A sala do conselho sempre foi meu território. Quantas vezes eu já tinha sentado naquela mesa de madeira escura, enfrentado diretores com seus olhares duros, e defendido cada projeto como se fosse um pedaço de mim? Mas naquela manhã… alguma coisa estava errada. Eu senti no ar assim que empurrei a porta.
O silêncio foi imediato. Todos os olhares se voltaram para mim, como se estivessem esperando um espetáculo. Alguns mostravam surpresa, outros — pena. O que me irritava ainda mais.
Carlos, meu pai, estava na ponta da mesa, sério, as mãos cruzadas sobre os papéis. Ele nunca desperdiçava tempo com formalidades.
— Finalmente — disse ele, a voz seca. — Precisávamos de você.
Puxei a cadeira, sentei sem baixar os olhos. — Então fale. O que é tão urgente?
Ele me encarou por alguns segundos antes de soltar as palavras que mudariam tudo:
Um zumbido encheu meus ouvidos. Por um segundo, pensei que tivesse entendido errado.
— Você ouviu.
A mesa murmurou, vozes baixas trocando comentários. Meu coração disparou, mas mantive a postura ereta.
A porta se abriu. Eu já sabia quem era pelo som dos saltos ecoando. Ana entrou como se estivesse em um desfile. Vestido claro, maquiagem suave, sorriso treinado. Para qualquer um de fora, parecia a imagem da inocência. Mas ela não me enganava, eu a conhecia bem.
— Desculpem o atraso. — Ela ajeitou uma mecha de cabelo atrás da orelha. — Espero não ter perdido nada.
Engoli em seco, segurando a raiva. — Não perdeu. — Cruzei os braços. — Só o anúncio de que vai roubar o que é meu.
Alguns conselheiros tossiram, desconfortáveis. Ana levou a mão ao peito, fingindo ofensa.
Revirei os olhos. — Não seja hipócrita. Você nunca se importou com esta empresa. Sempre viveu às custas do que eu conquistei.
— Basta! — meu pai ergueu a voz, cortando o ar. — A decisão já foi tomada.
Eu me virei para ele, que me encarava com aquela frieza calculada.
Ele respirou fundo e me lançou um olhar cheio de raiva. — Você só terá a presidência quando engravidar, como determina o testamento da sua mãe. Até lá, eu decido.
As palavras me atravessaram como facada. O testamento. O maldito testamento que sempre pendia sobre minha cabeça. Meu estômago revirou, mas não recuei.
Olhei diretamente para Ana. — Então vamos resolver de outra forma.
Ela estreitou os olhos, desconfiada. — De que está falando?
— Uma aposta. — Minha voz soou firme. — Quem conseguir primeiro o contrato com o Grupo Santos fica. Quem perder… sai da empresa e não volta nunca mais.
A sala explodiu em murmúrios. Conselheiros se inclinavam uns para os outros, surpresos com a ousadia.
— Isso é loucura — disse meu pai, mas não com força o suficiente.
— É justo — rebati. — E você sabe que é.
Ana ficou em silêncio por alguns segundos. Eu vi em seus olhos a hesitação, mas o sorriso logo voltou, falso e doce como sempre.
A reunião foi encerrada às pressas, cada um dos diretores falando baixo, já calculando em qual lado deveriam apostar suas fichas. Eu permaneci sentada, observando enquanto todos se levantavam.
Ana passou por mim, lenta, se inclinando para falar apenas o suficiente para que só eu ouvisse:
Olhei para ela, sem piscar. — Veremos quem cai primeiro.
Ela saiu, balançando os quadris como se já tivesse vencido.
Fiquei sozinha na sala por alguns segundos. Inspirei fundo. O peso da decisão caía sobre mim, mas eu não me arrependia. Era lutar ou ser esmagada. E se minha meia-irmã achava que eu ia entregar tudo de bandeja, estava prestes a descobrir quem eu realmente era.
O contrato com o Grupo Santos seria meu. Custe o que custar.