O silêncio da madrugada envolvia o escritório como um véu pesado. Helena estava sozinha, iluminada apenas pela luz fria do monitor. Os documentos que Mauro havia mencionado estavam ali, escondidos entre cláusulas obscuras e assinaturas digitais. Elias Navarro não apenas manipulava ações — ele estava comprando influência, aos poucos, como quem move peças num tabuleiro invisível.
Ela digitava freneticamente, cruzando dados, rastreando conexões. Cada nova descoberta era como uma facada na confiança que ainda tentava depositar em Arthur. Ele dizia que não estava envolvido, mas tudo parecia girar em torno dele. E se ele estivesse apenas usando-a como escudo, como Elias pretendia?
O som da porta se abrindo a fez saltar da cadeira. Arthur entrou, sem avisar, como sempre. Mas dessa vez, havia algo diferente em seu olhar — menos arrogância, mais urgência.
— Você está aqui há horas — disse ele, aproximando-se. — Encontrou alguma coisa?
Helena hesitou. Mostrar tudo significava confiar. Esconder significava jogar sozinha.
— Elias está comprando ações por meio de empresas ligadas a políticos. Se ele conseguir 3% a mais, pode como CEO.
Arthur passou a mão pelos cabelos, visivelmente tenso.
— E você tem provas?
— Tenho indícios. Preciso de acesso aos registros da reunião do conselho de três meses atrás. A ata oficial foi alterada. Alguém está encobrindo movimentações.
Arthur assentiu, mas não se moveu. Ficou ali, parado, observando-a como se tentasse decifrar algo que não estava nos documentos.
— Você não precisa fazer isso sozinha, Helena.
Ela riu, sem humor.
— Desde que entrei aqui, tudo o que fiz foi sozinha. Você me jogou no meio de uma guerra e agora quer que eu confie?
Arthur se aproximou mais, a voz baixa.
— Eu não confio em ninguém. Mas estou tentando confiar em você.
Helena sentiu o peso daquelas palavras. Não eram doces. Eram duras, como tudo nele. Mas havia uma vulnerabilidade que ela não esperava.
— Então me dê o que preciso. E fique fora do caminho.
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Na manhã seguinte, Helena recebeu os registros. E com eles, uma surpresa: uma gravação de áudio da reunião. Ela ouviu com atenção, e ali estava — Elias sugerindo a fusão com cláusulas que beneficiariam empresas “aliadas”. Arthur havia discordado, mas sua voz fora abafada por votos majoritários.
Ela levou a gravação até Beatriz.
— Isso é ouro — disse a amiga, empolgada. — Mas se você publicar, Elias vai te processar. E Arthur pode ser arrastado junto.
— Eu não quero publicar. Quero usar isso para pressionar o conselho. Se eles souberem que tenho isso, talvez recuem.
Beatriz a olhou com cautela.
— Você está jogando como eles agora.
Helena suspirou.
— Talvez seja a única forma de vencer.
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Naquela tarde, Helena convocou uma reunião extraordinária com três membros do conselho. Elias não estava presente — propositalmente. Ela apresentou os dados, os documentos e, por fim, a gravação.
— Isso é chantagem? — perguntou um deles, visivelmente nervoso.
— Isso é um alerta — respondeu Helena. — Se Elias continuar com esse plano, todos vocês estarão envolvidos. Mas se recuarem agora, podem alegar desconhecimento. E salvar a empresa.
Os homens se entreolharam. Um deles, o mais velho, pigarreou.
— O que você quer?
— Que Elias seja afastado temporariamente. E que a fusão seja revisada com uma auditoria externa.
Eles concordaram. Não por ética, mas por medo. E Helena sabia disso.
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Arthur a esperava em sua sala, impaciente.
— Conseguiu?
— Elias será afastado. E a fusão vai ser reavaliada.
Ele sorriu, um sorriso raro, quase orgulhoso.
— Você jogou como uma Delacroix.
Helena franziu o cenho.
— Não sou uma Delacroix.
— Não ainda.
A frase pairou no ar, carregada de significados que ela não queria decifrar. Mas antes que pudesse responder, Arthur se aproximou, devagar, como quem pisa em território proibido.
— Você me surpreende, Helena. Sempre.
Ela sentiu o coração acelerar. Não era só o jogo de poder. Era ele. Era ela. Era o que havia entre os dois, crescendo como uma chama que ninguém conseguia apagar.
— Isso não muda o que você fez no passado — disse ela, tentando manter a distância.
— Eu sei. Mas talvez mude o que podemos fazer no futuro.
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Naquela noite, Helena voltou para casa com a cabeça em turbilhão. A guerra estava longe de acabar. Elias não desistiria tão fácil. E Arthur... Arthur era um enigma que ela ainda não sabia se queria decifrar.
Mas uma coisa era certa: ela não era mais a mesma mulher que entrou na Imperium Capital semanas atrás. Agora, ela sabia jogar. E estava disposta a vencer.