Há uma coisa que ninguém nunca entende sobre a Fênix: antes de renascer das cinzas, ela arde.
E eu ardi. Por anos. Agora, o fogo está sob controle. Canalizado. Direcionado.A vitória na sala de reuniões ainda está fresca nos meus sentidos. Posso sentir o gosto metálico da tensão, o perfume caro da humilhação alheia, o calor discreto da admiração nos olhos de Celso Barreto. A Phoenix não só entrou no jogo. Nós assumimos o tabuleiro.
Ao chegar em casa, ligo para minha amiga, que não demora a chegar. Assim que ela aparece, nós três decidimos sair para uma baladinha e comemorar.
— Bea e Elisa, vamos arrumar uns boys gostosos pra gente — diz Lívia, animada, e eu apenas rio ao encará-la.
— Não quero nenhum boy, amiga. Só quero tomar uns drinks e voltar para casa tranquilamente — respondo.
Lívia revira os olhos e nos chama para sair.
Na balada, cumpro exatamente o que prometi a mim mesma: bebo, danço e converso com as meninas. Quando algum homem se aproxima, sou rápida em dispensá-lo. Lívia, por outro lado, vive sumindo, e sei bem o motivo: está ficando com algum cara.
Desde que Leonardo destroçou meu coração, não me envolvi com mais ninguém. E, sinceramente, nem quero. Só eu sei o quanto foi difícil me reerguer.
— Beatrice, vou ao banheiro e já volto — avisa Elisa, saindo em meio à música alta.
Permaneço sentada e peço outra bebida ao barman, observando os flertes e as danças ao redor. Mais um cara tenta puxar assunto e o despacho com a mesma frieza. Elisa se aproxima e senta ao meu lado, limpando os lábios.
— Sério que você não vai escolher um gato pra passar a noite? — pergunto, e nego com a cabeça.
— Não estou dizendo pra você namorar ou se casar com um cara, mas o que estou dizendo é: se divirta! Beije, faça sexo louco e quente.
— Dispenso.
— Bea, você não sente falta de beijar ou transar loucamente?
— Tudo que eu quero é ver a minha empresa crescer. Quero esmagar Leonardo e Isadora. Foi só pra isso que voltei ao Brasil — digo, encarando-a com firmeza. — E, claro, para ver minha amiga louca.
— Acho bom mesmo que lembre de mim — retruca, fingindo ofensa.
Logo depois, ela vê um cara que a interessa e, incentivada por mim, vai até ele. Não deixaria minha amiga entrar na fossa junto comigo.
Elisa reaparece, e aviso que já estou indo embora. Ela diz que irá comigo. Como não encontro Lívia, envio uma mensagem pedindo que aproveite por mim e a informo que estamos saindo.
Ao chegar em casa, tomo um banho e me jogo na cama, adormecendo rapidamente.
Acordo com o celular vibrando incessantemente na mesinha de cabeceira. Ainda está escuro lá fora. Pisquei algumas vezes, sentindo o peso da noite anterior nos ombros não pelo álcool, que consumi com parcimônia, mas pelas emoções embaralhadas, pela nostalgia e pela guerra silenciosa que ainda arde dentro de mim, como brasas que se recusam a apagar.
Me estico e pego o telefone. É uma mensagem de Celso Barreto.
“Senhorita Marchesi, desculpe a hora, mas certos assuntos não esperam. A repercussão da reunião foi melhor do que imaginávamos. O conselho está ansioso para realizarmos a nossa primeira reunião oficial.”
“Não tem problema, senhor Barreto. Estou à sua disposição.”
“Obrigado, senhorita. Volto a entrar em contato em breve. Estamos ansiosos para trabalhar com a sua empresa.”
Sabia que a reunião da tarde anterior havia sido um sucesso. E, sim, estava animada.
Levanto da cama, amarro o cabelo e vou direto para a cozinha. Precisava de café. Forte. Preto. Amargo. Exatamente como meu foco agora. Com a caneca entre os dedos, caminho até a varanda do apartamento e olho a cidade adormecida.
Meu celular vibra novamente. Uma notificação das redes sociais. Abro por curiosidade. Há marcações de fotos da noite anterior.
Em uma delas, Lívia está sentada no colo de um cara tatuado, rindo com um copo na mão. Elisa aparece em outra, jogando o cabelo para trás no meio da pista, radiante. Em uma terceira, uma imagem minha — sozinha no bar, olhos fixos em algum ponto do além. Rosto sério, corpo relaxado. Eu parecia... perigosa.
“Você se tornou o tipo de mulher que assusta homens fracos”, Lívia costumava dizer.
Com o café já morno nas mãos, retorno ao quarto e abro o notebook. A Phoenix precisava de mim cedo. Havia contratos a revisar, uma nova proposta de expansão e uma reunião marcada com um possível investidor estrangeiro. Tudo indicava que estávamos crescendo rápido no Brasil — talvez rápido demais. E isso me deixava em alerta.
Enquanto reviso o material, uma notificação pipoca no canto da tela. Um e-mail.
Assunto: Convite Especial – Gala Empresarial Monteiro & Associados.Clico. O conteúdo é direto: um evento de gala para empresários e investidores, promovido pela Monteiro & Associados a firma jurídica que sempre esteve ao lado de Leonardo, meu ex-marido traidor e, agora, por ironia do destino, concorrente direto em várias frentes do mercado.
O nome dele está lá. Na lista de anfitriões.
Leonardo Vasconcellos. Ele estará lá. Isadora também, provavelmente. E sabe quem mais? Eu.Sorrio.
Animada pelo convite.Acho que as pessoas querem conhecer a CEO da Phoenix Group. Ou apenas ver como me porto no mesmo ambiente que meu ex-marido e alguns dos acionistas da empresa que ajudei a erguer.
Pego o celular e ligo para Lívia.
— Alô? — ela atende com voz sonolenta.
— Preciso de você. Hoje à tarde. Vamos às compras.
— Uau, bom dia pra você também — resmunga, bocejando. — Que tipo de compras?
— Um vestido. De matar. Vou a um evento da Monteiro & Associados.
Há um silêncio breve do outro lado.
— Leonardo vai estar lá? — pergunta, séria.
— Ele, Isadora, e metade dos canalhas engravatados que me viraram as costas. E talvez alguém da minha família, já que o grupo D’Ambrosio está entre os convidados.
— Você acabou de voltar... Tem certeza de que quer se meter nisso? — Sei que minha amiga está preocupada. Mas nada vai me fazer desistir.
— É hora de mostrar que eu não só sobrevivi... como voltei ainda melhor.
— Ok, estou dentro. Nos encontramos às três no shopping?
— Fechado.
Desligo com o coração acelerado. Aquela noite será um divisor de águas.
Eu sei.Não será apenas um evento social.
Será um campo de batalha.E eu entrarei nele impecável, confiante e com sangue frio nas veias.