Observando

Na calada da noite, com o vento cortando os becos de Moscou, Ivo chegou até o antigo apartamento de Aleksei, um prédio discreto, mas de segurança inexplicavelmente reforçada. Subiu sem chamar atenção, e encontrou o russo como sempre: sereno, impecável e lendo um livro de capa preta ao lado de uma lareira acesa.

Ivo… — disse Aleksei, sem desviar o olhar da página. — Sabia que você viria.

— Preciso falar sobre Amanda Duarte — foi direto. — Carlos está inflamado.

Aleksei fechou o livro com calma e cruzou as pernas. Havia um brilho sutil e ameaçador nos olhos dele.

Conhecer, não. Mas Amanda… Amanda me lembra alguém.

Ivo se inclinou, atento.

— Três anos atrás — começou Aleksei — surgiu uma jovem… fria, bela, letal. Ninguém sabia o nome. Mas ela foi a peça-chave para desmantelar uma rede de facções que operava na Ásia, Leste Europeu e parte da África. Drogas, tráfico de armas, corrupção institucional. Os países envolvidos nunca assumiram publicamente, mas ela… e o grupo que a seguia, trabalharam diretamente com governos aliados.

— Você está dizendo que Amanda fazia parte de um grupo secreto? — Ivo questionou, atônito.

Não fazia parte. Ela era o centro. A peça mais valiosa. A Rainha Negra. Assim chamavam ela nos rastros que deixavam — disse Aleksei, olhando diretamente para Ivo. — Nunca houve provas, só rumores. Mas eu vi. Um dia, quando voltava ao meu apartamento… ela passou por mim no corredor. Linda, serena… e fria. Tão fria quanto o ar daquela noite.

— Você a reconheceu?

— Não com certeza. Mas algo naquela garota... era a mesma presença. E quando entrei no meu apartamento, todos os meus arquivos estavam invadidos. E-mails apagados, contatos zerados. Mas não era uma ameaça: era um alerta.

— Como assim?

— Ela impediu que eu caísse em uma armadilha. Descobrimos depois que nossos associados russos usavam o nome da empresa para lavagem de dinheiro, propina, até venda ilegal de armas. Ela expôs tudo. Cada localização, cada contato, cada transação. E desapareceu. Nenhum rastro. Apenas uma última mensagem, criptografada: "A justiça às vezes veste salto alto."

Ivo recuou um passo, em silêncio. A figura fria e calculista de Amanda agora parecia maior do que qualquer suposição.

— Você tem certeza que era ela?

Aleksei sorriu de lado, ambíguo.

— Com Amanda Duarte… não se tem certeza de nada. Mas… — ele se levantou, pegando um copo de vodka — ...se for mesmo ela, então Carlos está brincando com fogo. E você também. Porque a Rainha Negra… nunca j**a para perder.

vo passou a noite em claro. Depois da conversa com Aleksei, algo dentro dele gritava por respostas. Pela manhã, reuniu-se com Carlos Duarte num escritório discreto de Moscou. Ambos estavam inquietos, preocupados, mas também determinados a descobrir quem era realmente Amanda Duarte.

— Temos que puxar tudo. Registros. Viagens. Comunicações. Até movimentações financeiras dela e dos irmãos — ordenou Carlos, com raiva nos olhos.

Contrataram um grupo de especialistas em ciberinvestigação, alguns com contatos obscuros. Vasculharam arquivos na Suíça, na Rússia, no Brasil. Tentaram, por todos os meios, ligar Amanda a algo concreto.

Mas não encontraram nada.

Ela era limpa. Sem rastro. Sem brechas. Sem nem uma multa de trânsito. Um fantasma envolto em elegância e poder. E, ainda assim, havia algo... algo que os fazia sentir vigiados.

Dois dias depois, às sete da manhã de uma terça-feira, Carlos e Ivo acordaram com ligações frenéticas.

Saiu na primeira página do "Коммерсантъ", um dos maiores jornais de negócios da Rússia:

“Empresários envolvidos em contrato irregular com Senegal são autuados”

Logo abaixo, os nomes:

Ivo Kalashnikov

Carlos Duarte

O escândalo não envolvia cifras altas — o contrato com o Senegal revelava indícios de propina, mas nada que levasse à prisão. Apenas uma multa alta e perda de prestígio no meio corporativo.

Mas o que gelou o sangue de Ivo foi o bilhete que chegou em seu escritório, sem remetente, datilografado, com uma flor seca de jasmim presa com alfinete:

Осторожно, где вы копаетесь.

Королева Чёрная.

(Cuidado onde vocês cavam. Rainha Negra.)

Carlos, ao ler aquilo, caiu sentado.

— Isso foi ela... — murmurou, apavorado.

— Como? Não deixamos rastro… ninguém sabia disso! — disse Ivo, olhando ao redor da sala como se Amanda pudesse estar ali, observando.

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