Lia Ashford é uma jovem lobisomem de sangue puro tentando viver uma vida comum entre os humanos — uma vida longe do cheiro de sangue e das tradições cruéis de sua linhagem. Mas toda lua cheia a puxa de volta: para a floresta, para a alcateia, para o ritual macabro que sua família mantém há séculos — caçar humanos considerados "descartáveis". Quando Lia conhece Etan Kingsley, um cantor de rua de olhos gentis e voz capaz de parar o mundo, ela sente algo que nunca sentiu antes: paz... e perigo. Ele é humano. Ele é doce. Ele é tudo o que o clã proibiria. E o pior? Sua família já prometeu sua mão a outra linhagem lycan — mais cruel, mais rígida, mais sedenta por controle. Quando Lia desafia essa promessa, os anciãos decidem que Etan será a próxima presa da caçada. Agora, entre a fera e o amor, entre o dever e o desejo, Lia precisará enfrentar sua própria natureza, desafiar séculos de sangue... e lutar para se tornar a Alfa que nunca quiseram — mas que o mundo precisa. Em um mundo onde tradições matam e canções salvam, até mesmo lobos podem aprender a amar.
Leer másA cidade parecia tranquila demais para alguém como Lia Ashford.
Caminhando pelas calçadas de paralelepípedos, com uma xícara de café nas mãos e os fones nos ouvidos fingindo tocar alguma música qualquer, ela tentava se encaixar. Era o que fazia todos os dias: acordava cedo, tomava banho como qualquer jovem de vinte anos, vestia jeans e camiseta, amarrava os cabelos dourados num coque alto, e saía para fingir que pertencia àquele lugar. Mas Lia não pertencia. Ela sentia isso na pele — literalmente. Como se cada célula do seu corpo vibrasse sob a superfície humana, à espera da próxima lua cheia. À espera da próxima transformação. Do chamado da floresta. O barulho dos carros, o som dos sinos de bicicleta, o riso das pessoas nos cafés... Tudo isso era ruído. Uma distração. Um disfarce. Ela podia fingir muito bem. Tinha prática nisso. Mas bastava um cheiro, um uivo distante ou uma lembrança amarga para que sua verdadeira natureza ameaçasse emergir. Ali, Lia era apenas uma garota de olhos estranhos — um azul, um verde — que trabalhava em meio período numa floricultura e estudava arte numa universidade que mal frequentava. Ninguém ali sabia que, a cada lua cheia, ela deixava o apartamento às escondidas, corria quilômetros pela mata, e se unia à alcateia para saciar instintos que odiava admitir. Ela odiava as caçadas. Não só por serem bárbaras — mas por serem injustas. Eles sequestravam pessoas da cidade. "Desaparecidos que ninguém sentiria falta", diziam os anciãos. Era uma tradição antiga, uma oferenda à "força ancestral", uma forma de manter o domínio dos lycans sobre aquele território. E Lia — apesar do sangue puro que corria em suas veias — sempre achou aquilo monstruoso. Foi num desses dias comuns, fingidos e urbanos, que tudo começou a mudar. Ela atravessava a praça central, entre folhas secas e o calor morno da tarde, quando ouviu. A voz. Um som doce, profundo, quase melancólico. Como se a dor fosse transformada em melodia. Como se alguém tivesse arrancado o próprio coração e o colocado em forma de canção. Ela parou. No centro da praça, um jovem cantava com os olhos fechados. Moreno, alto, cabelos lisos caindo sobre o rosto. Um violão gasto nos braços e um boné no chão com algumas moedas dentro. Algumas crianças observavam sentadas na grama, encantadas. Um casal de idosos sorria discretamente em um banco. Ele cantava como se nada mais existisse. Como se a dor fosse poesia. Como se a esperança ainda valesse a pena. Lia não percebeu que estava sorrindo. Nem percebeu que ele a viu. Etan Kingsley abriu os olhos ao final da música, e foi como se o mundo parasse por um segundo. Ele congelou, encarando-a como se tivesse visto uma miragem. Como se não pudesse acreditar que ela era real. — Você tem olhos... diferentes — disse ele, ainda com a voz embargada pela melodia. — Você tem uma voz... perigosa — respondeu ela, sem pensar. Ele riu, e Lia sentiu o mundo inclinar. Foi uma risada leve, sem pretensão. Como se ele fosse feito de luz e som. Era só uma tarde. Só uma música. Só um desconhecido. Mas foi ali, naquela praça qualquer, que a história começou. E foi ali que Lia começou a se perguntar se era possível, afinal, ter os dois mundos.O silêncio depois da música era quase ensurdecedor.Melanie não ouvia apenas a ausência de sons — ela ouvia o eco deles, ressoando por dentro do seu peito, como se cada batida do seu coração fosse uma lembrança do que havia sido deixado para trás. O reflexo havia se recolhido, mas não fora destruído. Era como se agora estivesse adormecido dentro dela… esperando.E algo mais despertava junto com isso.Um novo véu começava a se formar.---Etan foi o primeiro a sentir.Acordou durante a madrugada ouvindo algo semelhante a uma música tocada ao contrário — notas distorcidas, como se estivessem tentando se formar, mas não soubessem como. Quando abriu os olhos, viu uma névoa leve cobrindo o teto de seu quarto, dançando no ritmo da batida de seu coração.— Lia — sussurrou ele ao levantar.Correu até a casa principal.Lia já estava acordada.Seus olhos brilhavam em prata. As marcas de alfa pulsavam sob sua pele.— Você também está ouvindo? — perguntou ela.Etan assentiu.— Parece… uma lembran
O mundo havia mudado.Mesmo que as árvores permanecessem de pé, mesmo que os ventos sussurrassem as mesmas canções noturnas, algo invisível havia se alterado no ar. O véu — essa barreira etérea entre mundos — não era mais uma fronteira silenciosa.Agora, ele respirava.Com cada passo que Melanie dava pela vila, sentia a vibração da terra ecoar como um coração prestes a despertar. Lia caminhava ao seu lado, os olhos mais vivos, mais aguçados. E Etan... Etan começava a ouvir notas que não estavam sendo tocadas.Notas do outro lado.---Desde o ritual, Melanie via faíscas nas bordas da realidade.Linhas douradas tremulavam no ar como rachaduras de luz, especialmente próximas de antigos locais sagrados — a raiz cristalizada, o templo de pedra, a borda do lago.Ela tentou ignorar, mas não conseguia.Era como se o véu estivesse se expandindo. Ou pior… como se estivesse prestes a rasgar.— Não está mais apenas entre mundos — disse Lia, observando o céu nublado. — Está tentando nascer aqui.M
O rosto da mulher da cripta perseguia Melanie.Mesmo desperta, mesmo longe do templo, ela podia vê-la ao fechar os olhos. Sua pele branca como mármore, os olhos de dois tons — espelhos perfeitos dos de Lia e dos seus. Mas o que mais a perturbava não era a semelhança. Era o fato de que, no fundo dos olhos daquela mulher adormecida, havia dor.Dor e lembrança.E agora, após despertar por alguns segundos, ela parecia ter deixado uma semente dentro da mente de Melanie.Uma memória que não era dela.Uma vida que ainda precisava ser contada.---Durante os dias seguintes, Melanie começou a sonhar.Mas não eram sonhos comuns.Ela via lugares que jamais havia visitado — ruínas envoltas em luz dourada, florestas que se moviam como se respirassem, e uma torre espelhada que se erguia até tocar o céu. Em cada sonho, a mulher da cripta aparecia mais jovem, viva, andando por aqueles caminhos como se pertencessem a ela.E então, uma noite, ela falou.— "Meu nome foi Serelith."Melanie acordou com lá
O céu estava limpo, mas o ar ainda carregava o cheiro da noite anterior.Na vila, os sobreviventes caminhavam entre os escombros, tentando entender onde o real terminava e onde o véu começava. As marcas no chão, as espirais gravadas nas portas, e o silêncio ainda pulsante lembravam a todos de que a batalha contra o Esquecido fora vencida, mas não encerrada.Melanie observava tudo do alto da colina, onde o templo de pedras havia sido improvisado como posto de vigília. O selo vibrava sob sua pele, ainda quente, ainda ativo. A raiz cristalizada que usara para selar a fenda estava agora enterrada no centro da praça, envolta por pedras protetoras.Etan repousava, Lia liderava os rituais de purificação, e os primeiros lobos voltavam a cantar com a lua.Mas algo estava errado.No silêncio entre os cantos, Melanie ouvia... ecos.---A primeira vez que ouviu com clareza, foi ao pôr do sol.Ela recolhia ervas com Elen, preparando infusões para os feridos, quando sentiu uma pontada aguda na marc
O retorno de Melanie à vila foi silencioso.Não havia pássaros. Nem risos. Nem o som dos cascos que costumavam ecoar pelo mercado ao amanhecer. As ruas estavam vazias, como se a vida houvesse sido drenada do lugar. Mesmo o ar parecia mais pesado, carregado com o peso do presságio que ela havia sentido desde a noite em que selou a fenda no templo.O selo estava feito, mas a guerra apenas começava.Ela atravessou a rua principal com passos lentos, olhos atentos, os sentidos em alerta. A cada esquina, sentia a sombra do Esquecido sussurrar em sua pele, em sua marca, como se rissem de sua vitória temporária.Mas Melanie não se deixaria abater. Ela precisava encontrá-los. Lia. Etan. Todos os que ainda podiam se unir contra a escuridão.E precisava fazer isso antes que o silêncio se tornasse morte.---A primeira pessoa que encontrou foi uma criança.Sozinha, sentada na calçada, desenhando no chão com um pedaço de carvão.Melanie se ajoelhou, cautelosa.— Oi, docinho… onde estão seus pais?
O vento soprava diferente naquela manhã.Mais úmido. Mais denso. Como se a floresta respirasse através de um véu que não pertencia àquele mundo.Melanie estava de pé na borda do território dos Guardians, os olhos fixos nas sombras que dançavam entre as árvores. A marca em seu ombro ardia — não como fogo, mas como gelo derretendo sob a pele. Era um aviso. Um chamado. E ela sabia que não podia mais ignorar.Desde a visão do corpo marcado com a espiral, a tensão aumentava a cada dia. Os animais desapareciam. Os rios mudavam o curso. Os próprios lobos da vila sentiam que algo se movia sob a terra.O Esquecido estava acordando.E Melanie precisava descobrir onde ele se escondia antes que fosse tarde demais.---— O templo dos Primeiros? — perguntou, ainda ofegante. — Ele existe?A arqueira assentiu lentamente, os olhos fixos nas runas que brilhavam sob o chão da clareira.— Foi enterrado por medo. Escondido dos vivos e dos mortos. Mas você o viu nas visões. Ele está chamando.— E o que há
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