Fernanda é uma das melhores escritoras de romance da sua atualidade. Ela passa horas e horas dentro do seu quarto apenas vivendo o mundo imaginário dos seus personagens. Mas tudo muda quando, ao terminar mais uma história de amor, ela desmaia de exaustão e e então acorda dentro da sua própria história… não como a heroína, mas como a vilã! Presa em um universo que ela mesma escreveu, Fernanda agora precisa encontrar uma maneira de se salvar do próprio fim trágico que destinou para sua vilã. A morte. Será que ela se salvará? Ou vai acabar seguindo os passos de Lady Beatrice, a mulher cruel, manipuladora e calculista que ela mesmo criou para separar os dois protagonistas destinados a ficarem juntos?
Leer másEu nunca acreditei muito no sobrenatural, cresci aprendendo que a gente deve acreditar naquilo que a gente vê, naquilo que faz sentido e tudo que não tem sentido tem uma explicação logica por trás, mas o que eu estou fazendo no corpo da vilã do meu próprio livro?
Me olho no espelho sem acreditar. Há apenas algumas horas eu havia acabado de escrever o último capítulo da minha história e logo depois o que aconteceu? Acho que comecei a sentir uma leve dor no peito, cansaço, não era isso? Para terminar a história mais rapidamente, eu estava tomando bastante remédios para ficar acordada… Meu Deus, será que morri e possui o corpo da minha vilã? Me olho no espelho mais uma vez, ainda sem acreditar que eu agora sou a Beatrice Montrose. Seus cabelos são negros e ondulados que chegam a cintura, seus olhos têm uma tonalidade de verde musgo, um nariz empinado e uma boca carnuda de dar inveja. Seu corpo é escultural. Claro, a criei para ser uma obra de arte, mas uma obra de arte que será morta por conta da sua própria cobiça. - Eu estou lascada… Muito lascada! - começo a andar de um lado a outro em sua habitação. Olho para todo o quarto tentando encontrar algo que possa me ajudar e me perco na beleza que é esse cômodo. Parece um santuário de elegância e recato. As cortinas são de veludo claro e pendem em enormes janelas, deixando entrar um leve vento e a luz do luar. A cama da lady Beatrice é enorme, esculpida em madeira nobre e adornada com lençóis de linho branco que caem gentilmente sobre ela. E tem o espelho que passei horas me olhando, enorme e oval de moldura dourada, ouro, provavelmente. Me lembro bem que sua família é cheia da grana. Tudo aqui exala luxuria, o quarto perfeito para uma dama que toda sua vida foi criada para encantar a sociedade. Eu não estaria tão desesperada para viver nesse lugar, se não fosse o simples fato de que planejei uma morte trágica e dolorosa para a lady Beatrice. E agora eu sou ela. A porta enorme do seu quarto começa a se abrir. - Lady Beatrice… Teu pai te convida para se juntar a ele na mesa do jantar. - diz uma empregada pessoal minha. Olho para ela, seus cabelos castanhos presos em um coque, um ar de indiferença em sua cara, mas que mantém certo respeito, roupas modestas e limpas e nenhum acessório evidente. Claro, ela não é a nobreza aqui. Mas qual é o seu nome? Penso um pouco e chego a conclusão de que eu nem sequer havia dado nome a ela, e nem uma história. - Lady Beatrice… a senhorita está bem? Parece aérea… - diz ela parecendo um pouco impaciente. Caminho até a porta. - Estou bem… obrigada. - como eu deveria perguntar o nome dela? Seria estranho? Tecnicamente na história eu cresci com essa empregada pessoal, ela é uns 5 anos mais velha que eu, não posso simplesmente perguntar o nome dela do nada, ou podem achar estranho e eu acabar morrendo mais rápido do que o planejado por acharem que estou endemoniada. Ela me olha estranho, mas não diz nada. Apenas começa a caminhar e eu vou atrás dela, que logo para. - A senhorita quer me dizer alguma coisa? - me pergunta meio receosa. - Não.. Por quê? Eu deveria te perguntar alguma coisa? - vejo ela começar a transpirar de medo. - N-Não! Mas a senhorita não para de me seguir… - ela se curva - Me perdoe se te ofendi… Entao ela não vai para o mesmo caminho que eu? Aonde eu devo ir? Não escrevi muito sobre a casa de Lady Beatrice, só que é uma mansão e alguns detalhes e outros sobre seu quarto e o salão principal. Mas quem imaginaria que os meus personagens secundários viveriam suas vidas? Ainda nem acredito que eu estou no corpo de Beatrice, mas já me belisquei várias e várias vezes tentando me acordar desse pesadelo. - Não me ofendeu… Me pergunto se você poderia me levar até meu pai… Ele anda meio bravo comigo, então talvez se eu chegasse com você… ele não gritaria comigo… - é a desculpa mais esfarrapada que eu já dei. Ela me olha como se eu estivesse falando loucuras e com razão, eu devo estar parecendo louca mesmo. Suspiro. Tudo que eu sei sobre a Lady Beatrice e sua família é uns 15% de toda a história que criei. E se eu tentar fugir? - Ele não vai brigar com a senhorita… Vocês tem visitas. - ela me olha mais um pouco e diz - Com licença, agora eu me retiro. E assim a vejo seguir seu rumo. No momento estou parada no meio de um corredor enorme, então decido seguir para o lado oposto. Me perco uma e outra vez, também paro algumas para admirar o lugar e suas obras de arte e dez minutos depois eu finalmente acho onde as pessoas dessa casa se reúnem para comer. Já irritada por ter pedido ajuda três vezes e as empregadas da casa terem me dado as costas em todas elas. Aparentemente Lady Beatrice não é querida nem pelas suas próprias empregadas. - Minha filha! Pensei que não virias mais… - disse o Senhor Montrose, agora o meu pai - Sente-se. Ele aponta para uma cadeira a seu lado, começo a caminhar até ele, mas paro bruscamente quando olho para nossos visitantes. A minha frente está Duque Thomas Ashford e ao seu lado o Conde James Cavenley, cujas mãos de ambos são justamente as que vão tirar a minha vida.Será que Thomas e a senhorita Beatrice pensam que são discretos nesses toques um no outro? Qualquer pessoa notaria. Até uma criança notaria, bastaria prestar atenção em seus olhares, na tensão existente entre eles, nas mãos que somem de cima da mesa. - O que isso tem a ver? - pergunta ele, com o tom ligeiramente mais ríspido do que o necessário.Ah, então a pergunta o incomodou?Sorrio, mas sei que ele já está irritado. Ótimo, vou fazê-lo provar do seu próprio veneno. Afinal, ele sabia dos meus sentimentos por Arabelle e mesmo assim ousou flertar com ela, ainda que de forma discreta. - E o que achas da Lady Beatrice? - pergunto, com certa tranquilidade, deixando a taça na mesa de madeira.Beatrice me lança um olhar surpreso, tão confusa quanto Thomas. Ele, logo, recua ligeiramente na cadeira. Se afastando dela.- Eu jamais me casaria com a senhorita Beatrice. - responde ele, em um tom seco, com a coluna tão reta quanto um manequim. Beatrice solta uma risada curta, mais de chacota q
A sala de jantar é simples, mais do que eu esperava. A primeira coisa que noto é a mesa posta perfeitamente. Os pratos são de porcelana, as taças parecem de cristal, apesar do lustre ser claramente de vidro. Um toque curioso de nobreza decadente. Mas o mais marcante, naquele instante, não é o lugar… é o cheiro.Carne assada, com certeza, apesar de ter outro cheiro de erva que ainda não sei identificar. O aroma preenche completamente a sala com uma sensação agridoce. Começo a salivar mesmo sem ter tanta fome.Beatrice toma seu lugar à cabeceira da mesa, como fazem os chefes de família. Incrivelmente ela tem uma naturalidade para comandar e parece ficar orgulhosa de poder se sentar ali. James se senta à esquerda dela. Eu, a sua direita. É impossível não notar como as chamas da lareira recém-construída brinca com as sombras sobre seus rostos, especialmente o dela. O brilho da luz a faz parecer ainda mais... bonita.Mal nos sentamos e dois criados surgem. Um deles, visivelmente jovem, com
Quatro meses se passaram desde que comecei a arrumar Rosegate. Provavelmente ninguém vai entender o porquê eu estive sumida, mas dediquei a minha vida e alma nessas terras por 120 dias. Para mim está longe de estar como eu quero e ainda me falta encontrar a cláusula, mas pelo menos comecei a receber alguns ganhos da propriedade. Olga e Alicia decidiram vir comigo. Também contratei outros empregados, principalmente agricultores, para cuidar das plantações e agora minhas lavandas negras que já estão quase em época de colheita. Por sorte, James se manteve em contato comigo e me ajudou financeiramente em algumas ocasiões. Óbvio que como empréstimo. Conde James é a única pessoa além do meu pai e os empregados que sabe que comprei essas terras. O convidei para vir e ele chegará, provavelmente, amanhã. - Já preparei o quarto, senhorita. - diz Olga, limpando uma gota de suor da testa e com algumas mechas do cabelo desalinhadas.Me viro para ela e sorrio. Olga parece até mais contente ao re
O som das rodas da carruagem ecoa pelo pátio de pedra como se quisessem anunciar para todos que eu estava de volta. Desço da carruagem com a ajuda de Olga e Alicia e dou uma olhada geral pela mansão do senhor Montrose. A mansão tem sua beleza, apesar de não chegar nem perto da de Arabelle e muito menos da minha quando ela estiver pronta. Respiro fundo, sentindo aquela sensação de orgulho se apoderar de mim. Eu não estou aqui mais como uma filha submissa. Estou como a proprietária do quinto maior pedaço de terra do reino. Caminho diretamente ao gabinete do meu pai e quando bato na porta e a abro, encontro-o exatamente como imaginava: atrás da mesa de carvalho, com uma expressão séria. Mas quando ele me vê, logo seus olhos se iluminam. Talvez pela saudade que sentiu de mim, ou talvez pela ansiedade em ver o documento que trago comigo. O senhor Montrose se levanta e vem em minha direção sem esperar por minhas palavras. - Querida filha, conseguiste? - pergunta ao olhar para o en
O dia realmente está lindo, ensolarado, faz calor e os pássaros cantam lá fora. A essa altura do dia, a barra do meu vestido já está coberta de sujeira, meus cabelos presos num coque malfeito e o suor escorre pela minha nuca, me lembrando que comprar uma propriedade decadente pode ser mais trabalhoso do que eu imaginava.- Outra goteira. - aponto com a caneta para o teto manchado acima de nós.Olga anota em silêncio enquanto a outra criada, Alice, ergue o queixo para olhar também. Tive que perguntar o nome dela, mas pelo menos ela parece mais simpática e aberta a conversar do que Olga.- A senhorita quer que coloquemos um balde por enquanto? - pergunta Alice, tímida.- Sim. Não que eu ache que vai resolver grande coisa, o piso já está todo apodrecido mesmo… - murmuro, rabiscando no meu caderno.Continuamos andando pelos corredores da ala leste. As paredes até que estão boas, mas os pisos quase todos estão podres. O cheiro de mofo é constante, impregnado. Vez ou outra, faz a gente toss
Lady Arabelle segura delicadamente minhas mãos, como se fossemos velhas amigas. Parece até um pouco cômico para mim o tanto que ela é inocente. - Tem certeza que não quer descansar mais um dia, senhorita Beatrice? - pergunta Arabelle, com a voz doce e os olhos gentis - A senhorita ainda parece um pouco cansada...- Não precisa, obrigada. Já estou muito melhor. - respondo, sorrindo com falsa gentileza - Preciso voltar. Há assuntos que exigem minha atenção… e meu pai deve estar sentindo minha falta.Olho para James, que tem a mesma cara de infelicidade que Arabelle. Seria eu tão querida por eles assim? Ou eles apenas são assim com todo mundo? Me aproximo dele, para me despedir também. - Tchau, meu amigo. - digo a ele, que sorri para mim.- Tchau, minha cara amiga. - responde de volta.Eu realmente gosto dele, porque de todos aqui, ele é o mais real para mim. Apesar de haver um pouco da minha personalidade em James, grande parte do que ele é, representa o que meu amigo foi. Sinto vont
Último capítulo