Wick, um homem dividido entre a culpa e a violência, mantém Jade presa em um cativeiro que deveria ser apenas parte de um plano calculado. Mas o que era para ser um controle frio e distante se transforma em um emaranhado de emoções difíceis de controlar. Entre paredes que aprisionam corpos e corações, nasce um amor proibido, marcado por desejo, medo e culpa. Jade, frágil e resistente, luta para sobreviver à dor e à esperança, enquanto Wick batalha contra seus próprios demônios e a crescente intensidade do que sente por ela. “Amor Entre Crimes” é uma história visceral sobre o limite tênue entre amor e poder, onde o sentimento mais humano nasce na escuridão, e amar pode ser o maior dos crimes.
Ler maisEstou escondida atrás do banco da Kombi, com os olhos arregalados, enquanto vejo o sangue escorrer do corpo do homem que veio atrás de mim quando começou o tiroteio. Achei que tinha sido baleada, até perceber que ele havia se colocado na minha frente — a bala o atingiu bem na cabeça.
— Ayla! — começo a gritar pela minha amiga, da qual me perdi quando começamos a correr. — Ayla! — Sem resposta.
Não me atrevo a sair daqui. Ainda ouço os barulhos dos tiros. Não sei o que me passou pela cabeça quando concordei com a Anne em vir comemorar a virada do ano — e meu aniversário — em um baile de favela. Se meu pai descobrir que estou aqui, ele me mata. Mas, se eu continuar escondida, vou morrer do mesmo jeito. É só uma questão de tempo até me acharem dentro dessa lata velha.
— Ayla! — grito mais uma vez, mas só os tiros me respondem.
Percebo que os disparos estão se afastando, então me atrevo a me mover. Passo por cima do corpo do rapaz — ele parece ter uns 30 anos — e sinto algo escorrer pelo meu rosto. Só agora percebo que estou chorando. Só percebi ao me acalmar o suficiente para me mexer.
Chego ao banco da frente e olho ao redor, procurando alguém para pedir ajuda, mas não vejo ninguém. Sei que a Anne mora por aqui, mas não faço ideia de onde fica a casa dela.
Saio da Kombi e caminho até uma viela à frente. Vejo uma casa com a luz acesa. Quando vou bater na porta, sinto alguém me puxar pelo braço. Olho para trás e vejo um homem lindo me encarando.
— Por favor, me ajuda! Estou perdida, preciso sair daqui! — Ele me encara com seus olhos azuis, mas não diz nada.
Ele se vira e me puxa de volta em direção à Kombi.
— O que você está fazendo? Me solta! — digo, mas sou ignorada.
— Me larga! — insisto, mas ele continua me puxando.
Ouço um tiro atrás de nós. Ele me puxa com mais força, jogando-me dentro da Kombi e entrando logo atrás.
— Fica abaixada — ordena. Eu não me mexo. — Fica abaixada, porra!
Obedeço. Começo a chorar. Não sei quem ele é, mas vejo que está armado. Fico com medo. Mas, se quisesse me fazer mal, já teria feito.
Ele entra na Kombi e se depara com o corpo do homem morto. Vejo sua expressão mudar na hora. Os olhos, que antes eram da cor do céu, escurecem como o mar profundo. Ódio se forma em seu rosto. Ele me olha, mas não diz nada. Fica claro que conhecia o rapaz morto.
— Você o conhece? — pergunto, com curiosidade. Ele me encara, mas não responde. — Ele veio atrás de mim quando começou o tiroteio. Entrei aqui e ele entrou logo depois. Ouvi o tiro... pensei que tinha me atingido. Quando olhei pra trás, vi que foi bem na cabeça dele...
Ele fica vermelho. Na sua pele branca, a raiva é visível. Ele definitivamente não parece ser daqui. O observo de cima a baixo: usa um relógio e um cordão de ouro. Sua calça jeans clara da Calvin Klein está manchada de sangue.
— Você está bem? Se machucou? — pergunto.
— Cala a boca — ele responde, num tom baixo.
— Só estou preocupada... você está sujo de sangue — digo.
— Já mandei você calar a boca.
Ouço passos do lado de fora. Vejo um homem — está usando um uniforme do BOPE — e carrega uma mulher nos braços. Reconheço os cachos, o vestido branco longo. É exatamente como Ayla estava vestida. Sinto meu corpo estremecer ao ver que ela está coberta de sangue e desacordada.
— Ai, meu Deus... é a Ayla — falo, sentindo a voz falhar. — AYLAAAA — começo a gritar.
O homem que me puxou da viela me encara e tampa minha boca.
— Tá ficando maluca, porra? Para de gritar, vai chamar a atenção dele — ele sussurra, mas o tom é firme, frio. É agora que percebo: ele não é quem eu achava que era.
— Ele está ajudando ela! É uma boa pessoa! Não vai nos machucar — digo, com firmeza.
— Ele é o inimigo aqui — diz ele, com tanta certeza que me arrepia. Essa é a verdade dele, mas não é a minha.
— Quem é você? — pergunto.
— Não interessa. Agora cala a porra da boca.
Ignoro e grito de novo por Ayla.
— Vou ter que calar você na força, é isso? Ou a engomadinha não sabe seguir uma simples ordem? — diz ele, mais furioso que antes.
— SOCORRO! — grito, e vejo que chamei a atenção do homem que carrega minha amiga. Ele olha ao redor, tentando identificar de onde vem o som.
— SOCORRO! — grito mais uma vez.
Vejo o homem girar, procurando por mim. Mas, antes que ele me veja, sinto uma dor aguda na cabeça, e então, tudo escurece.
Já faz uma semana desde aquela noite na praia. Desde que, pela primeira vez em muito tempo, senti que Jade e eu respirávamos no mesmo ritmo. Mas agora, sentado ao lado de Murilo, com os relatórios abertos sobre o capô da viatura, o peso do cotidiano volta a se instalar.O caso novo é pesado — uma sequência de desaparecimentos que tem deixado toda a equipe sem dormir direito. Murilo fala alguma coisa sobre as evidências, mas minha mente divaga, volta para ela, para o jeito como o vento bagunçava o cabelo de Jade quando o sol nasceu naquele dia.— Tá me ouvindo, Samuel? — ele resmunga, batendo a caneta contra o papel.— Tô, tô sim — respondo, meio automático.Ele me encara de lado, desconfiado. — Você está esquisito. Desde a semana passada.Suspiro, cruzando os braços. — Fui ao médico, Murilo. Fiz uns exames.— Está doente? — o tom muda, preocupado.— Não. — balanço a cabeça. — Fui ver como andava… sabe, minha fertilidade.Murilo franze a testa, claramente sem entender.— A Jade… —
Os meses passaram como se o tempo tivesse perdido o rumo. Por fora, a vida parece ter voltado ao normal. Rigel corre pela casa, ri, canta, enche cada canto com sua energia. Mas dentro de mim… ainda existe um buraco. Apolo continua aqui, na minha pele, no meu peito, no silêncio entre uma respiração e outra.Gabriel nunca mais apareceu. Para Samuel, isso é um alívio. Para mim, é um medo calado. Silêncios longos demais escondem tempestades. Eu sei disso.Eu tentei seguir em frente, tentei me convencer de que o tempo curaria. Mas no fundo, tudo o que eu mais queria era sentir uma nova vida dentro de mim. Eu não contei a Samuel. Ele pensa que eu continuo tomando os anticoncepcionais, e eu deixo ele acreditar. É o meu segredo. A minha forma de lutar contra o vazio. Mas nada aconteceu até agora. E cada menstruação que chega é como perder de novo.As noites são as mais cruéis. Samuel deita ao meu lado, me abraça, me beija… mas eu sinto o medo nele. O desejo está lá, nos gestos contidos, mas e
Alguns dias depois, o sol finalmente parece brilhar diferente. A enfermeira retira os últimos acessos, e o médico confirma: posso ir para casa. O coração aperta, porque sei que cruzar aquelas portas significa deixar parte de mim para trás… mas também significa voltar para os meus.Samuel segura minha mão o tempo todo, cuidando de cada passo, como se eu fosse feita de vidro. Ao chegarmos em casa, percebo o movimento: risadas abafadas, vozes conhecidas tentando soar discretas. Quando a porta se abre, o estouro de palmas e sorrisos me envolve.— Bem-vinda de volta, Jade! — todos gritam juntos.O corredor está cheio: Ayla, Marco, Murilo, minha sogra, Julia, até vizinhos próximos. Balões simples, flores em vasos improvis
No começo é só silêncio. Um silêncio pesado, como se eu estivesse submersa em um mar escuro, sem ar, sem chão. Meu corpo parece distante, como se não fosse mais meu.Aos poucos, um som rompe essa escuridão. Um bip ritmado, insistente. Depois outro. E, então, uma voz que eu reconheceria em qualquer lugar.Samuel.Minha mente luta para emergir. É como tentar nadar contra uma correnteza. Cada movimento é um esforço, mas eu não consigo desistir. Eu preciso ouvir mais. Preciso chegar até ele.O peso nas minhas pálpebras é insuportável, mas finalmente consigo ab
O tempo não passa. Cada vez que olho para o corredor onde Jade desapareceu, sinto como se estivesse encarando um abismo. Murilo tenta me manter firme ao meu lado, mas nada preenche o vazio.Então, de repente, ouço passos apressados. O som de um salto batendo contra o piso frio. Levanto o rosto, e meu coração se aperta ao vê-la.— Mãe… — minha voz quase não sai.Dona Helena surge no corredor, os cabelos desgrenhados, o rosto ansioso, as mãos trêmulas apertando a bolsa contra o corpo. Quando seus olhos encontram os meus, ela corre até mim sem pensar.Eu me levanto num pulo e caio em seus braços. O abraço dela é quente, denso, quase sufocante, mas é
As portas do pronto-socorro se abrem com violência quando eu as arremesso contra a parede. O mundo inteiro parece girar em torno do peso que carrego nos braços.— AJUDA! — minha voz sai como um rugido, selvagem, cortando o ar. — SOCORRO, ALGUÉM ME AJUDA!Jade está desmaiada contra meu peito, o corpo mole, os cabelos grudados no rosto pela transpiração. O sangue escorre pelas minhas roupas, manchando tudo — meus braços, minhas mãos, até o chão por onde passo. O vermelho dela em mim.— Por favor! — imploro, quase tropeçando enquanto a seguro com força. — Ela tá grávida, pelo amor de Deus, AJUDEM!Enfermeiros correm em nossa direç
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