O restaurante "La Famiglia" estava em seu movimento noturno normal quando Valentina e Maximiliano entraram pela porta principal. Os garçons circulavam entre as mesas, o som de conversas em italiano ecoava pelo ambiente, e o aroma de alho e oregano pairava no ar.
Ninguém suspeitaria que em poucos minutos aquele lugar se transformaria num campo de batalha. Valentina usava um vestido preto simples mas elegante, seus cabelos presos num coque baixo. Aos olhos de qualquer observador casual, era apenas uma mulher grávida jantando com o marido. A ironia não escapava a ela - estava prestes a matar um homem enquanto carregava uma nova vida. - Mesa para dois? - perguntou o maître, um homem rechonchudo com sotaque carregado. - Na verdade, - disse Maximiliano com um sorriso cortês, - Gostaríamos de falar com o Sr. Torretti. Somos... velhos amigos da família. O sorriso do maître vacilou ligeiramente. - O Sr. Torretti está ocupado esta noite... - Diga a ele que Maximiliano Blackwood e Valentina Rosetti gostariam de uma palavra, - interrompeu Valentina, sua voz baixa mas carregada de autoridade. A menção do nome Rosetti teve o efeito de um tiro. O maître empalideceu visivelmente, gaguejando algo sobre verificar a disponibilidade antes de desaparecer pelos fundos do restaurante. - Sutil, comentou Maximiliano com aprovação. - Não vim aqui para ser sutil. Eles esperaram apenas alguns minutos antes de um homem corpulento aparecer, flanqueado por dois guarda-costas. Carmine Torretti tinha cerca de cinquenta anos, cabelos grisalhos oleosos e olhos pequenos que brilhavam com uma inteligência cruel. Quando viu Valentina, seus olhos se arregalaram com reconhecimento e medo. - Madonna mia, - sussurrou. - É verdade então. A pequena Rosetti cresceu. - E voltou para casa, - respondeu ela, levantando-se graciosamente. - Olá, Carmine. Creio que temos muito a conversar. - Aqui não, - disse ele rapidamente, olhando nervoso ao redor. - Meu escritório. Nos fundos. Eles seguiram Carmine através do restaurante, passando por uma cozinha barulhenta até chegarem a uma porta pesada de madeira. O escritório por trás era decorado como um santuário à velha Itália - bandeiras, fotografias de família, e crucifixos pendurados nas paredes. - Sentem-se, por favor, - ofereceu Carmine, mas sua hospitalidade era forçada. - Posso oferecer algo para beber? Vinho talvez? - Estou grávida, - disse Valentina simplesmente, acariciando o ventre. - Do filho de Maximiliano. - Parabéns, - murmurou ele, mas havia suor em sua testa. - Ouvi rumores sobre o casamento… - Que acontecerá em uma semana, confirmou Maximiliano. - Mas antes disso, minha noiva tem alguns assuntos pendentes para resolver. - Assuntos? - Carmine tentou parecer confuso, mas seus olhos delatavam seu nervosismo. Valentina se inclinou para frente, seus olhos verdes fixos nos dele. - Você matou meus pais, Carmine. Os únicos pais que conheci, as únicas pessoas que me amaram incondicionalmente. - Eu... eu não sei do que você está falando... - Não minta para mim, - sua voz se tornou gélida. - Acabei de sair de uma conversa muito esclarecedora com os homens que você contratou. Eles foram... cooperativos. O rosto de Carmine empalideceu ainda mais. - Onde... onde estão eles agora? - Mortos, - respondeu ela com a mesma facilidade com que diria o tempo. - Por minhas próprias mãos. - Jesus Cristo, - murmurou um dos guarda-costas. - Ele não pode te ajudar agora, - disse Maximiliano com um sorriso predatório. - Assim como não pode ajudar seu chefe. Carmine se levantou abruptamente, sua cadeira raspando no chão. - Escutem, talvez possamos chegar a um acordo. Dinheiro, territórios, qualquer coisa que queiram... - Eu quero sua vida, - disse Valentina simplesmente, também se levantando. - Nada mais, nada menos. - Você não pode fazer isso! Sou protegido pela família Torrino! Giuseppe nunca permitirá... - Giuseppe já foi informado, - mentiu Maximiliano suavemente. - Ele entende que alguns pecados precisam ser pagos com sangue. Na verdade, Giuseppe ainda não sabia do que estava acontecendo, mas isso seria resolvido depois. Primeiro, Valentina precisava de sua vingança. - Por favor, - implorou Carmine, toda sua arrogância anterior evaporando. - Eu só estava seguindo ordens. Havia uma recompensa pela cabeça de qualquer Rosetti sobrevivente... - De quem? - perguntou Valentina, interessada. - Quem colocou a recompensa? - Não sei! Era anônimo, pago através de intermediários! Valentina trocou um olhar com Maximiliano. Essa informação era nova e potencialmente importante. Alguém mais estava interessado em eliminar a linhagem Rosetti. - Descreva os intermediários, - ordenou ela. - Eram... eram russos, eu acho. Falavam com sotaque pesado, pagavam em dólares americanos. - Russos, - repetiu Maximiliano pensativamente. - Interessante. - Isso muda alguma coisa? - perguntou Valentina. - Muda a escala do problema, mas não muda seu direito à vingança. - Ela assentiu, voltando sua atenção para Carmine. - Você tem família?" - Uma... uma esposa. Dois filhos. - Eles sabem o que você faz? Sabem que você mata pessoas inocentes por dinheiro? - Minha família não tem nada a ver com isso! - Nem a minha tinha, - retrucou ela friamente. - Mas isso não os salvou, não é? Carmine caiu de joelhos, lágrimas escorrendo por seu rosto. - Por favor, pelo amor de Deus, não faça isso. Eu imploro... Valentina o observou por um momento, sentindo uma estranha mistura de pena e satisfação. - Os Moreira imploraram também? - Sim, - sussurrou ele. - Sim, imploraram. - E você os matou mesmo assim. - Sim. - Então você entende que súplicas não funcionam comigo. Ela fez um sinal sutil para Maximiliano, que se moveu com velocidade letal. Em segundos, os dois guarda-costas estavam no chão, pescoços quebrados com eficiência profissional. Carmine gritou, tentando se levantar, mas Valentina o empurrou de volta para os joelhos. - Shh, - disse ela suavemente, como se acalmasse uma criança. - Vai ser rápido. Mais rápido do que você deu aos Moreira. - Espere, espere! Posso te dar informações! Sobre quem realmente queria você morta! - Já sei que foram russos. Descobrirei o resto por outros meios. - Não, não é só isso! Há alguém dentro da sua própria família! Alguém que não quer ver a união dos Blackwood e Rosetti! Valentina pausou, a mão já no cabo da faca que havia trazido. - Explique. - Alguém me procurou há seis meses. Disse que haveria mudanças em breve, que as famílias tradicionais precisavam se preparar. Que a filha perdida dos Rosetti seria encontrada e precisaria ser eliminada antes que pudesse reclamar sua herança. - Quem? - perguntou Maximiliano, sua voz perigosamente baixa. - Não sei o nome! Era sempre através de intermediários, mas... mas havia um símbolo. Uma rosa negra com espinhos dourados. Valentina sentiu o sangue gelar. Conhecia esse símbolo - havia visto em alguns documentos no escritório secreto de Maximiliano. - Você conhece esse símbolo? - perguntou a ele. O rosto de Maximiliano estava sombrio. - Conheço. É... complicado. - Não me venha com 'complicado' agora. O que significa? - É o símbolo da família Kozlov. Os russos que conheceu no outro dia. Ou alguém próximo a ele. Viktor? Valentina processou essa informação rapidamente. Se Viktor estava envolvido na tentativa de eliminá-la, isso significava que a aliança internacional dos Blackwood estava comprometida. Significava que inimigos estavam mais próximos do que imaginavam. - Obrigada pela informação, Carmine, disse ela finalmente. - Infelizmente, isso não muda o fato de que você matou pessoas inocentes. - Mas... mas eu te ajudei... - Ajudou. E por isso, sua morte será rápida. A lâmina se moveu com precisão cirúrgica, encontrando o ponto exato no pescoço onde uma única pressão cortaria a artéria carótida. Carmine Torretti morreu em segundos, seus olhos se vidram enquanto encaravam o teto. Valentina se afastou, limpando a faca num guardanapo. - Está feito. - Como se sente? - perguntou Maximiliano, observando-a com fascínio. - Mais forte. Mais completa. Ela sorriu, e havia uma nova dureza em sua expressão. - E… pronta para descobrir quem mais quer me ver morta. - Vamos precisar conversar com Viktor. disse Maximiliano. - Oh, vamos conversar com ele, concordou ela. - Mas primeiro, temos um casamento para celebrar. Quero estar oficialmente casada com você antes de começarmos a eliminar traidores. - Pragmática. Gosto disso. Eles saíram do restaurante pela porta dos fundos, onde Marcus os esperava com um carro limpo. Enquanto se afastavam pela noite, Valentina colocou a mão no ventre, sentindo a vida que crescia ali. - Nosso filho vai nascer num mundo perigoso, - murmurou. - Vai nascer num mundo que controlamos, - corrigiu Maximiliano. - E será criado para ser ainda mais poderoso que nós. - Sim, - concordou ela, observando as luzes da cidade passar pela janela. - Será. A segunda fase de sua transformação estava completa. Agora ela não era apenas uma Blackwood por casamento, mas uma verdadeira herdeira dos Rosetti por direito de sangue derramado. E qualquer um que ameaçasse sua família descobriria exatamente o que isso significava.