Início / Romance / Elisa & Eduardo, Amor e Ódio / Capítulo 6 – A Invisível
Capítulo 6 – A Invisível

A pasta de partituras repousava sobre a mesa da varanda, aberta diante de Elisa. O violino descansava ao seu lado, e os primeiros traços de uma nova composição começavam a surgir em papel pautado. A caneta dançava entre seus dedos com leveza. Havia silêncio, mas não solidão. Pela primeira vez em semanas, o que ela sentia era foco.

A música voltava aos poucos. Como uma língua que nunca se esquece, mesmo depois de anos sem falar.

Elisa passava as manhãs transcrevendo melodias, harmonias e contrapontos. Em segredo, criava arranjos próprios e vendia partituras originais para músicos e conservatórios independentes. Usava um pseudônimo. E já começava a ser reconhecida entre os círculos discretos da música instrumental no Rio.

Eduardo jamais soube.

Ele acreditava que ela passava os dias entre o sofá e a cozinha. E ela o deixava acreditar.

Em paralelo, Elisa também voltará a estudar ... com afinco ... neurologia funcional, uma das áreas que mais a fascinava. Comprou livros, participou de webinars, assistia palestras enquanto ele dormia ou estava fora.

Cada conhecimento absorvido era como uma peça recuperada do quebra-cabeça de si mesma.

------

Transferi uma mesada pra sua conta, disse Eduardo uma noite, sem sequer olhar para ela.

Não precisa ... respondeu ela, mantendo a calma. — Eu estou me virando bem.

Ele franziu o cenho, surpreso.

Vai dizer que está comprando as coisas com... o quê? Bolos de caridade?

Não gasto quase nada. E o que preciso, eu mesma resolvo.

Ele deu um sorriso seco.

Se quiser fingir independência, tudo bem. Mas não banque a mulher moderna, Elisa. Você é uma esposa. Nada além disso.

Ela engoliu o gosto amargo da humilhação e não disse nada. Apenas se levantou da mesa e foi para o quarto. Não chorou. Já aprendera a não chorar por quem não sabe ver.

Mas naquela noite, ao tocar uma melodia suave ao violino, pôs toda sua dor nas notas. Como se a música falasse por ela.

E falava.

------

Dias depois, Eduardo estava em um restaurante de luxo na Barra com dois amigos de infância: André Carvalho e César Leal. Ambos riam alto, rodeados de taças de vinho e memórias antigas.

Então? ... provocou César. Como vai a esposa nova? Dizem que a senhorita Santos é linda, mas misteriosa.

Eduardo riu, com um tom de desprezo sutil.

É só um contrato. Ela cuida da casa, cozinha, arruma flores. Uma dona de casa discreta. Nada muito... estimulante.

André ergueu a sobrancelha.

Ué, não era ela neta da tal Francisca Santos? Dizem que é uma das famílias mais ricas do Rio...

A avó sim. Ela… bom, ela só obedeceu. Vive no meu apartamento, faz silêncio, não interfere. É conveniente.

Os amigos riram. Brindaram à praticidade.

Mas César cutucou:

E a Sophia? Nunca mais falou com ela?

Eduardo ficou em silêncio por um segundo.

Depois, bebeu o vinho e respondeu:

A Sophia escolheu as passarelas. Nunca foi de verdade. Foi... desejo. Imagem. Não passou disso.

Mas mesmo ao dizer isso, seus olhos ficaram vazios por um instante.

------

Naquela mesma noite, quando chegou em casa, encontrou Elisa lendo em um canto da sala, com óculos e os cabelos presos em um coque leve. A imagem da intelectualidade suave. Da calma. Da mulher que não cobrava nada, que não invadia seu espaço. Que ele mal percebia.

Mas naquele momento, talvez influenciado pela conversa no restaurante ou pela frustração com os próprios negócios, Eduardo sentiu algo dentro de si ferver.

Já pensou em se olhar no espelho antes de me esperar? — soltou, seco. — Parece uma bibliotecária cansada.

Elisa ergueu os olhos devagar, tentando entender o que motivava aquele ataque gratuito.

Eu não estava esperando você. Estava apenas... lendo.

Ótimo. Pelo menos está se entretendo com algo. Porque convenhamos… não tem muito mais o que fazer, tem?

Ela fechou o livro com calma, mas seus dedos estavam trêmulos.

Eduardo... por que me fala assim?

Ele deu de ombros, já indo para o quarto.

Porque é a verdade. Você não tem ideia de quem sou, do que carrego. Só está aqui porque nossos avôs quis. E porque eu cedi.

Ela mordeu o lábio inferior, segurando a vontade de chorar. Não na frente dele.

Eu nunca pedi nada de você. Só tentei oferecer algo.

Ele parou na porta, sem olhar para trás.

Pois pare de tentar. Já basta o que temos.

E desapareceu no corredor.

------

Mais tarde, no quarto, Elisa sentou-se com o violino nos braços.

Tocou em silêncio, lágrimas caindo sem som. Tocou até os dedos doerem. Até a mágoa se transformar em melodia.

E então escreveu.

Uma nova partitura, carregada de dor, mas também de força.

Elisa não era uma dona de casa. Não era uma boneca de luxo.

Era uma artista. Uma médica em formação. Uma mulher inteira.

E por mais que ele tentasse apagá-la com palavras, ela florescia no silêncio.

Continue lendo este livro gratuitamente
Digitalize o código para baixar o App
Explore e leia boas novelas gratuitamente
Acesso gratuito a um vasto número de boas novelas no aplicativo BueNovela. Baixe os livros que você gosta e leia em qualquer lugar e a qualquer hora.
Leia livros gratuitamente no aplicativo
Digitalize o código para ler no App