Isabela Andrade é uma talentosa pintora brasileira que deixou tudo para trás por amor — até ser cruelmente abandonada no altar, a milhares de quilômetros de casa. Em plena Paris, com o vestido ainda molhado pelas lágrimas e o coração em ruínas, ela encontra refúgio em um bar desconhecido e muito álcool para afogar as mágoas. Ao seu lado, no balcão, está Matheo Montclair, um CEO francês implacável, conhecido por sua frieza e por estar sempre em uma cadeira de rodas. Ao ouvir, quase por acaso, o desabafo embriagado de Isabela, algo o intriga — não por compaixão, mas por oportunidade. Ele vê nela a peça perfeita para um plano pessoal e empresarial: um casamento de fachada. Ela, sem opções. Ele, sem espaço para o amor. Um contrato assinado entre paredes frias e emoções contidas. Mas Paris não é feita apenas de mármore e contratos. Entre pinceladas de dor e olhares roubados, a convivência entre dois mundos opostos começa a borrar as linhas do acordo, revelando cores que nenhum dos dois acreditava mais existir.
Ler maisIsabela Andrade
O cheiro das flores brancas preenchia o ar como se quisesse esconder o vazio que crescia dentro de mim. A capela estava deslumbrante, exatamente como eu havia imaginado desde menina. Cada detalhe havia sido sonhado, rabiscado em um dos meus cadernos de arte e depois escolhido com amor. O altar, coberto por lírios e orquídeas, era como uma pintura que eu mesma teria feito. Era o meu grande dia. O dia em que minha vida mudaria. Ou assim eu acreditava. Com as mãos trêmulas segurando o buquê, meu olhar corria inquieto pelas laterais da igreja. Os convidados começavam a cochichar. A trilha instrumental tocava baixinho ao fundo, repetindo-se como um disco arranhado. Meus avós, sentados na primeira fileira, sorriam ao me ver, com os olhos marejados. Eles não sabiam, mas tudo o que eu fazia era por eles. Desde que meus pais morreram em um acidente de carro, quando eu tinha apenas quatorze anos, foram eles que me criaram. Com o seguro e uma herança modesta, conseguiram garantir minha educação, e eu — já crescida — investi a pequena fortuna que me restava em nosso futuro. Usei o dinheiro para abrir meu ateliê na França, concluir meus estudos e comprar uma casa simples, mas charmosa, onde moro com eles desde que nos mudamos de vez para Paris. Minha vida estava começando a tomar forma. Minhas esculturas haviam sido aceitas em uma pequena galeria no Marais, minhas pinturas estavam ganhando elogios, e Rafael… Rafael era o que eu achava que faltava. Nós nos conhecemos durante meu intercâmbio. Ele era encantador, educado, gentil. Me fazia rir e parecia me admirar mais a cada dia. Tínhamos planos, sonhos, viagens guardadas no tempo. Nunca me tocou — por escolha minha — e ele dizia compreender. Eu queria que a primeira vez fosse depois do casamento, algo sagrado, algo bonito. Ele prometia esperar. Eu acreditei. A porta da sala onde eu aguardava, separada da entrada principal da igreja, se abriu de repente. Rebeca, minha melhor amiga e madrinha, entrou com passos apressados e uma expressão alarmada. — Isa… o Rafael ainda não chegou. Senti um frio invadir minhas costas. — Como assim? — perguntei, sem conseguir esconder o tremor na voz. — Já ligaram pra ele. Mandaram mensagens. Ele não atende. Os pais também não sabem onde ele está. Estão tão confusos quanto nós. Acham que pode ser um atraso… trânsito, talvez. Balancei a cabeça, tentando afastar a angústia que crescia no meu estômago. Pedi que me deixassem sozinha. Eu precisava acreditar que ele viria. Precisava acreditar que era só um atraso. Mas o tempo passou. Meia hora. Depois uma. Duas. Sozinha naquela sala, encarando meu reflexo em um espelho de moldura dourada, vi meu rosto mudar. A esperança cedeu lugar à humilhação. Meu celular, pousado ao meu lado, vibrou. Era uma mensagem dele. Abri com as mãos trêmulas.“Isabela, vou ser direto porque não tenho mais energia para mentiras nem para floreios: eu não vou aparecer. Não vamos nos casar. Eu não te amo. E, sinceramente, acho que nunca amei. Me acostumei com sua presença, com seu jeito doce, com sua obsessão por perfeição. Você nunca me deu o que eu realmente queria — nunca deixou que eu te tocasse, nunca confiou em mim o suficiente para isso, e francamente, isso me cansou. Você é fria, puritana, idealista demais. Sempre parecia mais preocupada com seus avós, suas pinturas e seus ideais do que comigo. Eu conheci alguém. Ela é o oposto de você. Me deseja, me satisfaz, me faz me sentir homem. Você não fazia. Só me frustrava. A culpa é sua por termos chegado a esse ponto. Eu não podia me amarrar a uma vida sem paixão, sem calor, sem prazer. Não me procure. Eu não volto atrás. E não vou me desculpar por buscar o que mereço.” Minhas pernas perderam a força. Me sentei em um banco próximo de onde eu estava, sem conseguir respirar. A dor não era só no peito, era no corpo inteiro, como se cada palavra tivesse me rasgado por dentro. Minutos depois, Rebeca voltou e me encontrou ali, pálida, com o celular nas mãos. Ela leu a mensagem em silêncio. Nenhuma palavra podia curar aquilo. — Me ajuda a cancelar — foi tudo o que consegui dizer. — Manda todos para casa. Diz que… que está cancelado. Só isso. Não dê detalhes, por favor. — Isa, eu sinto muito, me deixa ficar aqui com vo- — Por favor, Rebeca. Preciso de um tempo, não deixe que ninguém entre aqui, por favor – minha voz saiu querendo falhar, e lágrimas brotavam em meu rosto sem parar, não consegui mais dizer uma palavra sequer. Ela, ao ver o meu desespero, quis argumentar, mas eu a olhei nos olhos e fiz uma súplica silenciosa de que precisava de espaço e um tempo sozinha. Ela assentiu, eu pude ver a dor em seus olhos, Rebeca e eu éramos como irmãs, antes que ela se virasse, vi que seus olhos estavam marejados. Fiquei ali mais alguns minutos, tentando absorver o que tinha acontecido. Mas nada fazia sentido. Chorei compulsivamente, senti meu coração se quebrar em milhares de pedaços. Abri a porta lentamente, meu olhar cruzou a igreja vazia, com os convidados já se retirando. Fechei novamente a porta e fui à um banheiro que havia ali perto. Senti o peso do vestido que eu mesma desenhara. Um sonho costurado à mão. Um sonho que já não valia nada. Rasguei a saia na altura do joelho, o caimento do cetim deixou minhas pernas à mostra até acima do joelho, era um modelo perfeito, digno de uma princesa, acentuava a minha cintura e valorizava meus seios com o seu corte tomara que caia. Meus cabelos castanhos estavam presos em um perfeito coque, com alguns fios soltos de forma despojada. Eu usava um scarpin branco, que tinha uma altura confortável. Minha maquiagem, embora fosse à prova d'água, estava por um fio, antes de sair decidi removê-la completamente. Nunca fui fã de maquiagem, uso apenas camadas leves. Quando saí já não havia mais ninguém além de Rebeca na igreja, meus avós estavam do lado de fora me esperando. — Isa, por favor, deixe-me levar vocês para casa. Dona Dolores e o Seu Almerindo estão preocupados... — Rebeca, por favor, leva eles — pedi. — Diz que foi um mal-entendido. Que eu estou bem. E que você vai me encontrar no ateliê depois. — Tá bom, amiga, pode deixar – disse ela enquanto me abraçava calorosamente. – Temos muito o que conversar. Por favor, fique segura. Pegue um táxi, eu te encontro lá assim que deixa-los em casa, tudo bem? — Tudo bem, obrigada. — Eu te amo! Vamos passar por isso juntas, como sempre fazemos, ok? Olha para mim! – Ela levantou levemente meu queixo. – Levanta essa cabeça, você é a mulher mais forte que eu conheço. — Eu também te amo, Rebeca! Você é a irmã que a vida me deu, obrigada por tudo. – Segurei o choro com as forças que me haviam sobrado. Rebeca era, junto com meus avós, meu porto-seguro, eu não conseguia esconder meus sentimentos diante de seu olhar preocupado. A vi saindo da igreja e levando meus avós para o seu carro, que não estava longe. Saí sozinha. Caminhei alguns quarteirões até conseguir parar um táxi. O motorista me lançou um olhar estranho ao me ver naquele estado, mas não perguntou nada. — Me leve ao bar mais distante que você conhecer. Um onde ninguém irá me reconhecer. Ele apenas assentiu e seguiu viagem.Isabela AndradePor um segundo, achei que tinha ouvido errado.— O quê? — foi tudo o que consegui dizer, quase num sussurro.Ele manteve o olhar firme, direto. Não havia hesitação, nem suavidade. A proposta veio como uma sentença:— Quero que você se case comigo. Não por afeto. Não por amor. É apenas um acordo.Meu coração disparou, mas não de emoção — de choque. A expressão dele era fria, calculada, como quem fecha um contrato.— Eu... não entendo — murmurei. — Isso é algum tipo de brincadeira?— Não — respondeu com indiferença. — Preciso estar legalmente casado até meu aniversário. É uma exigência no testamento do meu avô para assumir o controle das empresas. Tenho um mês. Não quero ser forçado a me unir com alguém escolhido por interesses familiares. Prefiro resolver isso com alguém que respeite o acordo, sem ilusões.Soltei uma risada nervosa, mais por incredulidade do que qualquer outra coisa.— E por que eu? Por que não escolheu alguém do seu mundo?— É justamente por você não p
Matheo MontclairLouis me ligou pouco antes do meio-dia.— Almoço? — foi tudo o que ele disse.Não respondi de imediato. Ainda tinha a imagem dela na cabeça — Isabela. Ela não saiu da minha mente desde então. E eu detesto perder o controle.Mesmo assim, aceitei o convite. Fingir que era só mais um dia comum parecia melhor do que admitir que algo havia tirado meu sossego.O restaurante era um dos nossos antigos favoritos. Mais discreto, elegante, longe das mesas lotadas de empresários tentando parecer importantes. Louis já estava à mesa quando cheguei. Sempre com aquele ar de quem acha graça de tudo — inclusive de mim.— Pela sua cara, você não dormiu. Estava trabalhando ou teve pesadelos? — disse, erguendo o copo d’água.— Você fala demais — rebati, sentando. — E não, não foi um pesadelo. Mas quase.Ele me observou por cima do cardápio.— Então, fala logo. O que houve? Suspirei, apoiando os cotovelos sobre a mesa.— Conheci uma mulher ontem à noite. Isabela. Ela entrou no bar vesti
Isabela AndradeNossos olhos se cruzaram e, por um instante, o tempo pareceu hesitar.Ele estava lá, do outro lado do salão, com a mesma presença serena e indecifrável da noite anterior. Sentado em sua cadeira de rodas, com os ombros eretos e o olhar firme, observava-me com um misto de surpresa contida e... familiaridade.Era como se nos reconhecêssemos, como se nenhuma parte daquela noite tivesse sido esquecida — nem por mim, nem por ele.Mas, antes que eu pudesse reagir, o garçom se aproximou da minha mesa e quebrou o momento como vidro estilhaçado.— Madame? Está tudo certo com a salada? — perguntou, com gentileza. — Notei que a senhorita ainda não comeu, quer que eu traga outra do seu agrado?Olhei para o prato como quem acorda de um devaneio. Folhas intactas, vestígios de molho espalhados de um lado para o outro. Eu nem havia percebido.— Está sim, obrigada — murmurei, recolhendo o garfo. — Pode trazer a conta, por gentileza. Já estou de saída.O garçom trouxe a conta e, logo em
Isabela AndradeAcordei com uma dor de cabeça latejante. Era como se martelos ritmados batessem nas têmporas, me lembrando a cada segundo da noite anterior. Meu corpo pesava e um vazio cruel ocupava o espaço que antes era cheio de sonhos.Olhei ao redor, reconhecendo vagamente o quarto do andar de cima do ateliê. Meus quadros, minhas coisas. Pelo menos, eu estava em casa. Mas não me lembrava como havia chegado ali.Logo ouvi a porta se abrindo devagar.— Bom dia... — Rebeca entrou com uma bandeja nas mãos. O cheiro de pão fresco e café me atingiu como um abraço distante. — Trouxe seu café da manhã da padaria. É aquele que você ama: croissant de amêndoas, suco de laranja natural, e geleia de framboesa. Ah, e um comprimido. Para dor de cabeça.— Não estou com fome, Rebeca... — murmurei, virando o rosto para o lado.Ela colocou a bandeja na mesinha ao lado da cama e sentou-se, cruzando os braços.— Eu sei. Mas você precisa comer alguma coisa, nem que seja um pedaço. Se não for por você,
Matheo MontclairPude sentir a agonia em sua voz.— Um estranho. Mas não um perigo. Eu a encontrei em um bar, sozinha, e evitei que dois imbecis a incomodassem. Ia levá-la para um hotel, mas agora, vou levá-la até você. Me passe o endereço de onde quer que eu a deixe.— Meu Deus... — ela respirou fundo, aflita. — Me chamo Rebeca. Sou a melhor amiga da Isabela, a moça que está com você. Estou no ateliê dela. Vou enviar a localização. Por favor, cuide da minha amiga.— Não se preocupe, não sou nenhum maníaco. Sua amiga está bem e chegará até aí da mesma forma. Me espere. — Desliguei.Oscar já estava do lado de fora, como sempre. Um homem de fala serena e modos impecáveis. Era mais do que um motorista — era parte da minha família. Foi ele quem me viu crescer, quem esteve ao meu lado quando tudo desmoronou... e quando, em segredo, tudo começou a se reconstruir.— Garoto... — ele disse, abrindo a porta traseira tentando entender o que eu fazia com aquela moça nos braços. — Posso ajudá-lo?
Matheo MontclairMeu pai nunca foi um homem de meias palavras. Era rígido, severo, exigente — e, ainda assim, sempre houve algo nos olhos dele que ia além do controle. Preocupação. Ele não dizia, mas carregava. Talvez fosse seu jeito torto de amar.— Um mês — ele disse, apoiado na bengala com que raramente aparecia em público. — Você tem um mês para encontrar uma noiva decente, ou eu encontrarei por você. E desta vez, Matheo… não vou aceitar mais desculpas.Engoli a raiva em silêncio. A mesma raiva de sempre. Mas não respondi.Era um jogo que eu conhecia bem. O peso do nome Montclair era uma armadura e uma prisão. E ele não hesitaria em usá-lo contra mim — mesmo que, no fundo, só quisesse me proteger.A raiva veio, como sempre vinha, mas não deixei transparecer. Meu pai sempre acreditou que tudo era questão de aparência. Alianças, sobrenomes, negócios. Tudo misturado. Lucia foi a única mulher por quem eu realmente senti algo. A mulher com quem eu planejava me casar. Ela ria com os ol
Último capítulo