Os olhos dele estavam marejados. Pela primeira vez na vida, aquele homem que enfrentava o submundo inteiro sem pestanejar, tremia como um menino. Enquanto a equipe médica corria contra o tempo, as portas da sala se fecharam diante de Dante, e ele caiu de joelhos ali mesmo, ao lado do sangue que ela deixou no chão. Petrov baixando-se ao lado dele. — Dante... ela é forte. E o pequeno Villano também. Eles vão resistir. Dante em sussurros, olhando para as mãos sujas de sangue. — Eu devia ter ficado com ela. Eu devia ter morrido no lugar dela... Ela era o que me mantinha humano. Lá dentro, Unirian estava pálida, imóvel. Seu coração parou duas vezes. Os médicos aplicaram choques, massagem cardíaca... o tempo parecia parar. Médico gritou. — Carga total! Choque! — Vamos, respira... respira! Por instantes, só se ouvia o bip contínuo da parada. Até que... BIP... BIP... BIP... O coração dela voltou a bater. Enfermeira ofegante. — Ela... ela está de volta. Fraca, mas está! Outro
A madrugada estava fria. A mansão silenciosa.Dante não dormia direito há semanas, mas naquela noite, o cansaço venceu. Com Villano adormecido no peito, ele se deitou na cama onde um dia Unirian sorriu para ele pela última vez... e caiu num sono denso, sombrio, tão profundo quanto seu vazio.Então veio o sonho.Não havia lugar. Nem luz. Apenas a voz dela.— Dante...— Você tá me ouvindo?A voz soava baixa, distante. Quase como um eco dentro dele.— Não deixa de me sentir.— Eu tô aqui... me encontra.E então, no meio do breu, os olhos dele a viram — ela, vestida de branco, leve, com a mão estendida, como se fosse feita de luz e saudade. O rosto cansado, mas sereno. O ventre vazio. A dor, deixada para trás.— Nosso filho precisa de mim. E eu... preciso de você.Dante tentou correr até ela, mas seus pés afundavam em algo invisível. Como se estivesse preso ao chão da realidade, enquanto a alma dele estendia a mão para alcançá-la.— Acorda pra mim, Unirian...— sussurrou, em lágrimas.
A porta da mansão se abriu devagar, e Unirian cruzou o limiar nos braços de Dante. Ele insistiu em carregá-la, mesmo que ela dissesse que estava bem. Seus olhos estavam atentos a cada passo, como se o chão pudesse ruir a qualquer instante.— Você está exagerando...— ela sussurrou, rindo leve.— Não quero correr riscos. Não mais,— ele murmurou, com os lábios próximos à testa dela.Petrov e Ricci observavam com expressões discretas, mas orgulhosas. Sabiam que ali não morava mais apenas um chefe implacável — mas um homem com algo (ou melhor, alguém) a perder.Ao entrarem no quarto, tudo estava como Dante tinha deixado. Lençóis limpos, travesseiros fofos e ao centro da cama... um pequeno ninho para Villano, cuidadosamente preparado com o mesmo zelo de quem prepara um trono.Unirian sentou-se devagar, suspirando ao olhar o berço portátil ao lado da cama. Dante colocou o bebê com delicadeza, como se estivesse depositando seu próprio coração ali.Ela olhou para ele, com os olhos marejados.—
O som do jazz elegante preencheu o ambiente enquanto os convidados brindavam ao nome dos Marchesi. Dante, agora mais calmo, observava Unirian conversando com os Morozov e segurando Villano no colo com naturalidade. Era como se ela tivesse nascido para aquele mundo — e, de certa forma, havia mesmo.Mas foi quando Ricci se aproximou discretamente, com o olhar levemente tenso, que o sangue de Dante começou a ferver.— Senhor Marchesi…— ele se curvou e sussurrou — temos uma presença inesperada no salão. Ela entrou com o grupo de diplomatas franceses.— Quem?— Dante franziu a testa.Ricci apenas olhou discretamente para a mulher ao fundo do salão.E ali estava ela.Caterine Valois.A mulher por quem Dante quase perdeu o controle anos atrás. A que ele chamava de *Rosa do Inferno*. A única que ousou amá-lo do jeito errado.Vestia vermelho sangue. Um vestido colado ao corpo, com uma fenda ousada que revelava a perna até a metade da coxa. O cabelo preso em um coque elegante, e um sorriso d
A fumaça do charuto pairava no ar como um véu denso de segredos. O patriarca dos Marchesi, Severino, observava a taça de conhaque em sua mão como se nela estivesse o destino da linhagem. À sua frente, sentada como uma dama de porcelana, estava Caterine Valois— elegante, com um vestido preto justo e um colar de rubi no pescoço.— Ele se apaixonou por ela. De verdade.— disse Don, com nojo contido. — Uma garota sem nome, sem sangue nobre. Uma virgem que virou obsessão.Caterine sorriu com doçura venenosa.— Por isso você me chamou de volta da morte?— Você era a única que ele obedecia sem questionar. A única que ele desejou antes de ficar cego por essa... Unirian.Ela inclinou-se para frente, com os olhos brilhando.— Então vamos fazer o lobo lembrar de onde ele veio. E quem ensinou a matar.Don bebeu o conhaque num gole só.— Traga ele de volta. Nem que seja quebrando o que o mantém fraco.Mais tarde, no jardim — Encontro entre Caterine e Unirian.Unirian estava sentada à sombra das ros
O bebê chorou mais alto, e Caterine, assustada, hesitou por um segundo antes de entregá-lo. Unirian o pegou com força e o abraçou como se fosse protegê-lo de um furacão. — O que você pensa que está fazendo aqui? Você perdeu o juízo? Dante apareceu no corredor, a expressão confusa se transformando em fúria pura ao ouvir a gritaria. — O que está acontecendo aqui?! — TIRA ESSA MULHER DAQUI, DANTE!— gritou Unirian, lágrimas escorrendo enquanto embala o bebê. — Ela estava com o nosso filho nos braços, sozinha! Dante viu vermelho. Ele agarrou o braço de Caterine e a puxou com força pelo corredor. Seus passos eram pesados. Caterine quase tropeçou, mas não se opôs. — Você passou de todos os limites.— rosnou ele, a mandíbula tensa. — Você não chega mais perto dela, nem dele. Nunca mais. Ela parou, puxando o braço, finalmente olhando para ele com olhos marejados. — Sabe por que eu fiz isso? Porque eu ainda amo você. Porque quando eu vejo aquele bebê, eu vejo tudo o que eu perdi. Tudo
Era sábado. E pela primeira vez em meses, não havia reuniões, ameaças ou olhares duvidosos cruzando o portão da mansão Marchesi.A casa estava silenciosa, exceto por um som suave vindo da cozinha. Dante, com a camisa branca parcialmente desabotoada e o cabelo um pouco bagunçado, equilibrava uma frigideira com uma mão e o bebê no canguru preso ao peito.— Nós vamos fazer panquecas pro café da manhã da mamãe, sim senhor. Mas você tem que me ajudar a não deixar queimar— murmurava para Villano, que, aos dois meses, observava tudo com olhos atentos e redondos.Unirian apareceu na porta da cozinha com um sorriso sonolento e o roupão amarrado preguiçosamente. Ao ver os dois juntos — pai e filho em plena harmonia — ela apoiou-se no batente da porta, sentindo o peito apertado de amor.— Esse é o homem mais perigoso da Itália fazendo panquecas de ursinho com um bebê amarrado ao peito. Isso precisa ser registrado.Dante olhou para trás e sorriu, aquele sorriso raro, que só ela conhecia.— Shhh,
— Me promete… que vai voltar. Que vai lutar por isso aqui. Por nós.— Eu morreria por isso aqui, Unirian. Por vocês. Mas não hoje. Hoje, eu vou viver. Pra voltar.Eles se abraçaram forte. Ele a beijou demoradamente, como se cada segundo pudesse ser o último.Quando soltou, olhou para o berço.— Se ele acordar, diz que o papai volta logo. E que eu amo ele mais do que minha própria alma.Unirian apenas assentiu com lágrimas nos olhos.Na porta, antes de sair, Dante virou-se uma última vez. Olhou para os dois amores da sua vida e disse com firmeza:— Eles não sabem com quem mexeram. E vão pagar. Mas primeiro… eu volto. Pra vocês.E então, desapareceu na escuridão da madrugada, deixando para trás o perfume suave de lavanda da casa… e o coração da mulher que, mesmo acostumada com guerras, nunca se acostumaria com o vazio que Dante deixava.O carro seguia silencioso pela estrada escura. A cidade ainda dormia, mas na mente de Dante, o mundo inteiro estava em ruínas. A ausência do toque del