Anos atrás, Luna foi humilhada diante de toda a universidade pelo homem que mais odiava — Caio Ventura: arrogante, cruel e intocável. Desde então, ela prometeu nunca mais deixar que alguém a diminuísse. Agora, adulta e em busca de recomeço, Luna aceita às pressas um emprego como cuidadora de um paciente misterioso e milionário. O destino ri da sua promessa: o homem na cadeira de rodas é ninguém menos que Caio Ventura. Mais frio, mais amargo — e completamente dependente dela. Obrigados a conviver sob o mesmo teto por força de um contrato, Luna e Caio se enfrentam todos os dias como se estivessem em guerra. Mas a linha entre ódio e desejo é perigosa e, às vezes, quase imperceptível. Entre provocações, tensão crescente e segredos enterrados, a antiga mágoa dá lugar a algo mais profundo... e muito mais arriscado. Só que Caio esconde muito mais do que sua condição física — e Luna pode descobrir tarde demais que, para se libertar do passado, precisará encarar a verdade sobre o homem que jurou destruir... e acabou desejando.
Ler maisPrólogo – Capítulo 0
[Flashback – Seis anos atrás]
— Luna! Está todo mundo olhando! — sussurrou a amiga, tentando cobri-la com o casaco.
Mas já era tarde demais. As risadas ecoavam pelas paredes da faculdade como navalhas. Gritavam seu nome, zombavam da sua roupa, da sua ingenuidade... e da carta de amor que ela tinha deixado no armário dele.Caio Ventura estava no centro da roda, alto, impecável, com aquele sorriso cruel estampado no rosto. Segurava a carta nas mãos como se fosse um troféu ridículo.
— Você realmente achou que eu ia me interessar por você? — ele perguntou, a voz carregada de desprezo. — Isso aqui é patético.
O coração de Luna se partiu ali, diante de todos. Não pela rejeição. Mas pela forma.
Pelo prazer que ele sentia em humilhá-la.
Pelos risos dos colegas.
Pela vergonha que colou nela como uma cicatriz.
Naquela noite, jurou nunca mais olhar na cara de Caio Ventura.
Nem em um milhão de anos imaginaria que, seis anos depois, ele estaria sentado diante dela. Em uma cadeira de rodas. E precisando dos seus cuidados.
O destino tem um senso de humor perverso.
E Luna ainda não sabia que aquele reencontro mudaria tudo.
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Capítulo 1 – Contrato com o Passado
A folha tremia entre os dedos de Luna, mas não era pelo peso do papel — e sim pelo peso das escolhas. O letreiro da Agência Vitae de Cuidadores Profissionais ainda brilhava no reflexo da janela enquanto ela ajeitava a pasta no colo e tentava respirar fundo.
Depois de meses de entrevistas, recusas e trabalhos temporários, aquela proposta parecia um milagre. Ou uma armadilha bem disfarçada.
— Você tem um ótimo histórico — dissera a supervisora, uma mulher seca de blazer azul-marinho, que não sorria com os olhos. — Mas esta vaga exige discrição absoluta.
— E o que exatamente significa “paciente de alta complexidade”? — Luna perguntou, tentando parecer segura. — Ele é... reservado. Rígido. Mora sozinho numa propriedade isolada. Não recebe visitas. E não aceita cuidadores há meses. Mas hoje, por algum motivo, ele pediu para ver currículos. — E... ele escolheu o meu? — Na verdade, ele viu seu nome e pediu para que fosse você. Pessoalmente.Luna franziu a testa.
Ela não conhecia ninguém influente. Não fora enfermeira de nenhuma celebridade. E não tinha parente rico. Algo ali não fazia sentido.— Quem é ele? — perguntou.
A mulher apenas entregou um cartão. Um endereço era num condomínio de bairro nobre de Vinhedo, sem nome, sem pista alguma. — Vá. Hoje. Ele te espera às 17h. Se aceitar, o contrato é imediato.O portão da mansão se abriu lentamente quando ela chegou. A propriedade era grande, mas não ostentosa — cercada de jardins bem cuidados, fontes silenciosas, esculturas discretas. Mas o que chamava a atenção era o silêncio.
Não havia música. Nem vozes. Nem risos.
Tudo ali parecia estagnado no tempo.O mordomo surgiu na porta com movimentos precisos, medidos.
— Boa tarde. A senhorita Luna, correto? — Sim. — O senhor Ventura a espera na sala oeste.O coração de Luna parou por um segundo.
Ventura?
Não podia ser. Era um sobrenome comum. Não podia ser ele.Ela seguiu o homem pelos corredores amplos. Os quadros nas paredes mostravam paisagens nebulosas e rostos que pareciam julgá-la. O ar era gelado, e o silêncio só fazia o som dos seus passos ecoar mais forte.
Quando entrou na sala, a luz atravessava as janelas altas e dourava o ambiente com um tom quase sacro. E ali estava ele — de costas, na cadeira de rodas, diante de uma lareira apagada.
O som da porta se fechando fez o homem girar lentamente a cadeira de rodas.
O tempo parou.
Luna sentiu o estômago afundar.
Os cabelos mais curtos, o maxilar mais marcado, os olhos ainda mais frios. Mas era ele.
Caio Ventura.— Olha só... — ele disse, com aquele meio sorriso que sempre soou como veneno. — Quanto tempo, Luna.
Ela não respondeu. Só ficou ali, em pé, com as mãos trêmulas e a mente tentando aceitar que o destino tinha mesmo um senso de humor macabro.
— Você não vai dizer nada? Achei que estaria mais... surpresa.
— Estou. Só... tentando entender o que você quer de mim. — Cuidados. — Ele apontou para as pernas. — Como pode ver, não estou mais no meu auge.Luna se aproximou um passo.
— Por que eu? Depois de tudo? Você tem dezenas de profissionais à disposição. — E nenhum deles me interessa. Gosto de desafios.Ela cerrou os punhos.
— Eu não sou um brinquedo. — Não. Você é uma enfermeira que precisa de dinheiro. E eu sou um inválido solitário que precisa de cuidados. Somos perfeitos um para o outro.O sarcasmo dele doía mais que os anos que os separavam.
Ela olhou para a cadeira, depois para os olhos dele. E, pela primeira vez, notou algo além da arrogância: havia raiva. Havia mágoa. E talvez, muito talvez... havia dor.
— Eu jurei nunca mais olhar na sua cara, Caio.
— E eu jurei nunca mais precisar de ninguém. — Ele se inclinou para frente. — Mas cá estamos. Que tal quebrarmos nossos votos juntos?Ela queria ir embora. Mas não foi.
Porque por trás de toda aquela tensão havia algo que ela precisava mais do que orgulho: respostas.
— Qual é a condição?
— Um mês. Vinte e quatro horas por dia. Você mora aqui. Recebe dobrado. Mas... não pergunta. Não invade. Não sente pena.Luna respirou fundo.
Se aceitasse, não seria apenas um emprego.
Seria uma guerra.
E ela estava pronta para lutar.
— Traga o contrato — disse, finalmente. — Eu fico.
Caio sorriu.
E pela primeira vez, em muito tempo, ela teve medo do futuro.Mas não recuou.
A cidade estava mais fria naquele fim de tarde. O vento soprava entre os prédios como se anunciasse mudança — não da estação, mas da alma. Uma brisa que levava embora o que já não cabia, e deixava espaço para o que talvez ainda pudesse florescer.Luna caminhava devagar, com as mãos dentro dos bolsos do casaco. Passava pela praça onde crianças corriam em um mundo à parte, rindo alto como quem nunca teve o coração quebrado. Os galhos das árvores se curvavam com o vento, e o céu, tingido de âmbar, parecia respirar com ela.Ela não sabia se aquela decisão era um começo, um fim ou só um ponto de pausa entre as duas coisas. Mas sabia que precisava estar ali. Precisava encarar o que ainda morava dentro dela. Mesmo que doesse. Mesmo que não desse em nada.O campo estava logo à frente, o portão entreaberto como da última vez. O mesmo lugar onde tudo começou. Onde Caio caiu. Onde os sonhos, antes tão altos, colidiram com o chão. Onde ela o amou em silêncio — e depois, em voz alta — até não sabe
A casa da avó de Luna, encravada nas colinas verdes de Minas, parecia parada no tempo. Cada detalhe — o rangido do portão de madeira, o cheiro de café coado na hora, o som das cigarras ao entardecer — fazia parte de uma memória viva, como se o tempo ali se recusasse a seguir em frente.Havia algo reconfortante na rotina daquela pequena cidade, nos dias simples, nas manhãs sem pressa. Luna havia fugido para ali tentando silenciar os ruídos do passado, como quem se esconde de si mesma entre os muros da infância. A avó compreendia seu silêncio e respeitava suas pausas. Às vezes conversavam, às vezes apenas dividiam o mesmo espaço em silêncio, com o rádio tocando modinhas antigas enquanto a chaleira apitava.O dia já se esvaía quando Luna voltou da padaria da esquina com um saquinho de pão de queijo ainda quente na mão. Caminhava devagar, como quem tentava absorver a última luz do sol. Ao dobrar a esquina de casa, parou de súbito.Gabriela estava sentada na varanda.O coração de Luna deu
O papel estava sobre a mesa há dias. Branco. Intacto. Intimidador.Caio encarava aquela folha como quem encara um espelho. A caneta estava ao lado, mas as palavras… ainda não estavam prontas. O silêncio da sala o engolia. O som distante de uma bola quicando no campo ao fundo contrastava com o turbilhão dentro dele. Escrever aquela carta parecia mais difícil do que enfrentar uma final de campeonato. Porque, ali, não havia torcida. Não havia aplauso. Só a verdade nua, dolorida e urgente.Ele havia passado as últimas semanas reunindo informações, cruzando conversas antigas, revendo vídeos, escutando áudios antigos com os ouvidos e com o coração. Gabriela, como sempre, tinha sido firme, leal, uma ponte entre o caos e a lucidez. Foi com a ajuda dela que ele finalmente conseguiu o que precisava: a confirmação de que Marina e Roberto Arcanjo haviam se encontrado diversas vezes antes da matéria que destruiu sua vida e a de Luna.Não eram apenas encontros casuais.Eram reuniões. Estratégicas.
Era uma manhã fria em Minas, daquelas em que o cheiro de café e pão na chapa parece mais acolhedor que qualquer cobertor. Mas o sol, teimoso como os corações que não desistem, tentava abrir caminho entre as nuvens densas, lançando feixes dourados sobre a varanda da casa da avó de Luna. O ar cheirava a terra úmida e a silêncio.Luna terminava de coar o café, vestida com um moletom antigo e os cabelos presos de qualquer jeito. Colocou a caneca sobre a mesa de madeira desgastada quando o celular vibrou. Um número desconhecido.— Alô?— Senhorita Luna Almeida? — disse uma voz feminina, profissional, mas gentil.— Sim, é ela.— Aqui é Clara Rezende, da produção do Congresso Nacional de Saúde Coletiva. Fomos indicados ao seu nome por Gabriela Nunes.Luna se sentou devagar, o coração repentinamente atento.— Eu… certo… posso ajudar?— Gostaríamos de convidá-la para compor o painel “Injustiçadas pela Mídia: A Reconstrução das Mulheres Silenciadas”. A sua trajetória tem inspirado muitas profis
O avião tocou o solo em Guarulhos sob uma garoa fina, quase simbólica. Caio olhava pela janela como se fosse a primeira vez que pisava no Brasil. A cidade parecia embaçada, distante, como se houvesse uma camada entre ele e tudo que deixara para trás. Não trazia com ele assessores, imprensa, nem malas caras — apenas uma mochila simples e o caderno onde vinha escrevendo nas últimas semanas, preenchido com pensamentos, confissões e páginas que jamais seriam publicadas.Passara um mês fora. Viajara para Portugal, depois Espanha, depois o interior da França. Não por turismo, mas por silêncio. Andava pelas ruas de paralelepípedo como quem busca um eco da própria alma. Entrava em cafés pequenos, conversava com desconhecidos, observava idosos jogando cartas nos parques. Precisava se ouvir. E se perdoar.E agora, enfim, estava de volta.Mas não era o mesmo homem que partiu.Enquanto isso, Marina perdia o controle da própria imagem. Cada tentativa de reação parecia acelerar sua queda. A denúnci
O Brasil inteiro assistia. As redes estavam em ebulição desde cedo, os principais portais noticiavam com manchetes chamativas a presença de Luna Almeida em um dos programas de maior audiência da TV nacional. O tema era "Vozes silenciadas", e Luna era a convidada principal.Ela chegou cedo, acompanhada por Gabriela, que ainda tentava convencê-la a desistir da entrevista.— Você não precisa se expor assim, Luna… — disse, aflita. — Já conseguiu tudo o que precisava: justiça, reconhecimento. Agora pode sumir dos holofotes.Mas Luna estava irredutível. O olhar calmo escondia uma decisão inabalável.— Não quero mais ser sombra. Quero ser voz. Por mim, e por outras como eu.Vestia um vestido azul-marinho simples, de linhas retas. Os cabelos estavam presos em um coque baixo, o rosto sem exageros, apenas com a naturalidade que lhe era própria. Não havia personagem, nem mise-en-scène. Havia apenas ela, inteira, disposta a ser escutada.Quando as câmeras se acenderam, o país parou. A hashtag com
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