(Isabella)
Eu fiquei boquiaberta, literalmente. O choque me paralisou. Ninguém jamais havia falado comigo daquela maneira, muito menos dentro da minha própria casa. A audácia era tão absurda que meu cérebro se recusou a formular uma resposta. Eu apenas pisquei, perplexa com aquele comportamento desdenhoso e abertamente desrespeitoso. Ela ainda soltou um suspiro impaciente, como se estivesse lidando com uma criança lenta. — Na realidade, não saia ainda — disse ela, gesticulando com os dedos — Busque um café para mim. Sem açúcar. E ande logo. A ordem foi o estalo que eu precisava para me recuperar do choque. A perplexidade se transformou em uma chama de indignação. Cruzei os braços, sentindo o sangue subir ao meu rosto. — Eu não sou uma empregada — respondi, a voz firme. Ela soltou uma risada curta, sem humor algum. — Como não? Com essas roupas... — seu olhar percorreu meu vestido de algodão florido e minhas pantufas. — O que você é, então? A jardineira? A tensão era tão densa que podia ser cortada com uma faca. Eu estava prestes a dar a resposta que colocaria aquela mulher em seu devido lugar, quando o som da porta principal se abrindo nos interrompeu. Nesse momento, Pedro entrou, segurando a mão do pequeno Benjamin. A transformação daquela mulher foi instantânea e assustadora. A máscara de arrogância fria derreteu, sendo substituída por um sorriso radiante e ensaiado. Sua postura relaxou, tornando-se mais suave, mais convidativa. — Pedro! Querido! — sua voz agora era mel, pura doçura. Ela deu um passo rápido em direção a ele, os braços se abrindo como se fosse para um abraço íntimo e esperado. Porém, antes que pudesse se aproximar, seu olhar caiu sobre nosso filho ao lado dele. Seus olhos se arregalaram por uma fração de segundo, e ela parou abruptamente, o sorriso congelando em seu rosto. O abraço se desfez no ar. — Oi! Você deve ser o pequeno Benjamin, certo? Meu filho não respondeu e se escondeu atrás da perna do pai. Pedro, então, falou: — Sim, é ele. Bom dia! Chegou bem cedo mesmo. — Ele se virou para mim, a confusão em seu rosto era evidente, não tinha certeza se ele tinha ouvido nossa conversa. — Já conheceu a sra. Campos? — Ainda não a vi — Ela respondeu Meu olhar encontrou o de Pedro, e ele pôde ver a indignação ainda queimando em minha expressão. — Isabella, esta é Jessica — começou ele, tentando preencher o silêncio pesado. — Ela é a irmã mais nova do meu amigo Arthur. Acabou de voltar ao país e soube que eu procurava uma babá. Então, pediu o emprego... Enquanto ele falava, vi o pânico brilhar nos olhos azuis de Jessica. Ela deve ter se dado conta de que eu era a esposa de Pedro. Provavelmente com medo de ser demitida ou movida pelo puro desespero, ela o interrompeu. — Desculpe, sra. Campos, pelo meu comportamento! — A mudança foi tão rápida que pareceu teatral. Ela juntou as mãos em um gesto de súplica. — Como a senhora estava vestida assim, tão... simples... eu pensei que fosse uma empregada. Por favor, me perdoe! Pedro franziu a testa, seu olhar alternando entre nós duas. — O que aconteceu? — Eu acabei confundindo a sra. Campos com uma empregada... — começou Jessica, a voz embargada, pronta para encenar o maior arrependimento de sua vida. Mas eu agi mais rápido. Olhei para Pedro, para a expressão confusa em seu rosto, e entendi a situação em que ele se encontrava. Se eu expusesse Jessica, talvez criaria um problema para ele com Arthur. Colocá-lo nessa posição, por mais que eu desejasse ver aquela garota ser humilhada, não era o meu estilo. — Está tudo bem! — disse, forçando um sorriso tranquilizador e cortando a fala dela. — Foi só um mal-entendido, não foi? Coisas que acontecem. Virei-me para Jessica, meu sorriso agora com um toque de ironia que só nós duas entenderíamos. — Você quer um café, não é? Vou pedir à Madalena para preparar um para você. Sem esperar resposta, me abaixei e peguei meu filho no colo, dando um beijo estalado em sua bochecha. O gesto foi protetor, quase uma demarcação de território. "Esta é a minha família", eu queria dizer. Com Benjamin aninhado em meus braços, me virei e caminhei em direção à cozinha, e senti os passos de Pedro me seguindo, deixando Jessica sozinha na sala.