O vento daquela noite tinha gosto de lembrança.
Soprava do sul, frio, com um leve cheiro de terra úmida e de tudo o que o tempo insiste em não levar embora.
Guilherme estava parado na varanda da pousada, o copo de uísque na mão esquerda e o celular na direita.
O som baixo do rádio velho que o dono do lugar deixava na cozinha atravessava as paredes e chegava até ele, junto com a voz rouca de Alexandre Pires cantando “Depois do Prazer.”
“Tô fazendo amor com outra pessoa…
Mas meu coração vai ser pra sempre teu...”
A música o atravessou como uma navalha.
Não porque fosse exatamente sobre ele e Júlia — mas porque era sobre o depois.
E ele estava vivendo o depois.
Deu um gole no uísque, devagar.
O líquido queimou a garganta, desceu quente, mas o frio dentro dele continuou intacto.
O celular brilhava na palma da mão, mostrando aquela última mensagem que ele havia enviado fazia mais de uma hora:
“Você tá bem?”
Nenhuma resposta.
O visto nem azul ficou.
Ele encostou o copo na beirada da madeira