Liz Montesi achou que o pior do dia seria flagrar o namorado com outra. Estava errada. Horas depois, é praticamente vendida a Ettore Bianchi, o homem que ela amou, feriu e perdeu há três anos. Ele precisa de uma esposa para assumir de vez o controle da empresa. Ela, de um acordo que salve os negócios da família. Um casamento por interesse. Um passado que ainda sangra em ambos. Agora, presos sob o mesmo teto, precisam fingir um amor que já foi real. Mas a linha entre atuação e verdade é fina — e cada toque pode reacender tudo o que tentaram enterrar... inclusive verdades que nenhum dos dois estão prontos para enfrentar.
Ler mais— Tem certeza de que é uma boa ideia fazer uma surpresa, Liz? — minha melhor amiga pergunta, pela quarta vez só nessa ligação. — Sei lá… surpresas nem sempre acabam bem. E, sinceramente? Não confio nesse seu namorado.
— Você implica com o Marco desde que o conheceu, Giulia. Admita, você o odeia porque ele é sério demais, diferente de você. — E você devia desconfiar justamente por isso. — Você disse que estava feliz por mim — sussurro, estacionando em frente à empresa. — E estou, mas… só tome cuidado, ok? Gosto de ver esse brilho voltando aos seus olhos, mas odeio imaginar que alguém possa apagá-lo de novo. Sorrindo diante da proteção excessiva da minha amiga, desligo o motor do carro. Após tudo o que aconteceu há três anos, o simples fato de me envolver com outro homem já é quase um ato de coragem. — Te ligo mais tarde, amiga. Vou tentar convencê-lo a almoçar comigo. Quero comemorar esses seis meses juntos. — Bem, boa sorte, amiga. Encerro a ligação e respiro fundo antes de pegar minha bolsa para sair do carro. A recepcionista me reconhece rapidamente. Um aceno de cabeça e pronto: acesso liberado. Subo pelo elevador sozinha, ensaiando mentalmente o discurso. Nada muito romântico, só… humano. Uma tentativa de, enfim, me entregar completamente a essa relação. Logo, o elevador pára no oitavo andar. Ao virar o corredor, percebo que a secretária dele não está na mesa dela. A maníaca por controle, como eu a apelidei. A mulher faz questão de me anunciar, como se eu fosse uma desconhecida, mesmo sabendo que sou namorada do chefe dela. — Que sorte a minha — murmuro, sorrindo feito boba. Quando finalmente paro em frente à porta do escritório dele, meu sorriso se amplia ao imaginar a surpresa dele ao me ver ali. No entanto, quando empurro a porta, a cena que encontro me faz congelar e meu sorriso desaparece. A secretária está sentada sobre a mesa dele, com a saia enrolada na cintura e a blusa aberta. Marco está entre as pernas dela, com a calça arriada. Ambos ofegantes. O tempo para enquanto minha mente se recusa a processar o que os meus olhos estão vendo. Ela me vê primeiro. Então, abre um sorriso satisfeito antes de descer da mesa e sair da sala, ajustando a roupa, sem qualquer pressa. Marco apenas me encara, como se eu tivesse atrapalhado sua diversão, fechando o zíper da calça com uma calma irritante. — Liz… — Não — corto, finalmente encontrando minha voz. — Deixa eu adivinhar. Vai dizer que não é o que parece? Solto uma risada baixa, amarga, mesmo sentindo o estômago embrulhar pelo cheiro de sexo que continua no ar. — Ou vai dizer que a carne foi fraca? Vamos lá, pode começar suas mentiras. — Você se ilude fácil demais, ragazza — responde, num tom calmo e quase entediado, como se tivesse razão em estar assim. — É irônico ouvir isso do homem que dizia que me amava sempre que eu pensava em desistir. — Chega a ser adorável o quanto você acreditou nisso — ele rebate, sorrindo enquanto se encosta na mesa e cruza os braços. — E, para ser sincero, bem inocente da sua parte. — E por que eu não acreditaria? Você… — minha voz falha. — Você me fez acreditar que eu era especial. — E era, claro. Uma Montesi entregue de bandeja para mim. Ou esqueceu que seu pai praticamente me empurrou você? Eu só aceitei a oferta. — Você aceitou ficar comigo por conveniência? — pergunto, sentindo meus olhos arderem com as lágrimas. — Claro. Não sou burro. — Ele dá de ombros. — Estar com você me deu acesso a contratos e pessoas importantes. Mas agora… bom, você não teria serventia por muito tempo mesmo. — O que você… Antes que eu consiga completar a frase, meu celular toca, me interrompendo. O nome do meu pai aparece na tela. Atendo automaticamente. — Onde você está? — meu pai pergunta, impaciente. — Venha para a empresa. AGORA! — Hoje é minha folga, pai — respondo, sem desviar os olhos do traidor à minha frente. — E estou ocupada. — Se não estiver aqui em quinze minutos, as consequências serão graves para você. A ligação é encerrada antes que eu possa protestar. Típico. — Papai está chamando, principessa — Marco debocha, sentando-se na própria cadeira. — Podemos continuar essa conversa outra hora. Quem sabe até negociar pelos seus… serviços, já que em breve seu sobrenome não vai valer muito. Encaro o homem à minha frente, tranquilo, como se não tivesse acabado com o pouco que ainda havia em mim. Engulo o choro como se fosse veneno. Porque é isso que Marco foi: um veneno doce, bem disfarçado, servido a mim pelo meu próprio pai. E eu fui a idiota que bebeu o copo inteiro, acreditando que era amor. — Você é podre, Marco — murmuro, dando um passo para trás. Ele apenas sorri. Aquele sorriso que intensifica o nojo que sinto. Nojo ao imaginar que, nos últimos seis meses, fui usada como um cartão de visitas. Saio da sala apressadamente, piscando rápido para conter as lágrimas que ameaçam cair. Quando fecho a porta, sinto a ironia da situação me atingir com força. Há três anos, fiz alguém sentir exatamente essa dor. A dor da traição. Isso é carma? Paro em frente ao elevador, apertando o botão com força, desesperada para sair daqui. Então ouço passos se aproximando e me viro. A secretária surge, sorrindo como se tivesse vencido um troféu. — Uma pena você descobrir assim — diz, encostando na parede ao meu lado. — Mas achei que devia deixar claro que não foi a primeira vez. Ele tem um fogo que… meu Deus. É difícil de apagar. Ela inclina a cabeça, me lançando um olhar maldoso, fingindo inocência. — Ah, é. Você não sabe disso, né? — conclui, pisando mais fundo na ferida. O nó na minha garganta triplica, mas me recuso a dar esse prazer a ela. Engulo o choro e forço um sorriso tranquilo. — Acabou? — digo, mantendo a voz firme. — Então volta lá e termina seu turno… enquanto ainda é a escolhida da vez. O elevador chega antes que ela possa responder, mas, ao menos, minhas palavras fazem seu sorriso diminuir. Quando as portas se fecham, solto o ar que nem percebi que estava prendendo e encaro meu reflexo. Uma risada amarga escapa. Mais de dois anos para finalmente me envolver com alguém e, quando acontece… dá nisso. Chega a ser irônico. — O castigo demora, mas uma hora ele vem — murmuro, finalmente saindo do elevador. Afinal, essa é a tal lei do retorno, não é? Estou provando do mesmo veneno que ofereci a outro. E o mais cruel? Eu sabia que um dia isso poderia voltar para mim. Só não achei que fosse doer tanto. Entro no carro e ligo o motor no automático. Dirijo sem realmente prestar atenção, sendo perseguida pelas lembranças. A cena. As palavras cruéis. A constatação de que fui apenas… nada. Quando percebo, já estou estacionando em frente à Montesi & Co. Saio do carro e atravesso a entrada sem olhar para ninguém, tentando não desmoronar antes da hora. O elevador me leva até o andar da diretoria. Assim que viro o corredor, vejo meu pai andando de um lado para o outro, impaciente como sempre. — Você está atrasada — ele dispara, sem sequer me cumprimentar. — Te dei quinze minutos! — Desculpe, pai. Eu estava… — Não quero ouvir suas desculpas — ele me corta, fazendo um gesto com a cabeça. — Temos assuntos mais urgentes para tratar. Sem perder tempo, ele caminha até a sala de reuniões, e eu o sigo, sem entender nada. Ele abre a porta e indica que eu entre. E então meu mundo desaba pela segunda vez em menos de uma hora. Minhas pernas travam, e o ar some dos meus pulmões no instante em que o vejo. Ettore Bianchi. O homem que amei. O homem que traí. O homem que me odeia como se o tempo nunca tivesse passado.A Igreja de San Giuseppe está lotada.Do carro, consigo ver a multidão reunida do lado de fora: homens em ternos impecáveis, mulheres em vestidos elegantes, todos aguardando ansiosamente o momento.A presença da famiglia Villani transforma qualquer evento em uma demonstração de poder e tradição.— Uau… — meu pai murmura, observando pela janela. — Quantas pessoas…— Casamentos sicilianos são assim — explico baixinho. — Uma celebração para toda a comunidade.Ele assente, tenso, mas permanece em silêncio.O veículo para diante dos degraus da igreja. Imediatamente, dois homens de Don Matteo se aproximam para abrir as portas.— Pronta, principessa? — meu pai pergunta, respirando fundo.— Pronta.Descemos do carro e um murmúrio admirado percorre a multidão. Ajeito o véu uma última vez e aceito o braço dele.As portas duplas da igreja se abrem, revelando o interior iluminado por centenas de velas. A marcha nupcial ecoa e todos os presentes se levantam.Meu coração dispara quando vejo Lorenzo
O mundo para.Por um momento infinito, tudo ao meu redor desaparece: as vozes das mulheres, o barulho dos preparativos no andar de baixo, até mesmo as batidas do meu próprio coração.Existe somente meu pai, parado na porta, me olhando como se tivesse visto um fantasma.— Papà… — sussurro, mal conseguindo formar a palavra.Ele não responde de imediato. Apenas me observa, absorvendo cada detalhe: o vestido, o véu delicado, o colar da fênix brilhando contra minha pele.— Você está… — sua voz falha, e ele precisa engolir antes de continuar. — Você está linda, principessa.As lágrimas que eu vinha segurando há horas finalmente transbordam.— Eu pensei… que o senhor não viria — murmuro, dando um passo hesitante em sua direção.— Eu também pensei que não viria — ele admite, baixando o olhar.Giovanna, Elisa, tia Giulia e Emily se entreolham e, entendendo o peso do momento, saem discretamente do quarto, levando Giuseppe com elas.O silêncio que se instala entre nós é pesado. Carregado de mese
Hoje é o meu dia de casamento.Eu deveria estar radiante, perdida na euforia de me tornar oficialmente esposa do homem que amo. E estou feliz. Profundamente, verdadeiramente feliz.Mas com a felicidade, há uma dor constante que me acompanha há meses, uma dor que nem a alegria de hoje consegue apagar.Meu pai não estará aqui.Cinco meses se passaram desde aquele jantar desastroso.Cinco meses desde que vi meu pai sair pela porta dos Villani com a expressão mais fria que já presenciei.E há dois meses, me mudei definitivamente para a Sicília.Tentei voltar à rotina, ao trabalho. Mas bastaram duas semanas de frieza e distanciamento para eu entender: não havia mais espaço para mim lá.Não enquanto eu fosse noiva de Lorenzo Villani.Então, fiz as malas, entreguei minha carta de demissão e vim para cá. Para o meu novo lar. Minha nova vida.Emily e Pietro vêm me visitar sempre que podem. Pietro, inclusive, chegou ontem e vai me acompanhar até o altar, já que…Paro o pensamento antes que ele
O silêncio que se segue ao meu grito é ensurdecedor.Meu pai recua um passo, mas o olhar permanece furioso. Os homens param onde estão e voltam-se para Don Matteo, aguardando um sinal.— Papà — digo, tentando controlar a voz trêmula —, eu sei que é difícil de aceitar. Sei que não era isso que o senhor imaginava para mim.— Você não faz ideia do que imagino para você, Aurora — ele responde, e posso ouvir a dor por trás da raiva. — Imagino você viva. Imagino você segura. Não casada com alguém que pode ser morto a qualquer momento por seus próprios inimigos.— Lorenzo não vai morrer. Ele é…— É o quê? Imortal? — Ele ri, amargo. — Aurora, você acha que somos ingênuos sobre o que acontece nesse mundo? Conhecemos as histórias.— E eu conheço a realidade — retruco, enxugando as lágrimas que não param de cair. — Vivo essa realidade há mais de um ano.— Um ano? — minha mãe sussurra, incrédula. — Há um ano, você sabe… e nunca nos contou?— Porque sabia que seria exatamente assim — respondo, apo
Don Matteo fala algo em tom baixo com os homens ao seu lado. Mesmo sem elevar a voz, a autoridade é inconfundível.— Buonasera — cumprimenta, num tom que imediatamente atrai a atenção de todos na sala.— Buonasera, Matteo — meu pai responde, estendendo a mão. — Obrigado por nos receber em sua casa.— O prazer é meu, Ettore — Don Matteo diz, retribuindo o gesto. — A família da futura nora é sempre bem-vinda aqui.Desvio o olhar para minha mãe, que observa tudo ao redor. A curiosidade brilha nos olhos dela, fixos nos homens posicionados estrategicamente na sala.— Será hoje, certo? — Emily sussurra quando meus pais se distraem conversando com Matteo e Giovanna.— Sim — respondo no mesmo tom, sentindo o estômago revirar. — Só espero… que dê tudo certo.— Vai dar, ragazza — Lorenzo murmura, acariciando meus dedos. — Vai dar.Don Matteo bate as mãos uma vez, chamando a atenção geral.— Bene, famiglia — anuncia, gesticulando para a porta. — Vamos para a sala de jantar. Há muito o que celebr
Oito meses se passaram desde a última vez que vi Caterina, e finalmente conseguimos ter um pouco de paz. Também estabelecemos uma rotina que funciona para nós dois: passamos duas semanas na Sicília, quando Lorenzo precisa cuidar dos negócios da famiglia, e o restante do tempo ficamos em Milão. O mais importante é que, quando estamos juntos, tudo parece se encaixar. Meus pais conheceram Don Matteo e Giovanna no meu aniversário em Milão, há três meses, mas apenas como “os pais de Lorenzo”. Planejávamos contar toda a verdade naquele dia, mas hesitei e acabamos adiando mais uma vez. Funcionou bem até duas semanas atrás, quando Lorenzo me pediu em casamento durante um jantar romântico em nossa casa. Não foi nada grandioso, só nós dois. Ele se ajoelhou com um anel que pertenceu à avó dele e disse que não conseguia imaginar um futuro sem mim. Que queria formalizar nosso relacionamento. Aceitei sem pensar duas vezes, mas naquele instante soube: não dá mais para adiar. É impossível pla
Último capítulo