Curando a dor com o amor

Curando a dor com o amorPT

Romance
Última actualización: 2025-10-17
Sandro Raphael  Recién actualizado
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Resumen
Índice

Em uma escola de ensino médio, o lobo Free Goshui carrega as cicatrizes do estresse pós-traumático causado pela perda de sua irmã, devido ao intenso bullying que a mesma sofria. Seu caminho se cruza com o de Sheele Leonheart, uma javalina que sofre bullying devido ao seu peso. Vendo a situação e se aproximando mais dela, Free começa a desenvolver um forte senso de responsabilidade para com Sheele, se tornando seu protetor. Em um meio tempo, os dois desenvolvem um vínculo profundo nessa história que destaca a cura emocional, mostrando que somente o amor pode curar a dor.

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Capítulo 1

Prólogo

O dia amanhecia tranquilo em Sateraite, mas no pequeno quarto dos irmãos Goshui, o clima era bem diferente. Chelsea levantava da cama devagar, como se carregar o próprio corpo fosse um fardo pesado demais. Seus movimentos eram lentos, quase mecânicos, enquanto ela reunia suas coisas para mais um dia na escola.

Ao ouvir os sons abafados dela se movendo, Free abriu os olhos, ainda sonolento. Ele esfregou o rosto e se sentou na cama, observando a silhueta da irmã contra a luz fraca que entrava pela janela.

— Chelsea? Aonde você vai? — perguntou ele, com sua voz suave e cheia de curiosidade infantil.

Chelsea parou por um instante, fechando os olhos enquanto segurava sua mochila. Virou-se parcialmente para o irmão, esboçando um sorriso que mal conseguia esconder a dor em seu olhar.

— Vou à escola… — respondeu, com um suspiro carregado de cansaço, sua voz soando mais frágil do que ela queria.

Free, sem perceber o peso que carregava sua irmã, abriu um sorriso inocente e animado.

— Se cuide por lá! — disse ele, tentando transmitir carinho com sua energia infantil.

Chelsea apenas assentiu, mas quando se virou novamente, seu sorriso desmoronou. Enquanto ela ajustava a mochila no ombro, Tomone, a mãe deles, apareceu na porta.

— Chelsea — chamou ela, com uma voz firme, mas cheia de preocupação.

Chelsea levantou o olhar rapidamente, como se fosse pega tentando esconder algo.

— Estou atrasada... — respondeu, tentando apressar o passo.

Tomone, porém, deu um passo à frente, impedindo-a de sair sem olhá-la nos olhos.

— Filha, você está bem? Sabe que não  precisa ser forte o tempo todo… — perguntou ela, preocupada.

Chelsea desviou o olhar, mordendo o lábio para conter a onda de emoções que ameaçava transbordar.

— Estou bem, mãe. Só… cansada, só isso. — respondeu Chelsea, tentando se conter.

Sem insistir, mas com o coração apertado, Tomone deixou que Chelsea passasse pela porta. Ela sabia que as palavras da filha eram apenas um escudo. Ao vê-la sair, Tomone olhou para Free, que ainda a observava com um sorriso inocente, sem entender a profundidade do que estava acontecendo.

— Ela vai ficar bem, né mãe? — perguntou ele, confiante.

Tomone não respondeu de imediato. Apenas o abraçou de leve, desejando que ele nunca precisasse carregar aquele tipo de dor.

— Vai, querido… Vai ficar tudo bem. — ela responde, com um tom de preocupação para com Chelsea.

Enquanto isso, Chelsea saiu de casa apressada, mas com passos pesados, como se o chão puxasse seus pés para baixo. O vento frio da manhã acariciava seu rosto, mas não trazia conforto; apenas um vazio que parecia crescer a cada dia. Ela segurava a alça da mochila com força, como se aquilo pudesse evitar que desmoronasse.

Tomone observava pela janela da cozinha enquanto a filha desaparecia pela rua. Seus olhos refletiam preocupação e culpa. Sentia-se impotente por não conseguir alcançar a dor que Chelsea tentava esconder. Ela se virou para continuar o café da manhã, mas suas mãos tremiam levemente enquanto mexia o bule.

Free, ainda curioso com o comportamento da irmã, correu para a cozinha. Ele arrastou uma cadeira para perto da mesa e subiu nela, olhando fixamente para a mãe.

— Mãe, por que a Chelsea está tão triste? — perguntou ele com a sinceridade de quem não entendia completamente o que via, mas sabia que algo estava errado.

Tomone parou por um instante, sentindo o peso da pergunta. Ela sabia que não podia dizer a verdade, não daquela forma. Não queria que Free carregasse a mesma angústia.

— Às vezes, as pessoas têm dias difíceis, meu amor. Mas é por isso que precisamos cuidar umas das outras, como você faz com a Chelsea, dando aquele seu sorriso bonito. — respondeu ela, forçando um tom suave, enquanto passava a mão pelos cabelos bagunçados do filho.

— Então vou dar mais sorrisos pra ela! Assim ela fica feliz de novo. — disse ele, cheio de convicção.

Tomone sorriu, mas era um sorriso misturado com tristeza. Ela sabia que o amor de Free era sincero, mas também sabia que, às vezes, um sorriso não era suficiente para curar feridas tão profundas.

Chelsea caminhava pela calçada, passando por rostos conhecidos que não faziam questão de olhá-la nos olhos. Era como se estivesse invisível ou, pior, como se fosse algo a ser evitado. Ela mantinha os olhos baixos, tentando bloquear os murmúrios e risadas que ecoavam atrás dela.

Ao chegar na escola, a rotina era a mesma de todos os dias. As risadas maldosas começavam assim que ela cruzava o portão. Um grupo de colegas a olhava de cima a baixo, cochichando palavras que ela já conhecia tão bem que nem precisava ouvir claramente.

— Nossa, Chelsea, o que você fez com seu cabelo? Parece que tentou pentear com um garfo! — dizia uma garota, enquanto os outros riam.

Chelsea não respondia. Apertava a alça da mochila, mantendo o olhar fixo no chão. Ela sabia que, se tentasse se defender, só pioraria as coisas.

Dentro da sala de aula, as coisas não eram diferentes. As cadeiras ao redor dela permaneciam vazias, como se ela carregasse uma espécie de doença contagiosa. Os cochichos continuavam, agora misturados com bilhetes deixados em sua mesa, contendo palavras que queimavam mais do que qualquer insulto falado.

Durante o intervalo, Chelsea encontrou um canto isolado no pátio. Era o único momento em que podia respirar sem sentir tantos olhares julgadores. Ela olhou para o céu e suspirou profundamente, tentando ignorar o nó que apertava seu peito.

Mas, mesmo ali, ela não tinha paz. Um dos garotos do grupo que a provocava passou por ela e jogou um pacote de lanche vazio ao lado.

— Talvez você queira comer isso. Parece que você já come qualquer coisa, né? — ele disse, com um sorriso cruel antes de ir embora.

Chelsea não reagiu. Não chorava na frente deles, não dava essa satisfação. Mas, por dentro, algo em seu coração parecia se partir um pouco mais a cada palavra.

Free passou o dia tentando encontrar formas de animar Chelsea. Ele desenhou um retrato dela, com o sol brilhando ao fundo, e deixou o papel sobre a cama dela, ansioso para que ela visse ao chegar.

Quando Chelsea voltou para casa naquela tarde, ela parecia ainda mais exausta do que pela manhã. Tomone a recebeu com um sorriso, mas não insistiu em perguntar como havia sido o dia. Já sabia a resposta.

Chelsea foi direto para o quarto, largando a mochila no chão. Ao sentar-se na cama, encontrou o desenho de Free. Era simples, mas cheio de vida. Ela segurou o papel por alguns segundos, e pela primeira vez no dia, sentiu algo aquecer seu coração.

Free apareceu na porta, com um sorriso largo.

— Você gostou, Chelsea? Fiz pra você sorrir! — Free fala mostrando seu desenho para Chelsea.

Chelsea olhou para ele, e mesmo que fosse apenas um sorriso frágil e breve, ela conseguiu esboçar um.

— Obrigada, Free… É lindo. — respondeu ela, sorrindo fracamente.

Enquanto Free voltava a brincar no corredor, contente com sua “missão cumprida”, Chelsea deitou-se segurando o desenho contra o peito. Por um instante, sentiu que talvez ainda houvesse algo de bom no mundo.

Mas, mesmo assim, o peso em seu coração não desaparecia. E ela sabia que, após o feriado de independência, tudo começaria novamente.

A manhã em Sateraite trouxe o agito típico das festividades de independência. Bandeiras penduradas em postes, música tocando pelas ruas, e os moradores se preparavam para as celebrações noturnas. Na casa dos Goshui, Sakumo estava particularmente animado. Ele havia comprado uma grande quantidade de fogos de artifício para o evento, desejando tornar aquele dia especial para a família, especialmente para Free, que adorava luzes coloridas no céu.

Chelsea, no entanto, continuava quieta. Embora tivesse trocado algumas palavras com a família, sua mente estava distante, como se estivesse apenas assistindo a tudo de longe. Enquanto ela tentava ajudar Tomone na cozinha, Free correu até ela segurando um pequeno balão decorado.

— Chelsea, Chelsea! Vamos soltar balões juntos hoje? Vai ser divertido! — disse ele, com a empolgação de uma criança que via as festividades como algo mágico.

Chelsea olhou para ele, hesitando. Não queria desapontá-lo, mas também não tinha energia para se juntar à alegria dele.

— Talvez mais tarde, Free. Ainda tem muita coisa para fazer aqui... — respondeu, tentando evitar um “não” direto.

— Eu vou te esperar! — disse ele, correndo para fora com o balão.

Durante a noite, Free estava animado para a queima de fogos que sempre acontecia todos os anos na sua família, Sakumo havia preparado um espaço no quintal para soltar os fogos, enquanto Tomone cuidava de Free e Chelsea, garantindo que todos estivessem seguros. Free, ansioso, não conseguia parar de pular.

— Papai, papai! Vamos soltar os fogos agora? — perguntou ele, com os olhos brilhando de expectativa.

— Calma, campeão! Primeiro vamos testar um pequeno — respondeu Sakumo, acendendo um pequeno foguete, que subiu ao céu e explodiu em uma chuva de luzes douradas.

Free soltou uma risada alta, batendo palmas, enquanto Chelsea apenas observava de longe, ainda mantendo um sorriso forçado.

Conforme a queima de fogos avançava, Sakumo decidiu acender uma sequência maior, uma caixa cheia de pequenos fogos importados que ele havia comprado recentemente. Ele não sabia, no entanto, que a qualidade dos produtos era duvidosa e que os fogos tinham sido mal armazenados.

Quando acendeu o pavio, algo deu errado. Em vez de subir ao céu, um dos fogos explodiu ainda no chão, desencadeando uma reação em cadeia. A explosão foi alta e repentina, sacudindo o quintal como um trovão. Free, que estava perto demais, foi arremessado para trás pelo impacto.

— Free! — gritou Chelsea, correndo em direção ao irmão, enquanto Sakumo e Tomone tentavam entender o que havia acontecido.

Free estava no chão, chorando e segurando os ouvidos. O som da explosão tinha sido devastador, e ele não conseguia ouvir nada além de um zumbido ensurdecedor.

— Free! Você está bem? — Tomone pergunta, mas Free não conseguiu responder.

— Ele está machucado? Está sangrando? — perguntou Chelsea, com as mãos trêmulas, tentando afastar o medo que tomava conta dela.

— Não há cortes, mas os ouvidos dele estão sangrando… — respondeu Tomone, com a voz embargada.

Free olhava para todos, mas não entendia o que diziam. Tentava falar, mas sua voz parecia abafada até para ele.

Horas depois, no hospital local, o diagnóstico foi dado: os tímpanos de Free haviam sido gravemente danificados pela explosão. Ele perdera 80% da audição. O médico explicou que, com o uso de aparelhos auditivos, ele poderia recuperar parte da capacidade de ouvir, mas a perda seria permanente.

Para uma criança tão pequena, as mudanças seriam desafiadoras. Free, ainda confuso, olhou para seus pais enquanto o médico explicava a situação. Ele não conseguia ouvir nada claramente, apenas os ecos distantes das palavras, como se estivesse submerso.

Chelsea, sentada ao lado, segurava sua mão com força. Pela primeira vez em muito tempo, sua tristeza deu lugar a uma culpa esmagadora. Sentia que deveria ter ficado mais perto dele, que deveria ter impedido de alguma forma aquele acidente.

— Vou ficar bem, Chelsea? — perguntou Free, com uma voz fraca, enquanto olhava para ela.

Chelsea, contendo as lágrimas, forçou um sorriso e apertou ainda mais sua mão.

— Vai sim, Free. Eu prometo. — respondeu ela.

Após o acidente, a casa dos Goshui ficou em silêncio. A alegria usual de Free foi substituída por um comportamento mais retraído, enquanto ele tentava se adaptar ao uso dos aparelhos auditivos. Chelsea passou a dedicar mais tempo ao irmão, sentindo que era sua responsabilidade compensar o que ele havia perdido.

— Quer desenhar comigo hoje, Chelsea? — perguntou Free, com um sorriso tímido, enquanto mexia nos aparelhos em suas orelhas, tentando se acostumar com o incômodo.

— Claro, Free. Vou desenhar o céu com você. — respondeu Chelsea, sentando-se ao lado dele.

No fundo, ela sabia que não podia desfazer o que aconteceu. Mas, ao olhar para o irmão, sentiu que, talvez, poderia ajudá-lo a encontrar luz mesmo nos momentos mais escuros — algo que ela mesma ainda buscava.

Enquanto isso, Sakumo carregava o peso da culpa pelo acidente, mesmo que ninguém o culpasse diretamente. Ele passava mais tempo no trabalho, evitando os olhares de Tomone e as perguntas de Free.

A explosão havia deixado cicatrizes profundas, não apenas nos ouvidos de Free, mas no coração de toda a família.

O som estridente do sinal ecoava pelos corredores, marcando o início das aulas. Chelsea caminhava lentamente até sua sala, os olhos fixos no chão, como se o peso do mundo estivesse em seus ombros. Ao entrar, os sussurros começaram, baixos o suficiente para não serem claros, mas altos o bastante para que ela soubesse que era o centro das atenções — e das piadas.

— Lá vem a esquisita! — murmurou uma voz.

Outro risinho escapou de um canto da sala.

Chelsea fingiu não ouvir. Apertou os livros contra o peito, como se aquilo pudesse protegê-la, e caminhou até a última fileira de carteiras, onde sempre se sentava sozinha. Tentava se concentrar no quadro negro, nas palavras do professor, em qualquer coisa que não fossem as risadas abafadas.

— Ei, Chelsea, você não está sentada na cadeira errada?  Saia daqui, sua estranha! — comentou um dos garotos em voz alta, arrancando gargalhadas dos demais.

As palavras atingiram Chelsea como lâminas invisíveis. Seu rosto queimava, mas ela não levantou os olhos. Respirou fundo, sem responder. Resistir era tudo o que podia fazer.

Na hora do intervalo, Chelsea caminhava pelo pátio com sua bandeja de comida, procurando um lugar isolado. Sentou-se em um banco próximo às árvores, onde as sombras a escondiam parcialmente. Antes mesmo de levar a primeira garfada à boca, ouviu passos e risadas.

— E aí, Chelsea, vai comer tudo isso? Não vai dividir com a gente? — perguntou uma garota, arrancando a bandeja de suas mãos.

Chelsea levantou-se rapidamente.

— Me devolve! — implorou, mas sua voz saiu fraca.

— Calma, só queremos te ajudar... Você não quer ser mais bonita? — debochou outra menina, jogando a comida no chão.

Os risos ecoaram novamente, enquanto Chelsea se abaixava para juntar os restos. Suas mãos tremiam, e as lágrimas que segurava desde a manhã começaram a nublar sua visão.

— Ela parece um cachorro, olha isso! — gritou um garoto, e mais risadas se espalharam pelo pátio.

Chelsea se levantou de súbito, sem olhar para ninguém, e saiu correndo. Passou pelos corredores, ignorando os olhares de desprezo e os comentários. Ao chegar ao banheiro, trancou-se em uma das cabines, deslizando até o chão.

Ali, longe dos olhos de todos, Chelsea deixou as lágrimas caírem.

— Por que eu? — murmurou baixinho, encostando a cabeça contra a parede fria.

As horas arrastaram-se até o fim do dia. Quando a última aula terminou, Chelsea pegou suas coisas e caminhou para casa em silêncio, sentindo-se mais vazia do que nunca.

Ao entrar em casa, Chelsea encontrou Free no chão da sala, desenhando algo com seus lápis de cor. Ele olhou para ela com seu sorriso inocente, mas o rosto cansado da irmã o fez parar.

— Chelsea! Você voltou! Quer ver o desenho que fiz? É o céu com muitos fogos de artifício! — disse Free, levantando o papel com entusiasmo.

Chelsea forçou um sorriso frágil e passou a mão carinhosamente na cabeça dele.

— Depois eu vejo, maninho. Deixa eu só descansar um pouco, tá?

Free assentiu, embora ainda a observasse com um olhar curioso.

Mais tarde naquela noite, enquanto o silêncio reinava na casa, Chelsea chamou o irmão. Ela estava sentada no sofá, os olhos mais suaves, como se quisesse guardar aquele momento para sempre.

— Maninho, preciso falar algo sério com você — disse ela, com uma voz doce, quase um sussurro.

Free, curioso como sempre, correu até ela.

— O que foi, irmãzona? — perguntou ele, sorrindo, enquanto se aproximava e se sentava ao lado dela.

— Posso te perguntar uma coisa? — Chelsea continuou, olhando com ternura para o irmão.

— Pode sim! — respondeu Free, sorrindo calmamente.

Chelsea fez um carinho na cabeça de Free, que, sentindo o conforto do toque, se deitou no colo dela.

— Você sabe o real motivo pelo qual você nasceu com uma força maior que a de muita gente? — perguntou Chelsea, sua voz carregada de um misto de amor e melancolia, enquanto os dedos deslizavam pelos cabelos do irmão.

Free franziu a testa por um instante, pensativo.

— Não, não sei… — respondeu ele, fechando os olhos e se aconchegando no colo da irmã.

— Vou te dizer então: você nasceu com uma força enorme dentro de você, e sabe o que deve fazer com ela? Ajude os outros. Mesmo que seja uma pessoa só, já está bom. Mas ajude quantas pessoas puder e se cerque de amigos e pessoas que você ajudou de alguma forma. — explicou Chelsea, tentando segurar o choro que ameaçava escapar.

— Por quê? — perguntou Free, curioso, olhando para cima, para o rosto de Chelsea.

Ela respirou fundo, mantendo o carinho nos cabelos do irmão.

— Sabe, o poder foi criado para ajudar os outros, nunca para ganho pessoal ou para fazer maldades… Seja forte e ajude os outros… — continuou ela, com a voz embargada. — Quando você crescer, você quer entrar para a polícia militar, certo? Pois um dia, você será o melhor policial…

Chelsea fez uma pausa, tentando encontrar forças para concluir. As lágrimas começaram a escorrer por seus olhos amarelo-topázio.

— Só me prometa uma coisa: você vai usar essa força enorme que você tem, só para ajudar quem precisa… — pediu, enquanto as lágrimas finalmente rolavam por seu rosto.

Free assentiu, com a sinceridade de uma criança que acreditava em tudo que a irmã dizia.

— Eu prometo, só vou usar minha força para ajudar os outros! — afirmou Free.

Chelsea olhou para ele, e naquele momento, o peso que carregava parecia um pouco mais leve.

— Free, você foi o único e o melhor irmão que já tive. Muito obrigada por fazer parte da minha vida. Eu sempre vou te amar, não importa onde eu esteja… — finalizou Chelsea, com a voz quase sumindo, enquanto as lágrimas continuavam a cair.

Free olhou para ela, sentindo o peso das palavras, mesmo sem compreender totalmente o significado por trás delas. Ele apenas sabia que queria fazer Chelsea se orgulhar, não importava o que acontecesse.

Chelsea sorriu, mesmo em meio às lágrimas, e continuou acariciando os cabelos do irmão. Naquele instante, ela sentiu que, talvez, aquele fosse o momento mais sincero e precioso de sua vida.

A semana havia se arrastado lentamente desde o último diálogo entre Chelsea e Free. Mesmo depois das palavras doces ditas ao irmão, o olhar dela parecia cada vez mais distante. Em casa, ela falava menos, comia menos, e seu sorriso, que já era raro, desaparecia por completo.

Tomone, atenta, percebeu que o peso sobre Chelsea aumentava. Ela tentou se aproximar, bater à porta do quarto, chamar para conversas casuais, mas Chelsea apenas respondia com um “tô bem, mãe” antes de se isolar novamente.

Naquela manhã de sábado, o sol entrava fraco pela janela do quarto. Chelsea acordou cedo, como se estivesse decidida a algo. Olhou ao redor, observando Free ainda dormindo em sua cama, com a respiração calma e o rosto sereno. Ela se aproximou dele, sentou-se ao lado e o observou por alguns instantes.

— Dorme bem, maninho… — sussurrou ela, colocando uma mecha de cabelo dele para o lado.

A voz dela era carinhosa, mas um vazio podia ser sentido ali.

Por volta do meio-dia, Tomone estranhou o silêncio da casa. Chelsea não tinha descido para o café, e Free, já acordado, brincava sozinho no quintal. Quando Tomone subiu as escadas e bateu à porta do quarto da filha, não obteve resposta.

— Chelsea? — chamou ela, com o coração começando a acelerar.

Sem retorno, a mãe girou a maçaneta. A porta estava destrancada.

Ao entrar, o quarto de Chelsea parecia calmo demais. O pequeno bilhete em cima da escrivaninha, dobrado com cuidado, foi a primeira coisa que chamou sua atenção. Com as mãos trêmulas, Tomone o abriu:

“Desculpa, mamãe. Desculpa, papai. Por favor, cuidem do Free. Eu não consegui mais ser forte. Eu amo vocês.”

O bilhete caiu das mãos de Tomone enquanto ela correu para o banheiro próximo. Foi ali que encontrou Chelsea, caída no chão frio.

O grito de Tomone ecoou pela casa inteira, ao perceber que Chelsea não estava mais entre os que vivem.

Free estava no quintal, empilhando pedras e fingindo construir algo. O som agudo da voz da mãe fez com que ele largasse tudo e corresse para dentro. O caos havia se instalado. Seu pai, Sakumo, subia as escadas às pressas, e sua mãe chorava alto, repetindo o nome de Chelsea.

— Mamãe? Papai? O que aconteceu? — perguntou Free, mas ninguém o ouvia.

Confuso, ele ficou parado no meio da sala, observando os adultos se moverem de um lado para o outro. Naquele momento, ele não entendia exatamente o que estava acontecendo, mas algo em seu peito começou a doer.

Horas depois, quando a casa se acalmou em meio ao silêncio fúnebre, Free se sentou no sofá com um olhar perdido. Ele segurava o desenho que fizera na noite anterior: um céu cheio de fogos de artifício, que agora parecia muito mais escuro do que antes.

Tomone se aproximou, com os olhos vermelhos de tanto chorar. Ela se ajoelhou ao lado do filho, segurando-o com delicadeza.

— Filho… a Chelsea… — começou ela, mas sua voz falhou.

Free olhou para a mãe, esperando uma explicação.

— Ela foi embora, meu amor… A Chelsea… não vai voltar mais.

— Para onde ela foi? — perguntou Free, inocentemente.

Tomone não conseguiu responder. Apenas o abraçou com força, enquanto lágrimas silenciosas desciam pelo rosto do menino.

— Ela prometeu… — murmurou Free baixinho, com a voz embargada.

— Ela prometeu que ia ver meu desenho... — Free responde chorando ao ver sua irmã sem vida, sem entender a situação.

O céu estava nublado no dia do funeral de Chelsea. Uma pequena multidão se reuniu no cemitério local, mas Free não conseguia compreender por que todos estavam tão tristes. Ele segurava uma pequena flor branca que sua mãe lhe dera e olhava para o caixão fechado, sem entender o que aquilo significava.

Ele se aproximou lentamente e colocou a flor sobre o caixão, imitando os adultos ao seu redor.

— Eu fiz um desenho novo pra você, Chelsea… Quando você voltar, eu te mostro, tá? — disse ele baixinho, como se a irmã pudesse ouvir.

Sakumo colocou a mão no ombro do filho, tentando consolá-lo.

— Ela sempre vai estar com você, Free — sussurrou o pai, com a voz embargada.

Free não respondeu. Seu pequeno coração sentia que algo estava errado, mas ele ainda não conseguia dar um nome para a dor que começava a se instalar dentro dele.

Naquela noite, deitado em sua cama, Free olhou para o lado onde Chelsea costumava dormir. O espaço estava vazio, e o silêncio era ensurdecedor. Ele se lembrou das palavras dela, daquele último diálogo, e do carinho que sentiu enquanto ela falava sobre “usar a força para ajudar os outros”.

Free apertou os olhos, deixando lágrimas rolarem pelo rosto.

— Eu prometo, Chelsea… — sussurrou ele, com a voz tremendo.

— Eu vou ajudar os outros… Eu prometo que vou ser forte. — afirmou Free, com lágrimas em seus olhos azuis-safira.

Naquela noite, mesmo sem compreender tudo o que havia acontecido, uma semente foi plantada no coração de Free: a promessa de ser alguém que ajudaria os outros, de honrar a memória da irmã e de se tornar a pessoa que ela acreditava que ele poderia ser.

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