Saí do banho sentindo o cheiro da comida da mamãe. E que cheiro! Quanta saudade dessa comidinha. Quase todos os dias na capital eu comia miojo — era fácil e prático para a rotina que eu estava vivendo. Nada saudável, mas era o que dava.
Vesti minha calça jeans e camisa preta, que eu adorava. Dessa vez não coloquei meu chapéu, para deixar os cabelos secarem. Antes de terminar de descer as escadas, ouvi risadas. Henrique, pelo visto, não tinha mudado nadinha: continuava amando fazer graça. — Estávamos esperando por você, querida. Sente-se, vamos nos servir — disse mamãe. Claro que não perdi tempo. Enchi meu prato parecendo que estava passando fome. Comecei a comer e logo veio o comentário: — Estava presa, Aurora? — disse Henrique, em tom de brincadeira. — Pelo menos não estou comendo na casa alheia — retruquei, revirando os olhos. — Vocês cresceram, mas continuam duas crianças — soltou mamãe, rindo da situação. O almoço foi muito bom: muitas histórias sobre os animais e o rancho. Mamãe havia passado um café quando meu pai soltou: — Então, Henrique, não vai laçar nenhuma mulher pra casar? Pude ver seu rosto quase corar. Mas, como sempre, ele se saiu bem... até eu perceber seu olhar direto para mim quando respondeu papai: — Ainda não encontrei nenhuma que me fizesse mudar de ideia. Seu olhar veio de encontro ao meu, por cima da xícara de café. Desviei o olhar e me levantei para retirar a mesa. Claramente meus pais perceberam o tom da frase dele e o olhar pra mim. Eles se entreolharam e papai pigarreou. — Acho que nenhuma teve coragem de assumir essa bomba, isso sim — falei, dando gargalhadas. Aliás, era assim minha amizade com ele. Por que mudaria agora? Henrique se levantou levando a xícara até a pia. Parou perto de mim, encostou-se, cruzou os braços e me olhou sério. — É isso que você acha de mim? Que eu sou uma bomba? Não esperava por aquilo. Olhei fixo em seus olhos e respondi: — Que nada! Você é maravilhoso... só está bem escondida essa parte sua. Ele balançou a cabeça, dando uma risadinha, e meus pais caíram na gargalhada. — Tá na hora de ir, senão fico para o jantar — disse Henrique, em tom de brincadeira. — Eu te acompanho, só pra ter certeza que você vai — falei, puxando-o pela mão e arrastando-o para fora de casa. Ele era um chato, mas amigo. Saímos pela por dos fundos, um breve silêncio, até que ele perguntou: - Me lembro que você amava cavalgar, ainda gosta? - Amo, é o momento em que mais me sinto livre, cavalgar pelas terras, pela natureza – parei imaginado a cena – é tão bom, é uma liberdade indescritível. Podemos cavalgar qualquer dia desses se o doutor bichano não estiver muito ocupado – disse dando um saquinho em seu braço. - É claro que venho, mas antes, quero te levar na cidade pra jantar. Lembro que você ama uma boa massa. - isso é verdade. Pode ser, eu vou é só marcar o dia e a hora que eu apareço lá. - Não, eu venho buscá-la, seu pai me mata se eu não vir buscar e não deixá-la em casa. - Relaxa, mas tá bom. Eu te espero, agora vai embora, vai. – falei acenando pra ele entrar no carro, ele entrou, dei com a cabeça e nos despedimos. Foi legal revê-lo, senti falta das pessoas daqui, as pessoas na capital são tão diferentes, mais frias, foi difícil fazer amizade por lá. Ainda bem que conheci a Ana, doidinha, mas maravilhosa. A única que me fez sentir um pedacinho daqui, estando longe. Passaram-se alguns dias, mimosa estava bem, um alívio pra nós e principalmente pra ela, a coitada sofreu muito. Desde então Henrique não marcou o jantar e nem deu as caras no rancho, eu que não iria atrás. Quando terminei de pensar enquanto catava os ovos das galinhas, o celular tocou com uma notificação, desbloqueei o celular, era uma mensagem: “Oi, que tal nosso jantar hoje? Diz que sim, a semana foi puxada na clínica, não conseguir marcar antes. Beijo, H.” Respondi na mesma hora: “ Ok.” Henrique “Ok”? Aurora: “ok, ilustríssimo Dr. Bichano. Te aguardo.” Henrique: 😆💣 Guardei o celular e continuei meu serviço, estava um calor danado. Resolvi pegar o Max, meu cavalo e cavalguei até o rio que ficava não muito distante, mas ficava entre nosso rancho e a propriedade do vizinho.