de Catarina. No início, ele havia me estranhado, rosnando baixo e mantendo uma distância cautelosa, mas com o tempo conquistamos uma amizade sincera, selada por petiscos furtivos e longas caminhadas ao ar livre. Nossa casa ficava afastada da cidade, cercada pela serenidade da natureza. O bosque próximo exalava um aroma de terra úmida e folhas secas, e o vento, ao deslizar por entre os galhos, sussurrava como se compartilhasse segredos antigos. O riacho serpenteava por um campo aberto, suas águas cristalinas refletindo o sol poente como se fossem fragmentos dourados espalhados pela correnteza. Enquanto Bruno corria adiante, saltei sobre uma raiz exposta e apanhei um galho. O cão, atento, fixou os olhos brilhantes no pedaço de madeira. — Pega, Bruno! — exclamei, lançando o galho pelo ar. Ele dis
Na manhã seguinte, antes do sol nascer, fui até a cozinha e encontrei Catarina organizando os pratos do jantar anterior. A luz fraca da aurora tingia o chão de um tom dourado, como se o dia surgisse com promessas de mudança. — Preciso de sua ajuda — anunciei, com a voz baixa, quase hesitante, enquanto me aproximava. Ela ergueu os olhos, surpresa. Seus dedos pararam sobre a porcelana como se temessem que minha voz fosse uma armadilha. — Minha ajuda? Para quê, prima? — perguntou, desconfiada. Expliquei meu plano: reformaria vestidos antigos e os venderia para jovens da alta sociedade. Precisaria de alguém para exibi-los, e quem melhor do que ela, com sua postura graciosa e aparência delicada? Catarina franziu a testa, apertando as mãos diante do avental. — Me desculpe, é que... estou intrigada. Por que, de repente, me trata com gentileza? E sua mãe ficará furiosa se eu me atrasar nos afazeres — ponderou, a voz embargada entre a mágoa e a cautela. Sorri, tentando ocultar o nó em
Respirei fundo e segui até o quarto dela. O ambiente estava na penumbra, iluminado apenas por um feixe de luz que escapava por entre as cortinas pesadas. O cheiro familiar de velas de lavanda misturava-se ao perfume amadeirado do carpete antigo. Mamãe estava recostada na cama, acariciando o gata que ronronava preguiçosamente sob seus dedos adornados por anéis de prata. Seus olhos me analisaram por um momento antes de sua voz suave, mas firme, preencher o quarto. — Abra as cortinas. Quero ver o que você fez com o vestido. O tecido grosso da cortina deslizou sob meus dedos enquanto puxei, deixando a luz da lua inundar o ambiente. Dei um passo à frente, permitindo que ela me examinasse melhor. — Não acha que estou bem? Decidi mudar. Vou fazer dezoito anos daqui dois meses. — forcei um sorriso. Mamãe inclinou levemente a cabeça, como se ponderasse. Seus olhos brilharam com algo inesperado. — Sempre achei o gosto de minhas filhas um tanto extravagante... mas confesso que ficou bom. —
Deitada naquela cama, senti o toque macio dos lençóis contra minha pele e o perfume suave de lavanda que impregnava o quarto. A luz trêmula das velas lançava sombras delicadas nas paredes, tornando tudo ainda mais surreal. Minha mente, porém, estava longe dali. Longe daquele corpo que agora ocupava. Meu nome era Lúcia. Ou será que ainda era? — Eu morri mesmo? — minha voz saiu num sussurro rouco, quase inaudível. — “Minha vida foi tão pequena... Não fiz nada de importante, minhas irmãs mais velhas construíram família, e viviam confortavelmente fui para a cidade grande e não consegui muito dinheiro, nem um namorado.” A lembrança de Renato, um colega de trabalho, emergiu como um sussurro no vento. Seu sorriso caloroso, a maneira como me olhava quando o ajudei com um relatório complicado... Era um lampejo de felicidade em uma rotina sem cores. — "É inacreditável. Aquele dia tinha sido tão bom... E agora nunca mais o verei e nem a minha família." — pensei, e uma onda de triste
O que diachos está acontecendo? — perguntei, perplexa, ao me deparar com uma cena que parecia ter saltado das páginas de um conto de fadas distorcido. Uma senhora de semblante duro, carregando a altivez de quem se julga acima do mundo, observava com desdém. Ao seu lado, uma jovem trajando roupas berrantes e de gosto duvidoso maltratava uma criada. Esta, de olhos castanhos ligeiramente úmidos e cabelos loiros presos às pressas com um lenço puído, usava um vestido desbotado, quase em farrapos. Ainda assim, havia algo de sereno em sua figura. A dignidade irradiava de sua postura ereta e dos gestos contidos. Mesmo sob o desgaste da roupa, seu corpo estava limpo, e os pés calçavam sapatos simples, mas firmes e inteiros, destoando do restante da indumentária. — Sua lerda! Ainda por cima deixou derramar! — bradou a senhora, a voz cortante como chicote, enquanto o rosto ruborizava de raiva. — Me desculpe, senhora. Vou limpar imediatamente. — respondeu a criada, tremendo ao se curvar, desa