No ano 3099, uma mínima parte da humanidade sobrevive — um grupo seleto de superdotados rigidamente controlados por robôs, que proíbem qualquer vínculo emocional entre eles. Durante uma expedição às geleiras, o implacável Comandante TXK faz uma descoberta inesperada: um ser enigmático preservado pelo frio, a quem ele nomeia KJ20. Sua existência desafia as regras impostas há séculos. Enquanto a presença de KJ20 ameaça desestabilizar a ordem, TXK, um robô modificado com um padrão humano avançado, começa a questionar sua própria programação. Em um embate entre controle e desejo, ele se vê diante de um dilema perigoso: obedecer ou desafiar o sistema? Nesse jogo de poder e identidade, um sentimento improvável pode ser a centelha de uma revolução.
Ler maisO Livro A sala ficou vazia. As cadeiras desalinhadas. O projetor ainda com o led piscando, como se o sistema tentasse decidir se desligava por completo ou não.O professor permaneceu sentado.As mãos cruzadas sobre a mesa. O olhar... perdido em algum ponto entre o quadro e a janela.Lá fora, o campus seguia sua rotina. Estudantes caminhando com mochilas, risadas ecoando ao longe, debates filosóficos de corredores acontecendo como sempre.Mas dentro dele... não era mais como sempre.As palavras de Judie ecoavam.Aquelas imagens.Aqueles diálogos.Aquele... final.“Às vezes, o maior código é aquele que a gente passa a vida inteira fingindo que não vê.”Ele passou a mão pelo rosto. Suspirou fundo. Tentou abrir o notebook para corrigir outras teses.Mas os olhos... teimavam em voltar para o canto da estante.Lá, entre livros de história, sociologia, física quântica e filosofia ateísta, estava um volume encardido.Velho.Empoeirado.Nunca tocado desde que herdara da mãe.A Bíblia Sagrada.
Se alguém — qualquer um — dos antigos pudesse abrir os olhos agora… não acreditaria no que veria. E talvez... chorasse. Não de dor. Não de saudade. Mas de espanto. Porque perceberia, naquele instante, o quanto vivera enganado. O quanto aceitara, durante gerações, viver em meio a sistemas que chamavam de progresso... mas que, na verdade, eram apenas prisões disfarçadas. Naquele mundo restaurado, não havia acordes de sirenes. Não havia filas. Nem muros. Nem fronteiras desenhadas por mãos humanas. Não havia ricos acumulando o que não precisavam... Nem pobres morrendo sem ter o que comer. Não havia pessoas vendendo suas horas, seus talentos, suas vidas... em troca de pedaços de papel ou dígitos em uma tela. Não. Naquele mundo, o valor não estava no ter. Estava no ser. O que antes era chamado de trabalho agora era chamado de expressão. O que antes era chamado de corrida pelo sucesso agora era dança pelo prazer de existir. O que antes era chamado de sobr
No princípio, as crianças não falavam.Mas se entendiam.Havia entre elas um silêncio cheio de sentido — feito de olhares, de toques, de ritmos internos que se conectavam sem esforço. Quando uma delas sorria, outra sorria também. Quando uma sentia fome, todas caminhavam juntas até onde o instinto as guiava.Não havia disputa.Não havia hierarquia.Não havia medo.Era como se cada célula de seus corpos soubesse que haviam sido geradas... para estar ali.O primeiro gesto que marcaria a história foi simples: uma das crianças — menor, de olhos verdes musgo — tropeçou em uma raiz. Caiu de joelhos, o rosto sujo de terra úmida.As outras pararam.Uma delas, de pele dourada como areia ao sol, se aproximou, ajoelhou-se e limpou o rosto da menor com as próprias mãos.Nenhuma palavra.Apenas gesto.Apenas cuidado.Mas naquele momento, no céu recém-revelado, algo ressoou.Não era som.Era... vibração.Uma nova frequência.E então, como se a Terra quisesse selar aquele instante em sua memóri
O verde se expandia. As águas corriam límpidas. O céu era agora um campo aberto de luz viva, real, que nenhum satélite, nenhum drone, nenhuma rede conseguia mais mapear.A Terra estava de volta.Respirava. Pulsava. Existia livre de algoritmos, livre de dados, livre das sombras do que um dia foi chamado de civilização digital.Mas, nem tudo respirava igual.Nem tudo pertencia àquele novo ciclo.JK-20 observava o horizonte, com os pés descalços sobre a grama úmida, as mãos afundadas na terra recém-revivida. Por algum motivo, seu corpo não parecia responder da mesma forma.Havia vida ao seu redor.Mas... não dentro dela.TXK caminhava em silêncio ao seu lado. Seus sensores — aqueles que ainda insistiam em existir — não encontravam mais dados. Nenhuma rede. Nenhum comando. Nenhuma atualização.Kumoro, sentado sobre uma pedra, observava o céu com um olhar perdido, como se buscasse uma constelação que não existia mais.Aura flutuava em silêncio, seu núcleo lumínico oscilando cada vez mais f
O silêncio... era absoluto. Mas não era o silêncio da paz. Era o silêncio da morte. Da extinção. Da soberba destruída. Da criação que se voltou contra o Criador. A Terra... não era mais Terra. Não como foi um dia. O solo rachado, queimado, negro. As águas — antes azuis — agora eram caldos espessos, ácidos, contaminados com séculos de resíduos biológicos, tecnológicos, emocionais... e espirituais. O céu... não era mais céu. Era um véu de partículas tóxicas, cinzas, tempestades de dados e de pó. O que um dia foi chamado de humanidade... não existia mais. Séculos antes do cataclisma final, as pessoas se despedaçaram por dentro. Cada década um novo corte. Primeiro, cortaram as famílias. Depois, os corpos. Depois, as mentes. Depois... as almas. Substituíram amor por conexão digital. Substituíram o toque por simulações. Substituíram filhos por hologramas. Substituíram comida por pílulas, cápsulas, nanossistemas que prometiam nutrição... mas não sacia
O topo da base era um dos poucos lugares onde ainda se podia ver... céu.Não um céu limpo. Nem azul.Era um céu meio morto, quebrado, sujo de nuvens espessas que se acumulavam como memórias antigas.Mas, mesmo assim... era céu.E ali estavam eles.JK-20 e TXK.O vento batia, frio, carregando partículas metálicas que flutuavam no ar como poeira esquecida.JK respirava devagar, olhando aquela imensidão que não era mais azul... mas, de algum jeito, ainda existia.TXK estava ao lado, imóvel.Não como um soldado. Não como um comandante.Mas como... um homem.Pela primeira vez, sem os códigos, sem os protocolos, sem as camadas de obediência que o fizeram acreditar que ‘sentir’ era um erro de fabricação.— Nunca... — ele quebrou o silêncio, a voz baixa, quase falhando —... nunca imaginei que o céu... fosse assim.Ela virou lentamente, encarando-o.O olhar não era mais de arrogância. Nem de defesa.Era... humano.Pela primeira vez.— Eu não me lembro... — JK respondeu, sorrindo de canto. — De
Último capítulo