Mundo ficciónIniciar sesiónCecily Sartore sempre viveu cercada de seguranças. Filha de um magnata da indústria farmacêutica, aprendeu cedo a se livrar deles de formas criativas. Nenhum resiste por muito tempo. Mas sua liberdade, depois do último, durou menos do que esperava. Agora, Matteo Florence é quem está no comando. Seu novo guarda-costas não é como os outros. Mais atento. Mais insistente. Mais difícil de afastar. E o pior: Cecily não tem certeza se realmente quer que ele vá embora. Ele é jovem. Bonito. Misterioso. Carrega uma lista duvidosa de especializações e um passado sombrio. Uma tentação perigosa demais. Um desafio do qual Cecily sabe que não conseguirá escapar em apenas uma semana. — Estou aqui para protegê-la. É a porra do meu trabalho e eu não ligo para quantos desses filhos da puta virão atrás de mim. Eles podem entrar na fila.
Leer másTem um estranho no meu quarto. Um estranho de quase dois metros de altura e pelo menos o triplo do meu peso em músculos escondidos pelas roupas negras. Jaqueta de couro, calças jeans de lavagem escura e Vans. Seria cômico, se meu coração não estivesse tentando se recuperar do susto que levou. Vans com cadarços extremamentes brancos.
Considerando que meu último segurança foi demitido faz uma semana, talvez esse deva ser o cara que papai encontrou para substituí-lo. E só por isso, eu engulo o grito entalado na garganta. Analiso-o da cabeça aos pés, porque a chance de que ele não saiba que estou aqui ainda existe. Para onde eu olhe, é impecável: A jaqueta não tem um arranhão no couro, nenhum sinal de ressecamento, a calça foi muito bem passada e os tênis quase brilham na luz amarelada dos abajures. A única luz do ambiente vem deles, direto das mesinhas em ambos os lados da cama feita com maestria pelas empregadas da casa. Elas devem me detestar com todas as almofadas e travesseiros que precisam afofar todos os dias e com todas as camadas de cobertores com os quais gosto de dormir. Um lençol, um edredom pesado e uma cobertinha felpuda e fofa. Essa última é de um roxo claro e delicado e todo resto é branco.
Mas o estranho não liga para a decoração exagerada da minha cama, ou para os buquês de peônias frescas ao lado das luzes, ou para o enorme lustre de cristal e ouro pendendo do teto no centro do quarto. Ele não liga para nada, além do que está segurando. O porta retrato que fica na minha escrivaninha ao lado da janela.
— É uma péssima maneira de começar seu primeiro dia. Invadindo minha privacidade. - Digo, quando ele passa segundos demais olhando a foto.
Atiro a bolsa no banquinho comprido sem encosto aos pés da cama, aveludado no mesmo tom de roxo. Todo esse cômodo é branco com detalhes em dourado e violeta. O estranho pisca para a fotografia e ergue os olhos para mim, por cima dos ombros, por um longo instante. Ele devolve o porta retrato, o maxilar remoendo algo que ele engole junto com saliva.
— Não é meu primeiro dia.
A voz dele ressoa, baixa e calma. Como se a errada aqui fosse eu, como se eu estivesse invadindo o momento dele. Cruzo os braços apoiando o peso na perna direita.
— Meu pai sabe que está aqui? - Indago, indignada. O estranho observa o quarto, despretensiosamente, sem pressa alguma de dizer seu nome, ou de me implorar que não conte ao chefe dele que invadiu meu quarto, sozinho e sem permissão, sem nenhuma justificativa emergencial para estar aqui.
— Assinamos um contrato há dez minutos e ele apertou a minha mão, então ao menos que aquele não seja seu pai, o que seria preocupante, sim Cecy, ele sabe.
Cecy. Não, senhorita Sartore. Nem Cecily. A porra do meu apelido saindo pela boca de alguém que eu sequer sei o nome, alguém atrevido demais para ousar dizê-lo e quebrar uma das clausulas do contrato que todos os meus seguranças assinam. Nesta casa, a cozinheira, o motorista e meu pai me chamam assim. Eles me viram nascer e crescer. E fora dela, mais duas pessoas têm esse direito e com certeza, esse cara não é uma delas.
Estreito os cílios para ele, que enfia as mãos nos bolsos da frente da calça e inclina a cabeça levemente para trás. Está mascando um chiclete e me analisando com o olhar incômodo. Arrogante.
— Ele disse que você estaria aqui, para que nos conhecêssemos, mas nitidamente não estava. - Os olhos vacilam para minha bolsa e depois voltam a me percorrer, passando e reparando em cada peça de roupa em meu corpo. Dos scarpins brancos com as meias de renda transparente nos tornozelos ao vestido branco, curto e romântico se aderindo às minhas curvas, feito de um tecido com bordado inglês com pequenos recortes florais. A saia se franze nas laterais em um drapeado que o deixam ainda mais curto, algo que papai jamais me deixaria usar para sair. Como se ele me deixasse sair dessa casa para qualquer coisa além das que ele julga importante para mim. — Quando o segurança sai a princesinha vai a uma festa?
Cambaleio pelo corredor mal iluminado, me segurando nas paredes sem poder ver direito. Meu coração bate tão forte que sequer respiro e tudo bem, porque cada inspiração que tento dar a cada passo desencadeia uma onda latejante na coxa. Sinto o sangue escorrer pelo meio da perna, impregnar a meia-calça, grudando-a na pele.Esbarro em algo duro, porém macio. Minha têmpora também lateja e dedos fortes se fecham ao redor dos meus braços.— Aí! - Reclamo, tentando me livrar do aperto desesperador. E se um daqueles caras da mesa decidiu voltar e fazer de mim o que bem entender? Não. Eles não tem esse perfume. Ergo a cabeça, me deparando com aquelas íris castanhas, um mar revolto de preocupação e raiva. Ele está com raiva de mim.— Porra, Cecy, quando eu te ligar, você me atende, entendeu?! - Matteo dispara, furioso, arrastando-me para o salão do carteado.Deixo que me leve. Que me arraste pelo braço como uma boneca em pedaços pelo lugar revirado. Tudo que sou capaz de ver com a iluminação po
Andrés empurra sua cadeira majestosa, as mãos escondidas despretensiosamente nos bolsos da calça social. Um relógio de ouro robusto enfeita o punho, a aliança me lembra de sua mulher e há um segundo anel no mindinho esquerdo. Gisella não está aqui, mas é óbvio que sabe sobre o segundo emprego do marido, após a escola. O papel de diretor disfarça muito bem o criminoso cretino que deve ser. Criminoso sim, porque apostaria todas as malditas fichas que aquele traficante que vende droga para adolescentes paga comissão para manter seu ponto de venda ativo.— O que ele fez com o meu Tommy… - Os passos ecoam pelo chão, pesados e meticulosamente calculados para me despertar ondas arrepiantes sob a pele. Saio do meio das duas poltronas, a última coisa que quero é que ele me ronde até ficar presa ali. Recuo devagar, a cada passo dele. — Não costumo perdoar, apesar da sua tentativa ridícula de fazer as pazes no hospital.— Ele mereceu. - Disparo envolvendo a cintura com os braços, a jaqueta bloqu
— Senhor Martínez?As letras se embolam ao escaparem da minha boca sozinhas. Incrédulas.O diretor da escola é dono de uma mesa de carteado, em um bar que serve bebidas para menores e, na maioria das noites, para seus próprios alunos. Para o filho dele. Por isso Tommy me viu no Redbloom outro dia. Por isso ele estava aqui. É o negócio do papai. Quanto mais amigos ele trazer, melhor. Quanto mais alunas com seus vestidos curtos tiver naquele bar, mais clientes pervertidos o pai dele terá. E esse tipo de pervertido é exatamente quem enche os bolsos dele com rios de dinheiro ao perderem suas apostas depois de se sentirem poderosos e imbatíveis com alguns drinks. — Cecily. - O homem bafora meu nome em meio a fumaça do charuto grosso. A essência do cravo e especiarias queimadas enche a sala, tornando o ar sufocante e seco. Ele está com o mesmo terno que usava no hospital, mas tirou o blazer que agora descansa dobrado sobre o encosto de uma das poltronas em frente a mesa. — É a segunda vez
Sobramos eu e Isaac. Os dedos dele abaixam as cartas e um sorriso pervertido desperta uma onda gelada, ou talvez, seja o frio do ar condicionado no teto atrás dele. Algo me diz que estamos chegando ao fim e seu ego inflado é o vencedor, independente do que o meu baralho signifique.— O que está escondendo aí, Cecy. - Ronrona, escorregando o corpo na cadeira. As veias saltam pelos braços pálidos, as argolinhas enfeitam as orelhas direita e a tatuagem de olho realista que tem na garganta me encara de volta. Posso jurar que essa coisa piscará para mim a qualquer segundo. O pomo de adão sobe e desce.— Paga pra ver. - Respondo, engolindo a saliva com gosto de mel. Nenhum deles se incomodou em perguntar se eu ou meu amigo queríamos beber da garrafa praticamente vazia do uísque barato. Não iríamos querer, mas foi uma falta de educação tremenda.Isaac levanta as sobrancelhas negras e cheias. Ele paga.Solto as cartas no feltro verde, deixando-as visíveis para os quatro. Cinco, se contar o se
Somos guiados até a mesa. A música vibra nas paredes e no chão, o ar é carregado com o cheiro de charuto, maconha, perfume masculino, couro e uísque. Há somente uma mesa redonda no meio da sala, com a superfície de feltro verde gasto e manchado com diversas cores de bebidas e cinzas que caem para fora dos cinzeiros. É quase gritante contra o roxo das cadeiras. As fichas coloridas estão empilhadas no canto superior esquerdo, os copos quadrados de cristal tilintam com cubos de gelo e risadas ecoam de uma conversa entre os quatro integrantes sentados ao redor.Quatro pares de olhos interessados em nós assim que ficamos visíveis pela cortina de fumaça dos cigarros. Um deles, castanhos e intensos como os de Matteo, me devoram de cima a baixo, detendo-se nas coxas separadas e nos seios subindo e descendo, um tanto acelerados dentro do decote do vestido vermelho. Eu não percebi que tinha parado de respirar direito. O platinado tira o cigarro de maconha da boca e a fumaça sobe, embrenhando-se
— A mocinha não pode entrar aqui.Mal piso além da cortina pesada e empoeirada e uma mão enorme me empurra. O cômodo é redondo e inteiramente roxo, dos estofados das cadeiras ao redor da mesa de carteado, aos tapetes, painéis quadrados do chão ao teto e as luzes piscando ao som de uma música diferente da do bar: um hip hop obsceno e estridente vibrando cada poro do meu corpo.O segurança de pele retinta me encara com os olhos fundos e redondos, escuros como ameixas. O terno que usa é pequeno demais para a quantidade de músculos e a grande e grossa corrente de ouro no pescoço me diz que quem quer que for que o pague, paga muito bem. O punho é quase do tamanho do meu pescoço e o braço maior que a minha cabeça. Porém, estou acostumada a lidar com brutamontes, ao contrário de Luc, que se encolhe atrás de mim.— Servem bebidas para menores, mas não deixam a gente jogar? - Empino o nariz, cruzando os braços, a bolsa pendurada na dobra do cotovelo balança.— É coisa de gente grande. - A voz
Último capítulo