Rachel Millis Dickson tinha vinte e um anos e acreditava no amor como quem acredita em uma canção. Casada com Brent Bishop Dickson, um jovem advogado idealista, ela vivia uma vida simples, mas cheia de sonhos — até a noite em que a chuva levou tudo. A caminho do hospital, prestes a dar à luz, o carro do casal é atingido por um motorista embriagado. Brent morre no acidente. Rachel sobrevive, apenas para descobrir, ao acordar em um quarto de hospital vazio, que também perdeu o bebê. Sozinha, órfã e sem apoio da família do marido, ela é tomada pela culpa. As palavras frias da sogra — “você matou os dois” — ecoam em sua mente como uma maldição. Enquanto luta para aceitar a nova realidade, uma enfermeira chamada Brenda Smith se aproxima, oferecendo-lhe um trabalho inesperado: ser ama de leite da filha recém-nascida de sua prima, uma mulher rica que não deseja amamentar a criança. Sem forças para questionar, Rachel aceita. O corpo ainda produz leite; o coração, vazio, precisa de algo — ou alguém — para preencher o silêncio que ficou. Quando chega à mansão Sumerland, ela encontra uma bebê de olhos tão familiares que o peito se contrai de um jeito inexplicável. Cuidar daquela criança se torna mais que um emprego — é uma redenção. O que Rachel não imagina é que o destino a colocou novamente nos braços da própria filha, roubada ainda na maternidade.
Leer másO COMEÇO DE TUDO
A música sempre foi o idioma da minha alma. Desde menina, eu acreditava que as melodias eram orações disfarçadas — que, se eu tocasse com o coração, Deus me ouviria. Foi assim que Brent entrou na minha vida: entre uma canção e outra, no pequeno café ao lado da universidade. Eu tocava piano nas horas vagas, tentando juntar dinheiro para pagar o quarto onde morava — um lugar simples, alugado por uma viúva gentil, indicado pelas freiras do orfanato que me criara. Era a primeira vez que eu vivia sozinha, fora das paredes que me chamavam de “instituição”, e, pela primeira vez, a solidão parecia ter som. Ele entrou certo dia, com o sorriso mais bonito que eu já vi. Tinha livros de direito debaixo do braço e olhos que pareciam ler o mundo — e, ainda assim, me olhavam como se eu fosse o centro dele. Brent Bishop Dickson. Vinte e um anos, estudante de direito, sonhador, intenso. Um homem que falava de justiça como quem recita poesia. — Você toca com a alma — disse ele, depois de ouvir minha música. — E eu nunca soube que a alma tinha som. Eu ri, sem saber o que responder. Foi a primeira vez que alguém me olhou sem ver o rótulo de “órfã”. Ele me viu, simplesmente. Nos meses seguintes, a cafeteria virou nosso ponto de encontro. Eu levava partituras; ele trazia livros. Enquanto eu falava de Chopin e Debussy, ele explicava as leis que poderiam mudar o mundo. Nos apaixonamos devagar — e, quando percebi, já era tarde para voltar atrás. Brent me pediu em casamento no mesmo lugar onde nos conhecemos. Um anel simples, comprado com o primeiro salário de estágio. Eu tinha acabado de completar dezoito anos, ele estava terminando a faculdade. Nos casamos no civil, em uma cerimônia pequena. As freiras foram minhas testemunhas; ele levou apenas o pai e a mãe — embora a presença dela, confesso, tenha gelado a minha alegria. A senhora Margaret Dickson nunca me aceitou. Achava que o filho, agora advogado promissor, merecia mais do que uma garota sem sobrenome, criada por caridade. Nos olhares dela, eu sempre lia a mesma sentença: “você não é digna.” Mas Brent nunca se deixou influenciar. Ele dizia que amor não precisava de permissão. E, quando assinamos os papéis do casamento, ele me sussurrou ao ouvido: — Agora você tem um lar, Rachel, É um nome que ninguém vai te tirar. Dois anos depois , eu tinha uma surpresa para Brent. Vivíamos em um pequeno apartamento, com paredes pintadas de sonhos. O piano herdado do café ficava ao lado da janela, e o som dele era o coração da casa. Brent trabalhava em um grande escritório e começava a se destacar. Às vezes chegava tarde, exausto, mas bastava me ver tocando que o cansaço desaparecia. Foi na noite que completamos dois anos de casados que contei a novidade. — Brent, estou grávida, você vai ser pai amor. Ele me olhou por um instante, como se as palavras demorassem a fazer sentido. E, então, sorriu com uma alegria que encheu o quarto inteiro. — Você está brincando comigo não é amor? Balancei a cabeça, rindo e chorando ao mesmo tempo. Ele me abraçou com força, me levantou do chão e girou comigo. — Eu vou ser pai?!— repetia, como se precisasse se convencer. — Meu Deus, Rachel, eu vou ser pai! Naquele instante, tudo parecia perfeito. Ele começou a pintar o segundo quarto, comprou móveis, bichinhos de pelúcia, e um móbile com notas musicais que giravam ao som de uma caixinha de música. Dizia que nosso bebê— ele sempre acreditava nisso bebê seria uma menina , mas nós decidimos descobrir o sexo no nascimento. Mas nem tudo era música. A minha sogra continuava distante, fria, nunca me tratou bem. Nas raras visitas, fazia questão de lembrar que “bons casamentos não se fazem com piedade”. Eu ouvia em silêncio, tentando preservar a paz. Brent, por outro lado, se irritava. — Mamãe você que se acostume — dizia. — Rachel é minha família agora. Eu sorria, mas no fundo sabia que a senhora Dickson jamais me perdoaria por ter me casado com o filho dela. Naquela noite, a casa estava em silêncio. O relógio marcava onze horas, e a chuva começava a cair lá fora. Eu estava deitada, observando o teto, quando senti a primeira contração. Fraca, mas inconfundível. Meu coração disparou. — Brent amor, acorda!— chamei, tocando seu ombro. Ele se mexeu, sonolento. — O que foi, amor? — Acho que chegou a hora do bebê. Os olhos dele se abriram de imediato, tomados de uma mistura de susto e alegria. — O quê? Agora? Assenti, ofegante. — Está doendo. Ele saltou da cama, tropeçando nas cobertas, rindo e nervoso. — Meu Deus… tá bem, calma, calma. Eu vou pegar as malas. Olhei para ele, e um nó se formou na minha garganta. Era a mesma sensação de quando o vi pela primeira vez: a certeza de que eu estava segura. Eu nunca poderia imaginar que, dali a algumas horas, aquele seria o último sorriso que veria dele. A chuva aumentava lá fora. O som dos trovões se misturava ao meu coração acelerado. Peguei a mala do bebê, o casaco e o retrato de casamento sobre a cômoda. Brent segurou minha mão e beijou minha testa. — Vai dar tudo certo, amor, falou sorrindo. — nosso bebê vai nascer! Eu acreditei. Como sempre acreditei em tudo que ele dizia.O ECO DA AUSÊNCIAFiquei olhando por alguns segundos — talvez minutos — a imagem diante de mim.O senhor Dean sentado na poltrona, com a pequena Roxy aninhada nos braços, balançando-a com tanto cuidado, tanto amor, que o tempo pareceu parar.A luz que entrava pelas cortinas desenhava os contornos do rosto dele, e havia ali algo puro, quase sagrado.Por um instante, eu esqueci quem era quem.Esqueci que estava naquela casa apenas como babá.Tudo o que vi foi um homem segurando sua filha como se o mundo inteiro coubesse naquele gesto.Aquele quadro — pai e filha — rasgou algo dentro de mim.Senti a garganta arder, e antes que as lágrimas me denunciassem, pedi licença com um fio de voz:— Com licença, senhor, volto em um instante.Ele assentiu distraído, completamente imerso naquele pequeno milagre adormecido em seus braços.Entrei no banheiro e fechei a porta devagar.O som do clique ecoou como um suspiro pr
O PRIMEIRO ABRAÇO DE UM PAIO som dos passos de Dean ecoava pelos corredores como se a casa guardasse a respiração.O diálogo com Leonor ainda latejava em sua mente — as palavras frias, o desdém, a indiferença.Nada daquilo parecia real.Ele precisava ver a filha, e confirmar com os próprios olhos que havia algo verdadeiro em meio àquela frieza toda.Quando empurrou a porta do quarto, o coração dele amoleceu.Rachel estava de costas, debruçada sobre o trocador, falando baixinho com a bebê, a voz doce e calma como uma canção de ninar.— Pronto, meu amor, estamos quase acabando, tá? — dizia ela, sorrindo , trocando a fralda da bebê — Você é uma mocinha muito paciente princesa Roxy.Roxy balbuciava sons, chutando o ar com os pezinhos rosados.Rachel riu, limpou-a com delicadeza e beijou de leve o pezinho antes de colocar pomada e a fralda nova, vestiu o body na bebê e conversava o tempo todo.Dean ficou imóvel na
A CONVERSA QUE NUNCA DEVERIA EXISTIRO corredor da mansão parecia ainda mais frio quando Dean subiu as escadas.As mãos dele tremiam — não de medo, mas de incredulidade.O som dos saltos de Leonor ecoava no quarto, ritmado e impaciente, como se o choro da filha fosse apenas um ruído incômodo.Ele empurrou a porta, o olhar firme.Leonor estava diante do espelho, retocando o batom.Deixou o espelho com um meio sorriso, fingindo leveza.— Como foi o parto da nossa filha, Leonor? — ele perguntou, com voz grave, cortante.Ela girou devagar, apoiando as mãos na penteadeira.— Foi tranquilo, tudo correu bem, o nascimento foi parto normal.Dean franziu o cenho.— Tranquilo? — repetiu. — E você já está assim, como se nunca tivesse tido um filho?Leonor deu uma risadinha debochada.— Fiz dieta a gravidez inteira, Dean, além disso, você sempre estava viajando, nunca me olhou de verdade para minha barriga e não qu
O quarto da bebê Roxy cheirava a lavanda, e bebê.As cortinas claras balançavam devagar com o vento que vinha da sacada, e o choro suave da bebê me tirou dos pensamentos.A cada dia que passava, aquela casa me parecia mais estranha.Como podia uma mãe simplesmente esconder o nascimento da filha do próprio pai?Não conseguia entender, como uma mãe não consegue cuidar de sua própria filha?O senhor Dean havia chegado naquela manhã, exausto, trazendo na bagagem o peso de quem acreditava estar voltando para uma casa comum — e encontrou um bebê e uma babá a esposa indiferente.Lembrou, do olhar do Sr. Dean, a surpresa quando soube do nascimento da filha, me deixou com uma impressão ruim.Era o olhar de quem tenta juntar as peças de um quebra-cabeça que não fazia sentido, Sr. Dean não sabia do nascimento da filha...“Como ela não avisou ao próprio marido?” — pensei, observando a bebê no berço.Roxy se remexeu e começou a chorar b
Rachel permaneceu por um longo tempo sentada ao lado do berço, observando a respiração suave da bebê.O silêncio do quarto era cortado apenas pelo som da chuva e, de vez em quando, pelo leve ranger da cadeira de amamentação.A menina dormia tranquila, o rostinho sereno, os dedos fechados em punho sobre o cobertor.Rachel não conseguia desviar o olhar.Algo naquela criança a acalmava e a feria ao mesmo tempo.Era uma paz doída — o tipo de sentimento que nasce de um amor que não se compreende, mas se sente como verdade.As horas passaram sem que ela percebesse.Quando uma das empregadas entrou no quarto para levar uma bandeja de chá, Rachel quebrou o silêncio:— Ela dorme assim o tempo todo? — perguntou, num tom suave.A mulher sorriu, arrumando as almofadas.— Só quando está com você. Nunca vi a pequena tão calma.Rachel olhou de novo para o berço e perguntou, quase num sussurro:— A mãe dela não vem ver a menina?A empregada hesitou, parecendo pesar as palavras.— Faz uma semana que
Rachel despertou com o coração pesado, seu corpo ainda carregava o peso da perda, a lembrança das perdas, a dor de não ter seu marido e filho.O quarto estava vazio, não recebeu uma visita— sem flores, ninguém veio até ela, era como se a morte de Brent não a tivesse atingido.O som da chuva batendo na janela, o mesmo som que ecoava desde o acidente, era como ela se sentia, até o tempo chorava como ela.Virou e olhou para o lado e viu sobre a mesinha ao lado da cama, um envelope branco.com mãos trêmulas o abriu, e leu, reconheceua caligrafia inconfundível da sogra firme, elegante e fria."Não quero vê-la nunca mais.Suas coisas foram deixadas na portaria do prédio.Não ouse voltar.– Margaret Dickson."As frases cravaram-se nela como lâminas.Por um instante, o mundo pareceu parar, a sogra era cruel, nunca gostou dela, ela sabia que somente Brent a amava.Margaret, a mulher que ela chamou de sogra, agora a baniu co
Último capítulo