Criada à sombra da irmã perfeita, Aneliese Moore aprendeu a esconder suas inseguranças atrás de piadas afiadas e um sorriso teimoso. Mas tudo começa a sair dos trilhos quando, quase por impulso, ela aceita cuidar dos três filhos de seu chefe por um fim de semana. Alexander Reed Blake, viúvo, filho mais velho, Herdeiro e presidente da renomada Reed & Blake - Elevate Architecture, é conhecido por ser rígido, meticuloso e obcecado por controle — enquanto tenta manter a vida nos eixos com três filhos que desafiam qualquer babá. Hanna só precisava sobreviver a três dias. Três dias de armadilhas, gritos, crianças diabólicas… e um cachorro desaparecido. O que ela não esperava era que aqueles dias fossem apenas o começo. O começo do caos, das provocações, das descobertas… E do colapso cuidadoso das muralhas que ela e Alexander levaram anos para construir.
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Observo a montanha de papéis em minha mesa. Olho para o relógio na tela do computador. Volto os olhos para os papéis. Depois, novamente para o horário. 21h47. Eu realmente já deveria estar em casa a essa hora, comendo macarrão instantâneo e assistindo mais um episódio de The Walking Dead. Mas, por algum motivo, o senhor Blake decidiu ficar até mais tarde no escritório e, adivinha só? Eu também tive que ficar. Pra ver se ele precisa de algo? Não. Apenas por puro capricho. Porque, na mente brilhante dele, se ele não se diverte numa sexta à noite, então eu também não deveria. E, merda, eu tinha um encontro hoje. Com um cara que conheci num aplicativo de relacionamento — decadente, eu sei — mas ainda assim, um encontro. E agora... bem, eu também estou em um encontro. Ou date, como dizem os mais jovens. — Como se eu não tivesse menos de trinta. — Um date magnífico com uma pilha de documentos que precisam ser digitalizados e enviados ainda hoje. Eu pedi por isso? Não. Eu queria estar aqui? Também não. Mas aí me lembro que tenho boletos para pagar, e que a ração e os petiscos do Sirius — meu husky siberiano de dois anos e verdadeiro dono do apartamento — não se compram sozinhos. E sinceramente, a última vez que discutimos ele me deixou claro que não aceita menos do que já tem. Sim, eu converso com meu cachorro. E ele responde. Inclusive me chama de escrava. Respiro fundo, viro mais uma página e começo a digitar as informações. Fecho os olhos por um momento, movendo o pescoço de um lado para o outro, esticando as costas numa tentativa de evitar uma dor de coluna daquelas, quando ouço o som do elevador no fim do corredor. Não deveria haver ninguém aqui. Digo, não neste andar. O último andar do prédio é simplesmente o santuário do senhor Blake. O que significa que eu sou a única funcionária aqui e trabalho diretamente para o chefe. Meus olhos se voltam para o elevador, de onde surge a imagem de um entregador se aproximando com algumas embalagens nas mãos. — Senhorita Anelise Moore? — ele pergunta, conferindo o nome nas sacolas. — Sou eu — digo, arqueando a sobrancelha. — Como posso ajudar? — São pra senhorita — ele estende uma sacola com o logo de uma lanchonete local, e outra de uma loja que nunca vi. — Já está tudo pago. Só preciso da sua assinatura pra confirmar a entrega. — Desculpa, acho que houve algum engano — digo, levantando da mesa e me aproximando. — Eu não pedi nada disso. — Só estou fazendo meu trabalho, senhora — ele dá de ombros, visivelmente impaciente. — Se puder assinar, agradeço. Tenho outras entregas. Reviro os olhos, igualmente impaciente. Essa história de "presente misterioso" já estava virando rotina. Respiro fundo, assino, pego as sacolas e volto pra mesa, ignorando completamente a saída do entregador. Observo os embrulhos como quem espera respostas do universo. Abro primeiro o da lanchonete. O cheiro que invade meu nariz é um verdadeiro manjar dos deuses. Meu estômago ronca, me lembrando que não almocei hoje graças à avalanche de trabalho. Hambúrguer com fritas e refrigerante não são o que eu chamaria de jantar ideal, mas honestamente? O aroma me faz salivar. Retiro os itens da embalagem e então vejo um cartão preso à sacola. "Sei que não almoçou hoje. Espero que esse lanche ajude a renovar suas forças. Seu Admirador." Arqueio a sobrancelha. De novo essa história de admirador secreto? Pouso o lanche de lado e abro a outra sacola, que carrega o símbolo de uma loja que não reconheço. Dentro, uma caixa de veludo verde. Ao abri-la, encontro um bracelete singelo com uma única pedra esverdeada no centro. E outro bilhete. "Nenhuma pedra jamais brilhará tanto quanto seus olhos quando você sorri de verdade. Seu Admirador." Respiro fundo, observando o presente com uma mistura de surpresa, curiosidade... e uma pontinha de receio. O barulho da porta do escritório do meu chefe se abrindo me traz de volta à realidade. Guardo meu "presente" e volto os olhos para o lanche sobre a mesa, bem no momento em que o senhor Blake aparece na porta. Seus olhos, antes vidrados no telefone, se voltam para mim — e há um misto de incredulidade e surpresa estampado em seu rosto ao me ver ali, parada. — Senhorita Moore? Ainda aqui? Achei que já tivesse ido embora — diz ele, visivelmente confuso, ainda parado na entrada. — O senhor me pediu para aguardar, senhor Blake — respondo, observando-o sem entender a confusão. — Eu pedi? — ele repete, franzindo o cenho. — Não… Eu lembro claramente de ter mandado uma mensagem dizendo que poderia ir, faz mais de três horas. Já que eu iria sair mais tarde hoje. — Mas… e o bilhete sobre a mesa? — insisto, cada vez mais perdida. — Bilhete? — pergunta ele, tão confuso quanto eu. — Sim! O que estava na minha mesa… onde pedia para eu ficar até mais tarde, porque iria precisar de ajuda com... Mostro a ele o bilhete que havia encontrado em minha mesa. — Quando retornei do nono andar, após entregar alguns documentos horas atrás. — Onde deixava claro que eu deveria esperar até que ele fosse embora. Ele fecha os olhos e respira fundo, como quem tenta manter a calma. — Eu vou matar o Gaspar — diz, em tom sério. — Não deixei bilhete nenhum, senhorita Moore. Mas meu irmão esteve aqui esta tarde... Bem, é uma longa história. Você está dispensada. Ele respira fundo mais uma vez antes de voltar para dentro da sala, sem muita cerimônia. Sem saber se rio ou xingo, pego minhas coisas, guardo o lanche de volta na sacola — não vou desperdiçar, obviamente. Vou comer em casa. Ou melhor, vou dividir com Sirius, já que ele nunca me permite comer nada sozinha. Também guardo o "presente", mais um entre outros, se é que posso chamar assim. Desligo o computador e sigo em direção ao elevador, torcendo para as portas se abrirem rápido. Eu não vejo a hora de chegar em casa, tomar um banho e simplesmente esquecer que esse dia existiu. Em meio a todo esse caos, eu sequer me apresentei. Me chamo Anelise. Anelise Moore. Tenho 27 anos e atualmente sou assistente pessoal e secretária do senhor Alexander Blake. Sim, aquele Blake. Um dos homens mais poderosos — e rabugentos — do país. Sou formada em Gestão de Empresas, tenho doutorado na área, falo quatro idiomas fluentemente… e meus pais ainda não se conformam com o fato de eu ser “apenas” uma assistente. Mas, verdade seja dita: eu ganho mais do que o triplo do que qualquer assistente comum por aí. E, sinceramente, é por isso que continuo aqui. Acompanho o senhor Blake em viagens, eventos com investidores, reuniões em lugares paradisíacos — tudo pago pela empresa. Já conheci mais lugares do mundo do que minha irmã, que se casou com um cirurgião e virou esposa-troféu. E quem sou eu pra julgar, né? As portas do elevador se abrem e estou prestes a entrar quando ouço passos atrás de mim. Seguro as portas por reflexo, e logo o senhor Blake aparece, carregando algumas sacolas e um bolo de tamanho médio que quase vai ao chão — se eu não tivesse ajudado a segurar. — Obrigado, senhorita Moore — diz ele, tentando se equilibrar. — Um momento, senhor Blake — respondo, colocando minha bolsa no ombro. — Deixe-me ajudá-lo. Pego o bolo das mãos dele e o ajudo a se organizar com as sacolas. Ele parece respirar aliviado com a ajuda inesperada. Em seguida, entrego o bolo de volta, agora com mais segurança nas mãos dele. — Prontinho, senhor — digo, sorrindo, enquanto me encosto na parede do elevador. — Você acabou de salvar minha noite, senhorita Moore — ele responde com um tom mais leve. — Minhas meninas me matariam se eu chegasse em casa sem esse bolo. Ele sorri. E, pela primeira vez, vejo um sorriso de verdade em seu rosto. Um sorriso leve, distante daquela carranca habitual que ele insiste em usar todos os dias. — Tenho certeza de que elas vão amar a surpresa — digo, tentando parecer o mais gentil possível. — Que você fale pela boca de um anjo, senhorita Moore — ele responde, a voz mais suave do que o normal e um sorriso ainda presente nos lábios. As portas do elevador se abrem no estacionamento, e saímos de dentro da grande lata de metal. — Deixe-me dar-lhe uma carona, senhorita Moore. É o mínimo que posso fazer por tê-la feito ficar até tarde numa sexta à noite — mesmo que indiretamente — e pela ajuda no elevador — diz ele enquanto seguimos em direção aos carros. — Agradeço, senhor Blake, mas estou de carro — respondo, apontando para meu Honda Civic LX estacionado em uma das vagas. — Tudo bem, então… — ele diz, com um tom mais formal, talvez retomando a pose de sempre. — Tenha um bom fim de semana, senhorita Moore. — Bom fim de semana, senhor Blake — digo, me despedindo e seguindo rumo ao meu carro. Tudo o que eu quero hoje é meu sofá, minha série e meu lanche. E, se Sirius me deixar, até quem sabe um pedaço inteiro só pra mim.● Anelise Moore ●Os primeiros raios tímidos da manhã se infiltravam pelas frestas da janela, espalhando uma luz dourada pelo quarto. O cheiro de terra molhada, resultado da chuva da madrugada, invadia o ambiente junto com uma brisa fresca. Eu terminava de me arrumar para mais um dia de batalha — porque trabalhar naquela casa e lidar com três crianças logo cedo era praticamente um esporte radical.Sirius, como sempre, estava estirado sobre a cama, enfiado debaixo das cobertas como se fosse um Lord inglês aposentado, livre de qualquer obrigação terrena. Olhei para ele e balancei a cabeça. Vida boa é para poucos.Prendi meu cabelo em uma trança rápida, só para manter a sanidade durante o dia, coloquei o celular no bolso e saí do quarto. O relógio marcava 06h10. Segui até o quarto de Lucca, que, ao contrário da manhã anterior, estava completamente às escuras. Cortinas fechadas, silêncio total… o que só podia significar que o pequeno Blake ainda estava no modo “hibernação”.— Vamos lá, Lu
● Anelise Moore ●A ligação fica muda. Respiro fundo por alguns segundos e deixo o celular sobre a cama. Passam das 19h50, e eu agradeço aos céus por mais um dia estar chegando ao fim — principalmente depois de um dia tão… como posso dizer… incomum.Primeiro foi a cola nas cadeiras da sala de jantar, armadilha que por pouco — e só por causa de Vivian — não teria me deixado grudada ali feito um papel de parede humano. Depois disso, as crianças entraram em um turbilhão de atividades que faria qualquer adulto pedir arrego.Após a escola, eles almoçam, fazem os deveres e… pronto, começa a maratona. As gêmeas tiveram balé, enquanto Lucca foi para a aula de raciocínio lógico. Logo depois, foi álgebra para as meninas e esgrima para o Lucca, seguidos de natação para os três. E mais uma lista infinita que eu honestamente já desisti de decorar.Há pouco, terminamos o jantar. Foi quando recebi a ligação do senhor Blake. Sua voz soava cansada, quase suplicando por descanso. Mas, teimoso do jeito
Alexander Blake • — Talvez eu devesse ligar. — murmuro, sentindo a tensão começar a subir como uma maldita maré alta. — E se ela fez algo errado? Ou pior, se eles aprontaram algo ? ... e se armaram alguma das suas malditas peças? Aneliese não é exatamente o tipo de pessoa que...— Alexander Blake, eu juro pelos céus, se você não parar de andar feito um lunático de um lado pro outro, eu te jogo por essa janela. — A voz firme de Jade me arranca dos meus pensamentos miseráveis. Respiro fundo, tentando não mandar minha adorável irmã para o inferno.— Você deveria estar preocupado é com a sua secretária... Se ela sobreviveu à noite e claro, ao primeiro dia. Porque seus pequenos demônios de estimação estão muito bem, obrigada por perguntar. — Jade diz, tomando um gole de vinho como se estivéssemos numa conversa trivial. — Agora, Aneliese... Bom, não ficaria surpresa se tivessem amarrado ela e feito um ritual de fogo inspirado em algum tutorial tosco do Google.— Meus filhos, seus sobrinhos
● Aneliese Moore ●Vivian saiu da cozinha carregando uma bandeja enorme com frutas para os pequenos Blakes. E se, por um segundo, eu cogitei a ideia de me sentar naquela mesa e tomar café com os anjinhos? Pois é. Esquece. Esse pensamento foi direto pro ralo junto com a sanidade que eu ainda tinha.Reviro os olhos, abro os armários em busca de uma xícara. Não costumo tomar café da manhã, mas, sinceramente? Um pouco de cafeína nunca matou ninguém — e vai que ajuda a manter meus reflexos ativos diante de armadilhas infantis?Acho as xícaras num dos armários superiores, pego uma qualquer e estou prestes a me servir quando as portas de vidro que dão para o jardim se escancaram. Um dos seguranças do Alexsander entra como se tivesse acabado de correr uma maratona no meio de um furacão. Encharcado, com lama até os tornozelos.— Vivian vai te esfolar viva por molhar a cozinha dela desse jeito. — comento casualmente, servindo o café como se aquilo fosse um cenário comum. — E ainda espalhando la
• Aneliese Moore • Os primeiros raios de sol invadiram o quarto através de uma pequena fresta nas enormes cortinas, um lembrete silencioso de que uma nova semana se iniciava. Um lembrete igualmente cruel de que, pelos próximos três dias, eu seria a responsável pelos pequenos anjos do senhor Blake. E sinceramente? Eu estaria mentindo se dissesse que estou preparada. Para falar a verdade, tenho quase certeza de que rezei para todos os santos e divindades ontem à noite antes de dormir, implorando para que, ao final desses três dias, eu ainda tenha alguma sanidade. Não é por nada, as crianças foram uns amores ontem à noite, depois que Sebastian e aquela mulher - que descobri ser sua irmã mais nova - partiram. Claro, como secretária pessoal do Sebastian, eu sabia da existência de uma irmã. Só nunca tinha tido o prazer de conhecê-la pessoalmente. Também sei que ele tem um irmão, Gaspar Blake. Sei ainda que o senhor Blake é o irmão do meio, e aparentemente, o mais fechado dos três. Ningu
●Aneliese Moore ●Vejo quando o senhor Blake solta o ar em alívio, como se eu tivesse acabado de jogar um colete salva-vidas enquanto ele se afogava num mar de fraldas e gritos infantis. Ele sorri. Um sorriso genuíno, tranquilo... e, confesso, meio bonito.Acho que nesse pequeno intervalo de tempo desde que cheguei aqui, já o vi sorrir mais do que em todos os anos em que trabalho para ele. E, céus, eu não estaria mentindo se dissesse que esse homem deveria sorrir mais vezes. Mesmo que isso me custe uma hérnia emocional e algumas noites de sono.Mas antes que eu pudesse me perder naquele sorriso raro e perigoso, a realidade voltou e me acertou como uma bolada de criança hiperativa no parquinho: eu acabei de concordar em cuidar de três pequenos seres humaninhos que, ao que tudo indica, possuem pacto com alguma entidade do caos.Sirius... isso é por você. Espero que esteja preparado pra conhecer o lado selvagem da humanidade.•------•------•• Sebastian Blake •Com as malas prontas ao me
Último capítulo