Capítulo 10

“A dor nos ensina a atirar antes mesmo de sabermos segurar uma arma.”

Angeline

O silêncio antes do início foi pior que qualquer grito.

Só dava para ouvir o som seco do salto das mulheres que organizavam a fila e o tilintar metálico de uma corrente que arrastava pelo chão. Era o som da minha nova realidade.

Um homem entrou. Não precisava ver o rosto para saber que era ele quem comandava aquilo. O silêncio se quebrou como vidro, e as ordens começaram a ecoar.

— Primeira. — a voz era seca, sem emoção, como se estivesse chamando uma peça de carne para o balcão.

A garota na frente deu um passo hesitante, e imediatamente dois capangas se aproximaram, segurando seus braços. Ela foi levada até a marca no chão, bem diante do vidro espelhado.

E então tudo começou.

Uma voz masculina, amplificada por um microfone, anunciou seu “lote”. Ele não disse nome. Não disse idade. Apenas números.

Altura. Peso. Cor da pele. Medidas.

Cada dado lançado como se descrevesse um cavalo em um leilão rural.

Eu não conseguia ouvir as ofertas, mas podia ver a cabeça dele se mover, anotando valores em uma prancheta.

E então a garota foi empurrada para o lado e a próxima entrou.

Algumas tentavam sorrir. Sorriso falso, sorriso de sobrevivência. Outras choravam silenciosamente, como se já tivessem aceitado que não havia volta.

Uma delas caiu de joelhos, implorando para não ir. Recebeu um chute na barriga tão forte que o ar saiu dela num gemido abafado.

Ninguém ajudou.

Aqui, ajudar era assinar a própria sentença.

Quando minha vez chegou, senti minhas pernas travarem. O vestido curto colava na minha pele, e eu tinha a sensação de que todos os olhares escondidos atrás daquele vidro estavam despindo o pouco que me restava de dignidade.

— Lote 17 — a voz ecoou, fria, sem nome, sem história, sem passado. — Vinte e oito anos. Um metro e sessenta e seis. Sessenta quilos. Pele clara. Olhos verdes. Cabelos castanho escuro. Intacta.

A palavra “intacta” cortou como faca. Não era sobre pureza. Era sobre preço.

Eu podia sentir. Atrás daquele vidro, mãos levantavam discretamente para aumentar lances, como se estivessem competindo por um troféu.

Eles não me viam como uma pessoa. Eu era um investimento. Uma posse. Um capricho.

O homem que apresentava se aproximou, segurou meu queixo e girou meu rosto de um lado para o outro, como se verificasse a qualidade de uma mercadoria.

Depois puxou minha mão e obrigou que eu desse uma volta lenta, exibindo cada pedaço de mim para o vidro.

Quando terminou, ele anunciou o valor final. Eu não ouvi. Não queria ouvir.

Eu só sabia que, em algum lugar naquele escuro, alguém havia pago por mim.

E que, a partir daquele momento, minha vida tinha um novo dono.

Me puxaram para fora e eu só sentia vontade de vomitar, por nojo, por raiva, eu só queria desconectar minha mente do meu corpo.

— Você tem sorte. — A mesma mulher de antes se pronunciou quando entrei.

Fiquei sem entender, por que como alguém teria sorte num lugar desses?

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