MARIA AMARAL
— VAGABUNDA! — a loira grita, chamando a atenção de várias pessoas.
Nem respondo. Seria procurar mais humilhação. Posso ouvir algumas risadinhas mal disfarçadas de clientes e das outras mulheres no salão. Decretado: minhas chances de conquistar o Seven são nulas. Acabei de virar a piada da casa.
Sentada no chão, começo a tirar os sapatos que agora são inúteis. Todo estragado. Porcaria frágil! Preciso sair daqui. Deu tudo errado antes mesmo de tentar.
— O que pensa que está fazendo? — ouço a voz mais sexy que existiu ou vai existir cobrar.
Olho para eles, até esqueço a sandália por alguns segundos, perdida nos traços desse homem que exala um poder assustador. Ele está encarando a loira, seu rosto mostra seriedade.
— Todas sabem que não devem se aproximar do meu homem. — A loira responde com voz branda, alisando a camisa dele. Essa sabe com quem não deve levantar a voz.
— Seu? — ele levanta as sobrancelhas grisalhas e ela afasta as mãos dela.
Já disse o quanto ele é lindo, cheiroso e tem uma voz magnificamente máscula... Para de pensar essas merdas! Me repreendo.
— Eu não queria o seu homem — digo me levantando, com os resto da sandália em mãos. — Ele só tentou ser educado e evitar a queda de uma desconhecida. O que não adiantou muito já que você me jogou no chão.
Ela aponta o dedo para mim.
— Sem esse teatrinho. Conheço sua raça.
— Então tá. — Dou de ombros e me viro para a chance perdida de livrar João das garras de Jafar. — Me desculpe, senhor. Sinto muito por causar essa cena lamentável.
Viro as costas e dou alguns passos, sentindo o piso gelado sob meus pés.
— Espere, garota!
Não olho para trás. Afinal, ele não devia estar falando comigo. Por que falaria?
— Eu mandei esperar. — Uma mão máscula segura meu braço.
Levanto a sobrancelha sem entender o que ele quer.
— Olha, eu não quero apanhar aqui, já passei vergonha demais para o meu primeiro dia, e acho que último. Se não for sair daqui com uma de nós duas, é melhor se afastar.
— Uma de vocês? Por que não você? — Ele parece curioso com minhas palavras.
Dou uma risada nervosa, e acabo sendo sincera.
— Depois desse mico, eu não seria louca de tentar te seduzir. Então se sair com ela, pelo menos a mantem ocupada até eu ir embora sem represálias, ou se tiver mau gosto e sair comigo, também me salva de ser trucidada. Olha o olhar daquela mulher. — Vejo a loira nos olhando com ódio. Ela até está vermelha.
— Medo?
Dou de ombros.
— Sou péssima em luta corporal.
Ele gargalha. É um som lindo, que por um momento me hipnotiza. Não só a mim, quando saio do transe, percebo que as pessoas não parecem acostumadas a vê-lo sorrindo... Pois é, estão todos nos assistindo.
— Pensei em te dar uma chance, mas mulheres medrosas não me excitam. — E com essa, ele simplesmente anda para a saída, me dando a visão de suas costas largas de quem se cuida com exercícios pesados.
Foi embora sem nenhuma de nós. Esse gosta de ser do contra.
O jeito é ir embora também. Meus planos ridículos já eram. Não tem mais nada aqui que eu queira. As pessoas voltam as suas atividades, acabou o show.
Me despeço de Candy, que está grudada em um homem corpulento de barriga saliente, e saio pelos fundos para não ser notada por mais ninguém, completamente arrependida de não ter trago uma bolsa com roupas e calçados confortáveis. Afinal, terei que andar descalça pelo beco até a rua. Nenhum motorista entraria nesse beco mal iluminado.
Antes de chegar a calçada fora da casa uma mão gelada gruda o meu braço.
— Vocês combinaram de sair juntos? — É a loira.
Demoro só alguns segundos para entender a acusação.
— Está vendo alguém aqui? — pergunto irritada, mostrando o beco vazio e pouco iluminado.
Nesse hora vejo um homem que parece ser segurança. Devia imaginar que alguém faça guarda nesse canto. É como os becos onde acontecem os crimes nos filmes.
— Algum problema? — pergunta olhando diretamente para ela.
— Essa daí estragou meus planos com o mafioso — fala com uma voz irritantemente manhosa. — Dê um corretivo nela, por favorzinho, querido.
Olho de um para o outro. Estava claro que eles se conheciam muito bem.
— Sim, senhora — o gorila de terno responde sem titubear.
O que?
Arregalo os olhos ao perceber as intenções dele em me machucar.
Sem esperar para ver, disparo para longe desse lugar, até a luz no fim do beco, mas nem chego a alcançar. Meus cabelos são agarrados e meu corpo jogado contra algumas latas de lixo vazias. O barulho ecoa nos meus ouvidos como uma música macabra. Começo a fazer promessas para o caso de sair ilesa, promessas como nunca mais entrar em becos mal iluminados. Mas só até perceber que as intenções dele não era apenas me bater.
Sei que ele está falando um monte de merda que vai fazer comigo, só que não escuto, minha mente presa no passado, naqueles malditos anos de pesadelo. Novamente me vejo impotente nas mãos de um homem. Isso nunca vai ter fim.