Estou escondida atrás do banco da kombi, com os olhos arregalados enquanto vejo o sangue escorrer do corpo do homem que veio atrás de mim quando começou o tiroteio. Achei que tinha sido baleada, até ver que ele tinha entrado na frente, e a bala o atingiu bem na cabeça.
- Ayla - começo a gritar por minha amiga, me perdi dela quando começamos a correr - Ayla - sem respostas
Não me atrevo a sair daqui, pois ainda ouço os barulhos do tiro, não sei o que me deu na cabeça quando concordei com a Anne em vir comemorar a virada do ano e meu aniversário em um baile de Favela. Se meu pai descobrir que estou aqui, ele me mata, mas se eu continuar aqui, vou morrer da mesma forma. Será uma questão de tempo até me acharem escondida dentro dessa lata velha.
- Ayla - grito mais uma vez, só ouço os tiros como resposta.
Percebo que os tiros estão se afastando, então me atrevo a me mover, passo por cima do corpo do rapaz que parece ter 30 anos, e sinto algo escorrer pelo meu rosto, não tinha percebido que estava chorando até eu me acalmar um pouco para me mover. Chego no banco da frente e olho ao redor a procura de alguém para pedir ajuda, mas não vejo ninguém. Sei que a Anne mora aqui, mas não faço ideia onde fica a casa dela.
Saio da Kombi e ando até uma viela que está logo à frente, vejo uma casa com a luz acesa, e quando vou bater na porta sinto alguém me puxando pelo braço, olho para trás e vejo um homem lindo, me encarando.
- Por favor, me ajuda, estou perdida aqui, preciso sair daqui - ele me encara com seus olhos azuis mas não fala nada.
Ele se vira e me puxa na direção da Kombi.
- O que você está fazendo, me solta - digo, mas novamente sou ignorada
- Me Larga - ele continua me puxando
Ouço um barulho de tiro atrás da gente, ele me puxa mais rápido me jogando dentro da Kombi e vindo logo atrás de mim.
- Fica abaixada - ele me ordena, eu não me movo - Fica abaixada, porra.
Obedeço, e começo a chorar, não sei quem ele é, mas vejo que está armado, e fico com medo, mas se ele quisesse me fazer mal, já teria me matado. Ele entra na Kombi e se depara com o corpo do homem morto, vejo sua feição mudar na hora, seus olhos que antes estavam azuis da cor do céu, escurecem e ficam azuis da cor do mar, vejo o ódio se formar em seu rosto. Ele me olha mas não diz nada, mas claramente dá para ver que ele conhece o rapaz morto.
Você o conhece? - pergunto, com curiosidade. Ele fica me encarando mas não responde a minha pergunta - Ele veio atrás de mim quando começou o tiroteio, eu entrei aqui e ele entrou atrás de mim, eu ouvi o tiro, pensei que tinha me atingido, quando olhei para trás vi que o tinha atingido bem na cabeça.
Ele fica vermelho, em sua pele branca, vejo que o deixei ainda com mais raiva. Ele não parece ser daqui, o olho de cima a baixo, percebo que usa um relógio de ouro juntamente com um cordão de ouro. Sua calça jeans claro da Calvin Klein está suja de sangue.
- Você está bem? Se machucou? - pergunto
- Cala a Boca - ele fala bem baixo
- Só estou preocupada, pois você está sujo de sangue - Digo
- Já mandei você calar a boca
Ouço barulhos de passos do lado de fora, vejo um homem, percebo que usa um uniforme do Bope, e em seu braços vejo uma mulher, com seus cabelos cacheados, vestindo um vestido branco longo, exatamente como Ayla estava vestida. Sinto meu corpo se estremecer, quando vejo que está totalmente sujo de sangue e ela está desacordada.
- Ai meu Deus, é a Ayla - falo, sentindo a voz falhar - Aylaaaa - Começo a gritar por seu nome. O homem que me tirou do corredor me olha e tapa a minha boca.
- Ta ficando maluca, porra, para de gritar, vai chamar a atenção dele.- Ele diz baixo, mas em um tom que me faz perceber que ele não é a pessoa que achei que era.
- Ele é uma pessoa boa, está salvando ela, não vai nos machucar - digo em um tom firme.
- Ele é o inimigo aqui - ele me diz com tanta convicção que vejo que essa é a verdade dele, mas não é a minha.
- Quem é você? - pergunto
- Não interessa, agora cala a porra da boca - Ignoro o seu pedido e grito mais uma vez por Ayla.
- Vou ter que calar você na base da força, ou a engomadinha não sabe seguir uma simples ordem ? - diz ele com mais raiva do que um minuto atrás.
- Socorro - grito, e vejo que chamei atenção do homem que carrega a minha amiga nos braços, ele olha ao redor, procurando de onde está vindo o grito - Socorro! - grito mais uma vez. Só consigo ver o homem girando procurando pelos meus gritos.
Sinto uma dor aguda na cabeça, e não vejo mais nada.