Helena sempre fez tudo certo. Era a filha obediente, a noiva dedicada, a mulher que aceitava ser deixada de lado em nome da "filha adotiva perfeita". Mas tudo desmorona no dia em que ela flagra seu noivo — o homem com quem sonhava se casar — nos braços da irmã que ela sempre protegeu. Traída por quem mais amava e humilhada pela própria família, Helena decide que não vai chorar. Vai reagir. E sua vingança começa com uma proposta ousada: se casar com o homem mais poderoso que conhece... seu chefe. Ele é frio, milionário e tem seus próprios segredos. Ela, uma mulher destruída em reconstrução. O que começa como um acordo por conveniência logo se transforma em algo muito mais perigoso: sentimentos reais, planos inesperados e uma guerra silenciosa contra o passado. Porque agora, Helena não quer apenas justiça. Ela quer fazer todos pagarem. Um por um.
Ler maisHelena nunca gostou de surpresas, mas naquela tarde decidiu fazer uma.
Saiu do trabalho mais cedo, comprou os doces favoritos de Gabriel e pegou um táxi direto para o apartamento dele. Queria reacender o que estava se apagando há semanas. Ele andava distante, frio, com desculpas prontas demais para alguém que prometeu passar a vida ao lado dela.
"Talvez seja o estresse", repetia para si mesma como um mantra. Ela acreditava — porque amar, para Helena, sempre significava dar o benefício da dúvida.
Girou a chave na fechadura devagar, sorrindo ao imaginar o rosto dele ao vê-la ali, de surpresa. Mas a cena que encontrou congelou o sangue em suas veias.
Gemidos. Rápidos, abafados, intensos.
Nus.
— AH, MEU DEUS! — o grito escapou da garganta de Helena antes que pudesse se conter.
Gabriel empurrou Isadora, tentando cobrir a nudez com uma almofada ridiculamente pequena. Isadora, por outro lado, apenas puxou o lençol do sofá e cobriu os seios, olhando para Helena com os olhos semicerrados. Sem culpa. Sem vergonha.
— Você tá louca? Invadindo a casa dos outros desse jeito? — Isadora resmungou, como se tivesse sido a ofendida.
Helena sentiu o mundo girar. As mãos tremiam, o estômago se revirava. Ela olhava para os dois, mas nada fazia sentido.
— É isso? É isso que vocês faziam quando ele dizia que tinha reunião? Quando você sumia no meio da noite? Vocês dois... ME TRAINDO?! — sua voz saiu entrecortada, rasgada pela dor.
— Helena... — Gabriel tentou se aproximar, mas ela recuou, como se ele fosse uma doença.
— NÃO ENCOSTA EM MIM! — ela gritou, o rosto encharcado de lágrimas. — Três anos, Gabriel. Três malditos anos! E você me troca pela minha irmã? MINHA IRMÃ?!
— Ela nunca foi sua irmã de verdade — ele disse baixo, como se aquilo explicasse tudo.
Helena ficou em silêncio por alguns segundos. O tempo pareceu parar.
Então ela riu. Uma risada amarga, de cortar a alma.
— Então é assim que termina? Vocês fodendo no sofá e jogando a culpa em mim? Vocês são dois monstros.
— Helena... — Isadora suspirou, sem olhar nos olhos dela. — A gente se ama. Sempre se amou. Você só estava no caminho.
Helena sentiu o coração se despedaçar em mil pedaços. Pegou a bolsa do chão com mãos trêmulas, olhou mais uma vez para aquela cena — a traição escancarada, o desprezo nos olhos dos dois — e saiu sem dizer mais nada.
Mas dentro dela, algo nascia.
Era sede de vingança.
Helena não lembrava como chegou em casa. Apenas entrou, esbaforida, como se fugisse de um incêndio. O rosto ainda ardia, os olhos marejados, o peito em chamas.
Encontrou os pais na sala de estar. A mãe tricotava, como se o mundo estivesse em paz. O pai lia o jornal com uma xícara de café ao lado. Um retrato de falsa harmonia.
— Você sabia? — a voz de Helena cortou o ambiente feito faca.
A mãe ergueu os olhos devagar. O pai dobrou o jornal com calma.
— Sabia do quê, Helena? — a mãe perguntou, com aquela voz controlada que ela usava quando queria fingir civilidade.
— Do Gabriel. Da Isadora. Dos dois transando como se nada mais importasse! Vocês sabiam?!
O pai suspirou e se levantou.
— Helena, sente-se. Vamos conversar com calma...
— NÃO TEM CALMA! — ela gritou, os olhos faiscando. — EU ENTREI NA CASA DO MEU NOIVO E ENCONTREI OS DOIS! PELADOS! NA MINHA FRENTE! E VOCÊS... vocês sabiam?
Silêncio.
A mãe abaixou o tricô, devagar, com um suspiro cansado.
— Foi melhor assim, filha. Vocês estavam fadados a não dar certo. Gabriel e Isadora... eles têm algo que você e ele nunca tiveram.
Helena sentiu o chão sumir sob seus pés. Cada palavra da mãe era um tapa no rosto.
— Eu sou filha de vocês. Ela é adotada! Eu estive com ele por três anos! Como podem dizer que foi melhor assim?
A mãe olhou para ela como quem analisa um problema — não como quem olha para uma filha ferida.
— Você sempre foi difícil, Helena. Rígida. Fria. Sempre exigiu demais. Talvez esse choque te faça repensar quem você é.
A dor foi substituída por incredulidade. O pai não disse nada. Nem sequer a defendeu.
— Vocês preferem ela, não é? Sempre preferiram. Mesmo ela não sendo sangue de vocês.
— Não é uma questão de sangue, Helena — o pai disse, finalmente. — Isadora nos deu menos problemas. É mais doce. Mais... sociável.
Helena riu. Uma risada rouca, machucada, cheia de desprezo.
— Ela é uma cobra disfarçada de flor. E vocês vão descobrir isso tarde demais.
Ela olhou para os dois como se estivesse diante de estranhos.
— Eu enterrei qualquer ilusão hoje. Vocês não são minha família. E eu não vou mais implorar pelo amor de ninguém.
Virou as costas sem ouvir mais nada. Subiu as escadas com passos firmes, trêmula, mas decidida.
Naquele momento, Helena não era mais a mulher que aceitava migalhas.
Ela seria a mulher que faria todos se arrependerem de tê-la ignorado.
Isadora acordou antes do sol nascer, tomada por uma inquietação que não lhe dava trégua. A carta do advogado ainda estava sobre a mesa da pensão, dobrada e já com marcas de manuseio. A cada vez que seus olhos pousavam naquele papel, sentia a mesma dualidade: o peso de uma escolha e, ao mesmo tempo, a leveza de uma chance. Durante dias havia evitado dar uma resposta definitiva, mas agora a hesitação já não fazia sentido.Rafael chegou cedo, como sempre, trazendo dois cafés embrulhados em copos de papel. Não precisaram de muitas palavras; ele sabia que aquela manhã seria diferente. Enquanto caminhavam até a estação, a cidade ainda adormecida parecia não se importar com a pressa deles. As ruas estavam silenciosas, apenas o som de alguns galos distantes e o barulho ritmado dos passos. Isadora carregava consigo apenas uma pequena mala, mas dentro dela estava a ideia de um novo começo.A viagem até o sítio foi mais tranquila do que da primeira vez. O trem corria pelos trilhos com a cadência
Os dias que se seguiram à visita ao sítio foram marcados por um silêncio fértil. Não havia mais assembleias, discursos, ou reuniões. O telefone ainda tocava com convites, mas Isadora deixava-os se acumularem, como se a vida agora tivesse outro tipo de urgência. A carta do advogado e a chave da casa herdada permaneciam sobre a mesa da pensão, lembrando-a a cada manhã de que havia um território esperando por sua decisão.Na primeira noite após o retorno, ela e Rafael sentaram-se no banco da praça em frente à pensão, sob a luz amarelada dos postes. Ele, como sempre, não se apressava em sugerir caminhos. Apenas lhe perguntava com calma:— Você quer transformar aquilo em um novo começo, ou apenas visitar de vez em quando?Isadora ficou em silêncio longo antes de responder:— Não sei ainda. Mas senti que ali, naquele lugar, eu poderia finalmente existir sem a sombra de ninguém.A lembrança do cachorro correndo pelo quintal, do cheiro de bolo de fubá e do vento atravessando as folhas da mang
A cidade amanheceu com um vento morno que mexia nas cortinas da pensão e empurrava o dia para fora das janelas. Isadora levantou sem pressa, sentindo um vazio bom, desses que não pedem explicações. O bairro respirava em ritmo normal, e o nome dela já não pesava sobre as esquinas. Era estranho e leve ao mesmo tempo. Na cozinha comum, o porteiro deixara uma marmita com bilhete curto — “voltei a assar pão, lembra?” — e isso bastou para que ela sorrisse. O mundo voltava a caber no gesto mínimo.Rafael apareceu na calçada com duas passagens de trem e um plano simples: sair da cidade por algumas horas, atravessar o rio, comer sem relógio, olhar coisas que não pedem opinião. “Só nós, sem pauta”, disse, estendendo a mão. Isadora hesitou por um segundo — a hesitação antiga de quem se acostumou a pedir permissão ao medo — e então assentiu. Guardou o celular na bolsa e prometeu a si mesma deixá-lo em silêncio até a noite.A estação parecia um lugar emprestado de outro tempo. Bancos de madeira, l
O tempo passara rápido desde a noite do sarau. A repercussão ecoava ainda em rádios, jornais e redes sociais, mas Isadora sabia que aquele capítulo precisava ser encerrado. A Casa da Palavra tinha cumprido sua função: fora abrigo, resistência e celebração. Agora, ela não queria mais que sua vida fosse reduzida a esse espaço coletivo. A história precisava seguir por outros caminhos, e ela precisava reencontrar sua própria rota.Nos dias seguintes, as portas da livraria continuaram abertas, mas o protagonismo deixou de ser seu. O conselho formado pela comunidade assumiu a responsabilidade de gerir o lugar, organizando oficinas, encontros e eventos. Isadora participou das últimas reuniões necessárias, ajudou a delegar funções, mas fez questão de se afastar dos holofotes. Havia uma diferença entre inspirar e se aprisionar no papel de guardiã eterna; ela escolhera não se deixar aprisionar.Rafael percebeu sua decisão antes mesmo que ela o verbalizasse. Ele não a questionou, não tentou conv
A manhã seguinte à inauguração da Casa da Palavra trouxe não apenas resquícios de tinta ainda fresca nas paredes, mas também uma sensação palpável de expectativa. A cidade havia testemunhado um nascimento e, como todo recém-nascido, a Casa precisava ser cuidada, alimentada, protegida. A notícia do sarau inaugural espalhara-se rápido: rádios locais falavam do evento, jornais regionais estampavam fotografias das crianças lendo poemas e da rampa decorada com flores improvisadas.Mas junto com a visibilidade, vieram também os primeiros sinais de pressão. Na mesa da livraria, acumulavam-se convites: escolas pedindo oficinas, sindicatos pedindo palestras, jornais pedindo entrevistas. Havia quem enxergasse a Casa como espaço cultural, quem a quisesse como tribuna política, quem a sonhasse como centro de protestos. Cada convite parecia estender os braços para Isadora, mas também arrancar dela pedaços.Na primeira reunião do conselho rotativo, sentados em roda em torno de uma mesa marcada por
O sábado começou cedo, com passos apressados ecoando pela calçada diante da livraria. Não havia solenidade oficial, nem fitas de inauguração, mas havia expectativa no ar. O mutirão da Casa da Palavra se tornara ponto de encontro: vizinhos traziam baldes, pincéis, ferramentas improvisadas. Crianças carregavam latas de tinta como se fossem tesouros; jovens se revezavam entre escadas e rodos. O cheiro de tinta fresca misturava-se ao de café passado no balcão, enquanto as janelas eram abertas para receber o sol e a poeira acumulada era varrida sem pressa.Isadora observava tudo com um misto de espanto e gratidão. A cada pincelada nas paredes, sentia como se a dor do passado fosse sendo coberta, não para ser apagada, mas para se transformar em base de algo novo. A livraria já fora abrigo e resistência; agora, sob as mãos de tantos, tornava-se casa coletiva. Rafael, com o rosto manchado de tinta branca, organizava os turnos do trabalho. O padeiro trouxe pães quentes para reforço da manhã. A
Último capítulo