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Bebidas Amargas, Verdades Mais Ainda

O bar estava cheio, mas Helena não ouvia nada além da própria respiração. As luzes eram quentes, a música tocava baixinho no fundo, e a taça de vinho em sua mão estava quase intocada.

— Ok, agora me conta tudo de uma vez, ou eu vou enlouquecer — disse Júlia, sua melhor amiga desde a faculdade, jogando o cabelo para trás e encarando-a com preocupação.

Helena hesitou. Respirou fundo. Seus olhos estavam vermelhos, o rosto ainda inchado de tanto chorar.

— Eu peguei o Gabriel... transando com a Isadora. Na sala dele. Como se fosse normal. Como se eu fosse... ninguém.

Júlia arregalou os olhos. A taça de espumante dela parou no ar.

— COMO É QUE É?! — ela quase gritou, fazendo o garçom dar um passo para trás. — Aquela sonsa?! E o Gabriel?! Mas vocês iam se casar em dois meses!

— Pois é. Agora ela vai casar com ele, provavelmente. — Helena soltou um riso amargo. — E meus pais... sabiam.

— Eles o quê?

— Sabiam. Sabiam da traição e não me disseram nada. Pior: defenderam os dois. Disseram que ela era “mais doce”, “menos complicada”. Que era melhor assim.

Júlia levou as mãos à cabeça.

— Helena, isso é doentio. É nojento! Eu sempre disse que essa sua irmã tinha um olhar de cobra. Mas seus pais?! Como eles podem...?

Helena balançou a cabeça, os olhos marejados.

— Eu era invisível, Júlia. E agora virei descartável.

— Não. — Júlia segurou sua mão com firmeza. — Agora você é perigosa. E eles vão aprender isso da pior forma.

Helena a encarou.

— Eu pensei que fosse quebrar. Que fosse implodir. Mas sabe o que é pior? Eu tô... estranhamente calma. Porque tudo em mim morreu hoje. Inclusive o medo.

Júlia sorriu de lado, um sorriso que misturava carinho e admiração.

— E o que você vai fazer?

Helena bebeu o vinho de uma vez só. E quando ergueu os olhos, algo em seu olhar tinha mudado.

— Eu vou recomeçar. Mas antes... eles vão engolir cada escolha que fizeram. Vão engasgar com o que me fizeram passar.

— Isso é uma ameaça ou uma promessa?

— As duas.

Júlia a olhava com atenção, como se tentasse decifrar a mulher sentada à sua frente. Aquela não era a Helena de ontem. Era outra. Mais sombria. Mais determinada. E perigosamente calma.

— Então… — Júlia apoiou o queixo nas mãos. — O que exatamente você quer dizer com “vão engasgar com o que me fizeram”?

Helena girou a taça entre os dedos, o olhar perdido no líquido escuro. Depois, ergueu os olhos com um meio sorriso enigmático.

— Eu vou virar o jogo, Júlia. E pra isso, eu preciso de uma peça poderosa. Alguém que eles jamais esperariam que eu tivesse do meu lado.

— Tá… agora eu fiquei assustada. — Júlia riu, mas logo parou. — Espera. Você tá pensando no...?

— Sim. No Leonardo Alencar.

Júlia engasgou com o espumante.

— O seu chefe?! O CEO da empresa?! O mesmo que nunca sorri, que já fez três gerentes chorarem só com uma reunião?

— Esse mesmo.

— Você enlouqueceu — ela disse, sussurrando, inclinando-se sobre a mesa. — Aquele homem é um bloco de gelo com um terno caro! Ele nem olha nos olhos das pessoas, Helena!

— Mas ele olha nos meus. — Helena respondeu, séria. — Poucas vezes, sim. Mas olha. E quando olha… é como se ele me enxergasse inteira. Sem fingimentos, sem pena. Só… me vê.

Júlia piscou, tentando digerir aquilo.

— E o que você vai fazer? Jogar charme? Se oferecer pra ele?

— Vou ser o que ele mais respeita: estratégica. Ele é um homem de negócios. Se eu mostrar que tenho algo a oferecer... ele vai ouvir.

— Algo como?

— A oportunidade de calar a boca de meia sociedade hipócrita. De mostrar que eu não sou a mulher traída e jogada fora, mas a mulher que deu a volta por cima… ao lado de um homem mais poderoso que todos os outros juntos.

Júlia ficou em silêncio por alguns segundos. Depois ergueu a taça e murmurou:

— Ok… isso é insano. Mas é exatamente o tipo de insanidade que eles merecem. Então… à nova Helena?

Helena sorriu, fria, pela primeira vez naquela noite.

— À mulher que eles nunca viram chegando.

As taças se tocaram, e o som do vidro ecoou como um pacto.

No dia seguinte, Helena apareceria no escritório com um salto mais alto, um batom mais escuro… e um plano começando a tomar forma.

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