Um capitão de cruzeiro coreano, uma mocinha atrapalhada e traída quando faltava apenas uma semana para o casamento. Márcia viaja sozinha para aproveitar o cruzeiro de sua lua de mel que nunca aconteceu, após ser traída pelo noivo com quem estava há 10 anos. Mal sabe ela que o capitão do navio, Park, um coreano com um passado obscuro, a conquistaria de um jeito tão avassalador.
Leer másUfa! Finalmente anunciaram o meu navio! Já estou com a bunda dolorida de tanto tempo aqui sentada.
Cruzo apressada o saguão de embarque arrastando minha mala enorme e desajeitada. Fico em uma fila com crianças gritando, famílias e casais alegres por mais alguns minutos e enfim, sigo toda rebolativa para o guichê em que uma mocinha sardenta, sorridente e uniformizada me cumprimenta. Ela confere minuciosamente o meu bilhete e a minha identidade. Aquele “cara/crachá” de sempre.
― Tenha uma excelente viagem, senhora Márcia!
Sorrio de volta e pisco para ela com todo o meu charme.
Eu consigo esconder meus sentimentos muito bem. Parabéns, Márcia!
Passo pelo raio-x, sempre cumprimentando e distribuindo sorrisos e simpatia para os funcionários e ao sair do prédio principal do Porto de Santos, dou de cara com o navio em que passarei minha “quase” Lua de Mel. Quase, pois descobri que o verme do meu noivo, ou melhor, do meu ex-noivo estava me traindo com uma periguete, faltando só uma semana para o nosso casamento.
Minha mãe passou mal, meu pai ficou do meu lado, minha melhor amiga vibrou de alegria, pois detestava o traste e eu… bem, a minha ficha ainda não caiu direito.
Mas se tem uma coisa que eu não farei nunca, jamais, é sofrer e chorar por causa de homem.
E já que a vida me deu esse limão azedo, farei uma bela de uma Margarita!
Então eu vou curtir, vou conhecer gente, vou torrar o pacote de bebidas meu e dele e me dar uma nova chance, afinal, em um cruzeiro em pleno verão brasileiro, o que se espera é encontrar gente bonita e disponível no navio, não é? Assim espero…
Arrasto minha pesada mala cor-de-rosa repleta de chaveiros de anime e outros penduricalhos barulhentos até as escadas que ligam o porto ao interior do navio e quando tento levantá-la do chão para subir, percebo que está tão pesada que me desequilibro e caio para trás. É lógico que isso iria acontecer. Eu com meus saltos enormes! Não poderia esperar outra coisa.
Pronto, penso. Lá vou eu pagar aquele mico gigantesco como de praxe. A minha queda é ridícula! Perna para um lado, braço para o outro e mala no chão. Fecho os olhos já esperando minha bunda se estatelar com a queda no asfalto.
Mas não, do nada sou amparada por um braço forte que me pega por trás, segurando com firmeza a minha cintura.
— Caramba! Como sou desastrada! — digo rindo para disfarçar o vexame.
Quando me viro para agradecer meu benfeitor, eu o vejo.
Um oriental com uns dois metros de altura e o rosto mais lindo que eu já vi, trajando um uniforme branco impecável. Ele é sisudo e tem um ar compenetrado por trás dos óculos que combinam com seu rosto de traços fortes.
Meu Pai do Céu, será que eu estou em um dorama?
Fico sem ação contemplando este rosto que parece talhado em mármore, quando ele franze as sobrancelhas ao me encarar, me solta como se estivesse colocando uma peça delicada em uma prateleira, pega minha mala e se encaminha para o interior do navio me deixando para trás com cara de boba.
— Ei! Aonde você vai com a minha mala?
Dou uma corridinha desengonçada atrás dele. O sol ainda está forte e ofusca meus olhos. Tomo cuidado para não cair de novo. Meus saltos estalam ruidosamente: plec, plec, plec. Eu sabia que não devia ter vindo de salto, mas dane-se, agora já era. Ele coloca minha mala no chão, ajeita os óculos sobre o rosto e se inclina para a frente ligeiramente, me cumprimentando. Sua feição é séria, quase emburrada. Ao se erguer, vira-se para um recepcionista que está logo à entrada do navio e diz algo em outro idioma. É coreano? Acho que sim, afinal, são anos maratonando os mais variados doramas. Sou quase uma expert.
Ele sai rapidamente por um corredor à direita. O recepcionista vem até mim com um sorriso tímido e simpático e pega minha mala.
— A senhorita me acompanhe, por favor. Vou levá-la à sua cabine.
Arregalo os olhos sem graça abanando as mãos em negativa.
— Não, moço! Não precisa! Aquele rapaz já trouxe minha mala aqui para dentro, é o suficiente. Ela tem rodinhas, olha, agora eu consigo levá-la para o meu quarto. — Gesticulo exasperada mostrando as funcionalidades da minha mala gigantesca.
Ele meio sem jeito se aproxima de mim quase cochichando:
— O capitão Park mandou levar a sua mala até a sua cabine. Eu cumpro ordens, senhorita. Queira me acompanhar por favor.
Olho para trás na tentativa de ver para onde o oriental, o tal do capitão Park tinha entrado, mas ele não está mais ao alcance dos meus olhos.
O rapazinho sai em disparada e eu o sigo ligeira logo atrás.
— Você chamou aquele rapaz de capitão Park. Ele trabalha aqui?
O tripulante sacode a cabeça. Ele tem um leve sotaque nordestino.
— Sim, senhora. Ele é o capitão do navio.
— Ah, tá. — Respondi sem saber direito o que dizer.
— E pelo jeito dele, a senhora deve ser bem importante. — Ele piscou para mim. — Não é para qualquer pessoa que o capitão dá ordens de levarmos a bagagem até a cabine, ou para darmos tratamento vip como ele mandou para a senhora.
Oi?
— Como é que é? Tá falando sério?
O rapaz só balança a cabeça.
Ele chama o elevador e param duas senhoras atrás da gente.
— Filhinho, o elevador está subindo?
As mulheres me olham de cima a baixo, curiosas. São duas senhoras de seus 60 e poucos anos. Elas fazem aquele estilo meio peruas, meio chiques. Extremamente maquiadas e com roupas coloridas e leves, naquele estilo inconfundível de turistas.
— Sim, senhora. Estamos indo para o oitavo andar. Para qual andar as senhoras irão?
A de cabelo bem curtinho sacode a mãozinha fina repleta de anéis na cara do rapaz.
— É para lá mesmo que iremos! Olha, que sorte, Marta! Vamos, cuidado para não tropeçar, hein? A gente não tem mais idade para quebrar osso que é difícil de cicatrizar.
As duas se apressam e entram no elevador quando percebem que cedo passagem para elas.
— E o que essa moça linda e loira está fazendo aqui sozinha?
A outra senhora de cabelo cor-de-rosa, isso mesmo, cor-de-rosa, dá uma cotovelada de leve na amiga.
— Tá doida, Bete? Isso é pergunta que se faça?
E se volta para mim com um sorriso amarelo, afofando os cachinhos que a deixam com um ar de poodle de madame.
— Você desculpe a minha amiga, por favor, sabe como é a idade, não é mesmo? A pessoa fica sem filtro.
Eu gosto de cara das duas amigas e respondo com um sorriso divertido.
— Estou aqui para curar uma dor de cotovelo daquelas e tenho a sensação de que vou conseguir.
Elas se entreolham por alguns segundos. Pronto, criei um climão. Eu e minha boca de caçapa. Mas não, as mulheres caem na gargalhada fazendo barulho no elevador.
— Essa é das minhas! A fila anda, meu amor! E qual é o seu nomezinho mesmo?
— Eu sou a Márcia e vocês são Bete e Marta, não é?
Digo apontando para as donas dos nomes respectivamente.
— Que memória boa, menina! Queria ter uma memória assim.
Sorrio novamente para elas, e baixo os olhos, conferindo minhas sandálias, mas agora em silêncio. Falando em memória, penso no tal capitão que me socorreu a pouco. Ele tem algo familiar, me lembra alguém. É uma sensação passageira, um déjà-vu. Devo estar assistindo doramas demais.
— Oitavo andar, senhorita.
O recepcionista sai ligeiro do elevador e eu tento acompanhá-lo dando uma corridinha enquanto me equilibro sobre meus saltos.
Ele estanca diante de uma porta após percorrer um longo e frio corredor acarpetado e de virar à direita e à esquerda algumas vezes.
— Chegamos, senhorita. Espero que a senhora tenha uma experiência incrível em nosso navio.
Ele acena com a cabeça e sai andando apressado.
— Obrigada! — Grito.
Aproximo o cruise card do leitor da porta que magicamente se abre. Antes que eu possa entrar, as senhorinhas se aproximam rapidamente de mim, bufando.
— Nossa, você é acelerada, hein? Olha só, Marta! Somos vizinhas da Márcia!
— Bete, deixa de ser inconveniente. A moça está até incomodada.
— Não, imagina! Estou feliz em conhecer vocês. É bom ter companhia, assim, não me sentirei sozinha aqui no navio.
Marta olha para mim apertando os olhinhos de cobrinha.
— Pobrezinha. Se é assim, pode contar conosco, que solidão você não vai passar, não é Bete? — a amiga acena afirmativamente com a cabeça balançando os brincos coloridos e volumosos.
— Muito obrigada pelo acolhimento.
Sorrio para as duas e entro em minha cabine.
Estamos sentados, eu e o delegado Cauã, de frente para o monitor do computador de Lucas em que ele vai passar a gravação das câmeras de segurança da joalheria.Eu estou com frio e tremendo de nervoso. E eu sei que o que sinto é psicológico. A vontade que eu tenho é de pegar a Na-Ri e de jogá-la ao mar, mas é óbvio que eu não cometerei tamanha loucura, mas só de pensar no mal que ela está fazendo para a Márcia, me embrulha o estômago e me faz querer revidar cada ação que ela realizou.— Olha! É a Márcia! Digo empolgado demais. — Vê-la deixa meu coração quente e meu corpo animado. Nem parece que ela está desaparecida há horas. Como as imagens enganam o nosso cérebro!Ela entra na joalheria e fica olhando as joias. Ela chama a vendedora, aponta para uma das peças e elas conversam um pouco. Márcia faz uma expressão como se estivesse chateada, agradece e sai da loja.— Ela nem tirou a joia de dentro da vitrine para mostrar a ela. — Comento. — A Na-Ri vai pagar caro por isso.— Calma, capit
— A senhorita está me arrumando um problemão, sabe?O homem finalmente fala comigo após ficar alguns minutos de pé me olhando no escuro. Ele saca de um dos bolsos um maço de cigarros e o acende, e finalmente consigo ver o rosto dele, mesmo que mal iluminado.O homem é ruivo e bem bonitão, mas mal encarado e não parece ser muito amigo de um banho. Pelo sotaque, parece americano.— E que problemão é esse? Moço, eu só sou uma passageira. Quero curtir minha viagem e voltar para a minha casa, só isso. Eu nem conheço o senhor.Ele me analisa por uns instantes e puxa mais uma vez o cigarro com a boca, fazendo com que a brasa ilumine seu rosto de uma maneira sombria. De repente ele me parece familiar, não sei porque.O homem se senta no chão diante da porta, pelo jeito, não vai me deixar sair daqui mesmo. Eu tenho que tentar trazê-lo para mim, para fazer com que ele me deixe sair deste lugar.— Tem uma moça aqui no navio que não gosta da senhorita. Esta é a segunda vez que ela me envolve nos
— Oficial Ulrich, obrigado por vir tão rapidamente. Temos duas ocorrências no navio. A primeira e mais importante, é o desaparecimento de uma passageira, que é a minha namorada.Ulrich estufa o peito tão logo eu digo estas palavras.— Alguma ideia de onde ela possa estar, senhor?Ajeito os óculos sobre meu rosto e me levanto para abrir as janelas do meu gabinete. Faço estes gestos, que Juan já conhece muito bem e está calmamente aguardando eu terminar, para que eu pense melhor no que direi para não criar situações desagradáveis, ainda mais com a perigosa da Na-Ri aqui dentro. Quero estudar todos os seus movimentos e reações.— Antes de lhe passar esta informação, quero que você, Juan, busque o delegado, o senhor Cauã, que as amigas da Márcia mencionaram.Mal passo este comando para o Juan e escuto três batidas à porta.TOC TOC TOCJuan sai de onde está e abre a porta para o nosso visitante. Ele se demora alguns segundos e retorna com um ar mais alegre e positivo.— Não precisamos mais
Que dor de cabeça violenta. Abro os olhos que estão latejando e vejo tudo rodar. Onde é que estou mesmo? Aliás, o que foi que aconteceu? Minhas lembranças estão embaralhadas, parece que eu tomei um porre de bebida barata.Apoio meus braços para poder me erguer. Estou deitada em uma cama beliche, na parte de baixo. Estou sobre um colchão duro e velho, sem lençol e sem travesseiro. É um quartinho limpo, porém escuro. Tem cheiro de umidade e de coisas guardadas há muito tempo. E aqui faz um silêncio absoluto. Tento me levantar da cama, mas tudo começa a rodar novamente e me sento para não cair.Pensa, Márcia. Olho para o alto para chafurdar as lembranças e tentar entender o que estou fazendo aqui. Joalheria. Apagão. Kim Na-Ri. Arregalo os olhos e é como se eu estivesse fazendo um download de tudo o que me aconteceu recentemente.— Meu Deus! Foi isso! A Kim Na-Ri me trouxe para cá!Eu me lembro agora das exatas palavras que ela me disse com aquela voz sombria: “Acha que me esqueci de você
A certeza e a altivez de Na-Ri são impressionantes. Observo a tripulante ao seu lado. Ela trabalha como vendedora na joalheria. É evidente que está aqui contra a vontade. É uma jovem que entrou para o navio este ano e tem pouca experiência. Sua postura é a de um passarinho se encolhendo escondido da chuva com medo dos grossos pingos baterem em suas asas. Está oficialmente encerrada a minha amizade com a Na-Ri, mas tenho que me manter aparentemente tranquilo para não ter problemas legais, no entanto, a minha vontade é de partir para a violência.— Isso é algo que deve ser visto com a segurança do navio. Ademais, a senhorita Márcia não está presente e é necessário encontrá-la antes de se tomar qualquer atitude.Digo e bato a porta atrás de mim. Não vou dar a ela a possibilidade de entrar no quarto da Márcia, se é que ela já não fez isso. Ela se interpõe entre mim e o corredor para o qual eu tento me dirigir. A minha paciência está por um fio.— O que é agora, Na-Ri?Ela me encara desafi
“Park Ji-Hoon”Faz meia hora que estou aqui no restaurante e nada da Márcia aparecer. Já mandei mensagem e ela também não respondeu. O que pode estar acontecendo? Será que ela está passando mal? Será que está indisposta?Chamo o responsável pelo Iate Club.— Pois não, senhor capitão.— O quarto em que pernoitei. A minha namorada ficou lá depois que eu saí. Ela já deixou o quarto?— Sim senhor. Eu recebi pessoalmente o cruise card das mãos dela.— E estava tudo bem com ela quando saiu?— Perfeitamente. Ela estava até bastante sorridente.— Muito obrigado.O homem sai para seus afazeres. Algo aconteceu. Vou à cabine dela.Hoje cedo, por volta das cinco horas da manhã meu celular se encheu de mensagens sobre uma pane elétrica em um dos motores, corri para lá, nem pude tomar café da manhã tranquilamente com a Márcia, mas, a princípio, tudo estava na mais perfeita ordem.Dei os comandos, chamei os mecânicos, inclusive aquele que estava com a Na-Ri no dia em que me embebedei. O tal do Rober
Último capítulo