Dellfiori, o Homem que Me Destruiu e Depois Pediu Perdão
Dellfiori, o Homem que Me Destruiu e Depois Pediu Perdão
Por: Karina Fiori
Capítulo 1 – A Praça das Memórias

O vento daquela tarde era leve, mas tinha um jeito estranho de cutucar minhas lembranças, como se soubesse exatamente onde doía. Ele vinha carregando não apenas o cheiro das flores recém-molhadas pela irrigação da praça, mas também memórias que eu tentei esconder de mim mesma por anos. O tipo de lembrança que não se desfaz, não importa quantas vezes a gente diga que já superou.

Eu estava sentada no banco de madeira da praça principal da cidade — o mesmo banco de sempre, gasto pelo tempo, pelas chuvas, pelo sol, e talvez também por tantas histórias que ali se aninharam. Era como se aquele banco tivesse testemunhado mais da minha vida do que qualquer pessoa. Inclusive a parte que eu mais tentei esquecer.

As folhas secas dançavam ao redor dos meus pés, sendo empurradas pelo vento em movimentos circulares que pareciam quase coreografados. O chafariz ao centro fazia aquele barulho constante e suave da água caindo, aquele som que sempre me acalmou em dias turbulentos. Mas hoje, nem isso bastava.

O tempo passa. As paisagens mudam. As pessoas crescem, amadurecem, se reinventam. E ainda assim, certas marcas permanecem como tatuagens invisíveis, gravadas na alma. Faz doze anos. Doze longos anos — e ainda assim, me lembro como se tudo tivesse acontecido ontem.

E então, como uma onda esquecida que retorna à praia, veio o nome:

Guilherme.

Mesmo pensar nele ainda me trazia um peso familiar ao peito. Não um peso de raiva — raiva seria fácil demais. Seria simples culpar, gritar, virar as costas. Mas o que ficou foi um peso quente e nostálgico, como uma brasa que nunca se apaga totalmente. Um sentimento que eu nunca soube se queria afastar ou acolher.

Eu o amei. Amei profundamente, sem reservas, sem receios, sem medir quedas. Amei daquele jeito que só se ama pela primeira vez: sem manual, sem medo, sem limites. Uma entrega total. E ele… bem, ele me usou de um jeito tão silencioso, tão doce, tão gentil, que só percebi quando já era tarde demais.

Enquanto observava duas crianças correndo pela praça, rindo alto e felizes, me perguntei pela milésima vez como alguém podia transformar algo tão puro em algo tão cruel. Como alguém podia olhar nos meus olhos, tocar minhas mãos com carinho, prometer um futuro, um para sempre… e ainda assim partir como se nada tivesse acontecido?

Puxei o casaco um pouco mais para perto do corpo. Não estava exatamente frio, mas a saudade às vezes gela. Não a saudade dele, mas da menina que eu fui ao lado dele. A menina que acreditava, que tinha brilho no olhar, que achava que amor bastava.

Talvez eu devesse ter superado. Talvez fosse hora de seguir em frente, de fechar o livro, de aceitar que algumas histórias não são feitas para ter final feliz. Mas o problema é que ele não foi apenas uma história que vivi. Ele foi a minha história. Meu capítulo favorito. Meu começo. O marco que mudou tudo que veio depois.

E agora eu estava ali, tentando escrever o fim que eu nunca tive coragem de escrever.

Fechei os olhos por um instante, respirando fundo. O perfume das damas-da-noite, plantadas pelas bordas da praça, ainda era o mesmo. O canto dos pássaros também. A diferença era eu. Eu e a minha cicatriz invisível. Eu e as escolhas que fiz para sobreviver ao que senti.

— Doze anos… — murmurei para mim mesma, quase como quem confessa um segredo guardado por tempo demais.

Doze anos desde que Guilherme cruzou meu caminho. Doze anos desde que me ensinou a amar. E doze anos desde que me partiu ao meio. Doze anos desde que eu prometi a mim mesma que não voltaria aqui. E, ainda assim, aqui estou.

A gente sempre volta, no fim.

Olhei ao redor, buscando algo que me ancorasse ao presente. Pessoas passeavam com cachorros, uma senhora alimentava pombos, um casal adolescente dividia um fone de ouvido. A vida seguia. Sempre segue. Mesmo quando a gente para no tempo.

Eu toquei o banco novamente, como se procurasse alguma resposta na madeira envelhecida. Era aqui que nós costumávamos sentar no final das tardes. Era aqui que eu encostava minha cabeça no ombro dele enquanto falávamos sobre sonhos que nunca aconteceram. Foi aqui, nesse exato lugar, que ele me prometeu amor eterno. Lembro do sorriso dele, do brilho nos olhos, do calor da mão entrelaçada na minha. Lembro até do cheiro do seu perfume naquele dia.

Lembro de tudo.

E foi ali também, exatamente ali, que ele me deixou. Sem explicações. Sem despedidas dignas. Apenas um "não posso ficar" e passos que se afastaram sem olhar para trás. Eu fiquei parada, olhando o vazio onde ele havia estado, tentando entender onde foi que eu errei. Achando que talvez o amor tivesse sido pouco. Ou demais.

Mas a vida tem um jeito curioso de fazer círculos.

Foi justamente quando abri os olhos que ouvi uma voz familiar atrás de mim:

— Achei que ainda encontraria você aqui.

Meu coração parou.

Aquele timbre. Aquele jeito de dizer meu nome sem dizer. Aquele silêncio que vinha depois da frase.

Eu conhecia aquela voz.

Eu nunca deixei de conhecê-la. Porque tem coisas que o tempo não leva, não importa o quanto ele tente.

Eu não precisei virar o rosto para saber. Meu corpo reconheceu antes da mente. Meu peito apertou. Minha respiração falhou. Uma parte de mim quis fugir. Outra quis chorar. Outra — a mais silenciosa de todas — quis sorrir.

Lentamente, como quem teme se despedaçar, virei o rosto.

Guilherme estava ali.

Doze anos depois.

Ele parecia o mesmo — e completamente diferente. Os olhos ainda tinham aquela profundidade tranquila, mas havia sombras ali que não existiam antes. O cabelo estava um pouco mais curto, algumas marcas de expressão se formavam perto dos lábios que um dia eu beijei tantas vezes. Ele parecia mais adulto. Mais sério. Mais humano.

E eu… eu não sabia quem era diante dele.

Meu nome pousou nos lábios dele como se tivesse sido guardado por anos:

— Júlia.

Apenas isso.

Simples. Familiar. Cruel.

Eu engoli o ar devagar, tentando manter minhas mãos firmes sobre os joelhos. Não podia demonstrar fraqueza. Não agora. Não depois de tudo.

— Guilherme. — respondi, e meu nome saiu mais firme do que eu esperava.

O silêncio que veio depois era pesado, espesso, quase palpável. Ele deu alguns passos, aproximando-se, mas mantendo uma distância respeitosa. Ou talvez calculada. Eu não sabia.

— É estranho te ver aqui — ele disse.

— Não é. — respondi. — Eu sempre volto.

Ele respirou fundo, como quem carrega algo que precisa ser dito.

— Eu também voltei.

E naquela hora, naquele minuto suspenso no tempo, eu soube que minha história — aquela que eu tentei enterrar — ainda não tinha acabado.

Não ali.

Não ainda.

Não enquanto ele estivesse diante de mim.

E talvez — talvez — fosse hora de finalmente entender por quê.

Ou fechar o livro, de uma vez.

Mas, por agora, eu apenas senti.

Senti tudo.

Como se doze anos fossem apenas ontem.

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