Após flagrar o noivo com sua melhor amiga dias antes do casamento, Isabela vê sua vida desmoronar de forma cruel e repentina. Com o coração partido e a dignidade em ruínas, ela decide deixar tudo para trás e recomeçar em uma cidade pequena, onde o passado não tem voz e ninguém conhece suas cicatrizes. Entre flores delicadas e silêncios confortáveis, ela encontra Rafael — um ex-militar viúvo, marcado por perdas profundas e protegido por muros altos demais para o amor. Reservado, ele vive apenas para cuidar da filha e manter o controle, evitando qualquer sentimento que ameace sua armadura emocional. Mas o destino não precisa de permissão. E quando os caminhos de Isabela e Rafael se cruzam, o improvável acontece: nasce uma conexão sutil, perigosa e teimosamente verdadeira. Agora, ela precisa reaprender a confiar. Ele, a se permitir sentir. Porque algumas batalhas não se vencem com armas, e sim com coragem para amar.
Leer másISABELA
Trabalhar como recepcionista em um hotel por cinco anos poderia ser monótono para muitos, mas para mim, Isabela, era um privilégio. Aquele lugar tinha uma alma vibrante: a decoração aconchegante, o aroma suave de lavanda que permeava os corredores e os sorrisos genuínos dos hóspedes. Sentia-me em casa, imersa em um universo de histórias que alimentavam meus sonhos e me davam um profundo senso de pertencimento.
Naquela tarde, o coração batia acelerado, em sincronia com os planos que fervilhavam em minha mente. Ao fim do turno, dirigi-me ao banheiro com passos leves. Diante do espelho, retoquei o batom com um cuidado quase cerimonial. Meus cabelos castanhos caíam em ondas soltas, refletindo a luz amarelada, enquanto meus olhos, antes comuns, agora brilhavam com uma vivacidade inédita. Eu sabia o motivo: a surpresa que aguardava Carlos, meu noivo e futuro companheiro de vida.
Na bolsa, cuidadosamente protegida, repousava uma garrafa do melhor vinho do hotel, o preferido dele. Ao lado, uma revista de casamento, adornada com post-its coloridos que marcavam ideias para nossa celebração: arranjos simples, convites minimalistas e opções de cardápio que aqueciam o coração. Faltava apenas um mês para o grande dia, e meu maior desejo era passar aquela noite mergulhada em risadas, sonhos e amor, ajustando cada detalhe com ele. Carlos não desconfiava de nada. A surpresa seria perfeita.
Dirigi com uma leveza na alma, a cabeça repleta de planos e o rádio tocando suavemente, embalando minhas canções distraídas. Dez minutos depois, estacionei em frente ao prédio. O frio na barriga, o mesmo dos nossos primeiros encontros, ainda me acompanhava.
Subi os degraus lentamente, equilibrando a garrafa em uma mão e a revista na outra. À medida que me aproximava, vozes abafadas e risadas vindas de dentro começaram a se misturar a gemidos baixos, mas intensos. Meu coração estacou. "Não", tentei me convencer, "deve ser a televisão."
A mão suava ao girar a maçaneta. O peito apertou-se em um presságio inquietante. Forcei-me a acreditar na inocência da situação, mas a intuição, essa maldita intuição, já gritava um aviso sombrio. Empurrei a porta devagar, o coração quase saltando pela boca.
E então, eu vi.
Carlos estava no sofá, sem camisa, a cabeça jogada para trás, os olhos semicerrados. Sobre ele, Gisele, minha melhor amiga, com o vestido enfiado até a cintura, movia-se em um ritmo desesperado, como se o mundo fosse terminar ali.
Fiquei congelada.
O vinho escorregou dos meus dedos. A garrafa atingiu o chão, estilhaçando-se e liberando um cheiro doce e ácido de uva envelhecida. O som ecoou pela sala, cortando o silêncio como uma lâmina.
Carlos virou o rosto em um sobressalto. Gisele também. O cabelo desgrenhado, o rosto avermelhado, a expressão dividida entre choque e vergonha. O silêncio que se seguiu foi mais doloroso do que qualquer palavra.
— Isabela… — Carlos tentou, levantando-se abruptamente. — Isso… não é o que parece.
Uma risada vazia escapou dos meus lábios, uma risada que não pertencia à Isabela de segundos atrás.
— Sério? Porque parece exatamente o que é — minha voz soou fria. — Você. Com a minha melhor amiga. No sofá onde a gente escolheu juntos as cores do nosso casamento.
Gisele ajeitou o vestido apressadamente, puxando a alça caída do ombro. O rosto dela estava pálido, as mãos tremiam.
— Isa, por favor… me escuta. Isso não foi… a gente não planejou. Foi um erro. Um momento de fraqueza.
— Fraqueza? — balancei a cabeça devagar. — Não. Isso aqui é covardia. É traição. Eu estava escolhendo centros de mesa, Gisele. Enquanto você escolhia trair a minha confiança.
Carlos se aproximou, os olhos brilhando com culpa, talvez desespero.
— Eu errei. Eu fui um idiota. Mas eu te amo, Isa. Foi só uma vez. Eu estava… confuso.
— Confuso com ela montada em você? É isso?
Gisele soluçou, uma lágrima escorrendo pela bochecha.
— A gente estava meio bêbado… foi um momento horrível, não sei no que a gente tava pensando…
— Eu trouxe vinho — interrompi. — O seu preferido. Ia ser uma noite especial. Mas vocês já estavam ocupados comemorando, não é?
Carlos passou a mão no rosto, exausto. Sua expressão implorava por uma compreensão que eu não tinha mais.
— Podemos conversar. Resolver. Você não pode jogar tudo fora assim.
— Eu não joguei nada fora, Carlos — sussurrei. — Quem fez isso foi você. Você jogou fora cada promessa, cada plano. Você destruiu o que eu mais amava.
Minha voz falhou por um instante, mas nenhuma lágrima caiu. Eu não lhes daria esse gosto.
— Vocês se merecem — adicionei. — E espero, do fundo do coração, que toda vez que se olharem, lembrem do que perderam para ter esse momento nojento.
Virei as costas. Eles não mereciam ver minha dor.
A PerdaRAFAELEm frente à cama de hospital de Isa, o zumbido constante dos aparelhos parecia amplificar o vazio dentro de mim. Me perdi em meus pensamentos, enquanto a enfermeira aplicava o calmante. Cada movimento dela era lento, quase em câmera lenta, um contraste doloroso com a urgência que me consumia. O rosto de Isa, antes tão vívido e cheio de vida, agora pálido e distante, trazia uma dor que eu mal podia suportar. Não era apenas a dor do seu ferimento, mas a dor da perda, da amnésia que a roubou de mim.Não esperei. Não consegui. Saí do quarto, cada passo soando o vazio que sentia, o eco metálico dos meus sapatos no piso frio do corredor me lembrando da minha impotência. Meus punhos estavam cerrados, as unhas cravando na palma das minhas mãos, uma dor física que tentava abafar a dor da alma.Lembrei-me, com uma clareza brutal, do acidente que Isa sofreu. Aquela noite chuvosa, a perseguição insana. O medo que me paralisou, a sensação de que o tempo havia parado. Rita morreu na
DUAS SEMANAS DEPOIS...O Vazio da Memória e a Dor do DesconhecidoISABELA Meus olhos se abrem, mas o mundo é um borrão sem forma, cores e luzes indistintas que se misturam em um turbilhão confuso. Não consigo distinguir onde estou. O branco ofuscante do teto, as paredes sem cor, o cheiro de antisséptico invadindo minhas narinas. O único som constante que meus ouvidos registram é um bip rítmico e incessante, vindo de algum lugar à minha direita, como um coração mecânico batendo ao meu lado. Um rosto de um homem com cabelos castanhos entra em meu campo de visão, suas feições estão congeladas pela preocupação. Seus olhos são de um tom lindo, quase desesperados, e há olheiras profundas sob eles, como se não dormisse há dias. — Deus, já era hora de você acordar, já se passaram duas semanas — ele diz, a voz embargada de alívio e cansaço, mas com uma intensidade que me incomoda. Duas semanas. Minha mente tenta processar a informação, mas as palavras parecem flutuar sem sentido, sem âncor
O Impacto Brutal na Escuridão da ChuvaISABELA Rita dirigia há o que pareceram séculos, a escuridão da noite lá fora apenas quebrada pelos faróis que rasgavam a chuva. O som da música eletrônica no volume máximo vibrava em meus ouvidos, martelando minha cabeça já dolorida e entorpecida. Meu corpo, pesado e entorpecido pelo calmante, estava grudado no banco de couro do carro de Rafael, mas minha mente, apesar de turva, lutava com unhas e dentes para se manter consciente. A cada curva cega, a cada solavanco violento na estrada molhada, eu temia o desconhecido, o destino sádico que Rita havia planejado para mim. Ela não falava para onde ia me levar, apenas dirigia com uma fúria contida, seus olhos fixos na estrada como se quisesse queimá-la com o olhar. De repente, um lampejo de luz azul e vermelha rasgou a escuridão ao nosso lado. Um carro surgiu, e pela janela embaçada pela chuva, percebi as formas inconfundíveis de uma viatura de polícia. Um fio de esperança, tão tênue quanto um fi
Ela me conduziu, ou melhor, me arrastou de uma forma rude até o carro de Rafael. Meus pés mal se arrastavam pelo chão, meus joelhos cediam a cada passo. A porta do veículo se abriu com um estalo, e ela me empurrou para dentro. A chuva, que antes parecia fraca, agora batia em mim com força, encharcando minhas roupas, o vento gelado me cortando a pele. Eu mal conseguia ver algo ao meu redor, a visão embaçada, o mundo girando. O máximo que consegui fazer foi emitir sons de choramingos, um lamento fraco que escapava da minha garganta.Rita, parecendo incomodada com meus gemidos, ligou o som do carro em um volume alto, preenchendo o pequeno espaço com uma música eletrônica vibrante que parecia chocar com a cena de horror. Ela começou a dirigir, a voz dela se misturando à batida, como se desabafasse.— Sabe. Eu sempre fui apaixonada por Rafael — ela começou, a voz revelando uma obsessão doentia que eu nunca havia percebido. — Então, quando descobri que ele era casado com Jeniffer, eu sabia
A Última Súplica ISABELA Rita me puxou com uma força surpreendente para fora do quarto úmido, minhas mãos ainda presas dolorosamente às costas. A corda áspera arranhava meus pulsos a cada movimento. Fui arrastada pelo corredor escuro, meu corpo se chocando contra as paredes, até a sala, onde a pouca luz que entrava pelas janelas revelava o exterior. Olhei na direção da janela, e meu coração afundou: estava chovendo muito forte, a água escorrendo pelos vidros em torrentes, o som da tempestade abafando o meu próprio medo. Meus pensamentos voaram para Rafael e Emma, imaginando o quanto estariam preocupados comigo, o quanto meu desaparecimento, ainda sem explicação, os estaria afligindo. Uma pontada de culpa me atingiu por ter aceito aquela entrega, por não ter ouvido minha intuição. Pensei na minha tia Benedita, ela estaria bem? Estaria segura, sem saber o que estava acontecendo com sua sobrinha?Rita me jogou sem cerimônia no sofá velho e cheirando a mofo, que rangeu sob meu peso. O i
Quando cheguei à casa de Rita, a porta estava entreaberta, um convite sinistro que me gelou a alma. Uma luz fraca e sombria piscava no fim do corredor, como um farol macabro chamando-me para o desconhecido. Eu sabia que estava errado ao entrar sem pedir, invadindo a privacidade de alguém, mas a ansiedade por Isabela era maior do que qualquer regra, qualquer bom senso. Eu precisava ter certeza de que Rita não tinha nada a ver com o atraso de Isa, com o sumiço dela. Meu desespero me empurrava para frente.Abri uma porta que deveria ser do quarto de Rita e dei um passo para trás, o ar me faltando nos pulmões. Meus olhos se arregalaram em choque, e um arrepio percorreu minha espinha. A luz estava acesa, revelando um cenário que me fez gelar até os ossos, um pesadelo se materializando diante de mim. Uma parede inteira estava coberta por um painel de fotos, como um altar profano erguido à obsessão. Havia inúmeras fotos minhas, de Jeniffer, de Emma… e, para o meu horror, algumas de Isabela,
Último capítulo