A rua estava quase deserta quando Júlia estacionou o carro em frente ao prédio.
O relógio no painel marcava 23h47.
A cidade parecia adormecida — mas o coração dela não.
Subiu as escadas devagar, cada passo pesado, como se o corpo soubesse que algo estava prestes a acontecer. Quando colocou a chave na fechadura, respirou fundo, tentando organizar pensamentos que simplesmente não queriam se deixar organizar.
A porta se abriu.
Marcos estava sentado no sofá da sala, sem televisão ligada, sem música, sem nada.
Só ele.
Ele a esperava.
Ele sempre esperava.
O olhar dele a encontrou no mesmo instante em que ela entrou.
Não havia raiva.
Não havia cobrança.
Havia apenas tristeza serena — aquela que dói mais do que qualquer grito.
— Júlia — ele disse, baixinho.
Ela fechou a porta atrás de si, encostando-se nela por um segundo, sentindo toda a força do mundo pesando em suas costas.
— Eu precisava dirigir um pouco — ela murmurou.
— Eu sei — Marcos respondeu. — Eu imaginei.
Ele levantou-se devagar.