Mundo ficciónIniciar sesiónA proposta ficou suspensa entre nós, vibrando no ar gelado da noite paulistana. A vida dela... pela sua liberdade.
Eu não respondi de imediato. O choque inicial tinha dado lugar a uma cautela fria. Olhei para Peter Blackwood. Ele não parecia um homem fazendo um negócio; parecia um predador brincando com a comida antes de dar o bote.
— Você fala de liberdade como se fosse uma mercadoria, Senhor Blackwood — minha voz saiu controlada, embora minhas mãos tremessem dentro dos bolsos do paletó dele . — Mas liberdade dada por um homem rico geralmente vem com juros que a gente não consegue pagar.
Peter sorriu. Não foi um sorriso largo, mas um curvar de lábios que fez seus olhos cinzentos brilharem com uma aprovação sombria.
— Juros são para bancos, Alice. Eu não estou te oferecendo um empréstimo. Estou te oferecendo uma troca. — Ele deu um passo lateral, bloqueando o vento, criando uma bolha de silêncio ao nosso redor. — Sua arte, seu tempo, sua exclusividade... em troca da melhor equipe médica do mundo para sua mãe.
— Por que eu? — A pergunta saiu crua. — Você pode comprar qualquer artista nessa festa. Pode comprar o Bastos, a galeria, o prédio inteiro. Por que a garota do champanhe derramado?
Ele ficou em silêncio por um momento, estudando meu rosto como se estivesse memorizando um mapa.
— Olhe para dentro, Alice. — Ele gesticulou para a porta de vidro, para o salão iluminado onde a elite de São Paulo bebia e ria. — O que você vê?
Eu olhei.
— Vejo gente rica fingindo que se importa com cultura.
— Eu vejo cópias — ele corrigiu, a voz destilando tédio. — Vejo sorrisos ensaiados, conversas recicláveis e arte feita para combinar com sofás de veludo. É tudo bege. É tudo... seguro.
Ele se virou para mim, e a intensidade do olhar dele me prendeu como um alfinete em uma borboleta.
— Você não é segura. Você é uma bagunça. Você entra em uma sala e a temperatura muda. Você j**a champanhe em bilionários porque eles insultam sua dignidade. — Ele se aproximou, invadindo meu espaço novamente. — Eu não quero o que é fácil, Alice. Eu quero o que é real. E nesta festa inteira... você é a única coisa que não parece feita de plástico.
A "comunicação" dele era sedutora, envolvente. Ele estava transformando minha falha em um troféu.
— Você quer me colecionar porque eu sou... "real"? — zombei, tentando não deixar o elogio distorcido me afetar. — Isso soa como capricho de quem tem dinheiro demais.
— Chame do que quiser. Capricho. Obsessão. Patrocínio. — Ele deu de ombros, o tecido do terno esticando nos ombros largos. — O nome não muda o fato de que eu tenho a caneta para assinar o cheque que salva sua mãe. E você tem a caneta para assinar sua lealdade a mim.
— Lealdade... — repeti a palavra, sentindo o peso dela. — Isso soa como uma coleira.
— Ou como um cinto de segurança — ele rebateu rápido, a sinergia entre nós faiscando. — Depende de quem está dirigindo.
Eu o encarei. Ele era arrogante, perigoso e, irritantemente, a única saída que eu tinha. Mas eu não ia me vender ali, no frio, com a música ruim da festa ao fundo.
— Eu tenho termos — eu disse, erguendo o queixo.
— Eu imagino que tenha.
— E eu não vou discutir a vida da minha mãe em uma varanda, enquanto metade da sociedade paulistana tenta espiar através do vidro para ver quem é a mulher com o casaco do Peter Blackwood.
Peter olhou para a porta de vidro. Ele viu os olhares curiosos, os cochichos. A "privacidade" ali era uma ilusão.
Ele voltou o olhar para mim, e um brilho de respeito surgiu naqueles olhos de tempestade.
— Você está certa — ele concordou, a voz baixando para um tom íntimo, conspiratório. — Este lugar é um circo. E negócios sérios não se fazem no meio dos palhaços.
Ele estendeu a mão. A palma aberta, grande, marcada por linhas de quem, apesar do dinheiro, sabia segurar o mundo.
— Vamos sair daqui, Alice. Vamos para um lugar onde possamos... negociar... sem plateia.
Eu olhei para a mão dele. Aceitar era o primeiro passo para dentro da jaula. Mas recusar era condenar minha mãe.
Respirei fundo, sentindo o cheiro dele impregnado no paletó que eu usava.
— Onde? — perguntei.
— No meu território — ele respondeu, simples e direto. — Onde as regras são minhas. E onde o café é infinitamente melhor do que essa água suja que eles servem aqui.
Eu hesitei por um segundo, apenas um. Então, coloquei minha mão na dele.
O toque foi elétrico. Quente. Firme.
— Vamos — eu disse.







