Isadora cresceu acreditando que não era o bastante. Não bonita o suficiente. Não forte o suficiente. Não digna de amor. A vida a ensinou a se esconder — em roupas largas, sorrisos disfarçados e silêncios profundos. Sua rotina é solitária, feita de cafés mornos, livros revisados e janelas fechadas. Até o dia em que ela sente algo inexplicável: um olhar que atravessa sua barreira invisível. O novo vizinho da janela da frente. Caio. Gentil, calmo e com uma sensibilidade rara, Caio não é apenas um artista. Ele é também Cael, um anjo que quebrou uma regra celestial para descer à Terra e proteger uma alma que está prestes a desistir de si mesma. Mas Caio não veio para salvá-la. Ele veio para lembrá-la de algo que ela esqueceu: que sua existência já é um milagre. Que seu jeito de sentir demais não é fraqueza, mas força. E que ela não precisa ser perfeita para ser amada — só precisa se permitir ser quem é. Entre bilhetes na janela, silêncios partilhados e gestos delicados, nasce uma conexão que desafia o tempo, a dor e até as leis do céu. Só que Caio tem um prazo. E Isadora precisa aprender a se amar antes que ele vá. Mesmo Que Você Não Veja é um romance profundo, delicado e mágico sobre reconstrução, aceitação e o tipo de amor que começa quando você finalmente se enxerga. Mesmo que ainda duvide. Mesmo que ainda doa. Mesmo que você não veja.
Leer másDesde o vínculo, algo havia mudado.Isadora podia senti-lo — não apenas como uma lembrança, uma emoção ou um nome ecoando no fundo da mente. Cael pulsava dentro dela. Uma vibração sutil, constante, como uma eletricidade morna que corria sob sua pele. Às vezes era apenas um calor inesperado subindo pela espinha. Outras vezes, era um silêncio cheio de expectativa, como se o próprio ar soubesse que algo estava prestes a acontecer.E acontecia. Em sonhos. Em toques acidentais. Em olhares que demoravam mais do que o permitido.Ela sabia que ele sentia o mesmo. Porque o vínculo era vivo. E exigia ser alimentado.Naquela noite, o quarto era mais do que um espaço — era um campo energético. Ela estava sentada na ponta da cama, ele na poltrona perto da janela, como se a distância física pudesse conter a intensidade do que acontecia entre eles. Mas não podia. Havia algo queimando no silêncio. Um desejo latente. Uma força que os empurrava um para o outro, mesmo quando lutavam contra ela.Na sala
Desde o vínculo, algo havia mudado.Isadora podia sentir Cael dentro dela. Não apenas como uma lembrança ou uma emoção — mas como um pulsar. Uma vibração constante, quase imperceptível, que corria sob sua pele. Às vezes, era calor. Às vezes, era uma inquietação. Às vezes, era desejo.E ela sabia que ele sentia o mesmo.Naquela noite, o quarto parecia um campo energético. Nenhum dos dois ousava se aproximar do outro. Estavam ali, sentados em silêncio — separados por um espaço que parecia arder. O vínculo não era apenas simbólico. Era um selo vivo. E exigia contato.— Isso vai piorar antes de melhorar — disse Merah, na sala ao lado, enquanto observava grimórios antigos espalhados pela mesa.— Já está piorando — respondeu Cael, passando as mãos pelos cabelos, inquieto. — A ligação está fazendo com que os impulsos dela… escapem. E eu… sinto tudo.— Está abrindo seus canais antigos — Merah assentiu. — Você era o mais sensível de nós, Cael. O vínculo amplificou isso.— E ela?Merah olhou pa
O sol já tinha subido, mas a luz não entrava naquela casa. Um silêncio tenso pairava sobre todos, como se o tempo hesitasse em avançar. Isadora estava sentada no sofá, com o cobertor cinza sobre os ombros, as mãos trêmulas tentando manter alguma dignidade diante de três criaturas que pareciam ter saído de um outro universo.Cael andava de um lado para o outro. Os irmãos estavam imóveis. Como estátuas que julgavam.— Vocês não vão tocá-la — disse ele, com a voz baixa, mas firme.Thoren ergueu o olhar com lentidão.— Você sabe o que ela pode se tornar, Cael. Não por escolha. Mas por origem.— E sei o que ela ainda é — retrucou, virando-se para Isadora. — Ela não é Damaris. Não ainda. Talvez nunca. Se tiver escolha.Azariel falou pela primeira vez desde o confronto:— E você acha que vai conseguir protegê-la… de uma entidade que vive nela? Cael, nós já vimos isso antes. A escuridão adormece, se finge de humana. Espera. E então devora tudo ao redor.Isadora sussurrou:— Eu não quero machu
Isadora não conseguia respirar.A sala parecia menor, o ar mais denso. Cael estava parado à frente dela, os punhos cerrados, os olhos fixos em algo no ombro nu dela. Ele não falava. Nem se movia. Apenas olhava.Ela tentou tocar o próprio ombro, mas ele segurou sua mão com firmeza, quase com fúria.— Desde quando você tem isso?— O quê?— A marca, Isadora.Ela franziu a testa, confusa.— Que marca?Ele deu um passo para o lado, puxando-a com delicadeza forçada até o espelho da sala. Virou o corpo dela e mostrou. Um desenho antigo, circular, gravado na pele como uma cicatriz que nunca sarou. Parecia algo entre um sigilo e uma serpente alada envolvendo uma chama.— Isso apareceu agora? — ela perguntou, assustada.Cael recuou. Estava diferente. O calor em seus olhos tinha virado gelo.— Não. Isso não aparece. Isso é selado.— Eu não sei do que você está falando!Os irmãos dele ainda estavam ali, silenciosos, observando o colapso acontecer.— Você não entende — disse Thoren, com a voz pesa
O sol ainda não havia rompido totalmente o céu. A casa estava quieta, o quarto morno. O corpo de Isadora repousava sobre o de Cael, e ele a observava como se estivesse tentando memorizar o que não poderia mais esquecer.Ela dormia. Serena. Linda. Mortal.E ele… não sabia mais o que era.Desde o instante em que a tocou — em que permitiu que o desejo tomasse forma — algo dentro dele tinha se quebrado. Ou talvez nascido. Sentia o peito mais pesado, os sentidos mais vivos. O corpo, pela primeira vez, parecia real demais.Isadora se mexeu devagar, os olhos ainda fechados, e murmurou o nome dele com uma doçura que o atingiu no âmago.Mas antes que pudesse responder, Cael sentiu.O ar mudou. Ficou denso, elétrico. Uma vibração antiga correu pelas paredes, como se o mundo ao redor estremecesse com um segredo esquecido. Ele se sentou devagar, o olhar fixo na janela.— Não… — sussurrou.Isadora abriu os olhos, assustada.— O que foi?Cael se levantou num movimento só, o corpo nu envolto por uma
O toque de Cael foi um rompimento. Do céu, do corpo, do que ele era — ou fingia ser.Seus dedos pousaram na pele de Isadora como quem pede permissão e, ao mesmo tempo, como quem já pertence. Um toque que não era casto. Era contido, sim — mas apenas por um fio. E esse fio começava a arrebentar.Isadora sentiu o arrepio subir da base da nuca até os tornozelos. Cael parecia quente demais para um corpo só. A palma dele percorreu devagar a lateral do rosto dela, desceu pelo pescoço, com a mesma reverência de um homem que reza — mas ali, a oração era o corpo.Ela fechou os olhos.Quando abriu, ele já estava mais perto. Tão perto que ela sentia o coração dele, forte e acelerado, como o de quem está prestes a cometer algo que não se pode desfazer.— Eu não devia — ele sussurrou, e sua voz agora era grave, embriagada de vontade.— Então não pare — ela respondeu, com um fio de coragem que nem sabia que tinha.A boca de Cael roçou a dela com tanta lentidão que pareceu pecado. Mas não havia mais
A ponta do pincel escorregou lentamente pelo papel. Cael não olhava para o que pintava. Olhava para ela.Isadora estava sentada no sofá, envolta na própria hesitação. Havia uma inquietação no ar — algo mais denso que desejo, mais sutil que medo. Os olhos dele não eram apenas bonitos. Eram intensos demais para um humano comum. Como se guardassem séculos. Como se ele soubesse demais sobre tudo.Ela sentia que havia algo ali… que não fazia sentido.O modo como ele se movia, a delicadeza absurda com que tocava os objetos, a forma como sua presença preenchia o espaço como uma brisa quente que vinha de dentro dela. Era inexplicável.— Por que você me olha assim? — perguntou, num sussurro quase envergonhado.— Porque seu corpo tem música, e ninguém te ensinou a ouvi-la.Ela desviou o olhar, os dedos enroscando-se no próprio casaco. Aquilo não era um elogio qualquer. Era uma confissão. Um chamado. Como se ele a chamasse para habitar o próprio corpo com ternura — não por ele, mas por ela mesma
O apartamento de Cael era surpreendentemente silencioso, mas não por falta de vida — era como uma respiração contida, como o segundo antes do primeiro toque. A porta se fechou atrás de Isadora, suave, sem estardalhaço, como se até a madeira entendesse que aquele momento não podia ser interrompido.Ela deu alguns passos para dentro, os olhos vagando por tudo: os pincéis manchados de cor, as telas encostadas nas paredes, o cavalete no centro da sala. A luz era quente, dourada, como se o sol tivesse decidido morar ali. Mas havia algo mais. Um cheiro de tinta misturado com jasmim e alguma coisa que ela não conseguia nomear. Algo que a fazia sentir… presente.Cael não falou. Nem ela.Por um instante, eles apenas ficaram ali — ela, de pé no meio da sala, ele encostado na parede, observando. Mas não era uma observação invasiva. Era uma contemplação respeitosa. Como se ele estivesse esperando que ela respirasse aquele lugar e sentisse que podia ficar.Isadora passou os dedos levemente por uma
Os dias seguiram com o mesmo ritmo preguiçoso de domingo. Isadora se acostumou com o silêncio que agora preenchia sua casa, mas algo nela começava a se mexer, uma inquietação que ela não conseguia explicar. Algo havia mudado desde aquele olhar. O peso da conexão, invisível e ao mesmo tempo presente, não a deixava em paz.Ela acordou naquela manhã com uma sensação diferente. Como se estivesse à beira de algo, mas não soubesse o quê. Acordou sem pressa, com o café esfriando na xícara antes mesmo de ela tocá-lo. Seus pensamentos estavam mais dispersos, mais pesados. Algo dentro dela pedia para ser ouvido.Ao olhar pela janela, ela o viu novamente.Ele estava lá, no parapeito da janela, com as telas de pintura ao seu redor. O homem do prédio vizinho. Cael. A luz suave do apartamento dele parecia um farol, atraindo o olhar dela como se fosse inevitável. Ele estava mais uma vez a observar, não de forma direta, mas de um modo que parecia compreender cada pedaço de sua solidão. Cada pedacinho