Mundo ficciónIniciar sesiónSerá que até os monstros podem amar… sem destruir tudo ao redor? Anderson Silveira aprendeu cedo que alguns sentimentos, quando expostos, podem virar armas contra quem os carrega. No ensino médio, ao confessar seu amor por Samanta Palmer, a garota ruiva que parecia iluminar corredores inteiros — ele foi exposto, ridicularizado e quebrado diante de todos. A humilhação deixou marcas profundas, e algo dentro dele mudou completamente. A partir daquele dia, Anderson deixou de ser apenas um garoto tímido. Nas sombras do próprio peito, nasceu um monstro feito de raiva silenciosa, de impulsos que ele não compreendia e de uma escuridão que jamais pediu para sentir. Anos depois, ele se tornou um homem disciplinado, respeitado e aparentemente em equilíbrio. Mas o passado, quando não é curado, apenas se disfarça. E o dele estava prestes a bater novamente à sua porta — na forma de Samanta. O reencontro deles reacende tudo o que ambos lutaram para enterrar. Agora, os dois precisam atravessar suas sombras, enfrentar o que se tornaram e decidir se é possível construir algo onde antes só havia ruína. Porque às vezes, amar não é sobre luz. Às vezes, é sobre reconhecer a escuridão que existe em cada um — e, mesmo assim, permanecer.
Leer másUm dos melhores alfaiates de Caxias finalizou os últimos ajustes no smoking azul-turquesa de Anderson, que exibia um sorriso radiante por ter como par a garota mais desejada do Colégio Valdevez. Antônio, seu pai, e o irmão caçula uniram-se numa risada diante da euforia estampada no rosto do adolescente.
— Vai ser o garoto mais bonito do baile — disse Antônio, sorrindo diante da empolgação do filho em seu primeiro grande evento. — O senhor acha mesmo? — perguntou Anderson, levemente acanhado. — Não. Tenho certeza absoluta de que será o mais notável — respondeu o pai. No mesmo instante, o garoto desceu do banquinho e o abraçou com força. — Eu te amo, papai. — Embora soubesse que o senhor Silveira não era seu pai biológico, Anderson o respeitava e o tratava como se fosse. Logo após os últimos ajustes, o pequeno Matteo implorou ao pai que os levasse ao Boladoo, uma sorveteria famosa por servir a maior bola de sorvete da cidade. Agachado diante do filho, Silveira explicou o motivo de não irem mais até lá. — Lembra o que a senhora Salles disse ao ver seu irmão? — Que aquele lugar era para crianças negras... — respondeu o garotinho, cabisbaixo. — Por isso... — Pai, tudo bem. Vocês podem ir. Eu não estou com vontade. — Vamos, papai, antes que ele mude de ideia — disse Matteo, tentando aliviar a situação. — Filho, tem certeza? Você sabe que... — Pai, é sério. Podem ir. Diante da insistência dos filhos, o senhor Silveira cedeu. Anderson decidiu passar no píer para ver os patinhos antes de voltar para o consigo luxuoso. No caminho, próximo ao lago, esbarrou em Samanta, ela passeava com seu filhote de beagle. — Olha só, Melvin, quem encontramos por aqui. — disse Samanta, parando em frente a Anderson, que acariciava a cabeça do cachorrinho. — Olá, Samanta — cumprimentou ele, sem tirar os olhos do animal, que insistia em lambê-lo. — Oi, Anderson. Empolgado para o baile? — Sim. Samanta. Mas, só não entendi o porquê que me escolheu como seu par? — perguntou, agora com os olhos castanhos fixos nos olhos azuis dela. — Foi a única forma que encontrei de te pedir desculpas por ter sido uma idiota com você. — Um pedido de desculpas seria o suficiente... Mas por que escolheu justamente o nordestino como eu? Samanta alternou o olhar entre o cachorro e Anderson. Antes de responder, cumprimentou alguns conhecidos que passavam. — Nessas últimas semanas, você me mostrou que não é apenas um nordestino chato e sem graça. — Sam, ele está te incomodando de novo? — interrompeu Philip, um dos garotos do condomínio onde eles moravam, de punhos cerrados, pronto para confrontar Anderson. — Não, Philip. Ele não está me incomodando. Agora você... — Garota, não te entendo. Primeiro me deixa para andar com esse nordestino idiota, agora fica aí de papinho com ele. — Nos vemos à noite, Samanta. — disse Anderson, um pouco sem jeito. — Além de idiota, é um covarde. — provocou Philip com o sorriso convencido no rosto. Ao ouvir os insultos, Anderson quase voltou para agredi-lo, mas lembrou-se do vexame que causaria aos pais e seguiu em direção o seu trajeto rumo ao condomínio. Ao cair da tarde, diante do espelho, o garoto franzino se questionava se deveria mesmo acompanhar Samanta ao baile. Concluía, dentro de si, que os outros estavam certos ao dizer que ele não era bom o suficiente nem mesmo para Olga, a garota mais esquisita da turma. O som seco da escova arremessada contra o espelho fez sua mãe invadir o quarto, alarmada. — Filho, o que aconteceu? — perguntou Janice, ao ver o vidro estilhaçado. — Eu não quero mais... Eu não sou suficiente pra ela — respondeu Anderson, cabisbaixo. — Não estou entendendo... — Eu não quero mais ir ao baile, mãe — disse, com os olhos marejados. — Meu querido, você assumiu um compromisso com a senhorita Palmer. E filho meu não foge da responsabilidade, não. — Mas, mãe... — Mas nada, menino. Você não estava todo empolgado? O que foi que aconteceu? — Nada, mãe. Besteira minha... É melhor eu me apressar, senão chego tarde à casa da Samanta. — Tem certeza de que está bem? Aqueles garotos estão te provocando de novo? — indagou ela, lembrando-se das inúmeras vezes em que teve que ir à escola por causa de brincadeiras cruéis dos colegas. — Estou bem. E não, para eles, eu sou só mais um nordestino idiota — disse, desviando o olhar. Anderson odiava mentiras, mas odiava ainda mais admitir o preconceito que o cercava. — Eu sei que tem caroço nesse umbu, mas não vou insistir — respondeu a mãe, beijando-lhe a testa. Logo após deixar o quarto, a pequena Joana entrou com um aviãozinho de brinquedo nas mãos, imitando o som da decolagem. — O que foi que você perdeu agora aqui? — Nada. Só queria saber por que vai se casar com a ruiva estúpida — perguntou a garotinha, deslizando o brinquedo sobre a escrivaninha. — A Samanta não é estúpida... — Ah não? E como chamamos quem só faz estupidez? — Apesar da pouca idade, todos se espantavam com a sabedoria de Joana. — Vamos logo, que já estou atrasado — respondeu Anderson, pegando a irmã nos braços.A chuva caía pesada sobre o asfalto, transformando a estrada em um trajeto trêmulo de luzes vermelhas e azuis. Dentro da ambulância, o cheiro de combustível e metal molhado misturava-se ao som insistente da sirene. O socorrista Leandro, um profissional conhecido entre os colegas por fazer piadas até em meio ao caos, segurava o rádio com uma das mãos enquanto ajustava o curativo da vítima inconsciente.— Central, aqui é a Alfa 23 — anunciou, com um sorriso cansado no canto da boca. — Solicito linha com o Hospital St. Mônica e, se não for pedir muito, um café forte na recepção. A noite tá longa demais pra ser vivida com sono.O rádio chiou, e uma voz feminina respondeu com clareza e firmeza cirúrgica:— Hospital Municipal, residente chefe Samanta Palmer na escuta. Pode prosseguir, Alfa 23.Leadro soltou um suspiro de alívio.— Ah, doutora Palmer! Sempre bom ouvir a voz mais séria do turno noturno. Seguinte: colisão de picape com tronco de árvore. Estrada molhada, visibilidade zero.— Qu
O adolescente se acomodou na mesa perto da janela do refeitório, onde a luz suave da tarde iluminava seu rosto, que estava em um estado de profundo "pensamento existencial". Ele observava as pessoas ao seu redor, cada uma afundada em suas conversas e risadas, criando um contraste perfeito com a inquietação que morava em seu peito, como um hóspede não convidado.Na frente dele, estava Manuela Miller, sua fiel companheira de todas as horas. Ela, por sua vez, parecia perdida no universo paralelo de seus próprios pensamentos, na medida em que brincava com as ervilhas no prato, construindo pirâmides minúsculas e as derrubando com a precisão de um cientista maluco. "O que será que ela está pensando?", Anderson se perguntava, mas logo se viu perdido em um dilema ainda maior: como dizer para a amiga que estava completamente obcecado pela garota ruiva, a qual semanas há atrás nutria um ódio mortal? Uma questão de tamanha relevância que até as pirâmides de ervilhas pareciam mais simples.— Andy
Desde que o professor de Geografia uniu os adolescentes para o trabalho em dupla, eles encontraram formas de se ver sempre que a oportunidade surgia. No início, encontros eram simples, apenas para discutir mapas e apresentar ideias, mas rapidamente esses encontros se transformaram em momentos de diversões e descoberta, onde as horas passavam sem que eles percebessem.Era como se cada conversa fosse uma chance que o destino dava para os adolescentes se aproximarem. Ora passavam um tempo juntos, rindo alto e trocando confidências, ora debatiam sobre os mais variados assuntos, desde as tarefas escolares até os sonhos e medos que residiam em seus corações adolescentes.Todavia, sutilmente, Samanta sempre tomava a iniciativa para combinar os encontros às escondidas, esperando que Anderson se deixasse levar por seu magnetismo. Ela precisava daquele tempo, daquelas conversas que pareciam fazer o mundo externo desaparecer. Contudo, mesmo que as ideias de Samanta fossem românticas, era Anderso
No colégio Alencar, a chegada do adolescente nordestino era algo que causava mais pânico do que uma prova surpresa de matemática. A fama de seu temperamento explosivo durante o baile de primavera ainda ecoava pelos corredores, fazendo com que os alunos o vissem como uma espécie de ícone de medo. Mas, a verdade é que o adolescente apenas queria ser deixado em paz e talvez encontrar um pouco de diversão entre seus colegas.Contudo, ao passar pelo pátio, todos desviavam o olhar como se ele carregasse um bicho-papão escondido sob a mochila. Mas, como o destino adora pregar peças, o que ele encontrou foi Manuela, sua amiga de infância, sendo importunada por alguns valentões do sétimo ano.— Está tudo bem por aqui? — perguntou ele, se colocando atrás dos alunos, que na ocasião um deles puxava os cabelos dela. Porém, ao reconhecerem a voz de Anderson, os valentões fugiram como se tivessem visto um fantasma. Manuela, aliviada, deu um abraço forte nele.Enquanto isso, do outro lado do pátio, S
Dias Depois...Janice repreendia o pequeno Mateus que jogava as ervilhas do prato dentro do suco de melancia, por sua vez o pai folheava as páginas do jornal. Já a pequena Joana insistia para o irmão mais velho levá-la ao Radical Play, um espaço dedicado a pessoas amantes de esportes radicais.Quando a família Silveira deixara a cidade de Trancoso, o pai fez questão em levar Anderson e a Joana para o Radical Play, lugar aonde conheceu a sua primeira paixão: ciclismo que por sua vez a levou a conhecer a mulher que se tornaria o grande amor de sua vida, Janice.No entanto, após Anderson completar treze anos, os pais lhe deram permissão para ir com a irmã ao Radical sozinhos. A princípio ele ia mais por conta da irmã e a amiga Manuela que era uma brilhante skatista, mas as idas de Anderson se tornaram mais frequentes ao perceber a presença de Samanta que na época ia somente para assistir alguns amigos executar manobras na pista de skate ou para arriscar-se no patins.Apesar da insistênci
Logo após deixar a diretoria abraçada ao filho, ambos se depararam com Samara e a filha o que surpreendeu a senhora Palmer em vê- lo completamente sujo e as mãos manchadas de sangue.— Meu querido, o que foi que aconteceu com você? — Samara perguntou ao se aproximar de Anderson comovida com o estado físico dele, no entanto ele manteve o rosto sob o corpo da mãe.— Precisamos ir. — a senhora Silveira respondeu ríspida.— Nós podemos fazer alguma coisa por vocês?— Sim, só tem uma coisa que você pode fazer. — Anderson mencionou fitando os olhos sobre a mãe de Samanta.— Mantenha a sua filha o mais longe de mim... Vamos mãe. — exigiu Anderson ignorando as palavras da senhora Palmer.Janice cedeu ao pedido do filho, afinal de contas, ela desconfiava das boas intenções de Samantha desde o primeiro instante em que a garota havia se aproximado do filho.— Anderson! — Samara gritou umas três vezes o nome do adolescente, porém ele prosseguiu o caminho sem dar o mínimo de atenção a ela.— Mãe,





Último capítulo