O despertador tocou às 6h40, mas Júlia já estava acordada fazia muito tempo. Na verdade, ela não dormira de verdade depois daquele sonho. Havia deitado, fechado os olhos… mas o corpo permanecia alerta, como se a memória estivesse viva demais para deixá-la descansar.
Marcos saiu primeiro da cama, ainda sonolento, arrastando os pés até a cozinha. Júlia ouviu o som familiar da chaleira, o estalar do fogão, o cheiro do café começando a ganhar o ar. A rotina deles era uma coreografia antiga, tão automática que quase não precisava de palavras.
Mas naquele dia, tudo estava diferente.
Tudo nela estava fora do lugar.
Quando ela se levantou, sentiu o chão frio sob os pés. Olhou para o espelho rapidamente. O reflexo a encarou com um olhar que não era o seu. Como se fosse outra pessoa habitando o corpo dela.
Tinha algo no peito. Não exatamente dor. Não exatamente saudade. Era como uma corda esticada demais, prestes a arrebentar.
Marcos colocou a xícara de café diante dela na mesa sem dizer nada.