Mundo de ficçãoIniciar sessão"Ao amanhecer, a fazenda ganha vida, e junto dela, um encontro capaz de transformar destinos. Ela, mulher forte e determinada, feita de terra e coragem. Ele, herdeiro de uma fortuna, moldado pelo peso de seu legado. Entre segredos, promessas e silêncios, a aurora trará a verdade… e um amor impossível de ser apagado. O que vale mais: a fortuna herdada ou o amor inesperado?
Ler maisCapítulo 1
Era uma manhã de domingo. Uma ligeira brisa entrava pela janela do meu quarto, onde a cortina estava entreaberta. Fachos de luz do Sol atravessavam o tecido e vinham de encontro a mim, me despertando. Era um tempo gostoso, uma brisa suave que tocava minha pele de maneira gentil. Eu amava dormir com a cortina meio aberta. Acordar com a luz do dia era uma das coisas que eu mais gostava de contemplar no rancho. Quando olhei para o relógio, eram 5h45 da manhã. O Sol iniciava seu trabalho mais um dia — e que trabalho! Ao abrir os olhos, espreguicei-me, levantei e fui até a janela do quarto. Terminei de abri-la e pude contemplar a aurora, respirar o ar puro da natureza, ver as árvores balançando e ouvir os pássaros cantando, como se me dissessem: “Bom dia, Aurora Maria.” Acho que um dos motivos de gostar tanto do nascer do Sol é o meu próprio nome: Aurora, a manifestação da luz iniciando o dia. Meus pais não poderiam ter escolhido nome melhor. Troquei de roupa e desci para a cozinha. Já podia sentir o cheirinho do café que mamãe acabara de passar. Nossa casa era simples, mas tão aconchegante! Era rústica, muito bem cuidada por mamãe e papai. Eu amava cada cantinho dela, principalmente a cozinha. Ali mamãe fazia delícias absurdas. Aprendi um pouco com ela, mas confesso — com toda certeza do mundo — que não chego aos pés de Dona Helena Maria. Uma curiosidade da família: todas as mulheres têm “Maria” no nome. É uma tradição que nem me lembro onde começou, para ser sincera. Ao ver mamãe, dei um abraço forte e a beijei na testa. — Onde está papai? — perguntei. — Seu pai já foi para o curral verificar os animais. A Mimosa não estava muito bem ontem — disse ela. — Ai, será o que foi dessa vez?! — exclamei. — Depois que ela teve filhote, não consegue ficar muitos dias bem. Vou tomar esse café e vou atrás do papai, ajudá-lo no que precisar e dar uma olhada na pobre da Mimosa. Mimosa era uma das vacas do rancho. Havia dado à luz recentemente e sua saúde andava frágil. Fui até o estábulo e encontrei meu pai já lá, sem saber o que fazer. Ela havia piorado e não conseguia amamentar o bezerro. — Bom dia, papai. — Cumprimentei e dei um beijo nele. — Bom dia, querida — respondeu, com uma expressão de desânimo. — Não sei o que está acontecendo com ela... Antes só estava cabisbaixa, mas hoje parece sentir muita dor. — Podia ter me chamado quando veio para cá — falei, preocupada. — Não quis te acordar mais cedo do que já acorda, meu bem. Bufei e continuei: — Bem, vamos ver o que tem essa mocinha. Ela estava presa por precaução. Agachei-me e examinei suas tetas. Uma delas estava bem inchada. Resolvi apertar levemente para verificar. — Coitada! — exclamei, com dó. Ela sentiu muita dor mesmo eu tendo muito cuidado, e chegou a levantar a pata, quase acertando meu pai, que conseguiu se jogar para trás a tempo. — Ela está com abscesso — constatei, já imaginando o que teríamos que fazer. — Provavelmente é mastite, por isso não consegue amamentar o bezerro. Mastite é uma inflamação da glândula mamária, causada por bactérias ou fungos. Pode ser muito grave, até levar à morte. — Ótimo! — disse papai, animado. — Se já sabe o que é, já sabe o que fazer! Ele dizia isso porque eu havia acabado de me formar em Medicina Veterinária, na universidade da capital. Meus pais deram muito duro para que eu concluísse o curso, que não foi nada barato. Nosso rancho não era muito grande, e o que tirávamos dali era apenas para viver de forma simples. Ainda assim, eles se sacrificaram para realizar meu sonho. Papai não queria que eu trabalhasse, queria que eu me dedicasse apenas aos estudos. Mas, estando longe, acabei arrumando um emprego temporário em um bar para custear minhas despesas pessoais. Foi terrível: noites cercada de bêbados e riquinhos arrogantes que achavam que podiam tudo por ter dinheiro. Não gosto muito de me lembrar dessa época, foi bem difícil, apesar de ter sido por pouco tempo, mas o tempo suficiente para não querer nunca mais voltar. — Pai, ainda estou aprendendo. Não tenho muita prática — confessei. — Mas já facilita muita coisa. Podemos chamar o Henrique para me auxiliar no procedimento. O que acha? — Acho ótimo, querida. Apesar de confiar plenamente que você faria sozinha — disse ele, cheio de orgulho. Ri baixinho, feliz por ter realizado o sonho deles. Eu, que um dia corria descalça pelo rancho atrás das galinhas, subia em árvores parecendo um moleque solto no mundo... agora era veterinária. Suspirei, tomada de gratidão. Peguei o telefone para ligar para Henrique. Não sei por quê, isso me causou um certo desconforto, talvez nervosismo. Conheço Henrique há tanto tempo, desde menina. Ele é só alguns anos mais velho do que eu, se formou bem antes e vem de uma boa família — inclusive financeiramente. Estudou na Federal, mesmo podendo estudar em qualquer universidade particular. Disquei o número. Tocou algumas vezes, até que ele atendeu: — Alô, quem fala? — disse Henrique. — Oi... É... Aqui é a Aurora. Ainda lembra de mim? — gaguejei. Por que eu gaguejei? A primeira coisa que saiu foi assim. — Aurora?! Te esquecer é impossível — respondeu ele do outro lado da linha, aparentemente satisfeito em ter me ouvido. Estou contando as horas para revê-lo. Brincávamos tanto quando crianças, até mesmo na adolescência, era muito bom.Estou verdadeiramente feliz em ter voltado de uma vez por todas, eu pertenço a esse lugar e não pretendo sair daqui.
Cada minuto parecia durar uma eternidade. O som dos passos no corredor fazia meu coração disparar — qualquer um podia ser ele. Mas quando ouvi a batida leve na porta, em um padrão combinado — duas curtas, uma longa —, soube que era Lucas. Abri só uma fresta. Ele estava irreconhecível: boné, óculos escuros, uma jaqueta larga demais para o corpo. Um disfarce ridículo, mas perfeito. — Entra rápido. — Puxei-o para dentro e tranquei a porta. Ele tirou os óculos e olhou ao redor, avaliando o quarto. Eita, isso aqui parece cena de filme de espião. — Tentou brincar, mas a tensão no ar cortava qualquer humor. — Não tem graça, Lucas. — Suspirei. — Ele esteve aqui há pouco. — O Marcelo? Assenti. Ele se aproximou e apoiou as mãos na bancada, o olhar preocupado. — O que ele fez, Aurora? — Mandou outro arquivo... um dossiê contra o Antônio. — Peguei o notebook da mesa, abri a pasta e virei a tela pra ele. — Eu vi com os meus próprios olhos. Lucas se inclinou, observando as imagens e
O quarto do hotel era frio, impessoal. As cortinas pesadas deixavam passar uma luz pálida que parecia zombar de mim. Eu não dormi a noite inteira — cada ruído no corredor fazia meu corpo estremecer. Mas o pior ainda estava por vir. Uma batida seca na porta. Três toques, pausados. Eu sabia quem era antes mesmo de perguntar. — O que você quer agora, Marcelo? — perguntei, sem abrir totalmente a porta. — Calma, não precisa desse tom. Vim conversar, como pessoas civilizadas. — O sorriso dele era o mesmo de sempre: falso, cínico, nojento. Abri só o suficiente para deixá-lo entrar. Arrependi-me no mesmo instante. O ar pareceu ficar pesado, contaminado. Ele andou pelo quarto como se fosse dele, largou o paletó na poltrona e se virou para mim. Trazia na mão o celular, e um olhar de quem está prestes a destruir alguém. — Recebi mais um presente — disse ele, mexendo no aparelho. — E achei que você merecia ver. O vídeo começou a rodar. Imagens de câmeras, planilhas, áudios distorc
O carro seguiu em direção ao aeroporto, mas só mamãe iria embora — ela ainda não sabia. Eu precisava continuar, investigar tudo o que estava acontecendo. Não ia deixar Marcelo me dominar à toa. Quando chegamos, respirei fundo e tentei parecer calma. — Mamãe, faça uma boa viagem. Pegue, essa é a sua passagem. — Tirei o bilhete da bolsa e entreguei a ela. — O que está acontecendo, Aurora Maria?! — perguntou, a voz embargada de preocupação. — Prometo contar quando der. Mas agora preciso que confie em mim. Vou ficar e fazer o necessário pra acabar com essa palhaçada toda de uma vez. — Olhei fundo nos olhos dela, torcendo para que entendesse sem que eu precisasse explicar. E acho que entendeu. O olhar dela ficou marejado, mas firme. — Filha... — sussurrou — cuidado. Essas pessoas são perigosas. Quanto mais dinheiro, mais poder... e mais ganância. — Eu sei, mãe. Mas não estou sozinha. Vai ficar tudo bem. Dou notícias. O alto-falante anunciou o embarque. Ela me abraçou forte, e naqu
O telefone vibrou no meu bolso enquanto eu ainda respirava o ar do shopping — a voz de Marcelo tão clara no ouvido que a realidade pareceu rachar. Atendi antes do primeiro toque completar. — Alô? — minha voz saiu fina. Do outro lado, silêncio por um segundo, depois a calma calculada dele: — Aurora. Obrigado por atender. Mal terminara a frase e apareceu uma notificação na tela: arquivo recebido. O nome do arquivo era frio e objetivo: Dossiê_Bezerra.zip. Meu estômago deu um pulo tão forte que perdi o fôlego. — O que é isso? — perguntei, já tremendo. — Abre — ele mandou, seco. — Abre agora comigo. Minhas mãos não obedeciam. Tremi, mas toquei no arquivo. Enquanto o telefone cortava o silêncio entre nós com a respiração de ambos, o arquivo se abriu: miniaturas de vídeos, PDFs com cabeçalhos formais, prints de e-mails, extratos bancários com valores destacados. Na primeira miniatura um vídeo com um título curto: Recebimento_01.mp4. Ao lado, um PDF intitulado Contrato_Fachada.pdf e,
O dia amanheceu calmo, mas o ar parecia carregado — como se o silêncio escondesse algo prestes a acontecer. Mal havia dormido; as lembranças da conversa com Lucas ecoavam em minha mente, girando sem descanso. Pela manhã, Ana apareceu no quarto com o pequeno Artur nos braços e um sorriso animado. — Acorda, dorminhoca. Hoje você vem comigo. — disse, abrindo as cortinas e inundando o quarto de luz. — Com você pra onde? — perguntei, ainda sonolenta. — No shopping, ora. Preciso comprar umas coisas e você vai junto. Um pouco de distração vai te fazer bem. Hesitou, ajeitando o travesseiro. — Não sei, Ana... melhor não. Prefiro ficar por aqui. Ana arqueou uma sobrancelha, já acostumada com a minha resistência. — Aurora, você tá presa em casa há dias. Vai fazer bem sair um pouco, tomar um café, ver gente. E eu estarei com você, tá? Respirou fundo. Por mais que a ideia de sair me deixasse apreensiva, não queria preocupar Ana. Acabei cedendo. — Tá bom… mas só um pouquinho. Poucas horas
Antônio me ligou pedindo que eu e Artur passássemos a noite na casa da Ana. Disse que precisaria fazer uma pequena viagem e não voltaria para casa hoje. Achei estranho. Já fazia um bom tempo que não nos separávamos, e agora, com tudo o que tem acontecido, essa ausência parecia ainda mais pesada. Ele me transmite tanta segurança… e estar longe dele me causava um vazio incômodo. Fui para a piscina pensar, enquanto Ana e Lucas brincavam com Artur dentro de casa. Sentei na beira, mergulhei os pés na água e fiquei observando o reflexo das luzes ondulando sobre a superfície. Pensei em como minha vida havia mudado em tão pouco tempo — que reviravolta absurda. Eu me sentia a protagonista de alguma história louca demais para ser real. A noite estava fresca e tranquila. Senti a presença de alguém se aproximando, mas não me virei. Logo Lucas se sentou ao meu lado, em silêncio. Era como se ele soubesse que o silêncio era tudo o que eu precisava naquele momento, mesmo que dentro de mim o barulho





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