Mundo de ficçãoIniciar sessãoAlexander tinha tudo: sucesso, amor e uma vida perfeita. Mas no dia em que deveria comemorar o terceiro aniversário de casamento com sua amada, o destino lhe roubou tudo de uma só vez. Um acidente brutal tirou a vida da mulher que ele amava e o deixou em coma por dois anos. Ao acordar, duas verdades esmagadoras destruíram o pouco que restava de seu mundo: sua esposa estava morta e ele, agora, estava preso a uma cadeira de rodas, sem saber se um dia voltaria a andar. Exausto, amargurado e sem vontade de continuar, ele abandona a empresa que construiu e se isola em sua casa de campo, afastando amigos e familiares para não enfrentar olhares de piedade. Norah a jovem fisioterapeuta contratada por sua mãe. Linda, cheia de vida e determinada, ela não vê nele um homem quebrado, mas alguém que ainda pode recomeçar. Entre sessões de fisioterapia, provocações e pequenas vitórias, nasce um vínculo que vai muito além da recuperação física. Ela se torna sua luz no fim do túnel, despertando nele algo que acreditava ter perdido para sempre: a vontade de viver e de amar outra vez.
Ler maisPrólogo - Alexander
A primeira coisa que senti foi o peso. Um peso estranho, sufocante, como se o próprio ar tivesse ficado espesso demais pra respirar. Minha cabeça latejava, e o som de algum aparelho apitando me fez querer tapar os ouvidos, mas quando tentei mexer as pernas, nada aconteceu. O desespero veio de uma vez. Tentei mexer os pés, o tronco, qualquer coisa. Nada. Meu corpo inteiro parecia morto. Mas eu sentia o coração batendo, acelerado, como se tentasse compensar o resto que não funcionava. Abri os olhos com esforço. A luz branca me cegou por um instante, e quando consegui focar, vi o teto. Um teto frio, impessoal, típico de hospital. Fios. Tubos. Monitores piscando. Um cheiro forte de desinfetante. Tentei falar. Quis gritar. Perguntar o que estava acontecendo. Mas a voz não saiu. A garganta queimava e parecia colada por dentro. Tentei de novo. Um gemido rouco escapou, e foi o suficiente pra chamar a atenção de alguém. Uma mulher apareceu no canto da minha visão, usando roupas claras e uma touca no cabelo. — Calma, senhor, calma, o senhor está bem — ela disse, se aproximando rápido. — Respire fundo, tá? Eu vou chamar o médico. Bem? Ela disse bem? Como alguém pode estar bem preso dentro do próprio corpo? Senti o ar preso nos pulmões, a respiração descompassada, o peito subindo e descendo rápido demais. Consegui mexer as mãos, e agarrei o lençol com força. Era a única parte do corpo que parecia me obedecer. Minutos depois, um homem de jaleco entrou no quarto. O olhar dele era sério, cansado, e mesmo antes de abrir a boca, eu sabia que não vinha coisa boa dali. — Alexander? Consegue me ouvir? — ele perguntou, se inclinando. Pisquei duas vezes, tentando confirmar. — Ótimo. Vamos devagar, ok? Respira fundo, você está num hospital, em recuperação. Tentei formar uma pergunta com os lábios secos. Ele pareceu entender. — Eu sei que tem muitas dúvidas. Só um momento, vamos retirar os tubos. A enfermeira se aproximou, desligando aparelhos, tirando fios, soltando o tubo que estava na minha garganta. Eu tossi, tossi até o peito doer. Quando finalmente consegui respirar sozinho, sussurrei: — Água… por favor. Ela me deu um pouco, com cuidado. A sensação do líquido descendo foi a melhor coisa que senti desde que acordei. — O que… o que aconteceu? — minha voz saiu fraca, falhada. — Por que eu tô aqui? O médico respirou fundo. Olhou pra enfermeira, depois pra mim. — Sua família já foi chamada. Estão a caminho com a psicóloga. Vamos conversar com calma, tudo bem? — Eu não preciso de psicóloga. Nem da minha família. Eu só quero a minha esposa — respondi, e minha garganta travou no meio da frase. — Onde ela tá? O médico desviou o olhar. O silêncio dele doeu mais do que qualquer resposta. Pouco tempo depois, a porta se abriu. Minha mãe entrou primeiro, os olhos inchados de chorar. Atrás dela, meu irmão, com o rosto pálido. E uma mulher de jaleco, que eu presumi ser a tal psicóloga. — Alex… — minha mãe sussurrou, se aproximando, a voz tremendo. — Mãe, o que tá acontecendo? — perguntei, tentando manter a calma que eu já não tinha. — Cadê a Julia? A mulher de jaleco respirou fundo e deu um passo à frente. O olhar dela era sereno, mas carregava um peso que me gelou por dentro. — Alexander, eu sei que é difícil ouvir isso — ela começou, com aquela voz doce e controlada — mas você sofreu um acidente. — Acidente? — repeti, confuso. — Que acidente? — Foi há exatos dois anos e dois dias — ela disse. — Você estava com a sua esposa no carro. Houve uma colisão grave. Você ficou em coma desde então. Meu corpo inteiro pareceu congelar. Dois anos? — E a Julia? — sussurrei. A mulher hesitou. Meu irmão abaixou a cabeça, e foi aí que eu entendi. — Não… — balancei a cabeça, ou tentei. — Não, não, não… — Ela não resistiu, Alexander. Sua esposa faleceu no acidente. As palavras dela cortaram o ar. Eu não ouvi mais nada. Só um zumbido. Uma pressão no peito, como se o coração tivesse decidido parar junto com o resto do corpo. — Era pra ter me deixado morrer também — falei, com a voz embargada. — Eu não quero isso. Eu não quero viver sem ela. Minha mãe chorava encostada na cama. O médico tentou falar algo, mas eu gritei: — SAIAM! — Foi um grito mais mental do que físico, porque o corpo ainda não obedecia. — Me deixem em paz! O rosto da psicóloga se manteve calmo, mas os olhos dela denunciavam pena. Pena. A última coisa que eu queria. Fiquei ali, preso naquele quarto branco, sentindo o tempo se arrastar. A dor era tão grande que parecia ter corpo, forma. Ela me esmagava por dentro. Nos dias seguintes, os médicos falavam sobre terapia, reabilitação, esperança. Mas eu não ouvia. O que me importava já tinha morrido. Tentei lembrar do acidente, mas minha mente só trazia flashes desconexos. O som do vidro quebrando. O grito dela. E depois o escuro. Fiquei internado por mais algumas semanas. Cada manhã era um lembrete de que eu nunca mais andaria. Nunca mais sentiria o toque dela, o cheiro do cabelo dela, o riso leve que enchia a casa. Um dia o médico entrou com aquele mesmo olhar piedoso de sempre. — Alexander, os exames mostram que está tudo estável. Vamos dar alta amanhã. Assenti, sem emoção. Estável. Essa palavra soava como condenação. Fui levado pra casa numa cadeira de rodas. O caminho inteiro, encarei o vidro da janela, vendo a cidade passar sem conseguir sentir que eu fazia parte dela. Quando cheguei, tudo parecia estranho. A casa era a mesma, mas vazia de vida. As coisas dela ainda estavam lá, o perfume no ar, as roupas no guarda-roupa, a caneca preferida na cozinha. Tudo congelado no tempo, como se ela fosse entrar a qualquer momento pela porta. Passei os dias seguintes no silêncio. As pessoas vinham me visitar. Amigos, parentes, Amigos. Todos com aquele olhar de quem não sabe o que dizer. E eu não queria ouvir nada mesmo. Fiquei no quarto. As cortinas fechadas. A cadeira virada pra parede. O celular desligado. Só eu, o som do meu próprio respirar, e a lembrança dela. De vez em quando, eu olhava pra aliança no meu dedo. Aquela pequena faixa dourada parecia zombar de mim. Promessas de até que a morte nos separe. Mas ninguém te prepara pra quando a morte separa de verdade. Os dias viraram semanas. As semanas viraram meses. E eu continuei ali, me punindo, me trancando, esperando o tempo acabar. Porque, no fundo, eu já tinha morrido naquele carro. O que restou, é só o que sobrou de mim. E talvez seja isso que eu mereça. Viver preso no próprio corpo, sentindo a ausência dela em cada segundo. Um castigo. Um lembrete cruel do que eu perdi. Julia sempre dizia que eu era forte. Mas ela não tá mais aqui pra ver o quanto eu me tornei um fraco. E talvez… Talvez seja melhor assim.Norah Narrando Cheguei em tão, tão distante. Esse homem realmente veio se esconder do mundo. Mas, ah, Alexander ele ainda não aprendeu que eu sou persistente. Quando eu coloco algo na cabeça, não há distância, obstáculo ou silêncio que me faça desistir. E eu quero ajudá-lo, nem que pra isso eu tenha que ir até o fim do mundo.A estrada era longa, de terra batida, e o carro levantava poeira por todos os lados. O sol já começava a se pôr, tingindo o céu de tons alaranjados e rosados. O ar do interior tinha aquele cheiro de mato, de liberdade, de vida simples. Enquanto dirigia, senti o coração acelerar, uma mistura de nervosismo e esperança. Eu não sabia como ele ia reagir me vendo ali. Talvez gritasse, talvez mandasse eu ir embora. Mas eu precisava tentar.Quando vi a placa de madeira desgastada com o nome “Fazenda William”, reduzi a velocidade. A porteira era enorme, antiga, e rangia com o vento. Parei o carro em frente, respirei fundo e desci. O calor da tarde se misturava ao cheiro
Alexander Narrando A noite na fazenda foi silenciosa, pesada. O vento batia nas janelas e fazia aquele som arrastado que parecia vir de dentro da alma. Eu tomei os remédios que o enfermeiro trouxe, aqueles que me deixam meio fora do ar e, pela primeira vez em dias, consegui dormir. Não foi um sono tranquilo. Foi como cair num buraco escuro e fundo, sem fim.Quando abri os olhos, ainda zonzo, precisei de alguns segundos pra lembrar onde estava. A luz entrava pelas frestas da cortina, e os pássaros cantavam lá fora. O som deles ecoava no meio do silêncio da casa, e, por um instante, senti algo diferente. Aquela paz do campo, o cheiro úmido de terra, o aroma forte do mato molhado, fazia tempo que eu não respirava ar de verdade.Mas a lembrança veio rápido, cortando qualquer tentativa de sossego. Eu não tava ali de férias. Tava fugindo da minha própria vida.Ouvi baterem na porta.— Senhor Alexander, posso entrar? — era o enfermeiro.— Entra logo — murmurei, com a voz ainda pesada.Ele a
Norah Narrando O som do telefone me acordou no meio da madrugada, cortando o silêncio do quarto como uma lâmina. Peguei o celular tateando, os olhos ainda pesados de sono. Na tela, um número desconhecido piscava. O coração gelou.— Alô? — minha voz saiu rouca, quase um sussurro.— Senhora Norah? Aqui é da recepção do Hospital São Rafael. Sua mãe deu entrada há cerca de vinte minutos.Fechei os olhos com força, sentindo o peito apertar. Uma chuva de lembranças veio com tudo, gritos, portas batendo, o cheiro do sangue seco, o choro abafado de madrugada. A dor antiga, aquela que eu escondo no fundo do peito, voltou viva como se nunca tivesse ido embora.Levantei devagar, sentindo o chão frio nos pés. Vesti um moletom grosso, coloquei luvas, gorro e cachecol. O frio lá fora estava de cortar a pele, mas nada se comparava ao gelo que eu sentia por dentro. Peguei a bolsa, o celular e saí sem nem acender as luzes.O trajeto até o hospital pareceu interminável. As luzes da rua passavam rápida
Alexander Narrando O dia amanheceu cinza, pesado, com aquele tipo de silêncio que já avisa que nada vai dar certo. Acordei com a claridade atravessando as frestas da cortina, mas o que me despertou de verdade foi a voz da minha mãe, chamando meu nome com a calma que só ela tem.— Alex — ela disse, entrando no quarto junto com o enfermeiro. — A Norah não apareceu.Abri os olhos devagar, ainda meio grogue do remédio da noite. — Como assim, não apareceu?— Não ligou, não mandou mensagem, nada. Tentei o número dela, o doutor Washington também, mas o telefone só cai na caixa postal. — Ela cruzou os braços, claramente preocupada. — Você disse alguma coisa pra ela ontem?Olhei pra minha mãe por um segundo, depois desviei o olhar, irritado. — Ela não passa de uma incompetente.O enfermeiro, que estava em pé no canto do quarto, levantou os olhos pra mim. — O que foi? — perguntei, ríspido. — Tá me olhando por quê? Me ajuda logo a sentar nessa cadeira.Ele se aproximou, em silêncio, e me aju
Alexander NarrandoAcordei antes do sol nascer. O quarto ainda estava na penumbra, mas o silêncio era pesado demais pra dormir de novo.Não era mais o barulho do despertador que me acordava, e sim a consciência de que eu ainda estou vivo e inútil.A cadeira de rodas ao lado da cama parecia me encarar. Um lembrete diário de tudo o que perdi. Eu olhei pra ela com raiva. Uma raiva que não tinha destino certo.Ou talvez tivesse.O relógio marcava oito da manhã quando ouvi passos no corredor.Nem precisei olhar pra saber quem era.— Bom dia, senhor William — a voz dela veio leve, animada demais pro meu gosto.Revirei os olhos.— Já te disseram que você fala alto demais pra quem chega cedo?— Já me disseram que gente mal-humorada precisa de café. — Ela sorriu, colocando a bolsa no canto. — Quer que eu traga uma xícara?— Quero que me deixe em paz.Ela riu, como se nada a afetasse.É irritante o quanto essa mulher parece imune ao meu mau humor.— Hoje vamos fazer algo diferente. Um pouco mai
Norah Narrando Acordei com o toque insistente do meu celular vibrando na mesinha de cabeceira.Abri um olho, ainda sonolenta, e estiquei o braço pra pegar o aparelho.No visor, o nome do doutor Washington piscava.Atendi de imediato.— Bom dia, doutor — murmurei, tentando disfarçar a voz rouca.— Norah, minha querida amiga! — ele respondeu naquele tom animado e tranquilo que era só dele. — Tá com horário na sua agenda hoje?Suspirei, me sentando na cama.— Tenho sim. Acabei o atendimento de dois pacientes e tô com dois horários vagos. Por quê?— Ótimo. Tenho um caso novo pra te passar. Um paciente que acabou de acordar de um coma de dois anos. Da família William.Meu coração acelerou por um instante. Eu sabia desse caso.Alexander William.O homem que ficou paraplégico depois de um acidente trágico, que levou a vida da esposa.— Eu conheço o histórico — falei baixinho. — Ele finalmente acordou, então.— Acordou, mas a situação é delicada. Tá revoltado, não aceita ajuda, não quer reab





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