Evie
As palavras de Ana ecoavam como t***s na minha cara.
Ela dizia o quanto minha vida era importante, o quanto eu não deveria nem ter pensado em acabar com tudo.E eu chorava.
Não por Luca. Mas por mim mesma.Por ter sido fraca.
Por não ter buscado a ajuda dela quando precisei.Eu sei que não estou sozinha.
Meus pais adotivos sempre me amaram. Meu irmão sempre me tratou como princesa. E, mesmo com todo esse amor… eu os abandonei.Troquei tudo por um homem que nunca me deu valor.
Agora sinto vergonha. E saudade. Será que eles algum dia vão me perdoar?— Você prestou atenção no que eu falei, Evie?! — Ana me sacudiu.
— Eu estava pensando… nos meus pais. Os que me criaram. E também… no porquê meus pais biológicos me abandonaram.
— Evie! — Ana levantou a voz. — Não pense assim. Eles provavelmente não tinham condições de criar você. Te entregar à adoção pode ter sido o gesto mais difícil… mas também o mais amoroso.
— Eu sei… mas esses pensamentos vêm junto com—
— SEGURANÇA!
Um grito ecoou do lado de fora do quarto.
Havia confusão na recepção.Não consegui sair da cama por causa da medicação, então olhei para Ana:
— Vai lá ver o que está acontecendo! Mas não volte com fofoca pela metade. Vai!
Ela correu.
Eu fiquei ali, ouvindo barulhos de briga, e uma risada escapou.Algumas pessoas estavam ali lutando pela vida…
E eu quase a desperdicei. Sou mesmo uma idiota.As palavras de Vittorio surgiram na minha mente: “Dê a volta por cima.”
Ele estava certo. Eu devia mostrar ao mundo que podia. Mostrar a Luca que eu não dependia dele. Amanhã mesmo assinaria o divórcio. E começaria de novo, do zero se fosse preciso.Foi então que Ana entrou de volta no quarto.
Pálida. Com os olhos arregalados.— Ana… o que aconteceu? Você parece que viu um fantasma.
Ela respirou fundo.
— Evie… seu príncipe encantado acabou de socar a cara do seu marido.
Demorei a processar.
“Príncipe encantado” era como Ana chamava Vittorio. E agora… ele tinha acertado um murro em Luca?— Luca… estava aqui?
— Sim. Eu não avisei. Ele deve ter vindo procurar você. — Ana fez uma careta. — Mas quando chegou… Vittorio já estava esperando. E os dois… claramente já se conheciam.
Meu coração acelerou.
— O que eles disseram?
— Que iam se destruir. Trocaram ofensas. Luca saiu furioso. Mas Vittorio saiu por cima. Ele disse que não tem medo de ameaças de um homem que não sabe cuidar da própria mulher.
As palavras de Ana me deixaram sem ar.
Luca e Vittorio se conheciam. E agora… eram inimigos declarados.Enquanto ela descrevia a cena, só consegui pensar em uma coisa.
O punho cerrado de Vittorio. O corpo musculoso. O peito firme onde eu chorei feito criança.Senti minhas bochechas queimarem.
Levei as mãos ao rosto.— SUA SEM VERGONHA! — Ana gritou. — Eu aqui contando o barraco e você pensando no corpo daquele deus grego!
Eu ri, nervosa.
Ana sabia de tudo. Ela sempre soube que, por Luca, eu tinha um desejo avassalador. Mas ele… nunca quis filhos. Sempre disse odiar crianças. E agora estava tendo uma… com o grande amor da vida dele.As lágrimas voltaram.
Ana me abraçou com força.— Não chore, Evie. Eu estou aqui. Sempre vou estar.
— Obrigada… — sussurrei, com a voz trêmula.
— Vem pra casa comigo. Amanhã a gente resolve o resto.
Concordei.
O médico me deu alta, e fomos direto para a casa dela.Lá, Ana cuidou de mim como uma irmã.
Banho quente. Roupas limpas. Comida na mesa — mesmo sem eu ter fome. E, por fim, um filme para distrair.Adormecer parecia impossível.
Mas então… o celular vibrou.Uma mensagem de número desconhecido.
"Minha gentil donzela, terá Vossa Graça já se alimentado? Sente-se restabelecida em espírito e em corpo?
Rogo que não ouseis mais vaguear sozinha pelas ruas frias da noite. Envio estas palavras para que vosso descanso seja sereno, vossos sonhos doces… e para recordar-lhe que é chegada a hora de erguer-se novamente, qual fênix das cinzas do infortúnio. Assinado, seu Cavaleiro Vingador."Um sorriso nasceu nos meus lábios.
Meu corpo esquentou. Ele sabia exatamente o que dizer.Respondi no mesmo tom.
"Meu nobre cavaleiro de armadura, a vós devo mais que palavras. Fostes quem, com vossa mão firme, me arrancou das garras da morte.
Carrego feridas que não desejo lançar sobre vossa alma. Temo… que, se prosseguirmos, eu acabe ferindo justamente aquele que me salvou."Ri sozinha.
Ainda bem que sempre amei ler, senão jamais entenderia como responder no mesmo estilo.A resposta dele veio rápida.
"Minha doce gata borralheira… não fales em dívida.
Não te salvei apenas por bravura. Ao ver-te pender sobre o abismo, revi o mesmo olhar perdido que um dia já habitou a face de minha mãe. Não suportaria perder-te como a perdi a ela. Não busco em ti um curativo para minhas feridas. Desejo apenas ver-te inteira, erguida, dona de teu destino. Se me chamas de cavaleiro vingador, permita-me ser também teu guardião. Pois entre todas as batalhas que já travei, nenhuma será tão nobre quanto velar para que tuas lágrimas deem lugar ao sorriso que mereces."As palavras dele atravessaram meu peito.
Me fizeram chorar de novo — mas dessa vez… de esperança.Percebi que a minha morte só traria dor para quem realmente me ama.
Não para Luca.Estava decidido.
Amanhã eu assinaria o divórcio. E recomeçaria.Enviei a última mensagem antes de dormir:
"Obrigada, meu cavaleiro.
Decidi que minha reviravolta começa amanhã. O primeiro passo será libertar-me das correntes de um matrimônio desfeito. E, quando eu erguer a cabeça como princesa que retorna ao trono, talvez possa convidar-vos para um jantar — não como dívida, mas como gesto de eterna gratidão."A resposta dele veio certeira:
"Minha princesa, se esse jantar vier, não será pagamento de dívida.
Será privilégio. E talvez… o início não apenas de tua nova vida… mas de algo nosso."Adormeci com um sorriso no rosto.
E uma enorme expectativa pelo amanhã.