Helena Vasconcellos encarava o espelho do elevador como quem se preparava para uma batalha. O blazer preto impecável escondia a insegurança que latejava em seu peito. Ela havia passado os últimos dois meses tentando se reerguer após o colapso de sua vida pessoal e profissional. Agora, ali estava ela: prestes a começar como assistente jurídica na Imperium Capital, uma das empresas mais temidas do país.
O elevador parou no 38º andar. As portas se abriram com um som metálico, revelando um ambiente de vidro, aço e silêncio. O escritório parecia uma galeria de arte corporativa — minimalista, elegante e absolutamente intimidador.
— Helena Vasconcellos? — chamou uma voz feminina, firme e educada.
Ela se virou e encontrou uma mulher loira, de coque apertado e olhar clínico.
— Sou Beatriz, diretora de RH. O senhor Delacroix está em reunião, mas pediu que você fosse apresentada à equipe jurídica imediatamente.
Helena assentiu, tentando manter a postura. O nome Delacroix ecoava em sua mente como um alerta. Arthur Delacroix, o CEO da Imperium, era conhecido por sua frieza, decisões impiedosas e uma ascensão meteórica que deixava rastros de empresas quebradas — inclusive a de seu pai.
Ela foi conduzida por corredores silenciosos até uma sala ampla, onde três advogados digitavam freneticamente em seus notebooks. Beatriz fez as apresentações rápidas e saiu, deixando Helena com um manual de procedimentos e uma pilha de contratos para revisar.
— Você vai se acostumar — disse um dos advogados, sem tirar os olhos da tela. — Só não tente impressionar o Arthur. Ele não se impressiona com ninguém.
Helena sorriu de canto. Veremos.
Duas horas depois, Beatriz voltou com um convite inesperado:
— O senhor Delacroix quer que você participe da reunião de diretoria. Ele disse que é “bom testar os novos em campo”.
Helena engoliu seco. Não esperava ser jogada aos leões tão cedo. Mas recusaria? Jamais.
A sala de reuniões era um aquário de vidro com vista para a cidade. Arthur Delacroix estava na cabeceira da mesa, impecável em um terno cinza, olhos fixos em um tablet. Ele não olhou para Helena quando ela entrou, mas sua presença dominava o ambiente.
— Vamos começar — disse ele, sem levantar a voz, mas com autoridade suficiente para silenciar todos.
A reunião girava em torno da aquisição de uma empresa de tecnologia. Um dos diretores, nervoso, tentava justificar os riscos da operação. Arthur o interrompeu com um gesto.
— Você teve três semanas para apresentar um plano viável. E me trouxe dúvidas. Está demitido.
Silêncio absoluto. O diretor empalideceu, tentou argumentar, mas Arthur já havia voltado ao tablet.
Helena observava tudo com o coração acelerado. A frieza dele era real. Mas havia algo mais — uma tristeza contida, uma raiva silenciosa. Ela reconhecia aquele tipo de dor. Era familiar.
Após a reunião, Helena foi chamada à sala do CEO. Arthur estava em pé, olhando pela janela.
— Você é filha de Álvaro Vasconcellos, não é? — disse ele, sem se virar.
Helena congelou. Não esperava que ele soubesse.
— Sou — respondeu, firme.
— Seu pai me processou há sete anos. Disse que eu destruí a empresa dele.
— E você destruiu.
Arthur se virou, finalmente encarando-a. Seus olhos eram de um azul cortante, mas havia surpresa em seu rosto.
— Você tem coragem. Gosto disso.
— Não estou aqui para agradar — disse Helena. — Estou aqui para trabalhar. Mas não esqueço o que aconteceu.
Arthur sorriu de canto, um sorriso sem alegria.
— Então estamos quites. Eu também não esqueço nada.
Ele se aproximou, parando a poucos passos dela.
— Veremos se sua memória atrapalha sua eficiência.
Helena manteve o olhar firme.
— Veremos se sua arrogância atrapalha sua liderança.
Por um segundo, o silêncio entre eles foi quase palpável. E então, Arthur voltou à sua mesa.
— Pode ir. Mas esteja pronta. Aqui, ninguém sobrevive sendo medíocre.
Helena saiu da sala com o coração disparado. Ela sabia que havia cruzado uma linha. Mas também sabia que, pela primeira vez em muito tempo, estava viva.