— Pare uma esquina antes. — A ordem de Franck ao motorista. O carro encostou discretamente.
Antes que o veículo parasse por completo, Rose já abria a porta e descia com pressa, como se fugir fosse a única maneira de se livrar dele.
Mas, antes que pudesse dar mais de dois passos, o motorista abriu o porta-malas e retirou sua bagagem.
Rose parou. O choque estampou seu rosto. Aquela mala era sua vida inteira: lembranças, cartas, joias, segredos.
Do banco traseiro, Franck a observava. Um sorriso de canto se formou em seus lábios, satisfeito ao ver a surpresa dela. Um sorriso sarcástico, quase cruel.
Naquele instante, Rose entendeu.
“Ele achou minha mala. Ele sabe quem eu sou. E... ele mexeu nas minhas coisas.”
O estômago dela revirou com o pensamento. Era insuportável imaginar Franck folheando seu diário, lendo as cartas da mãe, tocando nas joias guardadas com tanto cuidado. Nada era mais íntimo do que aquilo. E agora tudo parecia exposto às mãos erradas.
Rose ficou furiosa. O sangue lhe subiu ao rosto, mas sua indignação foi respondida apenas pela voz provocadora dele:
— Até mais, princesa.
Não respondeu. Apenas virou-se e caminhou firme, passos pesados, sem olhar para trás. O coração apertado pedia para chorar, mas ela se conteve. Cada lágrima guardada era uma barreira contra a invasão dele.
Ao chegar em casa, mal cruzou a porta quando a voz áspera da madrasta a cortou:
— Onde você estava? Você sumiu! — disse Valéria, com arrogância, os olhos faiscando.
Rose não disse nada. Subiu as escadas, como se cada degrau fosse um escudo contra aquela mulher.
Valéria não desistiu:
— Você nos deve satisfação! Você mora nesta casa! — A pausa foi cruel, carregada de veneno. — Ah... achou sua mala.
Ignorou a madrasta e trancou-se no quarto.
Abriu a mala com pressa, quase arrancando o zíper.
Respirou fundo. Tudo estava intacto. As joias, as cartas, o diário, as roupas... nada parecia fora do lugar. Quase como se ninguém tivesse ousado mexer.
Mas a dúvida corroía sua mente: “Ele mexeu. Tenho certeza que mexeu.”
A sensação era clara. Mesmo sem provas, o desconforto a consumia.
Logo, a batida suave na porta a trouxe de volta à realidade.
— Dona Rose — disse a empregada com delicadeza —, a senhora Valéria pediu para lembrar que a senhorita não deve se atrasar para o jantar na casa dos DeLuca.
Rose fechou os olhos, exasperada.
“Claro... ainda tem esse jantar hoje, preciso me recompor”
E o peso do destino voltava a cair sobre seus ombros.
Rose se arrumou sem entusiasmo.
Diferente de Ana, que não parava de tagarelar no carro, excitada com a ideia de estar diante da poderosa família DeLuca. Rose, porém, mantinha o silêncio. O peso do destino já lhe sufocava.
Quando o carro parou diante da mansão dos DeLuca, Rose conteve o fôlego. Era muito mais imponente do que a de seu pai. Mármore branco, colunas altas, jardins impecavelmente cuidados. Cada detalhe daquela propriedade gritava poder. Rose já sabia — os DeLuca estavam entre os mais respeitados da hierarquia da máfia.
“É para isso que minha vida foi destinada…”, pensou, lembrando das palavras da mãe. Foi ela quem explicara o arranjo: Carmen Vitale havia sido grande amiga da matriarca dos DeLuca, Lúcia. E desse laço surgira o pacto que agora pesava sobre Rose.
Foram recebidos na sala de estar. Tapetes persas cobriam o chão, quadros antigos decoravam as paredes, e o ambiente cheirava a riqueza e tradição. Lúcia DeLuca surgiu imponente, um sorriso suave no rosto. Sua presença era tão refinada quanto sua fama.
— Sejam bem-vindos — disse com voz calorosa, mas firme. Aproximou-se de Rose e a fitou com ternura. — Você deve ser a filha de Carmen.
Rose curvou a cabeça, emocionada.
— Sim, sou Rosalie.
— Você se parece muito com ela — Lúcia comentou, beijando-lhe o rosto com elegância.
Logo foram conduzidos à sala de jantar. A mesa era deslumbrante: toalhas finas, talheres de prata, taças de cristal, tudo disposto com perfeição. Valéria e Ana cochichavam entre si, admirando cada detalhe, incapazes de esconder a inveja.
Quando todos já estavam acomodados, um homem entrou. Alto, de postura ereta, terno impecável. O patriarca, senhor DeLuca, irradiava autoridade.
— Boa noite, desculpem a demora — disse, a voz grave dominando a sala. Seu olhar pousou diretamente em Rose. — Você é quem vai se casar com meu filho.
Era uma afirmação, não uma pergunta.
— Sim, senhor — Rose respondeu, tentando manter a calma.
Ele sorriu levemente.
— Martin logo chegará da Alemanha. O casamento será em breve.
O coração de Rose se apertou, mas ela sorriu educadamente, disfarçando o nervosismo.
— Ele está ansioso para conhecê-la — acrescentou Lúcia, com suavidade. — Já mandei a ele as fotos que sua mãe nos enviara.
Rose apenas acenou, engolindo em seco.
— Rosalie foi muito bem criada — seu pai interveio, orgulhoso de repente, quase teatral. — Será uma ótima esposa.
— Sim, eu acredito — respondeu o senhor DeLuca, objetivo, voltando sua atenção ao jantar.
Os pratos começaram a ser servidos. O clima parecia se acalmar, até que…
As portas se abriram novamente. Passos firmes ecoaram pelo mármore. Rose ergueu os olhos e, no instante em que o viu, o ar lhe faltou.
Franck.
Ele atravessou o salão como se fosse dono do espaço. A presença dele enchia o ambiente, atraindo todos os olhares. Rose engasgou com o pedaço de carne que mastigava, tossindo sem parar.
— Rose, tome água, você se engasgou — disse Valéria, preocupada apenas em aparentar.
Um dos empregados rapidamente lhe serviu a taça. Rose bebeu, mas seus olhos não desgrudavam de Franck. Ele também não desviava o olhar, penetrante, firme, quase desafiador.
Lúcia, sem perceber a tensão, anunciou com naturalidade:
— Esse é meu filho, Francisco.
O coração de Rose disparou. Francisco. Franck.
Ele se aproximou da mesa, ainda com o ar calmo de quem sabe o poder que exerce. Puxou a cadeira vazia ao lado de Rose e sentou-se, tão perto que ela pôde sentir novamente o perfume amadeirado que já a atormentava.
— Desculpem a demora — disse, com um leve sorriso que parecia esconder segredos. — Estava resolvendo alguns assuntos.
Então, virou-se para Rose e, sem pudor, cravou-lhe o olhar.
Rose sentiu o corpo inteiro estremecer