Era uma manhã tranquila em Sateraite, e Free estava ao lado de Sheele no hospital. Ele permanecia atento, sentado ao lado do leito, enquanto ela descansava. O som monótono do monitor cardíaco era o único ruído na sala, até que passos ecoaram pelo corredor e uma figura inesperada entrou no quarto.
Ao levantar os olhos, Sheele congelou. Lá estava ele. Xavier, seu pai, que ela não via há anos. A presença dele trouxe uma avalanche de lembranças dolorosas que ela havia enterrado a muito custo. Xavier deu um passo hesitante para dentro, os olhos cheios de arrependimento. — Filha... Eu vim assim que soube do que aconteceu. — ressaltou Xavier, olhando para Sheele. Aquelas palavras acenderam uma chama de raiva em Sheele. Ela se sentou mais ereta na cama, o olhar fixo nele como se fosse uma lâmina. — Filha? — começou ela, a voz carregada de rancor. — Não se atreva a me chamar assim. Você traiu minha mãe, nos abandonou quando eu era apenas uma criança, e agora aparece anos depois como se nada tivesse acontecido? — perguntou, a voz cheia de amargura e tristeza. As palavras dela eram afiadas, como facas cortando fundo. Xavier tentou avançar, mas vacilou ao notar Free ali, o jovem lobo de olhar firme e protetor ao lado de sua filha. — Quem é ele? — perguntou Xavier, tentando esconder o desconforto em sua voz. — Sou amigo da Sheele. — respondeu Free, mantendo seu tom sério, mas estudando Xavier com desconfiança. Xavier respirou fundo, desviando o olhar para Sheele novamente. — Eu sei... Sei que o que eu fiz foi errado. Não há desculpa para o que fiz à sua mãe, ou a você. Mas, por favor, me escute... Eu vim aqui para tentar consertar as coisas. Quero reconstruir o que destruí. — afirmou Xavier, com um tom amargo que refletia seu arrependimento. Sheele apertou os lençóis com força, sua expressão uma mistura de dor e frustração. — Reconstruir? Depois de anos? — Ela soltou uma risada amarga. — Você sabe o que é crescer sem um pai? Ver minha mãe lutar sozinha enquanto você estava sabe-se lá Deus onde? — completou ela, a voz cheia de amargura e um tom cirúrgico. Xavier parecia querer responder, mas as palavras não vinham. Ele sabia que Sheele tinha razão. — Eu não estou pedindo perdão imediato... Só uma chance. Uma chance de mostrar que mudei. Free finalmente quebrou o silêncio, sua voz firme. — Se você quer mesmo consertar as coisas, vai precisar provar isso. Não só com palavras, mas com ações. Porque ela não merece mais decepções. — ressaltou ele, vendo a interação de Sheele com Xavier. Sheele olhou para Free, surpresa pela firmeza em sua voz, e depois voltou a encarar o pai. — Eu não vou perdoar você... Não agora. Mas se você realmente quer mudar, vai ter que me provar com o tempo. — afirmou ela, o tom frio. Xavier assentiu lentamente, os olhos marejados. — Obrigado, filha... Eu vou provar. Ele deu um último olhar para Sheele antes de sair do quarto, deixando um peso no ar. Quando a porta se fechou, Sheele suspirou, as emoções finalmente transbordando. — Você acha que ele merece uma chance? — perguntou ela, virando-se para Free. — Eu acho que só o tempo vai responder isso. Mas, independentemente do que acontecer, você não está sozinha, Sheele. — afirmou Free. Ela sorriu levemente, ainda com os olhos marejados. — Free, eu só queria que ele nunca tivesse feito aquilo... Que ele nunca tivesse ido embora! — respondeu ela, chorando um pouco. — Eu sei, Sheele... Entendo como se sente... — Free responde se chegando mais perto de Sheele. Sheele respirou fundo, tentando se acalmar. As palavras de Free a ajudavam a manter o controle, mesmo quando tudo dentro dela parecia prestes a desmoronar. Ela sabia que ainda havia um longo caminho pela frente, tanto para perdoar seu pai quanto para encontrar a paz interior, mas com Free ao seu lado, ela sentia que talvez, só talvez, pudesse um dia encontrar essa paz. Pela tarde, o clima estava mais tranquilo, com uma leve chuva e um pouco de frio, Free estava ao lado de Sheele, com uma expressão cansada depois de quase dois dias sem dormir nenhum minuto. — Free... Percebi que você não dormiu desde que chegamos aqui. — comentou Sheele, a voz refletindo preocupação. — Eu estou bem, Sheele... — respondeu ele, bocejando um pouco. — Não quer dormir um pouco? Se quiser te ofereço meu colo pra você dormir... — ressaltou ela, olhando para Free. — Você ficou muito tempo sem dormir... Por favor durma. — pediu ela, vendo o nítido cansaço no rosto de Free. — Mas, será que eu posso? — perguntou Free, com um tom de curiosidade. — Pode vir, deite a cabeça no meu colo e relaxe, apenas relaxe... — pediu ela, a voz cheia de sinceridade. Após deitar a cabeça no colo de Sheele, Free logo foi se acomodando, enquanto ela deslizava os dedos pela sua pelagem branca e densa. — Você sempre foi a calmaria na minha tempestade... Agora permita-me ser a calmaria da sua. — Sheele fala com uma voz baixa e terna. —O seu toque me lembra um pouco de como a Chelsea fazia carinho no meu pelo todo dia antes de sair... — comentou Free, sua voz cheia de sinceridade enquanto começava a cochilar no colo de Sheele. Assim que ele começou a pegar no sono, Sheele começou a lembrar de cada momento em que Free esteve lá para defendê-la e de como ele sempre a abraçou quando ela precisou. — Muito obrigada por cada momento em que você esteve lá para mim... Não há nada que compre o que eu sinto por você, Free Goshui... — começou ela, alisando a pelagem do lobo branco que dormia em seu colo. — Eu te amo, sabia? E ainda que eu não tenha te dito, eu te amo do fundo do meu coração. — confessou a javalina, a voz cheia de gratidão e ternura ao ver Free dormindo calmamente em seu colo. Free dormia profundamente, sua respiração tranquila indicando que, pela primeira vez em dias, ele finalmente descansava. E enquanto ela o observava, Sheele sentiu que, naquele momento, o mundo lá fora poderia desaparecer, e tudo o que importava era o lobo leucístico de olhos azul-safira que tinha dado tanto por ela. — Ainda que eu soubesse todas as palavras que significam amor, ainda faltaria muito pra descrever meu amor por você, Free... — afirmou Sheele, sorrindo ternamente enquanto Free ainda dormia. — Você foi como um anjo na minha vida, eu não sei como posso lhe agradecer por sempre ter me protegido... — monologou ela, ainda alisando a pelagem de Free. Quando a noite caiu sobre Sateraite, Sheele aproveitou o momento para apenas dormir e descansar bastante para se recuperar e ao raiar do sol, Free ainda dormia um pouco enquanto Sheele já estava acordada. — Ele ainda está dormindo... — observou, o olhar sereno e terno. — Senhorita Leonheart, chegaram os resultados dos testes... — o médico responsável pelo seu caso fala enquanto Free começa a acordar. — Bom dia, Sheele... — Free responde com voz de sono. — Bom dia, Free... — respondeu ela, olhando para Free. — Quais foram os resultados dos exames dela? — perguntou Free, com um tom de curiosidade e preocupação. — Ainda hoje ela vai ter alta, só precisamos de uma última avaliação... — respondeu o médico, olhando para a javalina. Enquanto o médico responsável pelo caso de Sheele a avaliava, Free aguardava ansiosamente para a resposta, a fim de saber se ela vai precisar ficar mais tempo ou não. — Bom, ela está estável e consciente, não há sinais de maiores sequelas ou problemas, então ela pode ir pra casa... — respondeu o médico, com um tom assertivo. Após sair do leito onde estava internada, Sheele criou coragem e foi até Free a fim de falar com ele. — Free... Antes de nós irmos pra minha casa, eu quero falar com você. — pediu Sheele, vacilando um pouco na voz. — Sobre o quê? Você está bem? — perguntou ele, olhando para ela. — Sim, eu estou bem... Só quero te falar uma coisa importante. — respondeu Sheele, saindo pelo hospital e agradecendo os profissionais que a socorreram. O sol começava a surgir no horizonte, banhando Sateraite com seus primeiros raios. As gotas de chuva da noite anterior ainda escorriam pelos telhados e folhas das árvores, enquanto Sheele e Free caminhavam para o estacionamento do hospital. Quando chegaram, Sheele parou repentinamente, girando sobre os calcanhares para encarar Free. — Free... — começou ela, a voz hesitante, as mãos trêmulas enquanto as palavras se formavam em sua mente. — Desde que te vi pela primeira vez, eu senti algo diferente em você. Não sabia o que era, mas era algo único, algo especial... — continuou ela, respirando fundo para conter a emoção. — E quando você me defendeu do Lean, eu percebi que você não era só alguém especial, mas alguém que... Que sempre esteve ao meu lado, mesmo nos meus piores momentos. Eu não sei como expressar isso em palavras, mas... — Ela deu um passo à frente, seus olhos brilhando com lágrimas contidas. — Free, eu te amo. Eu te amo mais do que posso explicar. — afirmou ela. O silêncio entre os dois durou apenas um momento, mas parecia eterno. O olhar de Free suavizou enquanto ele processava as palavras dela, e, por fim, um sorriso caloroso surgiu em seus lábios. Ele pegou gentilmente a mão de Sheele entre as suas. — Sheele, eu... Eu também sou grato por você estar na minha vida. — Ele começou, a voz baixa e cheia de sinceridade. — Você apareceu quando eu mais precisava, quando tudo parecia perdido. E o que eu sinto por você não é só gratidão... É algo muito maior. — Ele apertou de leve a mão dela, seus olhos fixos nos dela. — Eu te amo, Sheele. Amo mais do que imaginei que poderia amar alguém. — afirmou ele. Ele deu um passo à frente, envolvendo-a em um abraço caloroso. Suas mãos passaram suavemente pelo rosto dela, os dedos delicados traçando levemente o contorno de seu rosto. — Você é como um diamante, raro e precioso. Seu sorriso é o mais lindo que já vi, e cada pequena parte de quem você é, o jeito doce, gentil e forte faz meu coração bater mais rápido sempre que estou perto de você. — Sua voz era calma, mas carregada de emoção. Enquanto Free falava, seus rostos começaram a se aproximar, como se fossem atraídos um pelo outro. As respirações de ambos se sincronizavam, seus corações disparados em uma harmonia quase palpável. Free levantou a mão, pousando-a suavemente na nuca de Sheele. Seus olhos se encontraram por um momento que parecia infinito. Então, lentamente, seus lábios se tocaram, selando a confissão mútua em um beijo terno e cheio de significado. Naquele instante, tudo ao redor desapareceu. Não havia mais o hospital, nem a cidade, nem os desafios que enfrentaram. Apenas o calor de seus corações unidos, como se o universo inteiro tivesse parado para assistir ao nascimento daquele amor. — Eu te amo, e sempre vou te amar, meu lobinho... — Sheele responde enquanto deixava escapar um breve sorriso. — Seu sorriso é lindo, e pra completar, essas presinhas de fora o deixam ainda mais bela... — respondeu Free. — E eu também te amo, minha javalizinha... — completou ele, roubando mais um beijo nos lábios de Sheele. — Vamos pra casa? Se quiser posso te carregar nas minhas costas? — perguntou Free, com um tom de curiosidade. — Sim, até porque eu estou me sentindo meio cansada... — respondeu Sheele, enquanto Free se abaixava para carregá-la. Após ajustar Sheele em suas costas de forma a lhe proporcionar conforto, Free começou a andar lenta e calmamente pelas ruas da cidade. — Free, obrigada por corresponder meus sentimentos... Não sabia que você também gostava de mim... — agradeceu ela, fechando os olhos brevemente. — De nada, Sheele... — respondeu ele, sorrindo um pouco. — Sou muito grata por tudo que passamos juntos, desde as vezes em que você me protegeu do Lean até agora... — agradeceu ela novamente, sua voz cheia de gratidão. — Eu faria tudo de novo se precisasse, minha javalizinha querida... — respondeu ele, virando o rosto e olhando para Sheele. Ela riu baixinho, a risada um misto de ternura e cansaço, enquanto Free virou o rosto para olhá-la novamente. O olhar de ambos se encontrou, carregado de uma conexão que parecia eterna. Naquele breve momento, o amor deles parecia maior do que o mundo ao redor, como se cada passo que Free desse os levasse para um futuro onde estariam sempre juntos.