— Ai meu Deus. É ele.
Vic parou no meio do corredor de entrada, os olhos vidrados em um homem alto, camisa de linho bege e sorriso de propaganda de perfume caro. — Quem? — perguntou Talita, já curiosa. — O match. O meu match. O “Vinícius com V de veneno”. Olha pra aquilo, Brasil. As três viraram ao mesmo tempo. Sabrina soltou uma risada com ar de deboche: — Ele tem cara de quem sabe usar as mãos. — E de quem apanha com gosto se não souber — completou Clara, sem perder o ritmo. — Vocês são nojentas — Vic disse, ajeitando o cabelo. — Rezem por mim. Se eu não voltar, é porque morri feliz. — Ou amarrado — murmurou Talita. Vic sumiu no meio da multidão com o passo leve de quem já se sentia em casa. As três se olharam com cumplicidade e malícia. — A gente deveria seguir o exemplo e achar nosso próprio “V de veneno” — sugeriu Sabrina. — Ou só dançar até alguém implorar por um gole da nossa atenção — Talita ergueu a taça. Clara sorriu. Mas não respondeu. O vestido azul-marinho colava como segunda pele. O batom vermelho brilhava sob as luzes. Ela não precisava dizer nada. Já era provocação só por estar ali. — Vamos pro salão? — perguntou Talita. — Vamos deixar esse clube ajoelhado — respondeu Clara. E assim, as três entraram no salão de dança. Como tempestade em marcha lenta. E sem saber que o raio estava prestes a cair. O salão de dança era uma catedral moderna. Luzes pulsando no teto. Batida densa, grave, que vibrava no peito. Gente bonita demais pra estar num lugar tão escuro. E exatamente por isso… perfeita. As três entraram como se fossem um trio coreografado pelo próprio pecado. Talita foi a primeira a ser fisgada. Um homem de camisa preta e sorriso afiado se aproximou devagar, segurando um drink como desculpa e o desejo estampado nos olhos. — Tô vendo você dançar desde que entrou. — ele disse. — E tô dançando desde antes de te notar — ela respondeu, antes de aceitar a mão dele com um sorriso debochado. Sabrina, dois passos atrás, teve menos sutileza. Um moreno tatuado, olhar de desafio, colou nela no ritmo da música. — Você parece o problema mais interessante da noite. — E você parece alguém que vai chorar se eu sumir — disse ela, já puxando o cabelo pro lado e colando o corpo no dele. Clara observava as duas com um sorriso contido. Bebia devagar, mexia os quadris com a música, mas sem pressa de ser tocada. Ela gostava de ser caçada. Mas mais ainda… de escolher o caçador. Vic passou por elas com o braço no ombro de Vinícius, rindo alto. Quando viu Clara ainda sóbria e imponente no meio da pista, gritou: — CLARINHA! ACHEI MEU V DE VENENO! SUA VEZ! Ela ergueu a taça no ar, como quem aceita o desafio. E então… dançou. Primeiro devagar. Depois com mais entrega. O vestido colava, os fios soltos do cabelo dançavam com ela. O batom vermelho parecia mais vivo sob as luzes quentes. E os olhares… vinham de todos os cantos. Homens olhavam. Mulheres também. Mas ela não olhava de volta. Ainda não. A música trocou de batida. Mais lenta. Mais grave. Uma mistura de perigo com luxúria calculada. Clara girou sozinha no meio da pista, o vestido azul marinho grudando nas curvas como se tivesse sido costurado direto na pele. Ela não estava procurando ninguém. Mas foi ele quem apareceu. — Clara Antonelli? — a voz grave veio por trás, junto com um toque leve no ombro. Ela virou com calma. Sobrancelhas arqueadas. Olhos preparados pra cortar. Mas então… reconheceu. Eduardo Klein. Herdeiro arrogante da Klein Hotels International. Ex-cliente dela. E ex-foda. No plural. Houve uma época — rápida, crua e sem nomes salvos no celular — em que Clara dormiu com ele mais de uma vez. Sempre do mesmo jeito: Sem romantismo. Com pressa. Com força. Contra paredes, sobre mesas, de frente pro espelho e de costas pra qualquer sentimento. Eduardo gostava do jogo. Mas gostava mais da sensação de que ela poderia ser dele. E foi isso que doeu mais. Porque Clara nunca quis ser de ninguém. — Eduardo — ela disse, com um sorriso que não oferecia nada além do que já foi. — Ainda tentando entender onde errou? — Só esperando você voltar pra consertar — respondeu ele, os olhos famintos no vestido colado. Ele a puxou pela cintura, com a mesma ousadia de sempre. Ela deixou. Pelo controle. Não pelo desejo. Ela dançou com ele. Corpos colados. Ritmo exato. Mãos dele tentando reacender algo que ela já tinha apagado com água fria e ambição. Porque quando ele tentou se aproximar — depois das transas —, ela disse com todas as letras: “Eu não quero flores. Eu quero fundações. Não quero teu sobrenome. Quero o meu gravado no concreto.” E ele nunca superou. O que ela não sabia… É que, naquele exato momento, do alto do mezanino… Leon Vellamo a observava. Imóvel. Respiração contida. Olhos fixos no homem que tocava a mulher que ele ainda não teve — mas já desejava como se fosse dele por contrato. E esse homem era Eduardo Klein. O nome que ele odiava. A arrogância que ele desprezava. O inimigo que ele nunca esqueceu. Clara não dançava com qualquer um. Ela dançava com o homem que Leon jurou derrubar. E ali, no meio das luzes quentes e do som abafado, Leon Vellamo entendeu: A guerra começou.